Acórdão nº 351/14.7TBAVV-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 27 de Outubro de 2016

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução27 de Outubro de 2016
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães 1 – RELATÓRIO Carlos S e mulher Carla I deduziram embargos de executado (1) contra Banco B Mais, S.A. (que integrou o B Leasing S.A.), por apenso à execução 351/14.7TBAVV, pedindo se declare extinta a execução com condenação do exequente em multa e indemnização a favor dos oponentes, por litigar de má-fé.

Para tanto, alegaram, em síntese, que a dívida exequenda se encontra totalmente liquidada com a entrega dos bens ao Banco Exequente.

Igualmente o outro executado, Filipe M, deduziu embargos nos mesmos termos.

* Notificado o exequente, apresentou a sua contestação, tendo, em síntese, negado a liquidação da dívida com a entrega dos bens locados.

* Foi proferido despacho saneador, no qual se afirmou a validade e a regularidade da instância, tendo sido dispensada a fixação do objecto do processo e a enunciação dos temas da prova.

* Procedeu-se à realização do julgamento com observância do formalismo legal.

* No final, foi proferida sentença que decidiu julgar parcialmente procedentes os presentes embargos de executado e, em consequência, determino a redução da quantia exequenda relativamente ao contrato 77846, no montante de € 3.816,32 [três mil oitocentos e dezasseis euros e trinta e dois cêntimos] e a redução da indemnização ao montante de 700,00€ [setecentos euros] relativamente ao contrato 76793. Porque ambas as partes ficaram vencidas na ação, as custas são repartidas em partes iguais - cfr. artigo 527º do Código de Processo Civil.

* Inconformada com essa sentença, apresentou o exequente Banco B Mais, S.A. recurso de apelação contra a mesma, cujas alegações finalizou com a apresentação das seguintes conclusões: 1. Errou o Tribunal a quo ao decidir acerca da desproporção ou excesso de pena convencional acordada pelas partes nos contratos de locação financeira subjacentes às livranças que constituem os títulos executivos nos autos apensos atento aquela matéria não constituir questão cujo conhecimento oficioso se imponha e a mesma não ter sido suscitada pelos embargantes.

  1. Na verdade, as questões efectivamente suscitadas pelos embargantes nos respectivos articulados foram julgadas totalmente improcedentes pelo Tribunal a quo, em conformidade, evidentemente, com o Direito e a matéria de facto apurada na instância.

  2. O ónus de alegar e provar os factos que integrem a desproporcionalidade entre o valor da cláusula estabelecida e o valor dos danos a ressarcir ou um excesso da cláusula em relação aos danos efectivamente causados recaía sobre os embargantes, ora recorridos.

  3. O uso da faculdade de redução equitativa da cláusula penal, concedida pelo artigo 812º do Código Civil, não é oficiosa, mas dependente de pedido do devedor da indemnização.

  4. Mesmo a cláusula penal, manifestamente, excessiva, não pode ser reduzida, oficiosamente, pelo Tribunal, consoante decorre do preceituado pelo artigo 812º, nº 1, do Código Civil, sob pena de violação do princípio da proibição do julgamento «ultra petitum», devendo antes a sua redução ser solicitada pelo devedor interessado, por via de acção ou de reconvenção, ou de defesa por excepção, a deduzir na contestação, mas não, apenas, na fase de alegações, uma vez que para os negócios usurários, em geral, se prescreve o regime da anulabilidade e não o da nulidade, atento o disposto pelo artigo 282º, não se justificando, assim, a redução oficiosa, em face do regime legal da anulabilidade, que apenas é invocável pelas pessoas em cujo interesse a lei a estabelece, com base no preceituado pelo artigo 287º, ambos do Código Civil 6. Assim, mostra-se que o Tribunal a quo fez uso ilegítimo da faculdade de redução equitativa da cláusula penal, violando o princípio da proibição do julgamento «ultra petitum» (artigo 609º, nº 1 do Código de Processo Civil), devendo portanto a sentença recorrida ser revogada.

  5. Acresce que, a decisão em causa briga também com a boa interpretação da lei substantiva convocada para respectivo fundamento e com a matéria de facto apurada na instância onde donde se destaca que as livranças que constituem o título executivo nos autos apensos foram preenchidas pelo montante em débito à data do respectivo vencimento (vide pontos 20 e 26 do elenco dos factos provados) 8. Na verdade, o devedor, vinculado à cláusula penal, não se encontra obrigado ao ressarcimento do dano que, efectivamente, cause ao credor com o incumprimento, mas antes à compensação do prejuízo, negocial e antecipadamente, fixado, através da cláusula penal, sempre que não tenha sido pactuada a indemnização pelo dano excedente, nos termos do disposto pelo artigo 811º, nº 2, do Código Civil 9. A cláusula penal não pode valer como um simples pacto de simplificação probatória favorável ao credor, como uma simples regra de inversão do ónus da prova, porquanto o montante predeterminado entre as partes obsta a que o devedor venha a pretender a sua redução, até ao montante do dano efectivo, e bem assim como, em princípio, a que o credor obtenha uma indemnização superior àquela que foi, previamente, ajustada.

  6. Destinando-se a cláusula penal a reforçar o direito do credor ao cumprimento da obrigação, a indemnização devida será aquela que tiver sido prevista na pena convencionada, mais gravosa para o inadimplente do que, normalmente, seria, e, em princípio, deve ser respeitada, dado o seu carácter «a forfait», e por corresponder à vontade conjectural original das partes, sendo certo que só, em casos excepcionais, deve ser reduzida, com vista a evitar abusos evidentes, situações de clamorosa iniquidade, a que conduzem penas, «manifestamente excessivas», francamente, exageradas, face aos danos efectivos.

  7. Aliás, mesmo nos casos excepcionais antes referidas, a fim de não serem anuladas as vantagens da cláusula penal, respeitando-se a sua intangibilidade, o Tribunal não só não deve fixar a pena abaixo do dano do credor, como nem sequer deverá fazê-la coincidir com os prejuízos efectivos verificados, porquanto a redução da pena destina-se, tão-só, a afastar o seu exagero e não a anulá-la.

  8. A sentença recorrida ao decidir, oficiosamente, reduzir o pedido exequendo nos termos em que o fez, violou também o disposto nos artigos 405º e 406º, 810º, 811º e 812º do Código Civil, devendo portanto ser alterada.

    Termos em que deve ser dado provimento ao presente recurso e, consequentemente, revogar-se a sentença recorrida, substituindo-a por acórdão que julgue a oposição à execução totalmente improcedente e não provada e ordene o prosseguimento da execução para pagamento da quantia que constitui o pedido exequendo, como é de inteira JUSTIÇA.

    * Não foram apresentadas contra-alegações.

    * O Exmº Juíz a quo proferiu despacho a admitir o recurso interposto.

    * Facultados os vistos aos Exmºs Adjuntos e nada obstando ao conhecimento do objecto do recurso, cumpre apreciar e decidir.

    * 2 – QUESTÕES A DECIDIR Como resulta do disposto no art. 608º/2, ex. vi dos arts. 663º/2; 635º/4; 639º/1 a 3; 641º/2, b), todos do CPC, sem prejuízo do conhecimento das questões de que deva conhecer-se ex officio, este Tribunal só poderá conhecer das que constem nas conclusões que, assim, definem e delimitam o objecto do recurso.

    Consideradas as conclusões formuladas pelo apelante, este pretende que deve ser revogada a sentença recorrida, seja por violação do princípio da proibição do julgamento «ultra petitum», seja por violação do disposto nos artigos 405º e 406º, 810º, 811º e 812º do Código Civil, e substituída por acórdão que julgue a oposição à execução totalmente improcedente e não provada e ordene o prosseguimento da execução para pagamento da quantia que constitui o pedido exequendo.

    * 3 – OS FACTOS (factos que a sentença recorrida considerou provados e elencou no seu texto, resultantes da análise de toda a prova testemunhal e documental junta aos autos, nos termos ali melhor explanados) 1. As livranças dadas à execução foram entregues ao então B Leasing, SA, em branco, subscritas pela sociedade A, Lda. e avalizadas à...

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