Acórdão nº 35/17 de Tribunal Constitucional, 01 de Fevereiro de 2017

Data01 Fevereiro 2017
Órgãohttp://vlex.com/desc1/2000_01,Tribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 35/2017

Processo n.º 913/2016

1.ª Secção

Relator: Conselheiro José António Teles Pereira

Acordam, em Conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – A Causa

1. A., S.A. requereu a constituição de tribunal arbitral, nos termos dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, tendo em vista a pronúncia quanto à pretensão de anulação de atos de liquidação de IRC relativo ao ano 2009, bem como da liquidação dos respetivos juros compensatórios e acerto de contas, pela Autoridade Tributária e Aduaneira (a ora Recorrente). Sustentou, em suma, que se verificou a caducidade do direito à liquidação e invocou vícios de fundamentação, recusa ilegal de aceitação de custos fiscais e omissão de notificação de atos. Pediu, ainda, que lhe fosse arbitrada indemnização por indevida prestação de garantia.

1.1. Constituído o tribunal arbitral no âmbito do CAAD – Centro de Arbitragem Administrativa, a Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou resposta, defendendo-se por impugnação, alegando, posteriormente, por escrito. Destas alegações consta, designadamente, o seguinte, quanto à questão da caducidade:

“[…]

Por outro lado, a argumentação expendida pela Requerente encerra uma deficiente interpretação do instituto da caducidade, nomeadamente no que respeita à existência de causas suspensivas do prazo geral de quatro anos, constante do artigo 45.º, n.º 1 da LGT, previstas no artigo 46.º n.º 1 da LGT, bem como do regime de tributação dos grupos de sociedades.

Com efeito, a Requerente desenvolve a sua argumentação (apenas no que respeita à ‘caducidade do direito a liquidar – sociedade dominante A.’, abandonando tal linha argumentativa quando defende a caducidade relativamente às sociedades dominadas) na consideração de que está apenas em causa a notificação duma única liquidação respeitante à sociedade dominante A.;

Ignorando a Requerente que a liquidação, atempadamente notificada, resulta das conclusões constantes do respetivo RIT, notificado à ora Requerente como sociedade dominante do grupo, mas que se limita a agregar as correções efetuadas na esfera individual de cada uma das sociedades dominadas em resultado de diferentes ações inspetivas, relativamente às quais se aplica a causa suspensiva do prazo de caducidade prevista no n.º 1 do artigo 46.º da LGT.

Com efeito, e sem prejuízo de se encontrar provado que a notificação pessoal efetuada em 27/12/2014, cumpre todos os requisitos legais de validade e eficácia, o direito à liquidação do IRC, porque dependente das inspeções dirigidas às respetivas sociedades na sua esfera individual, esteve suspenso durante 117 e 131 dias, pelo que, o prazo de caducidade ainda estava em curso, só terminando, respetivamente em 28/04/2012 e em 12/05/2014 (cfr. artigos 49.º e 50.º da Resposta).

Assim é manifestamente ilegal o entendimento no sentido de que, por força da obrigatoriedade da liquidação do imposto no âmbito do RETGS ser efetuada à sociedade dominante do grupo, não se atende à suspensão do prazo da caducidade relativamente aos procedimentos inspetivos externos dirigidos às sociedades nele abrangidas, quando essa suspensão efetivamente ocorreu.

Nas palavras de AVELÃS NUNES, G., Tributação dos grupos de sociedades pelo lucro consolidado em sede de IRC, Almedina, 2001, pág. 95, ‘o grupo não é mais do que uma unidade fiscal sui generis em sede de tributação pelo IRC, em que a capacidade contributiva reside em cada uma das várias sociedades. Daí que elas sejam os contribuintes, embora a tributação do rendimento auferido pelas sociedades pertencentes ao grupo seja feita conjuntamente (…)’.

Desta forma, no âmbito do RETGS, a tributação do grupo depende absolutamente das correções efetuadas às sociedades dominadas em ações inspetivas à sua esfera individual e dos montantes consequentemente liquidados, pelo que a desconsideração da existência de causas suspensivas do prazo de caducidade, por força da obrigatoriedade da liquidação do imposto na esfera da sociedade dominante do grupo, é manifestamente ilegal, violando ostensivamente o disposto no artigo 46.º da LGT.

E tal interpretação não só é manifestamente ilegal, como inconstitucional, como se passa a explicitar.

A interpretação preconizada viola o princípio da igualdade na repartição da carga tributária e na prossecução da satisfação das necessidades financeiras do Estado, consagrado no artigo 103.º da Constituição da República Portuguesa, porquanto impede o exercício do direito à liquidação cujo prazo não decorreu em virtude da existência de causa suspensivas que simplesmente não são consideradas, impedindo a tributação de sociedades integradas num grupo que revelam capacidade contributiva, condicionando a necessária perceção de receitas que garantam as necessidades financeiras do Estado e a repartição justa dos rendimentos e da riqueza.

E viola igualmente o princípio da proporcionalidade, ínsito no artigo 18.º n.º 2 da CRP, na medida em que impede a Administração Tributária de beneficiar das causas suspensivas do prazo geral de caducidade perante em situações em que a liquidação resulta de ação inspetiva externa, não sendo, por tal facto, possível imputar-lhe qualquer inércia, o que se mostra desadequado ao fim que se pretende atingir com o instituto da caducidade atinente à salvaguarda da segurança jurídica.

Por último, a desconsideração de causas suspensivas do prazo de caducidade viola o princípio da igualdade, previsto no artigo 13.º da CRP, pois determina, de forma injustificada e desproporcional, o encurtamento do prazo de caducidade relativamente a sociedades objeto de ações inspetivas unicamente porque se encontram abrangidas pelo RETGS em detrimento das demais sociedades sujeitas ao regime geral de tributação.

[…]” (sublinhado acrescentado).

1.1.3. Foi proferido acórdão arbitral, tirado por maioria, no qual foi julgado procedente o pedido relativamente à anulação dos atos tributários e improcedente relativamente à indemnização por indevida prestação de garantia. Da respetiva fundamentação consta, com interesse para a presente reclamação, o seguinte:

“[…]

Como primeira questão, e precedente na ordem de conhecimento dos vários vícios imputados aos atos tributários objeto da presente ação arbitral, argui a Requerente a verificação da caducidade do direito à liquidação, por esta lhe ter sido notificada para lá do prazo fixado no artigo 45.º/1 da LGT.

Em causa está, no caso sub judice, aferir se a notificação operada na pessoa de alguém que não era funcionário da notificanda, mas que se encontrava no local da sede desta, e era funcionário de uma empresa que integrava o grupo de sociedades por ela encabeçado, tem, ou não, a virtualidade de interromper o prazo do referido artigo 45.º/1 da LGT, produzindo efeitos na esfera jurídica da Requerente.

[…]

Conforme resulta dos factos provados, a A. T. procedeu a duas notificações das liquidações sub judice:

– uma, no dia 21/12/2013, através da caixa Via CTT da Requerente, notificação essa que foi rececionada a 07/01/2014;

– outra, no dia 27/12/2013, na pessoa de B., trabalhador dependente da sociedade “C. SA”, sociedade esta que faz parte do grupo de sociedades encabeçado pela Requerente, e que tem sede no mesmo local desta.

É a respeito desta última notificação que se colocam dúvidas, acerca dos efeitos que a mesma possa ter na esfera jurídica da Requerente.

[…]

[A] regra (a preferência legal) é a de que as pessoas coletivas sejam notificadas nas pessoas dos seus representantes legais. Subsidiariamente, tais regimes toleram que as pessoas coletivas sejam notificadas na pessoa de qualquer empregado que se encontre no local onde normalmente funcione a administração da pessoa coletiva.

No caso, e para além da notificação por Via CTT, nos termos da primeira parte do artigo 41.º/1 do CPPT, a AT, usando a prerrogativa do artigo 38.º/5 do mesmo Código, optou por proceder também a uma notificação por contacto pessoal.

Note-se, desde logo, que estando em causa uma notificação por contacto pessoal, serão inaplicáveis as normas do Código de Processo Civil próprias da citação por via postal, maxime, as do artigo 228.º, em especial do n.º 2, que prevê a possibilidade de a carta ser entregue a qualquer pessoa que se encontre na residência ou local de trabalho do citando e que declare encontrar-se em condições de a entregar prontamente ao citando.

Antes, estando em causa uma notificação por contacto pessoal, a mesma terá de ser feita por contacto direto com o citando, como impõe o artigo 231.º/1 do Código de Processo Civil, aplicável por força do artigo 241.º/1 do mesmo código, sendo que, por força do disposto nos já citados artigos 41.º/2 do CPPT e 223.º/3 do Código de Processo Civil, as pessoas coletivas se considerarão representadas pelos seus administradores ou gerentes e, subsidiariamente, por qualquer empregado que se encontre no local onde normalmente funcione a administração ou gerência.

Em concreto, não há qualquer dúvida que a notificação realizada no dia 27/12/2013 não se deu na pessoa de qualquer administrador da Requerente, assim como não há, também, qualquer dúvida de que se deu no local onde normalmente funciona a administração daquela.

Verifica-se, conforme decorre da matéria de facto dada como provada, que a pessoa que rececionou aquela notificação de 27/12/2013, não era empregado da Requerente.

Face a tais factos, e ao disposto nos supra referidos artigos 41.º do CPPT e 223.º, 231.º/1 e 241.º/1 do Código de Processo Civil, não se poderá concluir que a Requerente foi notificada no dia 27/12/2013.

Não obstará à conclusão referida a circunstância alegada pela AT, e provada, de a pessoa notificada ter a...

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