Acórdão nº 639/08.6GBFLG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Outubro de 2012

Magistrado ResponsávelFERNANDO MONTERROSO
Data da Resolução15 de Outubro de 2012
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães No 1º Juízo do Tribunal Judicial de Felgueiras, em processo comum com intervenção do tribunal colectivo (Proc. nº 639/08.6GBFLG), foi proferido acórdão que decidiu (transcreve-se): - Absolver o arguido António M..., da prática de dois crimes de ameaça simples e um crime de ameaça agravado, previstos e punidos, respectivamente, pelos arts. 153°, n°1 e 155°, n°1, ala), do Código Penal; - Absolver o arguido António M..., da prática dos imputados crimes de injúrias na pessoa do assistente Miguel C..., previstos e punidos pelo art. 181°, do Código Penal; - Absolver o arguido António M..., da prática de um crime de injúrias na pessoa da assistente Laurinda C..., previsto e punido pelo art. 181°, do Código Penal; - Condenar o arguido António M..., pela prática de um crime de injúrias na pessoa da assistente Laurinda C..., previsto e punido pelo art. 181°, n°1, do Código Penal, na pena de setenta dias de multa; - Condenar o arguido António M..., pela prática de um crime de ofensa à integridade física simples, na pessoa da assistente Laurinda C..., previsto e punido pelo art. 143°, n°1, do Código Penal, na pena de cento e vinte dias de multa; - Em cúmulo jurídico, condenar o arguido António M... na pena unitária de cento e cinquenta dias de multa, à taxa diária de seis euros, num total de novecentos euros.

Quanto ao pedido cível - absolver o demandado António M... dos pedidos de indemnização formulados pelo demandante Miguel C...; - Condenar o demandado António M... a pagar à demandante Laurinda C... a quantia de novecentos euros, acrescida de juros à taxa de 4%, contados desde a presente até efectivo pagamento.

- Absolver o demandado António M... do demais peticionado em sede cível pela demandante Laurinda C....

* Os assistentes Miguel C...

e Laurinda C...

interpuseram recurso deste acórdão.

Suscitam as seguintes questões: - argúem a existência dos vícios previstos no art. 410 nº 2 als. a) e c) do Cod. Penal; - impugnam a decisão sobre a matéria de facto, visando, alterada esta, a condenação do arguido; - mesmo improcedendo a impugnação da matéria de facto, o arguido deverá ser condenado como autor de um crime de violência doméstica p. e p. pelo art. 152 nº 1 do Cod. Penal.

* Respondendo, o arguido António M...

defendeu a improcedência dos recursos.

Nesta instância, o sra. procuradora-geral adjunta emitiu parecer no mesmo sentido.

Cumpriu-se o disposto no art. 417 nº 2 do CPP.

Colhidos os vistos cumpre decidir.

* I – No acórdão recorrido foram considerados provados os seguintes factos (transcrição): 1. O arguido António M... viveu maritalmente com a assistente Laurinda C... desde 4 de Agosto de 2007 até dia não concretamente apurado do mês de Novembro de 2008.

  1. Do relacionamento de ambos nasceram as menores Inês M..., no dia 4 de Agosto de 2007, e Lara M..., no dia 27 de Março de 2009.

  2. No dia 6 de Julho de 2008, durante a tarde, quando se encontravam na residência sita no lugar da F..., Airães, o arguido e a assistente Laurinda começaram uma discussão, na sequência da qual e, quando ambos se encontravam já no exterior da habitação, o arguido deliberadamente apertou o pescoço da assistente, provocando-lhe dor e dificuldades respiratórias, em consequência do que esta sofreu escoriações na face esquerda do pescoço, que lhe determinaram três dias para cura, sem afectação da capacidade de trabalho.

  3. Agiu o arguido livre, voluntária e conscientemente, sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.

  4. No dia 14.11.2008, a assistente Laurinda deslocou-se ao serviço de urgência do Hospital de Penafiel, apresentando duas pequenas escoriações nos joelhos, sem outras lesões visíveis 6. No dia 12 de Março de 2009, cerca das 12 horas, quando a assistente Laurinda caminhava na via pública, no lugar de Pedra Maria, Varziela, Felgueiras, surgiu o arguido António que, ao vê-la, dirigiu-se a ela e, em tom elevado e de forma exaltada e séria, chamou-lhe “sua puta, sua filha da puta, sua porca”.

  5. O arguido agiu, no momento referido em 5), deliberada, livre e conscientemente, com intenção de insultar a assistente, como conseguiu.

  6. Sabia, outrossim, que a sua conduta era proibida e punida por lei.

  7. Em consequência do referido em 5), a assistente Laurinda sentiu-se ultrajada, transtornada, humilhada e afectada na sua dignidade pessoal.

  8. Por decisão datada de 31.01.2002, transitada em 15.02.2002 e reportada a factos ocorridos em 17.09.2000, o arguido foi condenado em pena de multa pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punido pelos art. 11° e 12° da Lei n° 57/98, de 18 de Agosto; tal pena foi declarada extinta pelo cumprimento em 20.09.2002; 11. Por decisão datada de 20.12.2004, reportada a factos ocorridos em 25.03.2003 e transitada em 17.01.2005, foi condenado em pena de multa, pela prática de um crime de furto simples, previsto e punido pelo art. 203°, n°1, do Código Penal; tal pena foi declarada extinta pelo cumprimento em 28.09.2005.

  9. Por decisão datada de 19.07.2010, reportada a factos ocorridos em 29.08.2008, 02.11.2008 e 24.02.2009 e transitada em 20.09.2010, foi condenado em pena de multa pela prática, respectivamente, de um crime de injúria, previsto e punido pelo art. 181°, n°1, do Código Penal, um crime de ameaça, previsto e punido pelo art. 153°, n°1, do Código Penal, um crime de difamação, previsto e punido pelo art. 180°, do Código Penal, e um crime de ofensa à integridade fisica simples, previsto e punido pelo art. 143°, do Código Penal; tal pena foi declarada extinta pelo cumprimento em 26.04.2011.

  10. Por decisão datada de 03.02.2011, reportada a factos ocorridos em 23.01.2009 e transitada em 07.03.2011, foi condenado em pena de multa pela prática de um crime de dano, previsto e punido pelo art 212°, do Código Penal, e um crime de injúria, previsto e punido pelo art. 181°, do Código Penal.

  11. O arguido iniciou a escolaridade em idade própria, concluindo o 6° ano, não tendo revelado motivação para os estudos, apesar de não ter dificuldades de aprendizagem.

  12. Iniciou precocemente o investimento profissional, como motorista profissional.

  13. No meio social em que cresceu sempre revelou uma imagem favorável, assente na funcionalidade do agregado de origem e em competências pessoais e sociais ajustadas.

  14. Viveu com a assistente Laurinda em união de facto desde 2007, habitando uma casa autónoma pertencente aos pais desta e próxima da deles.

  15. Exercia a actividade profissional de motorista de longo curso, passando períodos de ausência do agregado, altura em que a assistente se encontrava desempregada - sendo anteriormente operária fabril — e beneficiava do subsídio de desemprego. Como se encontrava desocupada, ajudava o pai na agricultura.

  16. O arguido e a assistente Laurinda têm duas filhas, actualmente com quatro e dois anos de idade, e desde há cerca de um ano que aquele está impedido de as ver, situação que o arguido não atribui à progenitora mas ao pai dela.

  17. Vive angustiado com esta situação, com dificuldades em gerir emoções, tendo recorrido por duas vezes às urgências dos hospital por problemas de sistema nervoso, apresentando episódios de ansiedade/depressão; durante a entrevista com os técnicos de reinserção social descontrolou-se por várias vezes com choro.

  18. Entretanto, reconstruiu a sua vida afectiva com outra pessoa, com quem vive em união de facto há mais de um ano, tendo já da mesma um filho com um ano de idade e sendo a relação avaliada pela companheira como gratificante, com partilha de responsabilidades e respeito mútuos.

  19. Após um período de desemprego, relacionado com o facto de ter abandonado actividade de motorista, trabalhou numa empresa de trabalho temporário até Novembro de 2011, auferindo um salário de €650. Actualmente faz “biscates” de motorista.

  20. A sua companheira está desempregada, vivendo ambos em casa arrendada pelo valor mensal de €150.

  21. No seu quotidiano, o arguido apresenta rotinas estruturantes, no tempo de lazer privilegia o convívio familiar e com os elementos do seu agregado de origem, com quem continua a manter grande proximidade.

* Considerou-se não provado: A. O arguido e a assistente Laurinda viveram maritalmente cerca de dois anos, tendo tal convivência conjugal terminado em meados de Fevereiro de 2009.

E. A assistente tem um filho maior de idade, fruto de uma relação anterior.

C. Desde o início de tal relacionamento, seguramente desde, pelo menos, meados do ano de 2007, de forma sistemática e sucessiva, o arguido agrediu fisicamente, insultou e ameaçou a assistente , em regra sempre no interior da sua residência, sita, na ocasião, em lugar de F..., A..., Felgueiras, desferindo-lhe bofetadas, murros e pontapés em diversas partes do corpo, para além de a ameaçar constantemente que a matava, bem como lhe puxava os cabelos e a insultava, em regra, com as seguintes palavras: “sua puta, és uma puta, uma vaca”.

D. Durante o período em que co-habitaram, por sucessivas vezes, o arguido desferiu murros e pontapés no corpo da assistente e dirigiu-lhe, em diversas ocasiões, as expressões “és uma puta, uma vaca, o filho que tens não é meu é do teu pai, filha da puta”.

E. O comportamento violento do arguido agravou-se desde Março de 2008.

F. No dia 19 de Abril de 2008, pelas 13 horas, no lugar de Longra, Semande, o arguido desferiu diversos pontapés no corpo da assistente, ao mesmo tempo que lhe dizia que o filho de ambos é filho do pai desta (assistente), tendo tais agressões ocorrido na presença da testemunha Vera Cunha.

G. Em 30.05.2008, pelas 18.30 horas, no lugar do Paraíso, Airães, Felgueiras, o arguido, quando a ofendida se encontrava a trabalhar na lavoura, conduzindo um tractor agrícola, arremessou-lhe pedras que a atingiram no corpo, ao mesmo tempo que lhe dirigia as seguintes expressões: “puta, porca, dormes junto com o teu pai”.

H. Nesta mesma ocasião, o arguido, dirigindo-se para o assistente Miguel, sem qualquer justificação e em voz alta, proferiu as seguintes expressões...

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