Acórdão nº 17/17 de Tribunal Constitucional (Port, 18 de Janeiro de 2017

Magistrado ResponsávelCons. Teles Pereira
Data da Resolução18 de Janeiro de 2017
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 17/2017

Processo n.º 615/2016

1.ª Secção

Relator: Conselheiro José António Teles Pereira

Acordam, em Conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – A Causa

1. Corre termos na 1.ª Secção de Comércio (Lisboa) da Instância Central do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, com o número 272/14.3TYLSB, um processo respeitante à insolvência de pessoa coletiva, em que é Requerente A., Lda., Requerida B., Lda. (pretende-se, pois, a declaração de insolvência desta sociedade) e uma das credoras da Requerida C., Lda. (a ora Reclamante).

1.1. Nesta insolvência, realizou-se, em 11/12/2014, a última sessão da audiência de julgamento, no decurso da qual a Requerida apresentou um requerimento visando a inquirição de uma testemunha (D.) em data posterior, alegando que a mesma se encontrava momentaneamente doente. Sobre tal requerimento, recaiu o seguinte despacho, proferido na própria audiência (fls. 57):

“[…]

Considerando o Tribunal que a testemunha é a apresentar, que o processo tem natureza urgente e considerando ainda que, não obstante o motivo invocado para o adiamento da inquirição da testemunha, a parte poderia, eventualmente, substituí-la, apresentando nova testemunha, o que não fez, entende-se não estarem verificados os pressupostos para esse adiamento de inquirição, tanto mais que, na anterior data, a testemunha igualmente não foi apresentada, não tendo sido justificada essa não apresentação.

Face ao exposto, indefere-se o requerido relativamente ao adiamento de inquirição da testemunha D..

[…]”.

1.2. De tal despacho pretendeu a credora C., Lda. interpor recurso para o Tribunal Constitucional. Fê-lo nos termos seguintes (fls. 20 a 24):

“[…]

[N]ão se podendo, como na verdade se não pode, conformar, nem se conformando pois, com o aliás douto despacho, proferido nos autos, pela Meritíssima Senhora Doutora Juíza recorrida, durante a audiência final, que teve lugar no passado dia 11 de dezembro de 2014 (vide a referência 328603974, do histórico de atos processuais do processo em causa no sistema Citius), despacho esse que:

– indeferiu o, pela requerida, então requerido adiamento da inquirição da testemunha […], indeferimento esse fundamentado numa interpretação normativa do segmento da alínea b), do número 3, do artigo 508.º, do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, doravante apenas CPC 2013, que possibilita que a parte requeira o adiamento da inquirição de uma testemunha, que não tenha comparecido por impossibilidade meramente temporária, interpretação normativa essa nos termos da qual tal segmento da norma em questão não se aplica a testemunhas a apresentar e a processos com natureza urgente, e que a requerida tem por inconstitucional, por violação do artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa (CRP);

– foi notificado à requerida, nos termos dos artigos 254.º do CPC 2013 e 17.º do CIRE, em 11 de dezembro de 2014, na própria audiência final;

– é desfavorável também à recorrente, causando-lhe prejuízo direto e efetivo, porque à recorrente, na sua qualidade de credora da requerida, não interessa a declaração de insolvência desta, por, na visão dela, essa declaração de insolvência dificultar a cobrança do crédito que ela recorrente tem sobre a recorrida, sendo certo que é admissível, pela menos teoricamente, que o depoimento da testemunha em causa, se tivesse sido prestado, fosse suscetível de alterar a decisão final e no sentido de não ser declarada a insolvência da requerida;

– desse douto despacho, que, atendendo a que o valor da causa são 2.000,00 euros, não admite recurso ordinário, por a lei – artigos 44.º, n.º 1, da Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto (Lei de Organização do Sistema Judiciário – LOSJ), 629.º, n.º 1, do CPC 2013 e 17.º, do Código da insolvência e Recuperação de Empresas (CIRE) – o não possibilitar, interpõe a recorrente, desde já, e através do presente requerimento, recurso para o Tribunal Constitucional, o qual é, em secção, o tribunal competente para de tal recurso conhecer – artigos 280.º, n.º 1, (corpo) da CRP e 70.º, n.º 1, (corpo), da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional- LOFPTC).

Assim, porque:

a) a decisão em causa é recorrível para o Tribunal Constitucional, em secção – artigos 280.º, n.º 1, al. b), da CRP e 70.º, n.º 1, al. b), da LOFPTC, e também artigo 80.º, n.º 3, da mesma LOFPTC, e princípio da prevalência da interpretação das leis ordinárias em conformidade com a Constituição (artigo 3.º, n.º 3), que permitem ao Tribunal Constitucional poder sindicar uma determinada interpretação ou dimensão normativa de normas, no que se pode considerar como uma decisão interpretativa imprópria, que é perfeitamente equiparável a uma decisão de inconstitucionalidade parcial vertical ou qualitativa, e abrangida portanto nas verdadeiras e próprias decisões interpretativas, expressamente permitidas por tal artigo 80.º, n.º 3, da LOFPTC;

b) a recorrente, muito embora não sendo, como não é parte principal, nos autos insolvenciais em questão, nem sendo neles sequer, pelo menos para já, parte acessória, tem contudo legitimidade para interpor o presente recurso, pois que, como atrás se disse já, a decisão recorrida prejudica-a a ela recorrente direta e efetivamente – artigos 69.º e 72.º, n.ºs 1, alínea b), e 2, ambos da LOFPTC, 631.º, n.º 2, do CPC 2013 e 17.º do CIRE;

c) e está em tempo para o fazer, pois que, como atrás se disse já também, o despacho reclamado foi prolatado no dia 11 de dezembro de 2014 - artigos 69.º e 75.º, n.º 1, os dois da LOFPTC, 138.º do CPC 2013 e 17.º do CIRE;

requer-se a V. Exa., que se digne admitir o presente recurso, interposto ao abrigo da alínea b) do número 1 dos artigos 280.º da CRP e 70.º da LOFPTC, sendo a atrás mencionada interpretação ou dimensão normativa dada pela Senhora Juíza recorrida, ao segmento da alínea b) do número 3 do artigo 508.º do CPC 2013 em causa, aquela cuja inconstitucionalidade se pretende que o Tribunal Constitucional, em sede de fiscalização concreta, a que aludem os artigos 280.º e 281.º, n.º 3, ambos da CRP, e 69.º a 85.º, todos da LOFPTC, julgue inconstitucional, por tal interpretação ou dimensão normativa violar, como, na opinião da recorrente, viola, o artigo 20.º da CRP e o Princípio da Tutela Jurisdicional efetiva, ao mesmo artigo 20.º da CRP subjacente, com todas as consequências legais de tal julgamento de inconstitucionalidade decorrentes.

Tal recurso deverá:

a) subir imediatamente ao Tribunal Constitucional (artigos 78.º, n.º 1, da LOFPTC e 14.º, n.º 5, do CIRE);

b) seguir para o Tribunal Constitucional em separado (artigos 78.º, n.º 1, da LOFPTC e 14.º, n.º 5, do CIRE);

c) ter efeito meramente devolutivo (artigos 78.º, n.º 1, da LOFPTC e 14.º, n.º 5, do CIRE).

[…]”.

1.2.1. A Senhora Juíza da Secção de Comércio proferiu, então, despacho no sentido de a Recorrente se pronunciar, querendo, relativamente à falta de suscitação prévia da questão de inconstitucionalidade. Em resposta, a Recorrente pronunciou-se nos termos seguintes:

“[…]

[V]em, muito respeitosamente, junto de V.ª Ex.ª, para, e em cumprimento de tal douto despacho, informar que a inconstitucionalidade das normas referidas no recurso, rectius da interpretação de tais normas feita no despacho recorrido, não foi, no decurso do processo, e...

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