Acórdão nº 15/11.3TCGMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 09 de Janeiro de 2014

Magistrado ResponsávelMANUEL BARGADO
Data da Resolução09 de Janeiro de 2014
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam nesta Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I - RELATÓRIO J e M intentaram a presente acção declarativa, com processo ordinário, contra A, Lda.

, pedindo a condenação desta a pagar-lhes a quantia global de € 36.963,05, sendo € 26.963,05 a título de danos patrimoniais e € 10.000,00 a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros até total ressarcimento.

Para tanto alegaram, em resumo, que: - no âmbito de um processo crime contra ambos instaurado, a autora foi condenada pela prática de um crime de ofensa à integridade física simples, na pena de 180 dias de multa à taxa diária de € 9,00, e o autor condenado pela prática de um crime de ofensa à integridade física simples na pena de € 180 dias de multa e de um crime de coação na pena de 8 (oito) meses de prisão, substituída por 240 dias de multa, na pena única de 350 dias de multa à taxa diária de € 60,00, tendo ainda a autora e o autor sido condenados no pedido cível a pagarem à aí demandante a quantia de € 600,00 e de € 3.000,00, respectivamente; - os autores, logo que saíram da sala de audiência após a leitura da sentença, deram instruções ao Dr.

N para recorrer, tendo o mesmo concordado com eles, referindo que a prova era contraditória e que, em sede de recurso, com toda a certeza a decisão seria alterada; - tudo o que o Dr.

N pediu aos autores, a título de honorários e despesas, foi pago, entendendo os autores, das conversas que com o mesmo mantiveram e do que pelo mesmo foi dito, que facilmente e na pior das hipóteses, no Tribunal da Relação a pena de multa do Autor baixaria em um quarto, já que entendia que bastaria ao Senhores Desembargadores ouvirem a prova produzida em julgamento para que ambos os Autores fossem absolvidos; - o recurso apresentado pelo Dr.

N veio a ser indeferido por ter sido interposto fora de prazo, tendo aquele informado a autora desse facto; - nesse recurso concluía-se pela absolvição dos arguidos e, ainda, caso tal não ocorresse, pela baixa dos autos ao tribunal a quo para quantificação da situação dos arguidos, de forma a ser fixada no mínimo a medida da pena; - nas alegações de recurso eram apontadas deficiências e contradições nos depoimentos prestados pelas testemunhas de acusação que, com grande probabilidade, levariam a uma diversa apreciação da factualidade em causa pelo Tribunal da Relação, sendo certo que, a manter-se qualquer condenação, os valores das multas e indemnizações cíveis em causa seriam certamente diminuídos em mais de 70%; - com o indeferimento do recurso por extemporaneidade, goraram-se todas as esperanças dos autores de verem reposta a verdade dos factos ou, pelo menos, de ver reduzida substancialmente a pena aplicada; - como consequência directa do erro ou falta profissional do Dr.

N, os autores sofreram danos na medida exacta das multas, custas e indemnizações em que foram condenados e que pagaram, no montante total de € 26.963,05; - os autores passaram a ostentar condenações nos respectivos registos criminais, sofrendo desgosto e angústia profunda, pois viram coarctada de forma definitiva o meio de poderem corrigir um erro judicial; - os autores sofreram ofensa à hora ou reputação, sendo pessoas conceituadas socialmente, queridas e respeitadas no local onde trabalham e habitam, sendo ainda conhecidos de todas as pessoas da região, onde rapidamente se constou a condenação; Contestou a Ré, invocando a sua ilegitimidade em virtude da acção não ter sido também proposta contra o Dr.

N, dizendo ainda, no essencial, que o recurso para a Relação não seria susceptível de alterar a decisão condenatória, não existindo nexo causal entre a conduta e os danos alegadamente sofridos pelos autores Terminou pedindo a sua absolvição da instância ou do pedido e, por último, requereu a intervenção principal provocada do Dr.

N.

Houve réplica, aceitando os autores o chamamento a juízo do senhor advogado e requerendo também eles a sua intervenção.

Admitida a intervenção requerida pela ré e citado o Dr.

N, veio este declarar que fazia seus os articulados da ré.

Dispensada a audiência preliminar, foi proferido despacho saneador tabelar e procedeu-se à selecção da matéria de facto assente e à organização da pertinente base instrutória.

Instruído o processo, seguiram os autos para julgamento, sendo a matéria de facto decidida nos termos do despacho de fls. 360 a 365, sem reclamações.

Por fim, foi proferida sentença que julgou a acção improcedente e absolveu os réus do pedido.

Inconformados com o assim decidido, apelaram os autores, extraindo da respectiva alegação as seguintes conclusões: «I. O Tribunal reconhece a conduta culposa e ilícita do Réu no cumprimento do contrato de mandato. Por uma questão de reafirmação e para que não hajam duvidas desta certeira posição do Tribunal, convém referir que realmente um dos elementos essenciais do contrato de mandato é que o mandatário assuma a obrigação de praticar actos jurídicos, que no caso dos autos não se tratam de actos jurídicos da lavra e iniciativa do mandatário, embora o pudessem ser, mas no caso dos autos é por ordem dos mandantes (vide números 20 e 21 dos factos dados como provados na Sentença), e com a concordância do mandatário. E para que exista contrato de mandato é necessário que os actos jurídicos a praticar sejam realizados por conta dos mandantes, que é o caso.

  1. Dispõe o artigo 1161.º alínea a) do Código Civil que “O mandatário é obrigado: … A praticar os actos compreendidos no mandato, segundo as instruções do mandante.” III. E até aqui o Tribunal “a quo” segue a linha de raciocínio de qualquer normal julgador, quer em face da Lei quer em face da prova produzida, mas de repente e logo que termina o apuramento da culpa no incumprimento do mandato, dá “uma cambalhota” no seu pensamento salutar e entre por caminhos tortuosos criando dificuldades as mesmas não existem, nem nunca existiram, e não se diga que é uma simples tomada de posição jurisprudencial, parecendo mais uma incursão peregrina nesse mesmo campo onde só alguns conseguem aceder.

  2. Parece-nos que não restam quaisquer dúvidas da existência de contrato de mandato e do seu incumprimento culposo por parte do Réu Dr.

    N.

  3. O Dr.

    N incumpriu o contrato de mandato culposamente (aliás sendo tal facto reconhecido pelo próprio), ou seja, não interpôs recurso, o que independentemente do resultado que viesse a ter não foi interposto, houve a “perda de oportunidade” por parte dos Apelantes e o Tribunal “a quo” entendeu que na sua opinião como alegadamente não houve prova do dano, fica tudo assim, na “paz dos anjos”, porque entende que essa oportunidade nunca existiu, em suma, não haverá qualquer responsabilidade civil do Réu Dr.

    N, porque o Senhor Juiz acaba por dizer entre linhas, que nem deveria ter havido recurso A douta sentença desde logo, começa por responder à matéria de facto de forma vaga e sem fundamentação laudável, tendo considerado factos como provados que não o poderiam ter sido, e um facto não provado, erradamente, tudo tendo como referencia a prova apresentada, pelos aqui Apelados.

  4. É óbvio que existe dano, quer patrimonial quer não patrimonial, até porque a convicção dos Réus era a alteração da decisão da primeira instância, e que nunca chegaram a saber se iria ocorrer, porque não chegou a ser apreciado o recurso.

  5. Com o devido respeito não pode o Tribunal “a quo” ter dons premonitórios ou adivinhatórios de que por certo não teria provimento, e muito menos substituir-se ao Tribunal superior a aspirar a tal, pois quando atingir o desiderato respectivo poderá proferir Acórdãos que se esperam mais “normalizados” e justos.

  6. O Tribunal “a quo”, não tem que analisar um recurso que foi rejeitado e muito menos um processo cujos contornos mais elementares desconhece e não tem que conhecer, deveria ter analisado o processo que lhe foi apresentado e decidir de acordo com a lei, a jurisprudência, a doutrina e sobretudo com bom senso jurídico, não tinha que inventar nada bastava cingir-se ao que consta dos autos, que em nosso entender é mais que suficiente para decidir de forma diferente da que decidiu que no caso tem duas parecenças opostas, por um lado uma tentativa de se substituir ao Tribunal da Relação e por outro um verdadeiro “non liquit”, até porque poderia sempre recorrer à equidade.

  7. Nem a mediatividade de um processo similar com os mesmos contornos e só foi rejeitado por uns minutos de atraso, fez com que o Tribunal “a quo” seguisse nem que fosse à distância a indemnização atribuída.

  8. O dano patrimonial é representado pela diferença entre a situação real actual da vítima e a situação hipotética em que se encontraria caso não houvesse sofrido o dano, nos termos do artigo 566.º n.º 2 do Código de Processo Civil.

  9. A culpa está dada como provada pelo Tribunal “a quo”, é evidente que existe dano, quer patrimonial quer não patrimonial. No limiar do absurdo, constata-se que ficou provado que os aqui Apelantes pagaram tudo que o seu advogado pediu para interpor recurso (confissão do Ilustre causídico), como o recurso não foi interposto pelo menos esses valores teriam que ser devolvidos, e para este elementar raciocínio não é necessário aspirar a ser Venerando Desembargador, pelo menos este valor é dano patrimonial, mas existe igualmente mais danos patrimoniais nomeadamente a perda de oportunidade que não sendo quantificável de forma matemática, tem que ser indemnizada sob pena de benefício claro do infractor nestes autos e nos próximos.

  10. Acrescem ainda os danos não patrimoniais e os danos não patrimoniais futuros, basta atentar nos factos provados sob os números 35 a 44 da Sentença, e todos eles decorrem da actuação (omissão) culposa do Ilustre Causídico.

  11. O nexo de causalidade entre o facto e o dano é simples e demasiado visível, bastaria o Tribunal questionar-se de forma introspectiva se todos os factos que deu como provados dos números 35 a 44 teriam ocorrido se o Advogado tivesse intentado o Recurso para o Tribunal da Relação de Guimarães dentro do prazo legal.

  12. O...

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