Acórdão nº 324/17 de Tribunal Constitucional (Port, 22 de Junho de 2017

Magistrado ResponsávelCons. Pedro Machete
Data da Resolução22 de Junho de 2017
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 324/2017

Processo n.º 737/16

2.ª Secção

Relator: Conselheiro Pedro Machete

Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:

I. Relatório

1. A., recorrido nos presentes autos em que é recorrente a Federação B., intentou uma ação de impugnação da regularidade e licitude do seu despedimento contra a ora recorrente. Por sentença de 16 de junho de 2015, foi aquela ação julgada improcedente e o pedido reconvencional oportunamente deduzido pelo autor procedente apenas no tocante a determinados créditos laborais (v. fls. 555-605).

Inconformado, apelou o autor para o Tribunal da Relação de Lisboa, que, por acórdão de 16 de dezembro de 2015, «julgou parcialmente procedente o recurso, alterando a sentença no sentido de declarar irregular o despedimento, face à irregularidade do procedimento disciplinar consistente na falta de fundamentação da não realização da diligência de prova requerida na resposta à nota de culpa», condenando, em consequência, a ré a pagar ao autor a quantia de € 25 396,00, a título de indemnização prevista no artigo 389.º, n.º 2, conjugado com o artigo 391.º, n.º 1, ambos do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro (“CT”), acrescida de juros de mora à taxa supletiva legal desde 30 de julho de 2014 até integral pagamento (fls. 754-773).

A ré, ora recorrente, não se conformou com esta decisão e, além de arguir a sua nulidade por excesso de pronúncia, interpôs recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, invocando, entre o mais, a inconstitucionalidade, por violação dos princípios da proporcionalidade e da igualdade, da norma do artigo 389.º, n.º 2, segundo a qual a mera irregularidade fundada em deficiência de procedimento deve ser sancionada com uma indemnização correspondente a metade do valor daquela que pode ser atribuída em caso de despedimento ilícito, calculada nos termos do artigo 391.º, n.º 1, do mesmo diploma. Por acórdão de 2 de março de 2016, o Tribunal da Relação de Lisboa indeferiu o requerimento de arguição de nulidade (fls. 820). Subidos os autos ao Supremo Tribunal de Justiça, este, por acórdão de 16 de junho de 2016, decidiu negar a revista e confirmar o acórdão então recorrido (fls. 844-870). Relativamente à citada inconstitucionalidade, o Supremo afirmou o seguinte:

«Alega [a recorrente] que a sanção prevista no preceito é excessiva, desproporcionada e que, através dela, o legislador veio, de forma enviesada, sancionar o empregador, que procede a um despedimento com justa causa. E mais argumenta que se consagra uma penalização para o empregador semelhante à do despedimento ilícito, pois o trabalhador acaba por obter uma indemnização.

Mas não tem razão.

Efetivamente, basta referir que os efeitos da irregularidade do procedimento a que se refere o nº 2 do artigo 389º são muito mais atenuados do que os que resultam dum despedimento ilícito, face às gravíssimas consequências que o nº 1 do mencionado preceito e o artigo 390º, ambos do CT, ligam à cessação ilícita do contrato de trabalho.

Na verdade, a indemnização no presente caso corresponde apenas a metade da que caberia ao trabalhador ilicitamente despedido (nº 2 do artigo 389º do CT, e que remete para o nº 1 do artigo 391º), para além de lhe não serem atribuídas as retribuições intercalares que são mencionadas no artigo 390º, nº1.

Por isso, não podemos aceitar que o legislador tenha sido excessivo nas consequências que associou à mera irregularidade do procedimento disciplinar, pois distinguiu notoriamente a situação quando confrontadas as suas consequências com as dum despedimento ilícito.

Diga-se ainda que também improcede a invocada violação do princípio da igualdade ínsito no artigo 13º da CRP, por pretensa desigualdade de armas do empregador perante o trabalhador.

Efetivamente, trata-se duma mera afirmação da recorrente que não contém qualquer suporte argumentativo.

Por outro lado, nunca podemos falar de qualquer tipo de desigualdade de armas, pois quem dá origem à irregularidade do procedimento é a recorrente, por não ter justificado por que razão não satisfez a pretensão de junção da conta corrente requerida pelo trabalhador na resposta à nota de culpa.» (fls. 869-870)

2. É de tal decisão que vem interposto o presente recurso de inconstitucionalidade, ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional – LTC), para apreciação da norma constante do artigo 389.º, n.º 2, do CT, na redação dada pela Lei n.º 23/2012, de 25 de junho, segundo a qual a mera irregularidade fundada em deficiência de procedimento de despedimento deve ser sancionada com uma indemnização correspondente a metade do valor daquela que pode ser atribuída em caso de despedimento ilícito, calculada nos termos do artigo 391.º, n.º 1, do mesmo diploma.

Admitido o recurso (fls. 893) e subidos os autos a este Tribunal Constitucional, foram as partes notificadas para produzirem alegações (fls. 899).

2.1. São as seguintes as conclusões da alegação apresentada pela recorrente:

« […]

3. Sendo [as diligências requeridas] patentemente infundadas, não é razoável que o processo disciplinar seja automaticamente considerado irregular, com os efeitos previstos no art. 389º, nº 2) pelo simples facto de o empregador não ter cumprido o ónus de alegar fundamentadamente a impertinência ou a irrelevância da diligência requerida. […]

6. O Tribunal da Relação de Lisboa e o Supremo Tribunal de Justiça limitaram-se a tirar a consequência imediata e mais simples da ausência de justificação para a não junção de prova documental, sem qualquer preocupação de saber e de valorar tal documentação como tendo ou não relevância para a defesa e descoberta da verdade material. […]

8. No caso dos autos um dos documentos pedidos não existia e os outros estavam na posse da empregadora, nos serviços dirigidos pelo recorrido, do seu total conhecimento.

9. No contexto acima explicitado, o Tribunal da Relação de Lisboa e o Supremo Tribunal de Justiça ao aplicar no caso sub judice o artigo 389.º nº2 e consequentemente a atribuição da indemnização, faz pender sobre a Recorrente uma sanção excessiva, desproporcionada o que lhe é permitido pela literalidade do preceito.

10. É inconstitucional a aplicação literal ao caso concreto do artigo 389º, nº 2 do CT, por violar o princípio da proporcionalidade e os seus subprincípios (adequaçáo, exigibilidade e justa medida), ínsitos no art. 18º nº 2 da CRP.

11. Se por um lado, a norma tem como objetivo salvaguardar o direito de defesa do Arguido, deve na sua aplicação ponderar-se o grau ou carga coativa decorrente da medida adotada e encontrar-se uma relação de justa medida com os fins prosseguidos.

12. A norma não deve ser aplicada de igual forma e medida a diferentes situações, sem especial ponderação, o que a sua redação permite.

13. O facto de a entidade empregadora ter que fundamentar a omissão de alguma diligência probatória requerida pelo Arguido, justifica-se/adequa-se ao fim de proteger o direito de defesa do mesmo, o que nem sucedeu no caso concreto, mas ainda que se admita o contrário, o grau de lesão do direito de defesa é tão insignificante, que a sua penalização deveria ter graduação muito menos gravosa.

14. Numa situação em que não se verifica a ausência de diligência probatória ou, existindo, a mesma não ponha em causa a defesa do Arguido, não se justifica a aplicação da norma em referência. Caso contrário estaremos a violar o princípio da adequação, o que sucedeu o caso concreto dos autos.

15. Relativamente ao princípio da exigibilidade (aplicação de medidas restritivas para alcançar os fins em vista, por o legislador não dispor de outros meios menos restritivos para alcançar o mesmo fim), também se verifica violação deste princípio, pois como acima se referiu e também na douta sentença proferida pelo Tribunal de 1ª Instância, na fase da resposta à nota de culpa ainda estamos no âmbito interno da empresa. […]

19. A violação do Principio da Igualdade verifica-se pois o nº 2 do art. 389º do CT afasta a possibilidade de qualquer sancionamento do trabalhador em favor do empregador

20. Seja excesso, falha, irregularidade processual, requerimentos injustificados, requerimentos dilatórios no âmbito do processo disciplinar praticados pelo trabalhador, não encontram previsão de sancionamento.

21. O mesmo é dizer que não há igualdade de armas. A colocação legal de trabalhador e empregador em desigualdade, tal como a desigualdade proporcionada pela norma em apreço viola, no entender da Recorrente, o princípio da igualdade perante a lei, ínsito no art. 13º da CRP.

22. Acresce que, ao aplicar a norma sem ter em conta as especificidades e diferenças em cada caso, sem analisá-los em pormenor, viola o princípio da igualdade no sentido negativo. […]

24. Acresce que, dispõe o art. 390º, nº 1 e 2 do CT, às retribuições deixadas de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do Tribunal que declare a ilicitude do despedimento, sendo deduzidas as importâncias que o trabalhador auferir com a cessação do contrato de trabalho e que não receberia se não fosse o despedimento.

25. Tal como em tantas outras situações de despedimento, não é raro que os trabalhadores obtenham...

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