Acórdão nº 1310/14.5TABRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 09 de Janeiro de 2017

Magistrado ResponsávelALDA CASIMIRO
Data da Resolução09 de Janeiro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, na Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães, Relatório No âmbito do processo comum (Tribunal Singular) com o nº 1310/14.5TABRG que corre termos na Secção Criminal (J1) da Inst. Local de Braga, Comarca de Braga, foi o arguido, Américo J.

, divorciado, nascido a…, natural de …, Vila Verde, filho de A… e de M…, residente na Rua … Vila Verde, condenado pela prática de um crime de burla, p. e p. pelos arts. 217º, nº 1, do Cód. Penal, na pena de 160 (cento e sessenta) dias de multa, à taxa diária de €6,00 (seis euros), num total de €960,00 (novecentos e sessenta euros).

E, na procedência parcial do pedido de indemnização civil, foi o arguido/ demandado condenado a pagar aos demandantes Pedro D. e Sílvia R. a quantia de €6.200,00 (seis mil e duzentos euros), acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% contados desde a notificação para a contestação do pedido de indemnização civil sobre o montante de €5.000,00 (cinco mil euros) e desde a data da presente sentença sobre o montante de €1.200,00 (mil e duzentos euros) até integral pagamento.

* Sem se conformar com a decisão, o arguido interpôs o presente recurso pedindo que se revogue a sentença recorrida e seja absolvido.

Para tanto, formula as conclusões que se transcrevem: I- Nos termos da sentença, ora objecto de recurso, o recorrente foi condenado: “pela prática de um crime de burla p. e p. pelo artigo 217º, nº 1 CP na pena de 160 (cento e sessenta) dias de multa, à taxa diária de €6,00 (seis euros), num total de €960,00 (novecentos e sessenta euros)” “a pagar aos demandantes a quantia de €6.200,00 (seis mil e duzentos euros), acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% contados desde a notificação para a contestação do pedido de indemnização civil sobre o montante de €5.000,00 (cinco mil euros) e desde a data da presente sentença sobre o montante de €1.200,00 (mil e duzentos euros) até integral pagamento” DA NULIDADE DA SENTENÇA II- Os pontos 5º, 9º, 10º e 13º dos factos dados por provados pelo Tribunal a quo, são diferentes dos factos que vinham descritos na acusação e lidos em audiência de julgamento de 09/05/2016, às 14:36:19, (CD/rotações: 00:01:32 às 00:07:13) porque alteram a extensão dos factos ou passaram a conter expressões e aditamentos tendentes a desvirtuar o sentido e o alcance dos factos da acusação.

III- Acresce que, conforme se constata pelas actas da audiência de discussão e julgamento, bem como pela audição da prova produzida em julgamento e devidamente documentada, o Tribunal a quo não comunicou ao arguido qualquer alteração dos factos, nem tão-pouco lhe concedeu prazo para que este preparasse a sua defesa.

IV- Esta alteração dos factos só encontra cabal justificação na prova testemunhal que foi produzida e na difícil coexistência entre a versão da acusação e a versão dos ofendidos em sede de julgamento.

V- O Tribunal recorrido operou uma alteração não substancial dos factos elencados em 5), 9), 10) e 13), quando comparados com os que vinham descritos na acusação e, assim, almejou limitar as informações que o arguido alegadamente transmitiu aos ofendidos, por forma a “caberem” na prova testemunhal que foi produzida, conciliando assim os factos aos depoimentos dos ofendidos com o intuito de, assim, dar como provados factos que, de outra forma não podiam ser dados como provados.

VI- Estamos portanto no campo de aplicação do princípio da vinculação temática, o qual funciona num duplo sentido: impede o tribunal de conhecer para além do facto e obriga-o a pronunciar-se até ao limite do facto, sendo este narrado pelo Ministério Público na acusação, pela defesa na contestação, bem como pode resultar da discussão da causa com relevância para a decisão VII- É a acusação que delimita os factos consubstanciadores do crime a julgar pelo tribunal, vinculando-o ao thema decidendum assim definido como forma de assegurar a plenitude da defesa, garantindo ao arguido que apenas tem que defender-se dos factos acusados, e não de outros, daí que a lei comine com nulidade, a sentença que condene por factos diversos dos descritos na acusação ou na pronúncia, se a houver, fora dos casos e condições previstos nos arts. 358º, 359º e 379º, nº 1, b), do C.P.P..

VIII- E ainda, nos termos do art. 355º, nº 1 do C.P.P., a alteração não substancial dos factos tem que decorrer da circunstância de as provas produzidas, todas ou algumas, indiciarem ou provarem que os factos praticados não coincidem totalmente com os factos acusados. E como toda a prova tem que ser produzida em audiência, é no decurso desta que se verifica a alteração, e não na sentença, como é o caso do aresto recorrido.

IX- Na verdade, os factos objecto desta alteração, revestem-se de essencial relevância para a condenação do arguido, porquanto, a título de exemplo, o arguido vinha acusado por, alegadamente, informar os ofendidos que os três prédios tinham capacidade construtiva em toda a sua extensão e, entendeu o Tribunal a quo dar como provados tais factos no sentido de que o arguido (apenas) informara os ofendidos que (só) o prédio com ruína capacidade construtiva em quase toda a sua extensão.

X- E ainda, tendo em conta que o Arguido vinha acusado porque “apenas a ruína neles implantada é suscetível de obras de reconstrução e não de ampliação” e, entendeu o Tribunal a quo, dar como provados tais factos, com a inovação de que “a ruína é susceptível de obras de reconstrução”, “mas já não é susceptível de ser ampliada em largura”, porque, como adiante se retomará, a ampliação em altura desta ruína é sempre possível.

XI- Nem se pense que esta nova versão da sentença recorrida é de escassa importância porque, para além de conduzir a uma condenação com base em pressupostos errados, ainda consegue limitar o direito de defesa do Arguido, seja em fase de julgamento, seja também em fase recursiva porque dificulta a impugnação da matéria de facto.

XII- Com isto, foi violado o constante no artigo 358º nº 1 e 97º nº 4 do C.P.P., assim como o vertido nos artigos 32º nº 1 e 205º da Constituição da República Portuguesa, dado que a alteração não substancial dos factos não foi acompanhada da indispensável comunicação e fundamentação e, assim, ficou coarctado o direito de defesa do arguido XIII- a sentença recorrida é nula, nos termos do art. 379º, nº 1, aI. b), do CPP, porquanto condenou o recorrente por factos diversos dos descritos na acusação, fora dos casos e condições previstos nos arts. 358º e 359º, do CPP.

DOS ERROS/VICIOS DE JULGAMENTO XIV- O Tribunal a quo, deu como provado: 5. No local, e porque pretendessem adquirir um lote para construção, facto que deram a conhecer ao arguido Américo J., os ofendidos questionaram-no se o terreno onde estava implantada a ruína referida em 3 tinha capacidade construtiva, ao que este lhes respondeu que tinha capacidade construtiva em praticamente toda a sua extensão, pese embora necessitassem os ofendidos de manter erguida uma das fachadas.

  1. Poucos dias mais tarde, os ofendidos tomaram conhecimento. junto da Câmara Municipal de Vila Verde, que o terreno que tinha implantada a sobredita ruína integra Espaço Agrícola de Produção na componente Reserva Agrícola Nacional e, como tal, jamais teria capacidade construtiva em quase toda a sua extensão, de acordo com os Planos de Urbanismo actualmente existentes.

  2. “Com efeito, apenas a ruína nele implantada é susceptível de obras de reconstrução, podendo ser restaurada e ampliada em altura em 70 m2 (e, ainda assim, desde que tais obras mantenham ou reconstituam a estrutura das fachadas). mas já não é susceptível de ser ampliada em Iargura.”, XV- Argumentando para tal, na motivação “Na verdade, decorre de tais meios de prova que a ruína supra mencionada apenas pode ser restaurada e ampliada em altura (só em 70 m2), não em largura, precisamente por o terreno se situar em Zona de Reserva Agrícola Nacional, tendo o arguido dado a entender o contrário aos ofendidos, aproveitando-se da sua ingenuidade, inexperiência e juventude”.

    XVI- É notória a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, porquanto o Tribunal a quo fundou a sua convicção nas declarações/certidões genéricas emitidas pela Câmara Municipal a fls 22, 23 e 149 e na testemunha José M..

    XVII- Apesar dessa testemunha ter reiteradamente referido que havia possibilidade de reconstruir a ruína, em largura, à data do contrato promessa de compra e venda (e à data prevista para o contrato definitivo), uma vez que o novo Plano Director Municipal apenas entrou em vigor em Novembro de 2014.

    XVIII- O certo é que quando se fala na possibilidade de obras de reconstrução e ampliação em largura, com o correspondente aumento da área impermeabilizada do solo incluído em zona de Reserva Agrícola Nacional, e a necessidade de desafectação para fins habitacionais, estamos no âmbito da actuação vinculada de uma entidade administrativa - a Entidade Regional da Reserva Agrícola.

    XIX- E como tal, é essa entidade, no âmbito dos poderes que Ihe estão destinados, quem poderá aferir se há ou não possibilidade de reconstrução e alargamento da área habitável da ruína.

    XX- Veja-se ainda, a perícia que foi realizada no processo 442/15.7T8VVD, processo que corre termos entre os aqui Arguido e Ofendidos, mais concretamente os esclarecimentos prestados a fls 97 e ss, onde o Sr. Perito suficientemente esclarece que é possível a construção de 105m2 de área bruta para uma habitação do tipo T3, se cumprissem os requisitos impostos legislação aí referida. (cfr.

    doc. nº 1 que se junta e dá por integralmente reproduzido) XXI- Aqui chegados, resultava ser essencial à prova dos pontos 5, 9 e 10 a audição ou parecer da referida Entidade Regional da Reserva Agrícola com informação da capacidade construtiva dos lotes à data dos factos.

    XXII- Pelo exposto, a factualidade dada como provada na sentença é insuficiente para fundamentar a solução de direito e assim ocorre o vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada (dos pontos 5, 9 e 10 da sentença...

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