Acórdão nº 78/12.4GDVCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 18 de Março de 2013
Magistrado Responsável | MARIA LU |
Data da Resolução | 18 de Março de 2013 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Guimarães: I – RELATÓRIO No processo comum (com intervenção do tribunal singular) n.º78/12.4GDVCT do 2ºJuízo Criminal do Tribunal Judicial de Viana de Castelo, por sentença proferida em 9/11/2012 e depositada na mesma data, o arguido Manuel V... foi condenado pela prática de um crime de violência doméstica p. e p. pelo artigo 152.º n.º1 alínea a) do Código Penal, na pena de 1 ano e 15 dias de prisão, suspensa na sua execução por igual período de tempo e no pagamento à vitima Ana V... da quantia de €1000,00, a título de indemnização por danos morais, acrescida de juros, à taxa legal, desde a data da decisão até efectivo pagamento.
O arguido, inconformado com a decisão, interpôs recurso, em 22/11/2012, extraindo da respectiva motivação, as seguintes conclusões [transcrição]: 1ª-Não existem dúvidas, de que, pratica o crime de violência doméstica, quem, de modo reiterado ou não, (sublinhado nosso) infligir maus tratos físicos ou psíquicos, incluindo castigos corporais, privações da liberdade e ofensas sexuais, ao cônjuge ou ex-cônjuge (...) – artigo 152.°, n.º 1 do C. Penal.
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-Correndo-se o risco de se estar a ser peregrino na análise jurídica, sem pretendemos que, um comportamento reiterado, só pode ser aquele que é repetido no tempo, mas com um carácter de renovação consequente e repetitivo.
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-De outro modo, privação da liberdade, só poderá ser entendida, como a retirada ou a negação por qualquer meio do exercício da liberdade individual, em termos de impedir, esse mesmo exercício individual, e 4ª-Maus tratos, só poderão ser entendidos, como o conjunto de acções (activas ou omissivas) que visem e atinjam uma terceira pessoa, causando-lhe prejuízo.
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-A violência doméstica, traduz-se, no nosso modesto entendimento, num comportamento ou comportamentos que pela sua natureza implicam a força física ou a intimidação de alguém, contra alguém, com um carácter de crueldade, de coação, de opressão, de tirania, de génio irascível de quem se encoleriza facilmente, e o demonstra com palavras e ou com acções – de outra maneira – a violência também se traduz num constrangimento físico ou moral que é exercido sobre alguém para o obrigar a submeter-se à vontade de outrem, demonstrando-se que esse comportamento tem em si mesmo um carácter violento – cf. por todos, Dicionário do Português Atual Houaiss, 1.a Edição/2011.
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-Não há reiteração porque a conduta do Recorrente não se traduziu em mau trato a quem ao tempo (cronológico) era ainda sua mulher, e também não foi determinante para a privação da liberdade, pois que esta não se verificou ou sequer é ou está aduzida nos factos imputados ao Recorrente e ou resultam da matéria de facto dada como provada.
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-Vista a sua conduta pela análise dos factos dados como provados, retira-se que, só a partir de 2011, e não se sabe, se do princípio, do meio ou fim desse ano, o relacionamento do casal se degradou, 8ª-Dos factos dados como provados, resulta inequivocamente que as expressões usadas pelo Recorrente contra a ofendida foram tomadas no âmbito de discussões, não fora utilizadas de modo voluntário e livre com vontade unívoca de atingir o físico ou o psíquico da ofendida, antes resultaram de uma relação de causa-efeito, discussão alimentada entre sujeitos, mas de cuja causa ou origem se desconhece, sendo portanto impossível (e injusto) atribuir apenas ao Recorrente o efeito pretendido pela lei, esquecendo-se o âmbito em que a sua conduta foi tomada. E, 9ª- Tribunal também deu como provado, que nas discussões existentes entre o Recorrente e a ofendida, era vulgar (sublinhado nosso) a ofendida também proferir expressões dirigidas ao arguido, de igual teor às supra referidas, 10ª- E mais está provado que, a ofendida mantém sentimentos de desconfiança relativamente ao comportamento do arguido, comportamentos alimentados pelo desinvestimento afectivo deste. Assim, 11ª-Se por um lado, se deu como provado, que o Recorrente proferiu as expressões supra referidas e que constam melhor descritas dos factos provados, também provado está que, a ofendida também (e vulgarmente) proferia iguais expressões dirigidas ao Recorrente, nas mais, 12ª- Na verdade, os sujeitos – Recorrente e ofendida – usavam igual conduta nas suas discussões, significando isso, que o vocabulário utilizado, não era, nem pode ser tido como reciprocamente ofensivo e ou lesivo das suas "honra e considerações".
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-Não está provado, que a ofendida tenha chegado ao estado de saúde referido nos autos, como consequência da conduta do Recorrente.
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-Resulta por isso que o Recorrente, com a conduta que tomou, não infligiu, impôs, aplicou, causou ou obrigou a ofendida a suportar o que se designa de "maus tratos".
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- O Tribunal errou na apreciação da prova, 16ª- Julgou incorrectamente os factos dados como provados, pelo que se impugna a decisão proferida sobre a matéria de facto – artigos 410.ª n.º 2 al. a) e c) e 412.ª do C. P. Penal.
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- Vai por isso violado o disposto no artigo 152.º n.º1 al.a) do C.P.Penal.
O Ministério Público junto da 1ªinstância respondeu ao recurso, pugnando pela rejeição do recurso uma vez que o recorrente afirma impugnar a matéria de facto e no entanto não deu cumprimento ao disposto no art.412.º n.º3 do C.P.Penal; defende ainda a confirmação da sentença recorrida [fls.358 a 365].
A demandante não respondeu ao recurso.
Admitido o recurso e fixado o seu efeito, foram os autos remetidos ao Tribunal da Relação.
Nesta instância a Exma.Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer em que se pronunciou pela procedência do recurso [fls.374 a 380].
Cumprido o disposto no art.417.º n.º2 do C.P.Penal, a demandante veio apresentar resposta, não ao parecer, mas antes ao recurso, pugnando pelo seu não provimento.
Colhidos os vistos legais, foram os autos submetidos à conferência.
II – FUNDAMENTAÇÃO Decisão recorrida A sentença recorrida deu como provados e não provados os seguintes factos a que se seguiu a respectiva fundamentação: “A – Factos provados Discutida a causa, o Tribunal apurou que: 1. O arguido Manuel V... contraiu casamento com Ana V... em 19/12/1987.
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Deste matrimónio nasceram dois filhos, Ilídio V..., de 22 anos, e Ana C..., de 20 anos.
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Desde o casamento o casal habitou sempre em casa dos pais da ofendida Ana V..., sita Caminho do X, M..., em Viana do Castelo.
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Desde 2011 que o relacionamento do casal se degradou.
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No Verão de 2011, a ofendida confrontou o arguido pelo telefone com uma suspeita de uma relação extra-conjugal por causa de uns comentários no facebook.
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Em 29/12/2011, cerca das 21h30m, a ofendida disse ao arguido que iria tratar do divórcio, ao que o arguido respondeu: «cala-te, qualquer dia dou-te um estouro...
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