Acórdão nº 467/12.4TBPTL-G.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 26 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelESTELITA MENDON
Data da Resolução26 de Fevereiro de 2015
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Processo n.º 467/12.4TBPTL-G.G1 Recorrentes: AA … e BB… Recorridos: “Banco CC …; Banco DD… e EE… ***Acordam na 1ª secção civil do Tribunal da Relação de Guimarães***No dia 29 de Maio de 2012, foi declarada a insolvência de AA e BB, por sentença já transitada em julgado (cfr. referência nº1897704, do p. e., e fls.87-89, do p. p.).

Os insolventes solicitaram a exoneração do passivo restante.

O credor “Banco CC…” pugnou pelo seu indeferimento, por incumprimento do dever de apresentação à insolvência, atento o que preceitua o artigo 238º, nº1, alínea d), do Código de Insolvência e Recuperação de Empresas (CIRE), alinhando, para o efeito, os argumentos invocados no requerimento de fls.165-171, do p. p., que, aqui, se têm por integralmente reproduzidos, por brevidade de exposição.

O credor “Banco DD” sufragou o mesmo entendimento (cfr. fls.172-176, do p. p.).

O Sr. Administrador da Insolvência nomeado, no relatório a que respeita o artigo 155º, do CIRE, não manifestou oposição a que os insolventes beneficiassem da pretendida exoneração (cfr. fls.161, do p. p.).

Em sede de assembleia de credores, o credor EE aderiu à posição dos credores CC e DD (cfr. fls.192, do p. p.).

Responderam os aludidos AA e BB pugnando pela concessão da pretendida exoneração com os fundamentos aduzidos no requerimento de fls.230-237, do p. p.

A final foi proferida a seguinte decisão: “Pelo exposto, indefere-se liminarmente o pedido de exoneração do passivo restante formulado nestes autos pelos insolventes AA e BB, com base nos artigos 3º, nº1, 18º, 237º, alínea a) e 238º, nº1, alínea d), todos do CIRE.

*Devem, pois, prosseguir os autos com as operações da liquidação do activo e posterior partilha”.

É desta decisão que vem interposto o presente recurso pelos Requerentes, que apresentaram alegações e formularam as seguintes CONCLUSÕES: 1. O despacho recorrido indeferiu liminarmente o pedido de exoneração do passivo restante formulado nos presentes autos pelos insolventes.

  1. Tal despacho deve ser revogado porque violou o disposto nos artigos 236º nº 4 e 238º nº1 alínea d) do CIRE e o artigo 342º do C.C 3. Com efeito, o pedido de exoneração foi formulado atempadamente, na petição inicial, e cumpriu os requisitos do artigo 236º nº 2 do CIRE, pelo que tinha de ser liminarmente admitido.

  2. Fundou o despacho recorrido a sua decisão no disposto na alínea d) do artigo 238º do CIRE, interpretando essa norma como sendo dever dos insolventes alegar e provar factos que permitam concluir que não causaram prejuízo aos credores, interpretação essa com a qual não pode concordar-se.

  3. Ora, como tem vindo a ser decidido pela Jurisprudência dominante e recente sobre esta matéria, os fundamentos para o indeferimento liminar contidos nas diversas alíneas do n.º1 do artigo 238º do Código da Insolvência integram factos impeditivos do direito do devedor obter esse benefício, que, assim, devem ser alegados e provados pelos credores e/ou pelo Administrador de Insolvência.

  4. Pois que, resulta, com evidência, do disposto no n.º 3 do artigo 236º do CIRE, que o devedor pessoa singular apenas tem de “expressamente declarar” que “preenche os requisitos” para que o pedido de exoneração do passivo restante não seja indeferido liminarmente. E, no caso, tal foi expressamente alegado – vide petição inicial.

  5. Não se verifica no caso o preenchimento de qualquer outro dos requisitos constantes das restantes alíneas do nº1 do artigo 238º, pelo contrário foi proferida sentença que qualificou a insolvência como fortuita.

  6. Conclui-se pois que, só verificado o preenchimento dos requisitos cumulativos do artigo 238º nº1 alínea d) seria lícito indeferir liminarmente essa pedido.

  7. Com efeito, não se pode aceitar que o simples avolumar de juros implica o prejuízo para os credores a que se refere a alínea d) do artigo 238º do CIRE, porquanto no CIRE, ao contrário do CPEREF, como é sabido, o passivo não fica estabilizado, uma vez que os créditos, enquanto não forem pagos, continuam a vencer juros – artigo 48º alínea b) do CIRE.

  8. Por isso é que, no que se refere a esse prejuízo, que pode ser causado aos credores em virtude de uma apresentação tardia, a Jurisprudência mais recente e maioritária tem vindo a decidir que o mesmo não tem de ser alegado e provado pelo insolvente, por não se tratar de facto constitutivo do seu direito, mas sim que tem de ser alegado e provado pelos credores enquanto facto impeditivo ou extintivo do direito a obter esse benefício.

  9. Conclui-se pois que se o devedor for uma pessoa singular, deve ser-lhe concedida a exoneração dos créditos sobre a insolvência, que não forem integralmente pagos no processo ou nos 5 anos posteriores ao encerramento deste (cfr. art. 235º do CIRE), dependendo a exoneração do passivo restante dos pressupostos referidos no art. 237º do CIRE, e estabelecendo o art. 238º, daquele código, os casos e as situações em que deve ser indeferido liminarmente o pedido.

  10. A apresentação tardia à insolvência só releva em desfavor do requerente, no âmbito da prestação de exoneração do passivo restante, se esse facto implicar prejuízo concreto e efectivo para os credores.

  11. O simples avolumar da contagem de juros não pode ser óbice ao deferimento da pretensão do requerente, uma vez que os mesmos, ao contrário do que acontecia antes da aplicação do CIRE, continuam a ser contados até ao momento da apresentação, sendo considerados créditos subordinados, nos termos da al. b) do n.º 1 do art. 48.º.

  12. Isto posto, os fundamentos previstos nas alíneas do n.º 1 do art. 238.º do CIRE, consubstanciam factos impeditivos do direito à exoneração, pelo que a sua alegação e prova competirá aos credores ou ao administrador da insolvência, uma vez que o insolvente tem o direito potestativo a que o seu requerimento seja admitido e submetido à assembleia de credores, sem que tenha de apresentar prova daqueles requisitos, bastando-lhe declarar expressamente que os preenche.

  13. Assim, em consonância com o exposto, não pode aceitar-se a fundamentação do despacho recorrido que indeferiu liminarmente o pedido de exoneração do passivo restante com base no argumento que incumbia aos devedores o ónus da prova dos factos constitutivos que pudessem afastar o indeferimento liminar.

  14. Pelo contrário, e como bem se decidiu nos Acórdãos que defendem tese contrária, é inequívoco que os factos integrantes dos fundamentos do “indeferimento liminar” previsto no art. 238º, nº1, do CIRE têm natureza impeditiva da pretensão de exoneração do passivo restante formulada pelo insolvente.

  15. Logo, o ónus de prova dos mesmos recai sobre o administrador e credores da insolvência (art. 342º, nºs 1 e 2 do CC).

    Termos em que e nos mais de direito deve ser dado provimento ao presente recurso e revogar-se o despacho recorrido, substituindo-o por outro que admita liminarmente o pedido de exoneração do passivo restante formulado pelos devedores na petição inicial.

    Não foram oferecidas contra alegações.

    Cumpre agora decidir.

    *** Sabendo-se que o objecto do recurso está delimitado pelas conclusões das alegações – artigo 635 do Código de Processo Civil – das formuladas pelo Apelante resulta afinal que a única questão a dirimir é a de saber se deverá manter-se a decisão de indeferimento liminar de exoneração do passivo, ou se, pelo contrário, deverão prosseguir os autos para esse efeito.

    *** Na decisão recorrida foram considerados como provados os seguintes factos: 1. No dia 18 de Abril de 2012 apresentaram-se à insolvência AA e BB.

  16. Os aludidos AA e BB foram declarados insolventes por sentença proferida no dia 29 de Maio de 2012, transitada em julgado no dia 19 de Junho de 2012.

  17. No dia 21 de Junho de 2006, no âmbito do Processo nº1184/06.0TBVCT, do 2º Juízo Cível, do Tribunal Judicial de Viana do Castelo, foi proferida sentença de declaração de insolvência de “Viana … Lda.”, transitada em julgado no dia 11 de Agosto de 2006.

  18. O insolvente AA era sócio-gerente da aludida “Viana …”, nela detendo 3 (três) quotas no valor de €200.000,00 (duzentos mil euros), cada, e uma quota no valor de €100.000,00 (cem mil euros), ascendendo o capital social à quantia de €1.000.000,00 (um milhão de euros).

  19. A mencionada “Viana …”, no dia 23 de Fevereiro de 2000, celebrou com o CC, um contrato de abertura de crédito, tendo ajustado, entre o mais...

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