Acórdão nº 3332/10.6TBBCL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 09 de Abril de 2013

Magistrado ResponsávelPAULO DUARTE BARRETO
Data da Resolução09 de Abril de 2013
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Cível (2.ª) do Tribunal da Relação de Guimarães: I – Relatório I…Companhia de Seguros, S.A., instaurou a presente acção declarativa sob a forma de processo sumário demandando o réu F…, residente no Lugar de…,Barcelos, pedindo que este seja condenado a pagar-lhe a quantia de € 22.678,60, acrescida de juros de mora legais contados desde a citação até efectivo e integral pagamento.

Para tanto alegou a autora, em síntese, ter celebrado com o réu um contrato de seguro para cobertura da responsabilidade civil emergente da circulação rodoviária do veículo de matrícula PG-…, pertença daquele.

Acrescentou que o réu, quando tripulava tal veículo, foi interveniente num acidente de viação, imputando a este a responsabilidade pela produção desse sinistro e aduzindo ainda que o mesmo não era titular de habilitação legal para conduzir aquela espécie de veículos.

Alegou também a ré que, em cumprimento das obrigações para si decorrentes daquele contrato de seguro, indemnizou o lesado interveniente no acidente de viação e suportou despesas com tratamentos hospitalares que lhe foram prestados, com o que despendeu o montante peticionado.

O réu veio oferecer contestação, alegado, em súmula, que quando celebrou com a ré o contrato de seguro informou expressamente o representante desta que não possuía carta de condução e que aquele lhe disse então que ocorrendo eventuais acidentes, derivassem ou não de culpa sua, o seguro cobriria sempre os danos provocados.

Além de impugnar a versão do acidente descrita pela autora, aduzindo que o sinistro terá ficado a dever-se a uma súbita perda consciência sua por ter sido acometido de um desmaio, impugnou ainda o réu os montantes indemnizatórios que aquela alega ter pago, referindo nunca ter sido ouvido ou achado sobre o pagamento dessas quantias.

Por fim, aduziu ainda o réu que o direito de a autora reclamar o pagamento das quantias peticionadas estaria prescrito, por ter decorrido o prazo previsto no artigo 498º, nº2 do Código de Processo Civil.

Foi proferida sentença a julgar procedente a acção e a condenar o réu a pagar à autora a quantia de 22.678,60 €, acrescida de juros de mora contados à taxa legal de 4% ao ano, desde a data da citação – 28/10/2010 – e até efectivo e integral pagamento.

Não se conformando com tal decisão, dela recorreu o Réu, tendo formulado as seguintes conclusões: “ I. De acordo com a alínea c) do artigo 19º do decreto-Lei n.º 522/85, de 31 de Dezembro, “Satisfeita a indemnização, a seguradora apenas tem direito de regresso contra: (…) o condutor, se este não estiver legalmente habilitado ou tiver agido sob a influência do álcool, estupefacientes ou outras drogas ou produtos tóxicos, ou quando haja abandonado o sinistrado”.

  1. Constituindo o direito de regresso da seguradora um direito “ex novo”, com a extinção da obrigação para com o lesado, ficando a seguradora na posição de credora em relação ao condutor que conduza sem habilitação legal, facto que é constitutivo do seu direito, recai sobre a seguradora o ónus de provar que o acidente teve como causa adequada a falta de habilitação do condutor ou, pelo menos, que tal carência foi uma das causas do acidente.

  2. Perfilhando este entendimento é de considerar, assim, que o direito de regresso da seguradora, por virtude do risco acrescido do contrato de seguro, só se verifica quando o acidente foi causado exclusiva ou parcialmente pela não habilitação do condutor, e já não nos casos em que tal falta de habilitação não concorreu para a respectiva produção.

  3. Daí que, incumba à seguradora, para exercitar o direito conferido pela mencionada alínea c) do artigo 19º do Decreto-Lei n.º 522/85, de 31 de Dezembro, a prova do nexo de causalidade adequada entre a falta de habilitação legal de condução e o acidente.

  4. A posição ora defendida, isto é, de que à seguradora cumpre provar o nexo de causalidade adequada entre a inabilitação legal para conduzir e o acidente para poder exercer o direito de regresso contra o condutor, apoia-se inclusive nas razões subjacentes à decisão do acórdão uniformizador de jurisprudência n.º 6/2002, de 28 de Fevereiro, onde refere que “a alínea c) do art. 19 do Dec-Lei n.º 522/85 de 31/12, exige para a procedência do direito de regresso contra o condutor por ter agido sob influência de álcool o ónus da prova pela seguradora do nexo de causalidade adequada entre a condução sob o efeito do álcool e o acidente”.

  5. Se a condução não habilitada faz presumir inaptidão para o exercício dessa atividade, já não constitui presunção do direito de regresso – não consagrando a citada alínea c) do artigo 19º essa presunção -, sendo que, por ser facto constitutivo do direito de regresso a condução sem carta, não pode deixar de caber à seguradora, nos termos do artigo 342º n.º 1 do Código Civil, a prova do nexo causal com o acidente.

  6. No caso concreto, analisando a sentença que antecede, é manifesto que a Autora/Recorrida não logrou a demonstração de que o acidente foi consequência adequada da falta habilitação legal de condução do Réu/Recorrente.

  7. Pela conjugação da factualidade provada, o Réu logrou demonstrar que, pese embora a ausência de licença de condução, possui as aptidões técnicas para conduzir, pois que utilizou o veículo de matrícula PG-… desde a data da celebração do contrato de seguro com a Autora - 17.08.1999 – até à data em que ocorreu o acidente – 20.07.2006 -, ou seja, durante cerca de 7 anos, pagando pontualmente o prémio de seguro, e sem que tenha sido interveniente em qualquer outro acidente com excepção daquele a que os autos se reportam.

  8. Atenta a factualidade demonstrada, e na ausência de qualquer prova quanto à verificação do nexo causal, a sentença recorrida violou lei substantiva, ocorrendo erro na aplicação da aliena c) do artigo 19º do Decreto-Lei n.º 522/85, de 31 de Dezembro.

  9. Assim, impõe-se a revogação da sentença recorrida, e a sua substituição por outra que, considerando ser ónus da Autora/Recorrida a demonstração de que o acidente teve como causa adequada a falta de habilitação do condutor, o que aquela não logrou provar, absolva o Réu/Recorrente do pedido contra si formulado.

    Subsidiariamente, apenas por mera cautela de patrocínio: XI. Prescreve o artigo 334º do Código Civil que “É ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites...

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