Acórdão nº 6020/15.3T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 17 de Novembro de 2016

Magistrado ResponsávelANTERO VEIGA
Data da Resolução17 de Novembro de 2016
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Relação de Guimarães – processo nº 6020/15.3T8BRG.G1 “Sociedade…, Ldª”, com a atividade de hotéis sem restaurante, interpôs recurso da decisão proferida pela AUTORIDADE PARA AS CONDIÇÕES DO TRABALHO (Unidade Local de Braga), que a condenou na coima única de 816,00 €, pela prática de: — uma contraordenação grave, por violação do disposto na cláusula 83ª, nº 3 do CCT celebrado entre a APHORT e a FESAHT (publicada no BTE nº 26/2008 de 15 de julho, alvo de Regulamento de Extensão e de Portaria de Extensão publicada no BTE nº 38/2010, de 15 de outubro), e punível nos termos do disposto nos artigos 521º, nº s 1, 2 e 3 do Código do Trabalho, porquanto não aumentou a duração dos dias de férias a gozar no ano de 2014, relativamente aos trabalhadores que não faltaram ou faltaram até 6 meios-dias no decurso do ano de 2013; e — uma contraordenação leve, por violação do disposto na cláusula 85ª, nºs 1 e 2, conjugado com o Anexo III, alínea a), dos nºs 2 e 3 do artigo 5º do CCT celebrado entre a APHORT e a FESAHT (publicada no BTE nº 26/2008 de 15 de julho, alvo de Regulamento de Extensão publicado no BTE, nº 17/2010, de 8 de maio e de Portaria de Extensão publicada no BTE nº 38/2010, de 15 de outubro), e punível nos termos do disposto nos artigos 521º, nº s 1, 2 e 3 do Código do Trabalho, porquanto não procedeu ao pagamento do subsídio de féria de alimentação na retribuição de férias e subsídio de férias no ano de 2014.

- Por decisão proferida na 1º secção trabalho, instância central da comarca de Braga a 2/3/2016, foi a arguida absolvida.

A decisão fundamentou-se designadamente no seguinte: “ … Porém, o conjunto de normas constante de uma CCT pode estender-se, total ou parcialmente, nos termos do disposto no artigo 514º, nº 1 do Código do Trabalho, “por portaria de extensão a empregadores e trabalhadores integrados no âmbito do setor de atividade e profissional definido naquele instrumento”.

… No caso dos autos, não se provou que a arguida estivesse inscrita na APHORT – Associação Portuguesa de Hotelaria, Restauração e Turismo, o que, desde logo, afasta a aplicabilidade direta do CCT referido pela ACT (CCT do setor da Hotelaria, Restauração e Turismo, celebrada entre a APHORT e a FESAHT, publicada no BTE nº 26, 1ª Série, de 15/07/2008).

Importa, portanto, averiguar se, por força das portarias de extensão que foram sendo publicadas, aquele CCT se tornou aplicável à relação laboral que se estabeleceu entre as partes. Isto porque não é o facto de uma empresa aplicar voluntariamente uma determinada cláusula de um CCT, que gera a obrigação legal de cumprimento da norma para efeitos da prática de uma contraordenação. Não existindo o dever legal de obedecer à norma, não ocorrerá a consequente violação.

Sabemos que aquele CCT foi objeto de várias PE’s, nomeadamente as publicadas nos BTE nº 47 de 22/12/2008 e nº 38 de 15/10/2010.

… No entanto, posteriormente à revisão global de 2008, a APHORT e a FESAHT outorgaram novo CCT, publicado no BTE nº 31 de 22/08/2011, que “revê globalmente e substitui na íntegra o publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 26, de 15 de julho de 2008, com revisão parcial publicada no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 20, de 29 de maio de 2009, e no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 17, de 8 de maio de 2010, celebrado entre a APHORT — Associadas pela APHORT — Associação Portuguesa de Hotelaria, Restauração e Turismo e, por outro, os trabalhadores ao seu serviço representados pela FESAHT — Federação dos Sindicatos da Agricultura, Alimentação, Bebidas, Hotelaria e Turismo de Portugal”.

Ora, não temos conhecimento (nem a decisão administrativa faz qualquer referência a tal assunto) de ter sido publicada qualquer Portaria de Extensão a estender os efeitos deste novo CCT às empresas não associadas nas associações patronais subscritoras.

Assim, considerando que o CCT em causa (mencionado na decisão administrativa) já não vigorava à data dos factos, cai por terra a imputação feita à arguida, que, evidentemente, não estava obrigada sequer a cumprir normas revogadas.

Com efeito, sendo revogado o CCT, as portarias de extensão que o aplicavam também deixam de ter qualquer efeito. Como refere o nº 1 do artigo 514º do Código do Trabalho, só pode ser aplicada por portaria de extensão “a convenção coletiva (…) em vigor…”. Face ao exposto, temos de concluir que os factos apurados supra elencados não preenchem os pressupostos objetivos e subjetivos das contraordenações imputadas à arguida...” - Inconformado o MºPº interpôs recurso nos termos do nº 2 do artigo 49º do RPACOLSS (L. 107/2009) fundamentando a admissibilidade do recurso na parte inicial do requerimento, nos seguintes termos: “Notificado da decisão absolutória proferida nos autos supra mencionados, e porque aí se considera que não havia Contrato Coletivo de Trabalho aplicável à relação contratual dos autos, com o que discordamos, vem o Ministério Público interpor recurso ao abrigo das disposições legais conjugadas dos artigos 74º, nº 4, do DL nº 433/82, de 27.10, 49º, nº 2 e 50º, nº 2, ambos da Lei nº 107/2009, de 14.09, na redação – mais recente – introduzida pela Lei nº 63/2013, de 27.08, recurso este a subir de imediato e nos próprios autos, fazendo-o nos termos que seguem Senhores Desembargadores do Venerando Tribunal da Relação de Guimarães: Venerandos Desembargadores: 1. De acordo com o artigo 49º, nº 1, al. a) da Lei nº 107/2009, de 14-09, a possibilidade de recurso da decisão proferida pela 1ª instância ficou a limitar-se aos casos em que a sanção (coima) aplicada fosse superior a 25 UCs ou seja €2550,00 (1 UC = €102,00).

  1. No caso em apreciação a unidade local da ACT de Braga aplicou uma coima única de €816,00, isto é, inferior ao mínimo legalmente previsto para a interposição de recurso, ao abrigo daquele inciso legal.

  2. Todavia, a mesma norma, n o seu nº 2, preceitua que: “Para além dos casos enunciados no nº 1, pode o tribunal da Relação, a requerimento do arguido ou do Ministério Público aceitar o recurso da decisão quando tal se afigure manifestamente necessário à melhoria da aplicação do direito ou à promoção da uniformidade da jurisprudência”.

  3. É jurisprudência corrente (cfr., por todos, o Ac. TRP nº 51/10.7TTMR.C1, de 09-12-2012; Rel. Azevedo Mendes) que só se observa a referida manifesta necessidade de recurso quando da decisão impugnada se observe um erro grosseiro, incomum, uma errónea aplicação do direito bem visível, tal não acontecendo quando nos confrontamos com uma mera discordância quanto à aplicação do direito.

  4. FERREIRA ANTUNES, pronunciando-se sobre o nº 2 do artigo 73º do Regime Geral das Contraordenações, afirma tratar-se de norma algo vaga e indefinida, tratando-se, de acordo com o mesmo A., de preceito que apenas e só assegura uma “válvula de escape” de todo excecional, já que aplicável aos casos em que não é admissível o recurso previsto no nº 1, al. b) do artigo 49º (RPCLOSS). – cfr. A. et ob. Cit., Contraordenações, Anot. e Coment., p. 485, Petrony Editores.

  5. “Válvula de segurança do sistema de alçadas que permita assegurar a realização da justiça” lhe chamam JORGE de SOUSA e SIMAS SANTOS. – cfr. Regime Geral das Infrações Tributárias anotado, 2ª ed., p. 506. E, continuam tais AA afirmando que “dado o escopo referido – válvula de segurança do sistema – ele não deve restringir-se, - ao contrário do que parece resultar da lei – aos casos em que apenas estejam em causa questões de interpretação ou aplicação da regra jurídica, propriamente dita”. E, prosseguindo, dizem tais autores que o recurso deve ser admitido nos termos de “permitir o controle jurisdicional dos casos em que haja erros claros na decisão ou seja de comprovadamente duvidosa solução jurídica” ou em que “se esteja perante uma manifesta violação do direito”. – sub. nos..

  6. Cremos não poder deixar de aceitar tal entendimento, sob pena, de total esvaziamento da norma do nº 2 do artigo 49º do RPCLOSS, pois que se a norma se não refere – segundo cremos, e sempre salvo melhor opinião – à previsão dos artigos 629º, nº 2, al. d) e 688º, ambos do C.P.C., algum conteúdo útil dever-lhe-á ser atribuído, o qual, em nossa modesta opinião, só pode ser, além do mais, aquela “válvula de escape” ou de “válvula de segurança” que permita, no dizer dos AA. Cit., no ponto que antecede, “ … o controle jurisdicional dos casos em que haja erros claros na decisão ou seja de comprovadamente duvidosa solução jurídica” ou em que [se] esteja perante uma manifesta violação do direito].

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