Acórdão nº 12287/17.5YIPRT.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 02 de Outubro de 2018

Magistrado ResponsávelM
Data da Resolução02 de Outubro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Évora

Sumário: 1. A limitação dos poderes representativos dos administradores de sociedades comerciais, estabelecida em cláusula do contrato de sociedade, não é oponível a terceiros de boa-fé.

  1. A boa-fé e a própria dinâmica das relações comerciais não é compatível com a exigência constante de exibição do pacto social ou de recurso ao registo comercial, para verificação dos poderes do gerente.

  2. O art. 260.º do Código das Sociedades Comerciais tutela a confiança na representação da sociedade efectuada pelos seus gerentes, enquanto o art. 261.º se apresenta como mera norma interna, disciplinadora do funcionamento dos órgãos executivos das sociedades por quotas.

  3. A invocação da falta de poderes do gerente, como expediente para a Ré se eximir ao cumprimento de obrigações assumidas em seu nome e representação e que beneficiaram a sua actividade económica, traduz venire contra factum proprium, proibido pelo art. 334.º do Código Civil.

    Acordam os Juízes da 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora: No Juízo de Competência Genérica do Entroncamento, foi julgada procedente a acção proposta por (…) e (…), Lda. – Sistemas de Rega, Bombagens e Electricidade, contra J.L. (…), Lda., e assim esta condenada a pagar a quantia de € 19.694,95, acrescida de juros vencidos desde a data de vencimento de cada uma das facturas.

    Desta sentença vem interposto recurso pela Ré, concluindo: A. No presente caso, a R. foi demandada para pagar uma obra de instalação dum sistema de rega, obra essa encomendada apenas por (…), gerente da R. conjuntamente com (…), sendo que a forma de obrigar da sociedade era à data pela assinatura de dois gerentes – factos 1.7 e 1.9.

    1. Fê-lo à revelia da outra gerente e dos sócios, desconhecendo-se por não demonstrado em que termos, i.e., se se apresentou como representando a Ré.

    2. A forma de obrigar a sociedade era pública, e constava do respectivo registo comercial – facto 1.9.

    3. Errou assim o douto tribunal a quo ao decidir que tal acto de (…) obrigou a sociedade, valendo-se de jurisprudência que por um lado não é pacífica, e por outro cuja aplicabilidade ao caso dos autos é dúbia.

    4. Se o contrato de sociedade prevê que a forma de obrigar da mesma é através de dois gerentes, e se tal facto é obrigatoriamente sujeito a publicidade, constando expressamente de qualquer certidão do registo comercial que pode ser obtida por qualquer interessado por € 15,00 é no entender da recorrente despropositado invocar a protecção de terceiros para subverter as regras legais e contratuais sobre a forma de obrigar da sociedade.

    5. Uma contratante que numa obra de € 20.000,00 não usa o seu dever de diligência para se certificar que a pessoa que se apresenta a encomendá-la é quem diz ser e se tem poderes de representação necessários, é no mínimo negligente, não merecendo qualquer tutela de protecção de terceiros.

    6. No presente caso nem se demonstrou sequer que (…) se tenha apresentado como representante da Ré.

    7. Mas mesmo que o tenha feito, o que só se admite ad cautelam, (…) agiu sozinho, no âmbito de uma gerência plural, em violação do disposto no art. 261º do CSC, agindo assim FORA dos poderes que a lei lhe confere, e à revelia da outra sócia da empresa, portanto também fora de qualquer deliberação social. Não cumpre assim os requisitos para que lhe seja aplicável o disposto no artigo 260º do CSC (neste sentido o Ac. TRL de 06/30/2009 proferido no proc. 3236/08.2TVLSB-A.L1-1 disponível em dgsi.pt.

      1. A consagrar-se o entendimento da douta sentença a quo seria absolutamente irrelevante as sociedades instituírem gerências plurais, pois que tal facto seria irrelevante perante terceiros. Ora tal seria uma subversão...

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