Acórdão nº 351/16 de Tribunal Constitucional (Port, 07 de Junho de 2016

Magistrado ResponsávelCons. Maria Lúcia Amaral
Data da Resolução07 de Junho de 2016
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 351/2016

Processo n.º 1039/2015

1.ª Secção

Relator: Conselheira Maria Lúcia Amaral

(Conselheiro João Pedro Caupers)

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional

I. Relatório

1. O representante do Ministério Público interpôs recurso da decisão que deferiu o requerimento de pagamento de despesas de deslocação apresentado por A., testemunha arrolada no Processo n.º 4910/08.9TDLSB, pendente no Tribunal da Comarca de Lisboa - Instância Central, 1.ª Secção Criminal – J16 (“Caso …”), constante de fls. 52084-52085 (fls. 52193).

Nos termos de tal decisão, foi recusada a aplicação do disposto nos artigos 317.º, n.º 4, do Código de Processo Penal (doravante, “CPP”), 17.º, n.os 2 e 5, e Tabela IV anexa, do Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de fevereiro, alterado pela Lei n.º 7/2012, de 13 de fevereiro (Regulamento de Custas Processuais, doravante “RCP”), com fundamento na sua inconstitucionalidade material, por violação dos princípios da igualdade e do acesso ao direito e tutela jurisdicional efetiva consagrados nos artigos 13.º, n.º 2, e 20.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa (doravante, “CRP”).

2. Notificado para alegar, o representante do Ministério Público neste Tribunal, concluiu da seguinte forma:

1.ª Recurso obrigatório do Ministério Público interposto do despacho proferido em 30 de junho de 2015, no Proc. 4910/08.9TDLSB-L, da 1.ª Secção Criminal da Instância Central da Comarca de Lisboa, despacho esse que julga «os arts. 317.º, n.º 4 do C.P.P. e 17.º, n.os 2 e 5 do D.L. n.º 34/2008, de 26.2. e tabela IV anexa, alterado pela Lei n.º 7/2012, de 13.2., materialmente inconstitucionais por violação dos princípios da igualdade e do acesso ao direito e tutela jurisdicional efetiva (arts. 13.º, n.º 2 e 20.º, n.º 1 da C.R.P.) na medida em que não permitem a compensação de uma testemunha pelo justo valor pelas despesas em que incorreu na deslocação a tribunal a fim de ser inquirida nessa qualidade e a que está legalmente obrigada».

2ª. Dispõe o art. 317.º, n.º 4 do CPP, relativamente às testemunhas, peritos e consultores técnicos, notificados para comparecer em audiência de julgamento, e que não sejam órgão de polícia criminal ou trabalhador da Administração Pública convocadas em razão do exercício das suas funções, que «o juiz pode, a requerimento dos convocados que se apresentarem à audiência, arbitrar-lhes uma quantia, calculada em função de tabelas aprovadas pelo Ministério da Justiça, a título de compensação das despesas realizada».

3ª. Ao caso dos autos não se aplica nem a versão originária do RCP, que constituía o anexo III do DL 34/2008, de 26 de fevereiro, nem, designadamente, a versão com as alterações produzidas pelo DL 52/2011, de 13 de abril, mas – tal como vem consignado no despacho recorrido – a versão republicada em anexo à Lei 7/2012, de 13 de fevereiro (cf. art. 7.º deste diploma), com a retificação 16/2012, de 26 de março.

4ª. O n.º 2 do art. 17.º do RCP, indicado no despacho recorrido, refere-se à remuneração de peritos, tradutores, intérpretes, consultores técnicos e liquidatários, administradores e entidades encarregadas da venda extrajudicial: sem aplicação, pois, ao caso.

5ª. O n.º 5 do art. 17.º do RCP versa sobre a compensação devida às testemunhas (realça-se o segmento inicial): «Salvo disposição especial, a quantia devida às testemunhas em qualquer processo é fixada nos termos da tabela IV e o seu pagamento depende de requerimento apresentado pela testemunha».

6ª. A tabela IV, anexa ao RCP, no seu item relevante e na redação considerada, no que à compensação das testemunhas respeita (4.ª linha): 1/500 UC (quilómetro) – remuneração por deslocação.

7ª. A jurisprudência constitucional tem sido, por diversas vezes, chamada a pronunciar-se em matéria de custas processuais, sobre a sua função, natureza e assinalados limites.

8ª. É acentuado o teor do preâmbulo do DL 34/2008, que aprova o RCM, na parte em que proclama o acolhimento de uma «filosofia de justiça distributiva à qual não deve ser imune o sistema de custas processuais, enquanto modelo de financiamento dos tribunais e de repercussão dos custos da Justiça nos respetivos utilizadores».

9ª. Interessa, no âmbito do presente recurso, focar a jurisprudência que, em especial, versou, em matéria de encargos, sobre a remuneração devida a uma outra categoria de intervenientes acidentais, que não, embora, as testemunhas – os peritos.

10ª. O valor da remuneração atribuída aos diferentes intervenientes acidentais, designadamente aos peritos e testemunhas, não é indiferente, quer numa perspetiva de acesso ao Direito e aos tribunais, quer na ótica dos custos da justiça.

11ª. No dever de colaboração com o tribunal vai compreendida a obrigatoriedade de comparência do perito em audiência em julgamento, quando para tanto notificado – tal como relativamente à pessoa convocada como testemunha, como também acentuado no despacho recorrido

12ª. Deveres distintos (embora entre si correlacionados) – ambos compreendidos no dever de colaboração com o tribunal – o dever de desempenho de função e o dever de comparência em audiência de julgamento, que diferentemente vinculam os dois intervenientes acidentais em causa.

13ª. O perito...

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