Acórdão nº 610/12.3TBGMR-E.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 21 de Maio de 2013
Magistrado Responsável | FILIPE CARO |
Data da Resolução | 21 de Maio de 2013 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I.
Vem o presente recurso interposto pelo insolvente R.., melhor identificado nos autos, da decisão proferida no processo de insolvência em que é requerente o próprio devedor, pela qual se lhe indeferiu liminarmente o pedido de exoneração do passivo restante, com o seguinte segmento decisório: “Pelo exposto, e ao abrigo do disposto no referido arte. 238.º/1/als. a) e d) CIRE, indefiro liminarmente o pedido de exoneração do passivo restante apresentado pelo insolvente.” O Administrador da Insolvência, no relatório, emitira parecer favorável à concessão do benefício pretendido e todos os credores se abstiveram, incluindo a Fazenda Nacional, representada pelo Ministério Público (cf. ata de assembleia de credores).
Na apelação, o recorrente formula as seguintes conclusões: «1. A presente apelação tem por fundamento a não concordância do recorrente com a decisão do tribunal recorrido quanto ao indeferimento liminar do pedido de exoneração do passivo restante apresentado pelo insolvente, ora recorrente 2. Segundo o tribunal recorrido o requerente incumpriu o dever de se apresentar á insolvência nos seis meses seguintes á verificação da sua situação de insolvência, causando com isso prejuízos para os credores, o que levou no seu entender a indeferir o pedido de exoneração do passivo restante solicitado ao tribunal no pedido inicial de insolvência 3. Foi ao abrigo do disposto no art.º 238.º n.º 1 als a) e d) do CIRE, que tal indeferimento foi decidido, 4. No entendimento do recorrido não basta que o devedor tenha incumprido o dever de apresentação à insolvência – o que não sucedeu, conforme adiante se logrará demonstrar – mas também é necessário que, cumulativamente: - esse incumprimento tenha determinado um efectivo prejuízo para os credores; - e, ainda, que o devedor soubesse ou não pudesse ignorar sem culpa grave que não existia qualquer perspectiva séria de melhoria da sua situação económica; 5. sucede que, não obstante se tratar de requisitos (negativos) legalmente previstos, os mesmos dependem de prova por parte daqueles que têm interesse na sua verificação, e não pelo devedor (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 21 de Outubro de 2010, relatado por Oliveira Vasconcelos, disponível em www.dgsi.pt).
6. A prova incumbe aos credores e ao administrador de insolvência, nos termos do art. 342º, n.º 2 do Código Civil – neste sentido, veja-se o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 27 de Setembro de 2011, relatado por Maria do Carmo Domingues, disponível em www.dgsi.pt.
7. A Administradora de Insolvência apresentou já a sua posição nestes autos, pronunciando-se no sentido do deferimento da exoneração do passivo restante 8. Os credores, nenhum deles se pronunciou quanto a este facto; 9. A decisão recorrida não explicita em que medida o incumprimento do prazo de apresentação determinou um efectivo prejuízo para os credores 10. Nem relata qualquer facto que determine que o insolvente sabia ou não podia ignorar sem culpa grave que inexistia qualquer perspectiva séria de melhoria da sua situação económica 11. O insolvente, conforme se logrou demonstrar em sede de apresentação à insolvência, deixou de pagar os créditos contraídos em momentos distintos, pagando paulatinamente conforme as suas possibilidades, tentando renegociar o pagamento das dívidas, solicitando por perdões que os seus credores sempre se negaram a conceder 12. O facto de ter começado a incumprir com o pagamento de alguns impostos em 2009 referentes a uma das suas actividades, tendo em conta que apesar de ser gerente de uma empresa continuou a trabalhar por conta de outrem no mesmo período de tempo, não significa que tenha sido nessa data que o devedor entrou em situação de insolvência 13. o ora insolvente apenas apresentou á insolvência a empresa da qual era único gerente em 2011 e só a partir dessa data foram revertidas algumas das dívidas referentes a impostos não pagos contra o insolvente.
14. Constatando-se que não se mostra decorrido o prazo de seis meses a contar do conhecimento da situação da insolvência e, nessa medida, não se mostra verificado o requisito negativo constante da 2ª parte da al. d) do n.º 1 do art. 238º do CIRE 15. O prejuízo para os credores a que se refere a alínea supra indicada pressupõe a verificação de factos que permitam concluir que, no caso em apreço, o retardamento na apresentação à insolvência pelos devedores determinou uma impossibilidade ou dificuldade acrescida na satisfação dos créditos que existiam à data em que se verificou a insolvência, em virtude de eventual aumento do passivo ou diminuição do activo 16. não tendo o ora insolvente contraído novas dívidas após a verificação da situação de insolvência e até à declaração da mesma, nem tendo o mesmo praticado qualquer acto de dissipação ou delapidação do património, ou sequer praticado actos favorecendo uns credores em detrimento de outros, no período entre a verificação da insolvência e o momento em que se apresentou à insolvência, 17. De igual modo, o devedor não cometeu qualquer acto de dissipação de património, que se manteve absolutamente inalterado desde há vários anos para cá, não tendo sido reduzida a garantia patrimonial dos credores 18. não ocorreu qualquer prejuízo para os credores que pudesse ter sido evitado caso os devedor se tivesse apresentado à insolvência num momento prévio àquele em que o fez 19. não ocorreu tal dissipação de património, ou sequer a sua considerável depreciação – nem as mesmas foram invocadas por qualquer um dos credores!!! – pelo que não haverá, efectivamente, qualquer prejuízo dos credores pela tardia declaração de insolvência 20. o insolvente cortou drasticamente com todas as despesas extraordinárias e tentou sempre reduzir as suas despesas correntes, em prejuízo do seu nível de vida e do seu agregado familiar, perspectivando, assim, a melhoria da sua situação financeira por aumento do rendimento disponível ao final do mês, que lhes permitiria a possibilidade de irem solvendo as suas dívidas junto dos seus credores, continuando a manter até o actual emprego; 21. devem “as pessoas singulares de boa fé incorridas em situação de insolvência” beneficiar da aplicação do princípio do fresh start, permitindo-se que estas recomecem a sua actividade, reintegrando-se na vida económico-jurídica sem o peso de uma insolvência anterior (cfr. ponto 45 do Preâmbulo do Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de Março), 22. Deve, pois, o insolvente beneficiar da requerida exoneração do passivo restante, por forma a poder, efectivamente, ter uma nova oportunidade para recomeçar a sua vida e, bem assim, ter a perspectiva de vir a proporcionar alguma qualidade de vida ao seu filho menor a seu cargo.» (sic) Termina pedindo que se conceda provimento ao recurso, ou seja, que se ordena a prolação de despacho que admita liminarmente o pedido de exoneração do passivo restante.
Não foram oferecidas contra-alegações.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
II.
A questão a decidir encerra apenas matéria de direito, estando o objeto do recurso delimitado pelas conclusões da apelação, acima transcritas, exceção feita para o que for do conhecimento oficioso (cf. art.ºs 660º, nº 2, 684º e 685º-A, do Código de Processo Civil).
Impõe-se...
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