Acórdão nº 2345/17.1T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Julho de 2018

Magistrado ResponsávelEDUARDO AZEVEDO
Data da Resolução10 de Julho de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães Sindicato dos Trabalhadores das Indústrias Metalúrgicas e Metalomecânicas do Distrito X e Manuel intentou acção com processo comum contra Sociedade Artística – Y, Ldª.

Pediram: “a R. seja condenada: - a retomar o uso do gozo pelos trabalhadores da 3ª feira de carnaval, sem atribuição de falta e perda de retribuição; - pagar ao A. Manuel a quantia de € 26,26, referente à 3ª feira de carnaval, que descontou da sua retribuição; - a pagar os juros de mora vencidos sobre essa quantia.” Alegaram, em súmula: o 1º A é uma associação sindical, filiada na X – Federação Intersindical das Indústrias Metalúrgicas, Químicas, Eléctricas, Farmacêutica, Celulose, Papel, Gráfica, Imprensa, Energia e Minas; anteriormente tinha a designação de Y – Federação Intersindical de Metalúrgica,Metalomecânica, Minas, Química, Farmacêutica, Petróleo, Gás e outros); o 2º A é associado da A e trabalhador da R; a R é associada da W-Associação dos Industriais Metalúrgicos, Metalomecânicos e Afins de Portugal; a R sempre concedeu o gozo da terça-feira de Carnaval a todos os trabalhadores; no final do ano de 2016 a R afixou uma circular com o nº 350/2016, pelos motivos que melhor aí constam; o 2º A discorda da aplicação da “BTE nº 10 de 15/03/2010”; no dia 15.02.2017, a R afixou aviso informativo segundo o qual a convenção colectiva entre a Associação dos Industriais Metalúrgicos, Metalomecânicos e afins de Portugal - W e o K - Sindicato Nacional de Industria e da Energia, não se aplica aos trabalhadores representados pela X; no início do ano de 2017, afixou mapa de trabalho para o ano com o feriado de Carnaval, designadamente, com a anotação “feriado obrigatório em termos da CCT/ não é feriado nos termos do CT P/filiados aos sindicatos representados pela X”; e, no dia de Carnaval a empresa esteve encerrada mas na retribuição do mês de Março a R considerando haver falta injustificada nesse dia descontou-o na retribuição do 2º A, bem como na dos outros trabalhadores filiados no 1ª A; e esta decisão deverá ser declarada ilícita.

A R contestou alegando, em síntese: com o CT/2009 a terça-feira de carnaval deixou se ser considerado feriado, apenas o podendo ser se tal viesse a ser regulado em instrumento de regulação colectiva de trabalho ou contrato de trabalho; a CCT aplicável veio a considerar como feriado obrigatório a terça-feira de carnaval, razão pela qual continuou a conceder aos seus trabalhadores o gozo desse feriado; mas como os AA opuseram-se à aplicação dessa CCT, aos trabalhadores filiados no 1º A não foi concedido o seu gozo; o 2º A faltou ao trabalho nesse dia e não justificou a respectiva falta; e o gozo do feriado da terça-feira de carnaval não constituiu qualquer prática reiterada por que resultou desde sempre do cumprimento da lei e da CCT.

No saneador não se seleccionou matéria de facto.

Realizou-se audiência de julgamento, altura em que se decidiu a matéria de facto.

Proferiu-se sentença: “Julgar a presente acção totalmente procedente, condenando a R.: a) a retomar o uso do gozo por todos os seus trabalhadores da 3ª feira de carnaval, sem atribuição de falta e perda de retribuição; b) - pagar ao A. Manuel a quantia de €26,26, referente à 3ª feira de carnaval, que descontou da sua retribuição; c) - a pagar os juros de mora vencidos sobre essa quantia.”.

A R recorreu e concluiu: “1ª Relativamente á matéria de facto, que foi decidida por douto despacho ref. 41832424, considera a Apelante que foi incorrectamente julgado como provado o ponto 19 dos factos assentes, nos precisos termos em que o foi.

  1. Com efeito da prova produzida em audiência de julgamento quer a testemunha Susana quer a testemunha C. S., declararam de forma espontânea e segura que no dia 28 de fevereiro de 2017 pela manhã a empresa estava em funcionamento, encontravam-se na empresa a trabalhar os gerentes e bem assim a empresa que assegura a manutenção de equipamentos, como ficou a consta da douta decisão que decidiu a matéria de facto. Mais esclarecerem as testemunhas que para esse dia foi organizado transporte para os trabalhadores como é normal a partir de Valença, todavia nenhum trabalhador compareceu no local habitual para ser recolhido.

  2. Porque assim foi declarado, não poderia considerar o tribunal “a quo” que os portões da empresa estavam encerrados não sendo possível o acesso ao seu interior. Com efeito, bastava a quem lá pretendesse entrar tocar a campainha para que lhe fosse aberto o portão, que normalmente está fechado por questões de segurança.

    4º Ora, considera a Apelante que tal facto está incorrectamente julgado porque ignora que na empresa estavam pessoas a trabalhar, pois os gerentes da empresa também trabalham.

  3. Por assim ser considera-se que tal ponto da matéria de facto deverá ser alterada e passar a constar como não provado, que: No dia 28 de Fevereiro de 2017, os portões da empresa encontravam-se encerrados, não sendo possível o acesso ao seu interior.

  4. Nestes termos requer-se que este Tribunal de recurso, no uso dos poderes de sindicar a decisão proferida sobre a matéria de facto conferido pelo disposto no art. 662º do CPC, proceda á apreciação das alegações e conclusões formuladas e reapreciando os concretos meios de prova produzidos, altere a decisão da matéria de facto impugnada, julgando como não provado o ponto concreto da matéria de facto vertida no ponto 19º, nos termos indicados, como é de toda a justiça.

  5. Tendo em atenção o acervo factivo considerado como provado, considera a Apelante que a douta decisão recorrida, ao sufragar o entendimento de que se teria constituído uso laboral relativo ao gozo do dia de carnaval como feriado, faz uma errada interpretação e aplicação do quadro jurídico aplicável.

  6. Desde sempre a Apelante deu cumprimento ao quadro normativo laboral vigente garantindo todos os direitos dos trabalhadores nele consagrado, designadamente observou as normas que disciplinavam o regime dos feriados e respectivo gozo. Com efeito, a terça-feira de carnaval foi sendo qualificado como dia feriado pelo menos desde o código do Trabalho de 2003, e nessa medida observado como tal pela Apelante empregadora. Deste modo a Apelante assegurava o gozo de tal direito, porque o mesmo resultava de norma jurídica que o reconhecia, e não por qualquer outra causa ou predisposição subjectiva, mormente qualquer prática espontânea.

  7. O CCT aplicável – cfr - BTE nº 10 de 15/03/2010 veio a considerar como feriado obrigatório a terça-feira de carnaval, razão pela qual a ré continuou a conceder aos seus trabalhadores o gozo desse feriado. Estabelecia a Cláusula 79.ª da CCT que «Para além dos previstos na lei, serão igualmente considerados feriados obrigatórios o feriado municipal da localidade e a terça-feira de Carnaval, os quais poderão todavia ser substituídos por qualquer outro dia em que acordem a entidade empregadora e a maioria dos trabalhadores.» 10ª Como se referiu a Apelante, desde a sua publicação da CCT de boa fé, passou a aplicar a todos os seus trabalhadores o regime contido no contrato colectivo de trabalho publicado no BTE nº 10 de 15/03/2010, quer as disposições que consagravam direitos como das que estabeleciam deveres laborais. Porque assim foi, todos os trabalhadores da Apelante a partir de 2010 continuaram a gozar o direito ao feriado da terça-feira de carnaval, como feriado obrigatório, direito contido naquele CCT.

  8. Nunca nenhum dos trabalhadores da Apelante, mormente os Apelados se opuseram á aplicação deste CCT de 2010 até 2016, sempre beneficiando do seu regime jurídico, durante os seis anos seguintes, 12ª Na sequência do procedimento de reclassificação ocorrido em 2015, vários trabalhadores sindicalizados e afectos ao sindicato Apelado, incluído o 2º Apelado opuseram-se a tal reclassificação, invocado que a CCT publicada no BTE nº 10/2010, não lhe era aplicável, apesar de o ter sido durante mais de seis anos 13ª Deste modo, a Apelante, atenta a posição destes trabalhadores e o facto de o sindicato que os representa ter deduzido oposição á aplicação da CCT e seu regime aos trabalhadores seus afiliados, deixou de aplicar a CCT a estes trabalhadores.

  9. Quer isto significar que as condições do trabalho resultantes do referido instrumento de regulamentação colectiva do trabalho apenas continuaram a ser aplicáveis aos trabalhadores não sindicalizados no referido sindicado e bem assim a todos os que sendo sindicalizados voluntária e individualmente declaram que pretendiam continuar como até aí a ser abrangidos pelo regime da CCT em vigor.

  10. O dia 27 de fevereiro de 2017, terça-feira de carnaval foi dia feriado obrigatório para todos os trabalhadores abrangidos pelo CCT, que como tal o gozaram. Relativamente aos trabalhadores filiados no sindicado Apelado, e concretamente ao 2º Apelado por recusa na aplicabilidade do regime da convenção nos termos da portaria de extensão, tal dia não constituía feriado e como tal não foi concedido pela ré o seu gozo.

  11. Deste modo todos estes trabalhadores excluídos do regime da CCT estavam obrigados a prestar o seu trabalho nesse dia, sendo que a empresa esteve aberta e em funcionamento, tendo o 2º Apelado faltado ao trabalho. Consequentemente a ré considerou tal falta ao trabalho como injustificada e procedeu ao desconto do valor correspondente ao dia de falta na retribuição desse mês.

  12. A douta decisão recorrida, veio no entanto considerar que o gozo do dia de carnaval, no quadro da empresa Apelante, constituía um uso laboral, e como tal estava integrado no concreto contrato de trabalho do Apelado, todavia, salvo melhor entendimento, tal decisão não tem fundamento jurídico válido.

  13. Com efeito a Apelante de boa fé desde 2010 e até dezembro de 2016, data em que os Apelados se opuseram á aplicação do regime da CCT, sempre aplicou este regime a todos os seus trabalhadores, que se conformaram e beneficiaram com essa aplicação.

  14. Os trabalhadores que em 2016 vieram recusar a aplicação do CCT, em simultâneo pretendiam...

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