Acórdão nº 6029/17.2T8GMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 04 de Outubro de 2018

Magistrado ResponsávelHEITOR GON
Data da Resolução04 de Outubro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no tribunal da relação de guimarães I. D. P .., Lda., sociedade comercial com sede na freguesia de …, concelho de Guimarães, pediu que a demandada Grupo … Italia Srl, com sede em …, Pinerolo, Itália, seja condenada no pagamento de 41.045,35€, acrescida de juros de mora vincendos até integral pagamento, valor que diz respeito ao fornecimento do equipamento e dos serviços constantes na fatura nº F12017/12 (39.072,00€) e a juros moratórios vencidos (1973.35€).

Contestando, para além de deduzir a incompetência absoluta dos tribunais portugueses para dirimir o litígio, a ré alega no essencial e em síntese que o equipamento de aparafusadores tinha defeitos e avarias que a autora não conseguiu corrigir nas suas deslocações a Itália, e as partes acordaram na resolução do diferendo através da redução do preço para 29.304,00€, e a autora obrigou-se a emitir uma nota de crédito e a desistir da acção, acordo que a ré não cumpriu.

Em jeito de resposta, a autora reduziu o pedido em 29.304,00€ (valor pago pela ré no decurso da ação) e sobre a matéria de excepção e documentos juntos pela ré alega não prescindir de se pronunciar em sede de audiência prévia.

No subsequente despacho, o Sr. Juiz ordenou que a ré juntasse a versão espanhola do doc. nº2 e que, mostrando-se junto, a A. tinha 10 dias para se pronunciar sobre a excepção. Notificada da junção do documento, a autora impugnou o seu teor e quanto à invocada excepção de incompetência do tribunal diz não existir qualquer convenção pela qual as partes designaram como competente o tribunal do domicílio do réu.

II.

No despacho saneador foi julgada procedente a invocada excepção de incompetência absoluta dos tribunais portugueses, e por consequência decretada a absolvição da ré da instância nos termos das disposições conjugadas dos artigos 96º/ a, 99º/1, 278º/1/a e 577º/a, do Cód. Processo Civil.

A autora interpôs recurso dessa decisão, contudo o Sr. Juiz do processo não o admitiu por entender que fora interposto para além do prazo legal.

No julgamento da reclamação apresentada pelo recorrente, esta Relação considerou tempestivo o recurso e determinou a requisição do processo ao tribunal recorrido (decisão sumária do Relator de 10.07.2018).

Recebido o processo, importa apreciar o objecto do recurso delimitado pelas seguintes conclusões: 1.

A sentença foi proferida sem que à Autora fosse dada a oportunidade de se pronunciar acerca da questão da incompetência internacional dos tribunais portugueses, pelo que estamos perante uma sentença surpresa, manifestamente proibida no nosso ordenamento jurídico.

  1. Com efeito, a proibição de “decisões surpresa” emana do princípio constitucional do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva através de um processo equitativo e obriga ao respeito do princípio do contraditório ao longo de todo o processo.

  2. É que face à atual legislação processual civil, a Autora não poderia responder à alegada exceção da incompetência internacional alegada pela Ré, tal como decorre do disposto nos artigos 584º, nº 1, e 3º, nº 4, do Código de Processo Civil, só o podendo fazer em sede de audiência prévia, tal como decorre do artigo 591º do Código de Processo Civil.

  3. E, embora sem necessidade de o fazer, a Autora, após a notificação da Contestação, veio aos autos apresentar requerimento através do qual expressamente referiu que, quanto à matéria de exceção, bem como quanto aos documentos juntos pela Ré, não prescindia de se pronunciar, mas que o faria em sede de audiência prévia, conforme resulta do disposto no artº 591º do CPC.

  4. Porém, nem a audiência prévia foi designada, nem a Autora foi notificada para se pronunciar acerca da referida exceção, tendo sido proferida a sentença, não obstante a lei impedir a ocorrência de decisões-surpresa, tal como resulta do disposto no artigo 3º, nº 3, do Cód. Proc. Civil.

  5. A violação do contraditório inclui-se na cláusula geral sobre as nulidades processuais constante do artigo 195º, nº 1 do Cód. Processo Civil – a prática de um ato que a lei não admita, bem como a omissão de um ato ou formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influenciar a decisão da causa.

  6. E o certo é que a sentença ora recorrida constituiu uma decisão surpresa com violação do princípio do contraditório e, consequentemente, nula por se tratar da omissão de uma formalidade que a lei prescreve – artº 3º, nº 3, do CPC - com manifesta influencia na decisão da causa.

  7. Embora não fazendo parte da decisão ora recorrida, desde já se refere que o alegado pacto privativo e atributivo de jurisdição não cumpre com os requisitos definidos no n.º 3 do art.º 94.º do CPC, designadamente não resulta de acordo escrito nem se encontra confirmado por escrito.

  8. Posto isto, atenta a matéria de facto alegada pelas partes, ou seja, o fornecimento de equipamentos pela Autora à Ré, que foram fabricados pela Autora, no exercício da sua atividade industrial de projetos, automatismos e periféricos industriais, de industria de metalomecânica, de fabricação e montagem de componentes eletrónicos e equipamentos periféricos, de acordo com as instruções da Ré constantes da encomenda efetuada.

  9. Não se poderá, pois, subsumir a relação comercial entre a Autora e a Ré num...

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