Acórdão nº 74/12.1TBVVD.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 05 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelFERNANDO FERNANDES FREITAS
Data da Resolução05 de Fevereiro de 2015
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

- ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES A) RELATÓRIO I.- A A. L… intentou a presente acção de condenação, sob a forma sumária, contra a “C…, S.A.” pretendendo obter desta o pagamento da quantia global de € 16.852,11, acrescida de juros de mora à taxa legal, contados da data da citação até efectivo e integral pagamento, liquidando pela referida importância a indemnização dos danos patrimoniais e não patrimoniais que lhe resultaram de uma queda ocorrida em 23/01/2009, pelas 00:15 horas, nas instalações da Ré sitas em Vila Verde.

A Ré contestou e requereu a intervenção da “Companhia de Seguros…” fundamentando num contrato de seguro que celebraram, pelo qual transferiu para esta a responsabilidade de indemnizar os danos sofridos por terceiros resultantes de acidentes ocorridos dentro das suas instalações.

A Chamada contestou e os autos prosseguiram os seus termos vindo a proceder-se ao julgamento que culminou com a prolação de douta sentença que, julgando a acção totalmente improcedente, absolveu a Ré do pedido.

Inconformada, traz a Autora o presente recurso pretendendo inverter o sentido da decisão.

Contra-alegou a Ré propugnando para que se mantenha o decidido.

O recurso foi recebido como de apelação, com efeito meramente devolutivo.

Foram colhidos os vistos legais.

Cumpre apreciar e decidir.

** II.- A Apelante funda o recurso nas seguintes conclusões (omissis quanto à matéria de facto transcrita de 1.ª a 15.ª): 16.ª - Conforme depuseram as testemunhas arroladas pela demandante, E…, M… e J… foram claros e objectivos, sendo peremptórios a afirmar que chovia muito e que, em consequência disso, com a entrada e saída de pessoas o piso acabou por ficar molhado, todas (testemunhas) tendo visto a demandante escorregar e cair, 17.ª - sendo certo que as testemunhas R… e J…, funcionários da demandada, nem tampouco se aperceberam que estava a chover: - certamente contactavam-se com o público, com os fregueses, através de um canudo… 18.ª - Quanto às alíneas a) e b) da matéria de facto dita não provada afigura-se-nos ser de inteira razoabilidade dá-las como matéria de facto provada.

19.ª - Os funcionários da demandada agiram com a mais profunda negligência, com um bocadinho, muito pequeno, de zelo e de cuidado, coisa que eles compreenderiam se a sinistrada fosse sua mãe… pois o seu zelo e cuidado ficou muito distante da diligência de um bonus pater familiae… 20.ª - A sentença recorrida, mercê da brutal negligência, grosseira, violou o disposto nos artigos 483º, 486º, 562º, 563º, 564º e 566º, todos do Cód. Civil.

** III.- A Ré, contra-alegando, defende que a decisão da matéria de facto, quanto aos factos impugnados, deve ser mantida por se extrair do depoimento das testemunhas J…, E… e M… e M… que o piso da Agência de Vila Verde não é liso nem escorregadio e por se ter julgado provado que os serviços de limpeza às referidas instalações se efectuam diariamente após o fecho das instalações ao público, ou seja, após as 15:30.

Entende não ser de se lhe exigir que num dia de chuva intensa com a entrada e saída dos clientes com os seus guarda-chuvas e sapatos molhados, tenha uma empregada de limpeza “sistematicamente a limpar a toda a hora o chão”, e considerado o temporal que se fazia sentir no dia 23/01/2009 os serviços de limpeza não iriam alterar o resultado do ocorrido, evitando o sinistro.

** IV.- Como resulta do disposto nos art.os 608º., nº. 2, ex vi do artº. 663º., nº. 2; 635º., nº. 4; 639º., n.os 1 a 3; 641º., nº. 2, alínea b), todos do Código de Processo Civil (C.P.C.), sem prejuízo do conhecimento das questões de que deva conhecer-se ex officio, este Tribunal só poderá conhecer das que constem nas conclusões que, assim, definem e delimitam o objecto do recurso.

De acordo com o que acima se deixou transcrito cumpre: - reapreciar a decisão da matéria de facto quanto aos dois pontos de facto impugnados; - decidir, com base na facticidade provada, se a Apelante tem o direito à indemnização que reivindica.

** B) FUNDAMENTAÇÃO IV.- Como acima se deixou referido, a Apelante pretende ver alterada a decisão sobre a matéria de facto.

i) Se a parte recorrente pretender impugnar aquela decisão tem de, obrigatoriamente, sob pena de rejeição do recurso, cumprir com o disposto em cada uma das alíneas do n.º 1 do art.º 640.º, do C.P.C.: indicar os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; os concretos meios probatórios que impunham decisão diversa da recorrida; e a decisão que, no seu entender, deve ser proferida.

Quando tenham sido gravados os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas terá ainda o recorrente de indicar, com exactidão, as passagens da gravação em que se funda, de acordo com o dever imposto pelo n.º 2 do referido preceito legal.

Na situação sub judicio a Apelante cumpriu com os deveres acima referidos e, por isso, cumpre reapreciar a decisão sobre a matéria de facto quanto aos pontos que impugna.

ii) O art.º 662º. do C.P.C. configura a reapreciação da decisão da matéria de facto dando-lhe a configuração de um novo julgamento.

Assim é que a alteração da decisão sobre a matéria de facto, que, em princípio, e já que estão em discussão direitos de natureza disponível, se restringirá à parte que foi delimitada pelo recurso, é agora um poder vinculado da Relação, desde que se verifiquem os pressupostos referidos no n.º 1, ou seja, quando os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.

A intenção do legislador foi, como consta da “Exposição de Motivos”, a de reforçar os poderes da Relação no que toca à reapreciação da matéria de facto.

Deste modo, mantendo-se os poderes cassatórios que permitem à Relação anular a decisão recorrida, nos termos referidos na alínea c) do nº. 2, e sem prejuízo da possibilidade de ser ordenada a devolução dos autos ao tribunal da 1ª. Instância, reconheceu-se agora à Relação o poder/dever de investigação oficiosa.

Não estando limitada pelos depoimentos e demais provas que lhe tenham sido indicados pelo recorrente, na reapreciação da matéria de facto, a Relação avalia livremente todas as provas carreadas para os autos e valora-as e pondera-as, recorrendo às regras da experiência, aos critérios da...

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