Acórdão nº 20650/16.2YIPRT.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 24 de Maio de 2018
Magistrado Responsável | MANUEL BARGADO |
Data da Resolução | 24 de Maio de 2018 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora I - RELATÓRIO AA apresentou requerimento de injunção contra BB, pedindo a notificação desta no sentido de lhe ser paga a quantia de € 7.264,27,00, sendo € 6.975,00 de capital, € 187,27 de juros de mora e € 102,00 de taxa de justiça devida pela injunção, e bem assim os juros legais, contados desde a citação até efetivo e integral pagamento.
Alegou, em síntese, ser a legitima proprietária da fração autónoma designada pela letra "A-Um", correspondente ao …º andar direito, (Corpo B), do prédio urbano sito na Praceta …, Torre 1, Edifício …, na Freguesia de Santo António dos Cavaleiros, Concelho de Loures, tendo dado a mesma de arrendamento à requerida por contrato celebrado em 29.01.2007, ficando esta última obrigada ao pagamento de uma renda no valor inicial de € 212,50, valor alterado por adenda em 04.10.2011, para o valor de € 450, 00, sendo que a requerida não pagou as rendas de Julho de 2014 a Janeiro de 2015, e nos meses de Março de 2015 e Abril de 2015, as rendas foram pagas com atraso, acrescendo ainda que a requerida resolveu o contrato em 27.06.2015, sem comunicação prévia à requerente.
A requerida deduziu oposição, contrapondo que na dada da celebração do contrato de arrendamento referido supra foi celebrado um outro, tendo nessa altura a requerida entregue a título de pagamento de renda do mês de Fevereiro de 2007 e caução o montante total de € 850,00, sendo que no período de Julho 2014 a Janeiro de 2015 foi acordado verbalmente entre as partes a redução da renda para aquele período, tendo a requerida pago tais rendas em dinheiro, propondo no final de Janeiro de 2015 a retoma do valor total da renda inicialmente acordada e o pagamento da quantia em falta em prestações de € 50,00 até perfazer a totalidade. Admite o pagamento das rendas de Março e Abril nos dias 10 e 9 desses meses e diz ter comunicado a pretensão de deixar o imóvel por carta registada com AR que remeteu para a morada da requerente/senhoria, a qual veio devolvida.
Os autos foram distribuídos como ação especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos, nos termos e ao abrigo do disposto no D.L. nº 269/98 de 1 de Setembro.
Foi julgada verificada a incompetência territorial do Juiz 1 da Secção Cível da Instância Local de Loures, e remetidos os autos à Secção Cível da Instância Local de Faro tida por territorialmente competente.
Notificada a autora para se pronunciar acerca da matéria de exceção alegada pela ré, veio a mesma impugnar o alegado acordo de redução do valor de renda invocado pela ré e esclarecer a razão dos acordos celebrados em 2007, pugnando pela improcedência da matéria de exceção alegada.
Foi designada data para a realização da audiência de julgamento, tendo no seu início as partes apresentado os respetivos requerimentos probatórios.
Concluída a produção de prova que teve lugar ao longo de três sessões de julgamento e antes da sua conclusão, em 23.06.2017, a Sr.ª Juíza a quo proferiu o seguinte despacho: «Não obstante as partes terem já produzido alegações, entende-se face à prova produzida que poderá verificar-se subsunção à excepção peremptória de abuso de direito (art. 334.º CCivil).
Trata-se de questão não suscitada pelas partes, mas de conhecimento oficioso.
Assim, ao abrigo do disposto no art. 3.º n.º3 do NCPC, determina-se a notificação das partes para, querendo, em 5 dias, se pronunciarem.
» Notificadas as partes, a autora pronunciou-se no sentido da inexistência de abuso de direito e a ré pela sua verificação.
Em 07.07.2017 a Sr.ª Juíza proferiu estoutro despacho: «Considerando que a prova produzida poderá importar a subsunção da factualidade à eventual condenação da A. como litigante de má fé (cfr. art. 542.º e 545.º NCPC), matéria de conhecimento oficioso, impõe-se deferir às partes o exercício do contraditório a respeito de tal matéria (cfr. art. 3.º n.º3 NCPC e neste sentido Ac. STJ de 11.09.2012, P.2326/11.9TBLLE.E1.S1, in www.dgsi.pt), concedendo-se para o efeito prazo até ao início da reabertura da audiência no próximo dia 12.07.2017, pelas 16.00h, data para a qual se transfere a diligência designada para o dia de hoje (que assim fica prejudicada).
No dia 12.07.2017, a Sr.ª Juíza proferiu o seguinte despacho: «Considerando que as Ilustres Mandatárias estavam regularmente notificadas para a diligência e não compareceram, determino que seja aberta conclusão, de imediato, a fim de a sentença ficar disponibilizada no Citius.
» Foi então proferida sentença, precedida da fixação do valor da causa [€ 7.162,27] e do saneamento tabelar da mesma, na qual se julgou a ação improcedente e se absolveu a ré do pedido, e condenou-se a autora como litigante de má-fé em multa que se fixou em 4 UC e ainda em indemnização de valor a fixar ulteriormente, a pagar à ré.
Inconformada, a autora apelou do assim decidido, finalizando as alegações com as seguintes conclusões: «i. A Mandatária da A. não foi notificada da Sentença proferida nos Autos, nulidade com evidente influência no exame e decisão da causa – art.º 195.º, n.º1, do CPC.
ii. Assiste à parte que litiga em causa própria, o direito de constituir mandatário em qualquer fase do processo, passando o mandatário a partir desse momento a assumir todos e quaisquer actos no processo e não a parte que até determinado momento litigou em causa própria, sem procuração outorgada a si mesma, figura legalmente inexistente.
iii. A inobservância do art.º 151, do CPC, e a violação do princípio da cooperação, igualdade de partes e bem como do principio do contraditório são nulidades processuais com evidente influência no exame e decisão da causa – art.º 195.º, n.º1, do CPC.
iv. A realização de qualquer Audiência, sem a presença de Mandatário constituído e a postergação de prazos processuais, constitui violação clara dos princípios do contraditório e da igualdade das partes ínsitos nos art.ºs 3 e 4.º do CPC.
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Existe omissão de pronúncia quando o Tribunal não se pronuncia acerca da extemporaneidade de apresentação de oposição, nos termos e para os efeitos do art.º 615, 1 d) do CPC.
vi. A Autora não foi notificada para aperfeiçoar o requerimento de injunção violando o Tribunal a quo os art.ºs 6º e 590º, ambos do CPC.
vii. A gravação da Audiência ocorreria por imposição legal e em todos os casos, sem necessidade de requerimento, o Tribunal não deu cumprimento ao regime previsto no art.º 155.º do CPC.
viii. Nos termos do nr.º 5 do art.º 3.º, do DL 269/98 não pode a parte produzir mais de três testemunhas sobre cada um dos factos que se propõe provar, não se contando as que tenham declarado nada saber, a prova produzida em sede de Audiência é nula, por violação do limite de número de testemunhas legalmente previsto.
ix. A decisão não se encontra fundamentada referindo-se a factualidade, sem referir os factos de que fazem parte a factualidade, sendo nula, nos termos e para os efeitos da alínea b) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC., sendo ambígua do ponto de vista em que aproveita prova contraditória que é uníssona, nulidade que se invoca nos termos da alínea c) do artigo 615.º do CPC.
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Foi violado o disposto no artigo 3.º, n.º 3 do Código Processo Civil, na dimensão normativa aí estatuída que impede que o tribunal emita pronúncia ou profira decisão nova sem que, previamente, accione o contraditório bem como o preceituado no art.º 149.º do CPC quanto a prazos, no que respeita à condenação por má-fe e à verificação de abuso de direito.
xi. Há violação de lei, designadamente das disposições conjugadas dos artigos 542.º e 543.º do CPC, porquanto não poderia na sentença conceder-se nova oportunidade para que uma parte deduza qualquer pretensão contra a outra. O requerimento apresentado pela R., em 03.07.2017., deveria ter sido indeferido, logo na decisão, pelos motivos que o próprio tribunal invoca, ao invés de, sem base legal, se conceder novo prazo e oportunidade.
xii. Os poderes do tribunal a quo esgotaram-se com a prolação da sentença, nos termos do disposto no art.º 613.º do CPC não podendo o tribunal influenciar as partes no sentido de virem pedir uma indemnização quando tal iniciativa compete apenas à parte que a peça, cfr. art.º 542.º 1 do CPC pelo que se entende que há nítida violação de lei quanto ao despacho emitido em 27.09.2017., após prolação da sentença.
xiii. A solução seguida pelo tribunal desvinculou-se totalmente do alegado pelas partes, nulidade que se invoca nos termos e para os efeitos da alínea e) do art.º 615.º do CPC.
xiv. O tribunal a quo produziu uma decisão surpresa, ao comportar uma solução jurídica que a parte não tinha obrigação de prever, pois não foi produzida qualquer prova sobre os fundamentos da decisão acerca da declaração de nulidade.
xv. A posição da Autora encontra-se suportada documentalmente nos Autos e a decisão é nula porquanto padece de omissão de pronúncia - art.º 615.º, n.º 1, d), quanto a documentos juntos aos Autos, cfr. carta enviada pela A. a exigir o pagamento de divida.
xvi. Não poderá ser considerada como de abuso de direito qualquer pedido da Autora porquanto esta exigiu o pagamento da divida em momentos anteriores, por documentos juntos aos autos.
TERMOS EM QUE deve a sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que, condene a R./ apelada do pedido, faça JUSTIÇA.» A ré contra-alegou, defendendo a manutenção do julgado.
Dispensados os vistos, cumpre apreciar e decidir.
II – ÂMBITO DO RECURSO Sendo o objeto do recurso limitado pelas conclusões das alegações, por elas se conclui que a recorrente invoca fundamentos de eventuais nulidades processuais, nomeadamente a inobservância do artigo 151º do Código de Processo Civil [CPC], a falta de gravação da audiência de julgamento, o excesso do número de testemunhas inquiridas, bem como a violação do princípio da cooperação, igualdade de partes e do principio do contraditório, e fundamentos de nulidade da sentença recorrida, concretamente, os previstos nas alíneas b), c), d) e e) do nº 1 do artigo...
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