Acórdão nº 127/18 de Tribunal Constitucional (Port, 13 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelCons. Claudio Monteiro
Data da Resolução13 de Março de 2018
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 127/2018

Processo n.º 699/2016

1.ª Secção

Relator: Conselheiro Claudio Monteiro

Acordam, em confer ência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional,

I – Relat ório

1. A. veio, ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na sua atual versão (LTC), interpor recurso (i) do despacho proferido em 16 de maio de 2016, pelo Tribunal Judicial da Comarca do Porto, segundo o qual constitui mera irregularidade a cominação de prazo inferior ao estabelecido na lei na notificação do arguido para a prestação de esclarecimentos do requerimento de abertura de instrução (cfr. fls. 171 a 173); (ii) do despacho que indeferiu a nulidade imputada à decisão de dispensa da presença de assistente no debate instrutório (cfr. fls. 180); (iii) da decisão instrutória proferida em 24 de maio de 2016, pelo mesmo tribunal, que pronunciou o Recorrente pela prática do crime de ofensa à integridade física simples (cfr. fls. 182 a 192).

2. Nos seus requerimentos de interposição de recurso o Recorrente apresentou, em resumo, os seguintes fundamentos (cfr. fls. 179, 180 e 201):

«Porquanto a norma dos art.ºs 105.º, n.º1, 118.º, n.º1 e 120.º, n.º 2, al. d) do CPP, na interpretação aplicada no douto despacho recorrido segundo a qual a notificação do arguido para prestar esclarecimentos do requerimento de abertura de instrução, cominando-lhe um prazo inferior ao que a lei estabelece constitui mera irregularidade acarretando insuficiência de instrução quando estão em causa garantias de defesa de salvaguarda da finalidade da instrução, é inconstitucional.

Efectivamente, além de ter tido por consequência a transformação da instrução num mero adereço processual do debate instrutório, uma tal interpretação que foi de todo inesperada, viola o princípio constitucional das garantias de defesa e o n.º 1 do art.º 32.º da Constituição da República Portuguesa»

(cfr. fls. 179)

«Não se podendo conformar com o douto despacho acabado de proferir, dele interpões recurso para o Tribunal Constitucional, porquanto a norma do art.º 120.º, n.º 2, al. b), do CPP, na interpretação aplicada no douto despacho recorrido no sentido de que o Tribunal goza da faculdade de dispensar o assistente ao debate instrutório, é inconstitucional por violação do princípio da garantia de defesa.»

(cfr. fls. 180)

«A norma dos artigos 308.º, n.º 1 conjugada com o art. 283.º, n.º 2 do C.P., na interpretação com que foi aplicada na parte do douto despacho em que pronúncia o arguido pelo crime de ofensa à integridade física simples p. e p. pelo art. 143 n.º 1 do C.P, segundo a qual há provas indiciárias suficientes nos autos para ser proferido despacho de pronúncia do arguido pela prática do crime de ofensa à integridade simples p. e p. pelo art. 143 nº1 do C.P., quando, negando o arguido a prática da agressão física ao queixoso, as testemunhas ouvidas não confirmaram, a versão do queixoso de que o arguido o tivesse agredido fisicamente, e, outroassim, do exame médico efectuado nos autos, não resulta concludente que o hematoma de 6cm2 que o queixoso apresentou na perna direita tenha sido motivado por agressão física, nenhumas provas mais havendo nos autos, é inconstitucional por violar o princípio de presunção de inocência, e as garantias de defesa, consagradas no art. 32 n.º1 primeira parte, da Constituição da República Portuguesa.»

(cfr. fls. 201)

3. Notificado pelo tribunal recorrido para, ao abrigo do n.º 5 do artigo 75.º-A da LTC, aperfeiçoar os requerimentos de recurso apresentados a fls. 179 e fls. 180, o Recorrente fê-lo, nos seguintes termos (cfr. fls. 199 e 208):

«A norma dos arts. 297 n.º 3, 289 n.º 1, e 120 n.º 2 al. b), do CPP, na interpretação segundo a qual pôde, por iniciativa do Mmno. Juiz de instrução, e sem que tal implique a ocorrência de nulidade, o Mmo. Juiz, oficiosamente dispensar a presença do assistente no debate instrutório, é inconstitucional por violar o princípio constitucional do direito do arguido ao exercício do contraditório na fase de instrução e das garantias de defesa, consagradas no art. 32 n° 1 primeira parte, da Constituição da República Portuguesa.

O recurso é interposto ao abrigo da alínea b) do n" 1 do art. 70 da Lei do Tribunal Constitucional, tendo a questão da inconstitucionalidade sido suscitada pelo recorrente por requerimento feito para a acta no debate instrutório.

Efectivamente, a lei- cfr. art. 289 n.º 1 do CPP-prevê um debate instrutório, oral e contraditório, o que é dizer dever ter o arguido a possibilidade de poder confrontar o assistente e de requerer diligências suplementares de tomada de declarações ao assistente, o que só é possível com a presença do assistente no debate instrutório.

O recurso sobe imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo nos termos do n.4 do art. 78 da Lei do Tribunal Constitucional.

(…)

«a) recurso interposto a fls, 179 para o Tribunal Constitucional:

-o recurso é interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do art. 70 da Lei do Tribunal Constitucional;

-não indica a peça processual em que a inconstitucionalidade tenha sido suscitada porquanto, como refere a fls, 179, a interpretação feita à norma arguida de inconstitucional, foi de todo inesperada.

b) recurso interposto a fls, 180 na completude defenida a fls. 199, para o Tribunal Constitucional::

-é interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do art. 70 da Lei do Tribunal Constitucional;

-a inconstitucionalidade foi suscitada a fls, 179 (cfr. final dessa folha e final da folha 152);

-dá por reproduzido o teor do requerimento de fls, 199.

c) recurso interposto a fls, 201, para o Tribunal Constitucional:

- a inconstitucionalidade foi suscitada a fls.126( cfr. fls. 182) e por declaração para a acta de debate instrutório de fls. 181;

-dá por reproduzido o teor do requerimento de fls. 201.»

4. Pela Decisão Sumária n.º 168/2017 (cfr. fls. 233 a 245) decidiu-se não tomar conhecimento do objeto dos recursos interpostos, com a fundamentação que de seguida se expõe:

«1. Do primeiro recurso de fiscalização de constitucionalidade

5. O Recorrente pretende que seja apreciada a inconstitucionalidade das «normas dos art.º 105.º, n.º1, 118.º, n.º1 e 120.º, n.º 2, al. d) do CPP, na interpretação aplicada no douto despacho recorrido segundo a qual a notificação do arguido para prestar esclarecimentos do requerimento de abertura de instrução, cominando-lhe um prazo inferior ao que a lei estabelece constitui mera irregularidade acarretando insuficiência de instrução quando estão em causa garantias de defesa de salvaguarda da finalidade da instrução» (cfr. fls. 118).

6. Para tal, alegou que a referida interpretação foi “de todo inesperada”, para efeitos de dispensa da obrigação de invocação prévia adequada da questão de constitucionalidade junto do tribunal a quo, enquanto requisito de admissibilidade do recurso junto deste Tribunal (cfr. fls. 179 e 208).

Vejamos.

i) Falta de invocação atempada, perante o tribunal a quo, da questão de inconstitucionalidade

7. O ónus de invocação atempada e processualmente adequada da questão de constitucionalidade traduz, mais do que um simples dever de cooperação do Recorrente com o Tribunal, uma exigência formal essencial à admissibilidade do recurso, como aliás tem sido unanimemente entendido pela jurisprudência do Tribunal Constitucional (cfr., entre muitos outros, Acórdãos n.os 156/2000 e 195/2006, disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt, bem como os demais arestos deste Tribunal doravante citados).

Para que se entenda que essa questão foi suscitada de forma processualmente adequada é necessário que a mesma tenha sido enunciada de forma clara, expressa, direta e percetível, bem como a sua fundamentação, exposta em termos minimamente concludentes, em termos que permitiam ao tribunal recorrido avaliar da pertinência da questão de inconstitucionalidade levantada.

(…)

8. Ora, tal não ocorreu no presente caso, tendo o Recorrente assumido não ter procedido à enunciação prévia e adequada da mencionada questão de inconstitucionalidade normativa, invocando que a interpretação adoptada pelo tribunal a quo «foi de todo inesperada» (cfr. fls.179 e 208).

Importa, nesta medida, verificar se estamos efectivamente perante uma situação excecional na qual o recorrente está dispensado do ónus de invocação prévia da questão de inconstitucionalidade, por a decisão judicial recorrida ter adoptado uma interpretação surpreendente e imprevisível.

9. In casu, o Recorrente, tendo sido notificado para, em cinco dias, indicar quais os esclarecimentos que pretendia que fossem prestados por perito médico (cfr. fls. 140), arguiu, junto do tribunal a quo, a nulidade do referido despacho, por ter fixado o referido prazo de cinco dias, em detrimento do prazo de dez dias, decorrente do artigo 105.º, n.º 1 do CPP (cfr. fls. 169).

E, na decisão recorrida, o tribunal a quo, em apreciação da nulidade arguida, concluiu no sentido de que a invalidade invocada pelo Recorrente não configurava um caso de nulidade, mas sim de mera irregularidade processual, nos termos dos artigos 118.º, n.º1, 119.º e 120.º do Código de Processo Penal...

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