Acórdão nº 119/17 de Tribunal Constitucional (Port, 15 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelCons. Teles Pereira
Data da Resolução15 de Março de 2017
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 119/2017

Processo n.º 782/2016

1.ª Secção

Relator: Conselheiro José António Teles Pereira

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

1. Correu termos na secção cível da instância local do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa uma ação declarativa de processo comum intentada por A. e B. (os ora Recorrentes) contra C., S.A. e D., S.A., pedindo a condenação da 1.ª Ré no pagamento da quantia de €2.397,26, acrescida de juros, e, subsidiariamente, a condenação de ambas as Rés no pagamento da mesma quantia, em regime da solidariedade. Posteriormente, foi admitida a intervenção principal da E., S.A., na posição de Ré.

O processo correu os seus termos até ser proferida sentença, que absolveu as Rés do pedido.

1.1. Transitada em julgado a decisão, cada uma das Rés apresentou nota de custas de parte.

1.1.1. Os Autores, ora Recorrentes, reclamaram das notas de custas de parte. Suscitaram, então, a seguinte questão prévia:

“[…]

1.º

Dispõe o n.º 2 do artigo 33.º da Portaria n.º 419-A/2009, na versão que resulta da Portaria n.º 82/2012, de 29 de março, que “a reclamação da nota justificativa está sujeita ao depósito da totalidade do valor da nota”.

2.º

Os AA. não procederam, assumidamente, ao depósito de qualquer quantia por entenderem ser a referida norma organicamente inconstitucional, por violação da reserva de competência da Assembleia da República em matéria de direitos, liberdades e garantias, constante do artigo 165.º, n.º 1, alínea b), em conjugação com o artigo 20.º, n.º 1, ambos da Constituição da República Portuguesa.

3.º

Tal entendimento – pela inconstitucionalidade orgânica da referida norma – foi já sufragado pelo Acórdão n.º 198/2016, de 03/05, do Tribunal Constitucional, a cujos argumentos se adere e se remete e aqui se dão por reproduzidos para todos os devidos e legais efeitos.

4.º

Termos em que deverá a presente reclamação ser admitida, dispensando-se os Autores do depósito de qualquer quantia.

[…]

Termos em que, atenta a inconstitucionalidade orgânica do n.º 2 do artigo 33.º da Portaria n.º 419-A/2009, na versão que resulta da Portaria n.º 82/2012, de 29 de março, deverá a mesma ser desaplicada no caso concreto e a presente reclamação ser admitida sem depósito do valor total das notas de custas de parte.

[…]”.

1.1.2. Foi proferido despacho, rejeitando a reclamação por não ter sido realizado o depósito a que se refere o artigo 33.º, n.º 2, da Portaria n.º 419-A/2009, de 17 de abril, e considerando que a referida norma não padece de inconstitucionalidade.

1.2. Inconformados, os Autores interpuseram, então, recurso desta decisão para o Tribunal Constitucional, o qual deu origem aos presentes autos, nos termos seguintes:

“[…]

[V]êm, nos termos e ao abrigo do disposto nos artigos 70.º, n.º 1, alíneas b) e g), 71.º, n.º 1, 72.º, n.º 1, alínea b), e n.º 2, 75.º, n.º 1, 75.º-A, n.ºs 1 e 2, todos da Lei do Tribunal Constitucional, interpor recurso para o Tribunal Constitucional, o que fazem nos termos e com os fundamentos seguintes.

I – Identificação da alínea do n.º 1 do artigo 70.º da LTC e da prévia invocação

1. O presente recurso é interposto ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, alíneas b) e g), da LTC.

2. A questão de constitucionalidade que ora se pretende submeter ao crivo do Tribunal Constitucional já foi previamente invocada na reclamação que se fez às notas de custas apresentadas pelos RR. (cfr. artigos 1, 2 e 3 da reclamação e pedido).

II – A questão de constitucionalidade

3. A questão de constitucionalidade que a Recorrente pretende ver apreciada é a seguinte:

A norma consagrada no n.º 2 do artigo 33.º da Portaria n.º 419-A/2009, na versão que resulta da Portaria n.º 82/2012, de 29 de março, que dispõe que “a reclamação da nota justificativa está sujeita ao depósito da totalidade do valor da nota” é organicamente inconstitucional, por violação da reserva de competência da Assembleia da República em matéria de direitos, liberdades e garantias, constante do artigo 165.º, n.º 1, alínea b), em conjugação com o artigo 20.º, n.º 1, ambos da Constituição da República Portuguesa.

Sendo que tal entendimento – pela inconstitucionalidade orgânica da referida norma – foi já sufragada pelo Acórdão n.º 189/2016, de 03/05, do Tribunal Constitucional, pelo que deverá ser declarada nos presentes autos e, consequentemente, ser desaplicada no caso concreto.

[…]”.

1.3. No Tribunal Constitucional, foi proferido despacho determinando a notificação das partes para alegarem.

1.3.1. Os Recorrentes apresentaram alegações que culminaram nas seguintes conclusões:

“[…]

A. Está em causa nos presentes autos de recurso a inconstitucionalidade orgânica do n.º 2 artigo 33.º da Portaria n.º 419-A/2009, de 17 de abril, na redação dada pela Portaria n.º 82/2012, de 29 de março, que condiciona a admissibilidade da reclamação da nota justificativa da conta de custas de parte à realização de um depósito da totalidade do respetivo valor.

B. Pese embora as custas de parte constituam verdadeiras custas processuais – cujo regime está consagrado no C.P.C. e no Regulamento das Custas Processuais – nenhum dos referidos conjuntos normativos prevê o modo e/ou condições em que podem ser apresentadas reclamações das notas justificativas de custas de parte.

C. Sendo que, o seu regime específico – e no que para os presentes autos releva, a obrigação de proceder ao depósito prévio do valor total das custas de parte peticionadas – encontra-se, inovadoramente estabelecido, apenas, na Portaria n.º 419.º-A/2009, de 17 de abril, na versão que resultou das alterações introduzidas pela Portaria n.º 82/2012, de 29 de março.

D. A referida obrigação de depósito prévio, constitui uma manifesta restrição ao direito de acesso à justiça e à tutela jurisdicional efetiva, direito fundamental cujo regime é equiparado aos direitos, liberdades e garantias.

E. São da reserva relativa da Assembleia da República, a quem incumbe, mediante lei, ou ao Governo mediante decreto-lei autorizado por aquela, estabelecer as restrições ao direito de acesso à justiça e à tutela jurisdicional efetiva.

F. A norma citada, constante em mera Portaria, padece, pois, de inconstitucionalidade orgânica por violação da reserva de lei prevista no n.º 2 do artigo 18.º e por violação flagrante da alínea b) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição da República Portuguesa.

G. Inconstitucionalidade que deverá ser declarada no caso concreto, com as legais consequências.

[…]”.

1.3.2. A Recorrida D., S.A./Rede Nacional de Assistência apresentou...

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