Acórdão nº 783/13.8TBBCL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 24 de Maio de 2018
Data | 24 Maio 2018 |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO
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A. S.
e mulher Maria vieram intentar ação com processo comum, na forma sumária, contra: 1. Sociedade de Construções PB, Lda.; e 2. X Portugal – Companhia de Seguros, S.A., que alterou a sua denominação para Y - Companhia de Seguros, S.A.
, onde concluem pedindo que a ação seja julgada procedente, por provada e os réus condenados a:
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Pagar aos autores a quantia de €23.500,00; b) Pagar aos autores os juros calculados à taxa legal sobre o montante atrás referido, desde a citação e até efetivo e integral pagamento; c) Pagar aos autores uma quantia a título de sanção pecuniária compulsória diária de €20,00, até integral ressarcimento dos autores; d) Pagarem as custas e procuradoria condigna.
A ré Sociedade de Construções PB, Lda, apresentou contestação onde conclui entendendo dever a ação ser julgada improcedente, por não provada e procedentes as exceções deduzidas, com as legais consequências.
Por sua vez a ré X Portugal – Companhia de Seguros, SA, apresentou contestação onde conclui entendendo dever a ação ser julgada improcedente, por não provada, com as legais consequências.
Os autores A. S. e Maria vieram apresentar resposta às contestações onde concluem entendendo deverem ser julgadas não provadas e improcedentes as exceções invocadas pela ré, concluindo-se como na petição inicial pela procedência da ação.
*Foi elaborado despacho saneador onde foi julgada improcedente a exceção de ilegitimidade.
*Procedeu-se a julgamento e foi proferida sentença que decidiu julgar a ação totalmente improcedente e, em consequência, absolver as rés do pedido.
*B) Inconformados com a decisão proferida, vieram os autores A. S. e Maria interpor recurso (fls. 528 vº e segs.), o qual foi admitido como sendo de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos, com efeito devolutivo (fls. 578).
*Nas alegações de recurso dos apelantes A. S. e Maria, são formuladas as seguintes conclusões:
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Os factos que impõem decisão diversa da recorrida são os constantes dos pontos 64), 70), 71) e 76) dos factos provados.
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Os meios de prova que impunham decisão diversa da recorrida são a prova pericial, as declarações de parte do autor marido e o depoimento das testemunhas Manuel, Daniel e Francisco.
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Da prova pericial não é possível extrair uma conclusão segura acerca das causas que originaram a fissuração verificada na habitação dos autores.
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Os Senhores Peritos não estavam na posse de todos os elementos factuais necessários para determinarem com segurança as consequências decorrentes da obra levada a cabo pela 1ª ré.
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Os Senhores Peritos, com exceção do Perito indicado pelos autores, partem do princípio que a obra foi levada a cabo em conformidade com as regras aplicáveis, mas não o podem fazer pois não assistiram à execução dos trabalhos.
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Não houve unanimidade entre os peritos.
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As conclusões apresentadas pelo perito indicado pelos autores revelam maior rigor científico.
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Os Senhores Peritos, para justificar a ausência de consequências danosas da obra levada a cabo pela 1ª ré, aludem a uma obra distinta que terá sido executada nas proximidades, no entanto não descrevem com pormenor a realização de tal obra, não fazem referência às medidas adotadas na mesma nem aos níveis de vibração aplicados.
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A comparação da obra objeto dos autos com outras que foram realizadas nas proximidades não configura um argumento científico válido, até porque os Senhores Peritos não assistiram à execução das mesmas.
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O perito indicado pelos autores apresenta-nos argumentos menos empíricos e mais técnicos, fazendo alusão à Norma Portuguesa …, de 1983 e realçando que a velocidade de vibração alcançada é um fator relevante para determinar as consequências de um trabalho de compactação.
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Enquanto os demais peritos dão respostas definitivas mesmo não tendo assistido à realização dos trabalhos, o perito designado pelos autores faz alusão a um fator determinante que só poderia ser aquilatado através da observância da obra.
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Na resposta ao quesito 25º da 1ª ré, o perito indicado pelos autores refere que num anexo situado próximo do local onde foram produzidas vibrações se verificam várias fissuras, fundamentando tal afirmação com fotografias do local.
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o autor marido, nas declarações por si prestadas, assegurou que a sua habitação não apresentava fissuras antes da realização dos trabalhos por parte da 1ª, o que foi corroborado por várias testemunhas.
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A testemunha Manuel, filho dos autores, declarou estar em casa quando a 1ª ré executou os trabalhos no logradouro contíguo à sua residência e foi clara ao afirmar que a partir desse dia é que se notaram as rachadelas nas paredes.
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A testemunha não teve quaisquer dúvidas de que as fissuras que se evidenciam na habitação dos autores surgiram na sequência dos trabalhos levados a cabo pela 1ª ré.
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A testemunha Daniel, dono da obra executada pela 1ª ré, confirmou que durante a execução dos trabalhos, quando o cilindro efetuava vibrações, o autor dirigiu-se a si dizendo que lhe estavam a danificar a casa, que a casa vibrava toda.
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A testemunha Francisco disse conhecer a casa dos autores há cerca de 15 anos, e só mais recentemente é que reparou que as paredes estavam muito rachadas, apresentando grandes fissuras, principalmente do lado onde a 1ª ré executou as obras.
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A testemunha Francisco viu a casa dos autores antes e depois das obras realizadas pela 1ª ré, conseguindo descrever os efeitos que estas provocaram.
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A testemunha Manuel assistiu às obras e pôde verificar, em tempo real, os efeitos que as mesmas produziram.
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O relato feito pela testemunha Daniel demonstra que, naquele instante, era nítida a perceção de que a vibração operada pelos cilindros estava a produzir efeitos nefastos na residência dos autores.
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Decorre assim da prova produzida que existiu efetivamente uma relação de causa e efeito entre a execução dos trabalhos e o surgimento de fissuras na habitação dos autores.
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O Tribunal a quo não fundamenta em que medida é que existe um nexo causal entre a fragilidade do imóvel e o surgimento das fissuras.
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O Tribunal a quo não especifica quais as fissuras pré-existentes à execução da obra por parte da 1ª ré.
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Contrariamente aos Senhores Peritos, o autor marido e a testemunha Manuel assistiram aos trabalhos e tiveram a perfeita noção que a vibração provocada era excessiva e potencialmente causadora de danos.
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Mesmo que a suposta fragilidade do imóvel tenha contribuído para o surgimento das fissuras, parece óbvio, atenta a prova produzida, que esta nunca poderia ser a única causa da verificação de tal fenómeno.
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Face aos concretos meios probatórios acabados de enunciar, os concretos pontos de facto supra enunciados ao serem considerados provados consubstanciam um julgamento incorreto e um claro erro da apreciação da prova.
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A não correspondência entre a prova invocada pelo Tribunal e a decisão sobre a matéria de facto que sobre ela assentou traduz uma violação e uma interpretação inconstitucional do preceituado no artigo 607º, nº 3 do Código de Processo Civil e viola o artigo 205º da Constituição da República Portuguesa.
ab) Deveriam considerar-se não provados os factos constantes dos pontos 64), 70), 72) e 76) dos factos provados.
ac) O que determina a qualificação de uma atividade como perigosa é a sua especial aptidão para produzir danos, aptidão que há-de resultar da sua própria natureza ou da natureza dos meios utilizados.
ad) A jurisprudência vem entendendo que a atividade de construção civil, quando recorre ao uso de maquinaria pesada, deve qualificar-se como perigosa, por ser apta a produzir danos em resultado da natureza dos meios utilizados.
ae) A natureza dos equipamentos utilizados pela 1ª ré confere perigosidade à atividade por si prosseguida, pelo que lhe é aplicável o disposto no artigo 493º, nº 2 do Código Civil.
af) Competia à 1ª ré provar que empregou todas as providências exigidas pelas circunstâncias com o fim de prevenir a ocorrência de danos, o que não se verificou.
ag) A decisão do Tribunal a quo viola assim o disposto no artigo 493º, nº 2 do Código Civil.
ah) Ficou demonstrado que os trabalhos levados a cabo pela 1ª ré causaram vibrações na habitação dos autores.
ai) Estamos perante uma violação do direito de propriedade dos autores, consubstanciada na deterioração da sua habitação.
aj) A 1ª ré violou um direito dos autores, pelo que se deve considerar ilícito o facto por si praticado.
ak) Da prova produzida decorre que, aquando da realização dos trabalhos, o autor marido alertou os trabalhadores da 1ª ré para o facto de a obra levada a cabo por esta ser suscetível de causar danos na sua residência e que a 1ª ré nada fez, não interrompendo a obra.
al) A 1ª ré, perante o alerta do autor marido, poderia ter analisado a situação, verificado se os receios do autor marido eram justificados ou adequar o seu comportamento com vista a evitar o surgimento de danos.
am) A partir do momento em que é avisada pelo autor marido para a suscetibilidade de produção de danos na sua habitação, a 1ª ré, ao prosseguir os trabalhos de vibração, previu necessariamente a produção do facto ilícito como um efeito possível ou provável da sua conduta, pelo que agiu com dolo eventual.
an) Caso assim não se entenda, o que não se concebe, sempre estaria demonstrado que a 1ª ré, após o alerta do autor marido, podia e devia prever a produção do facto ilícito e evitar a sua verificação, se usasse da diligência devida, pelo que a sua conduta sempre se revelaria negligente.
ao) Encontra-se preenchido o requisito da culpa.
ap) A decisão do Tribunal a quo violou o disposto no artigo 483º, nº 1 do Código Civil.
aq) O facto que atuou como condição do dano só...
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