Acórdão nº 8/19 de Tribunal Constitucional (Port, 08 de Janeiro de 2019

Magistrado ResponsávelCons. Claudio Monteiro
Data da Resolução08 de Janeiro de 2019
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 8/2019

Processo n.º 197/18

1.ª Secção

Relator: Conselheiro Claudio Monteiro

Acordam, em conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional,

I – Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, A. veio interpor recurso, ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, doravante designada por LTC).

2. O ora Recorrente figura como arguido no processo-base, tendo sido condenado, em 1.ª instância, pela prática, em autoria material e sob a forma consumada e continuada, de um crime de abuso de confiança contra a Segurança Social, previsto e punido pelo artigo 107.º, n.o 1, do Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT), numa pena de 240 dias de multa, à taxa diária de € 6,50. Mais foi julgado parcialmente procedente o pedido de indemnização cível deduzido pelo Instituto de Segurança Social e, em consequência, condenado o arguido ao pagamento de quantia monetária relativa a contribuições deduzidas a trabalhadores e gerentes reportadas aos meses de junho de 2006 a novembro de 2009, acrescida de juros já vencidos, contados desde as datas de vencimento de tais quantias, bem como dos juros vincendos até integral pagamento.

Inconformado com esta decisão, dela interpôs o arguido recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, renovando o seu interesse no recurso em separado do despacho que, 27 de maio de 2015, indeferiu invalidades processuais por si suscitadas na contestação que apresentou à acusação e ao pedido de indemnização cível deduzido pelo Instituto de Segurança Social, e declarou extinto o procedimento criminal contra a sociedade B., Lda., de que o arguido era responsável.

Por acórdão de 12 de outubro de 2016, o Tribunal da Relação de Lisboa negou provimento ao recurso interlocutório e ao recurso da decisão final.

Por ainda inconformado, interpôs o arguido recurso para o Supremo Tribunal de Justiça que, por acórdão datado de 24 de janeiro de 2018, decidiu considerar tempestivo o recurso interposto pelo recorrente; rejeitar o recurso no que toca ao segmento do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa que julgou improcedente o recurso interlocutório; rejeitar o recurso na parte penal, atenta a sua inadmissibilidade legal, plasmada no artigo 400.º, n.º 1, alínea e), do Código de Processo Penal (CPP); rejeitar o recurso na parte cível, em virtude de se verificar dupla conforme, nos termos do artigo 671.º, n.º 3, do Código de Processo Civil (CPC), ressalvada a questão da incompetência absoluta; admitir o recurso de revista apenas quanto à invocada violação das regras de competência em razão da matéria, nos termos conjugados dos artigos 629.º, n.º 2, alínea a), 671.º, n.º 3, ambos do CPC, 400.º, n.º 3, e 4.º, do CPP; julgar improcedente a exceção de incompetência absoluta, declarando o tribunal criminal competente para julgar o pedido de indemnização cível, com base em crime de abuso de confiança contra a Segurança Social; e, por fim, remeter os autos à formação prevista no artigo 672.º, n.º 3, do CPC, para apreciação preliminar sumária do recurso de revista excecional interposto pelo recorrente, nos termos do artigo 672.º, n.º 2, alínea a), do mesmo diploma, restrito à questão da responsabilidade cível da Sociedade VMJF, Lda. e de Valentim Gonçalves Morais, bem como à do quantum da indemnização civil fixada, em virtude da alegação de o último ato de execução imputável ao recorrente remontar a fevereiro de 2007 e ao montante global de € 14.921,74.

Nesta sequência, manifestando-se inconformado com o acórdão notificado, veio o recorrente interpor o presente recurso de constitucionalidade, dirigido ao Supremo Tribunal de Justiça, que mereceu despacho de admissão proferido por essa instância em 20 de fevereiro de 2018.

3. O Recorrente, no requerimento de interposição de recurso, apresenta o respetivo objeto nos seguintes moldes:

«1. O ora Recorrente interpôs recurso do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, Lisboa junto do Supremo Tribunal Justiça, não se conformando com aquela decisão de 2ª instância, quanto à componente penal [relativa à qual se arguiu a nulidade! (nos termos dos artigos 374°, n.º 2 e 379°, n.º 1, al. a) do CPP) da decisão daquela instância, constante de Fls, 67 daquele documento, violadora do disposto no artigo 425°, 5 do CPP (desde logo porque aquela previsão apenas se aplica a confirmações de absolvições, quando ao invés, nos presentes autos houve uma condenação), previsão cuja inconstitucionalidade foi arguida por violação dos artigos 2°, 13°, 20°, n.º 1 e 32°, n.º 1 da CRP e o artigo 6°, n.º 1 da CEDH] na medida em que fere o direito de participação e de reação recursória constitucionalmente consagrados.

2. O ora Recorrente interpôs recurso do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa junto do Supremo Tribunal Justiça, não se conformando com aquela decisão de 2ª instância, quanto à componente cível, nos termos dos artigos 400°, n.º 2 do CPP [na versão mais favorável (cfr. artigo 29º n.º 4 da CRP) ao Arguido (remontando os factos descritos na acusação ao ano de 2006), segundo a qual "Sem prejuízo do disposto nos artigos 427.º e 432.º o recurso da parte da sentença relativa à indemnização civil só é admissível desde que o valor do pedido seja superior à alçada do tribunal recorrido e a decisão impugnada seja desfavorável para o recorrente em valor superior a metade desta alçada”, ou caso assim não se entenda (sem conceder e por mera cautela de patrocínio) nos termos do artigo 400°, n.º 3 do atual CPP (nos termos do artigo 671°, n.º 3, última parte, 672°, n.º 1, al. a) e n.º 2, al. a) e 674° todos do CPC, por remissão do artigo 4.º do CPP, ou seja, para melhor aplicação do direito, face à sua relevância jurídica) e 433º do CPP (Cfr. artigo 379°, n.º 2), interpor recurso nos próprios autos (Cfr. artigo 406°, n.º 1 do CPP) com subida imediata (Cfr. artigo 407°, n.º 1 do CPP) e com efeito suspensivo (Cfr. artigo 408°, n.º 1, al. a) do CPP), o que a ter sido objeto de indeferimento viola o citado preceito constitucional.

3. O ora Recorrente interpôs recurso do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, não se conformando com aquela decisão de 2ª instância, quanto à circunstância do Acórdão então colocado em crise (que manteve a condenação do Arguido numa pena de duzentos e quarenta dias de multa, à taxa diária de 6,50€ e no pagamento ao ISS, LP. da quantia de 121.130,82€, acrescida de juros vencidos e vincendos) por nulidade, já que (Cfr. Fls. 67 daquela decisão) remetia para o disposto no artigo 425°, n.º 5 do CPP (que prevê a desnecessidade de fundamentação da decisão, facultando ao decisor a possibilidade de se limitar a remeter para os fundamentos da decisão impugnada) olvidando-se (com o devido respeito) estar em causa uma condenação e não uma absolvição, o que se considera inconstitucional e violador dos artigos 20°, n.ºs 4 e 5 da CRP, pois o referido artigo 425°, n.º 5 do CPP apenas é aplicável - no entender do Arguido - nos casos de Acórdãos absolutórios o que não é manifestamente o caso dos autos, tendo assim sido violado o dever de fundamentação imposto no artigo 374, n.º 2 do CPP, ao remeter para outra decisão (anteriormente tomada) de condenação, sendo por conseguinte nulo face ao disposto no artigo 379º, n.º 1 do CPP, devendo essa nulidade ser reconhecida, conforme o disposto no n.º 2 deste último preceito legal, in casu, por via do disposto no artigo 433° do CPP.

4. O ora Recorrente interpôs recurso do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, não se conformando com aquela decisão de 2ª instância, quanto à circunstância do próprio artigo 425°, n.º 5 do CPP ser inconstitucional por violar os artigos , 13°, 20°, n.º 1 e 32°, n.º 1 da CRP e o artigo 6°, n.º 1 da CEDH, na medida em que fere o direito de participação e de reação constitucionalmente consagrados.

5. O ora Recorrente interpôs recurso do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, não se conformando com aquela decisão de 2ª instância, invocando a ilegalidade (por violação do disposto nos artigos 57°, 58°, 262°, 119°, al. d) e 122°, n.º 1, todos do CPP e al. b) do n.º 4 do artigo 105° do RGIT, na remissão do artigo 107°, n.º 2 do mesmo diploma legal) e inconstitucionalidade, por violação do disposto no artigo 32°, n.º 2 da CRP (quanto à violação do princípio da presunção de inocência) e por violação do disposto no artigo 32°, n.º 5 (por violação do princípio do contraditório do processo penal), o entendimento segundo o qual os artigos 57° e 58° do CPP permitem a constituição de arguido contra alguém relativamente a quem ainda não possa ser deduzida qualquer acusação, nem requerida qualquer instrução (Cfr. artigo 57.º n.º 1 do CPP), já que sendo a al. b) do n.º 4 do artigo 105° do RGIT uma condição objetiva de punibilidade do crime de abuso de confiança fiscal, não pode (sem a existência de uma notificação validamente concretizada nos termos daquele preceito legal) considerar-se que possa haver uma suspeita fundada da prática de um crime (Cfr. artigo 58.º n.º 1, al. a) da CPP), que justifique a aplicação de uma medida de coação ou de garantia patrimonial (C.fr. artigo 58º n.º 1, al. b) do CPP) ou que seja detido qualquer suspeito, nos termos e para os efeitos previstos nos artigos 254º a 261º (Cfr. artigo 58º n.º 1, al. c) do CPP), apesar de ter sido levantado um auto de notícia (que dava uma pessoa como suposto agente de um crime), pois tal situação ainda não lhe havia sido comunicada e a notícia em causa era manifestamente infundada, já que a regra geral da condição de punibilidade consagrada na al. b) do n.º 4 do artigo 105° do RGIT (na remissão do artigo 107°, n.º 2 do mesmo diploma legal), ainda não se encontrava verificada, ou seja, se ainda não haviam decorridos os 30...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT