Acórdão nº 927/17.0T8BGC.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 18 de Outubro de 2018

Magistrado ResponsávelMARIA DA CONCEI
Data da Resolução18 de Outubro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I- RELATÓRIO O MINISTÉRIO PÚBLICO, em representação do Estado Português, intentou contra MARCO, residente na Avenida (...), em Bragança, a presente ação declarativa de condenação, sob a forma comum, pedindo que o Réu seja condenado a pagar ao Estado a quantia de € 13.263,67, acrescida de juros à taxa legal contados desde a data da citação até integral pagamento, e a quantia que vier a ser paga pelo Estado por força da incapacidade do agente A. M..

Alegou, em síntese, que no âmbito de uma operação de fiscalização de trânsito, os agentes da Polícia de Segurança Pública A. M. e L. R. fiscalizaram o Réu, que conduzia o veículo automóvel ligeiro de passageiros com a matrícula ..-DZ-.., e submeteram-no ao teste qualitativo de alcoolemia, tendo apresentado uma taxa de álcool no sangue de 1,41 g/l; informado pelos agentes da PSP que, por tal motivo, teria de os acompanhar à Esquadra para realizar o teste qualitativo, o Réu opôs-se esbracejando e dizendo que não se deslocava à Esquadra; os agentes solicitaram apoio policial e tentaram demovê-lo mas o Réu manteve-se intransigente; para ultrapassar essa reacção, os agentes viram-se obrigados a usar a força e gás pimenta e, mesmo assim, tiveram dificuldade em manietar o Réu; ao manietá-lo, o Réu caiu sobre a perna direita do agente A. M., provocando-lhe fortes dores no joelho e obrigando-o a tratamento hospitalar; o agente L. R. foi afectado pelo gás pimenta usado, carecendo também de tratamento hospitalar; o agente A. M. esteve de baixa médica, por incapacidade para o trabalho, durante 210 dias; como consequência directa e necessária da actuação do Réu, os agentes A. M. e L. R. careceram de assistência e tratamento médico, tendo o primeiro sofrido dores e lesões que lhe determinaram uma incapacidade para o trabalho no referido período em que não prestou qualquer serviço ao Estado; por tal motivo, o agente A. M. foi abonado pelo Estado nas quantias descritas no artigo 19.º da p.i. a título de vencimento base, suplemento de serviço funções de segurança, gratificação de trânsito e subsídios de alimentação, de patrulha, de turno, de Natal e de férias; o Estado suportou ainda a importância global de € 423,31 com a assistência e o tratamento médicos prestados ao agente A. M. em consequência das lesões sofridas e a quantia de € 18,05 com o episódio de urgência do Agente L. R..

Regularmente citado, o Réu apresentou contestação.

Foi proferido despacho saneador com identificação do objeto do litígio e enunciação dos temas de prova.

O Ministério Público apresentou articulado superveniente alegando que foi fixada uma pensão anual vitalícia ao agente A. M. no valor de € 1.430,23 pela incapacidade parcial permanente de 9% que lhe foi atribuída em consequência do acidente em serviço de que foi vítima, pedindo a condenação do Réu no pagamento da importância de € 18.867,59 a título de valor de capital de remição liquidado pelo Estado.

Foi admitido o articulado superveniente apresentado pelo Autor e a ampliação do pedido por ele implicitamente requerida e determinado que os novos factos articulados fossem igualmente submetidos a julgamento.

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento com a prolação de sentença que julgou a ação procedente, e condenou o Réu MARCO a pagar ao ESTADO PORTUGUÊS a quantia global de € 32.131,26 (trinta e dois mil cento e trinta e um euros e vinte e seis cêntimos), acrescida de juros de mora.

*Inconformado com a sentença, o Réu interpôs recurso, finalizando com as seguintes conclusões que aqui se sintetizam: O recurso, sobre matéria de facto e de direito, assenta em erro de julgamento por: ▪ desconformidade entre factos considerados provados, factos 8º, 9º e parte do 13º e a prova produzida quanto à realidade de facto ocorrida, e não consideração de outros factos que resultaram provados; ▪ incorrecta valoração dos depoimentos testemunhais prestados em audiência de julgamento e do despacho de arquivamento do inquérito (documento 4 anexo à Petição Inicial); ▪ desconformidade com o direito (não preenchimento dos requisitos ou pressupostos da responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos); ▪ errada identificação do facto voluntário praticado pelo Recorrente (facto voluntário que consiste na resistência - fazendo força e permanecendo imóvel, não saindo do sítio - por recusar deslocar-se ou ser conduzido à esquadra e que não consiste na queda sofrida pelo Recorrente e lesado A. M.).

Pugna o Recorrente pela integral procedência do recurso com a consequente revogação da sentença recorrida, e caso assim não seja entendido e a título subsidiário, considerar-se haver culpas concorrentes do recorrente e do lesado.

Foram apresentadas contra-alegações defendendo o Recorrido a manutenção do decidido.

Foram colhidos os vistos legais.

Cumpre apreciar e decidir.

*II - DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO As questões decidendas a apreciar, delimitadas pelas conclusões do recurso, consistem em determinar se deve ser modificada a decisão proferida sobre a matéria de facto, e, consequentemente, decidir pela verificação dos requisitos da responsabilidade civil.

*Da modificabilidade da decisão sobre a matéria de facto Nos termos do artigo 662º, do Código de Processo Civil, a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.

Incumbe à Relação, como se pode ler no acórdão deste Tribunal de 7.4.2016, “enquanto tribunal de segunda instância, reapreciar, não só se a convicção do tribunal a quo tem suporte razoável naquilo que a gravação da prova e os outros elementos constantes dos autos revelam, mas também avaliar e valorar (de acordo com o princípio da livre convicção) toda a prova produzida nos autos em termos de formar a sua própria convicção relativamente aos concretos pontos da matéria de facto objecto de impugnação, modificando a decisão de facto se, relativamente aos mesmos, tiver formado uma convicção segura da existência de erro de julgamento na matéria de facto”.

Apesar disso, sem prejuízo de uma valoração autónoma dos meios de prova, essa operação não pode nunca olvidar os princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação das provas.

O Recorrente considera incorretamente julgados os factos 8, 9º e parte do 13º, constantes do elenco dos factos provados por entender que deviam ter sido dados como não provados com base no depoimento das testemunhas e no teor do despacho de arquivamento junto aos autos.

A matéria em causa é a seguinte: 8. Para ultrapassar essa reacção, os agentes viram-se obrigados a usar a força e gás pimenta e, mesmo assim, tiveram dificuldade em manietar o Réu.

  1. Porque o Réu...

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