Acórdão nº 0631/14.1BESNT 0289/17 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 20 de Dezembro de 2018

Magistrado ResponsávelMARIA BENEDITA URBANO
Data da Resolução20 de Dezembro de 2018
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I – Relatório 1.

Instituto da Segurança Social, I.P. (ISS,IP), devidamente identificado nos autos, recorre para este Supremo Tribunal do Acórdão do TCAS, de 24.11.16, que decidiu “conceder provimento ao recurso, julgando-o procedente, revogar a decisão recorrida e, em substituição, anular o ato administrativo impugnado”.

Na origem do recurso interposto para o TCAS esteve uma decisão do TAF de Sintra, de 15.10.15, que decidiu nos seguintes termos: “Nos termos e com os fundamentos expostos, julgo improcedente a presente acção, e em consequência, decide-se: 1 – Não anular a decisão proferida pela Srª Chefe de Equipa do Núcleo de Prestações de Desemprego, da Unidade de Prestações, do Centro Distrital do Réu, pela qual foi determinada a cessação da prestação de subsídio de desemprego, de que a Autora beneficiou, e que será emitida nota de reposição no valor de € 43.512,96; 2 – Absolver o Réu do pedido formulado”.

  1. O R., ora recorrente, apresentou alegações, concluindo do seguinte modo (cfr. fls. 212 a 214v.): “1. O presente Recurso Excecional de Revista vem interposto do Acórdão proferido em 24/11/2016 nos autos supra referenciados, que concedeu provimento ao recurso jurisdicional interposto pela ora recorrida, A………… da sentença do TAF de Sintra que julgou improcedente a presente Acção Administrativa e absolveu o ora Recorrente do pedido.

  2. O Acórdão ora em recurso entendeu ser de revogar a sentença do TAF de Sintra, por considerar, contrariamente a este tribunal, e perante a mesma exata factualidade, que a Recorrida incumpriu de forma justificada a obrigatoriedade de não desenvolver outra atividade normalmente remunerada durante o período inicial de 3 anos de execução do projeto de criação do próprio emprego com recurso ao montante global de prestações de desemprego (artº 34º nº 3 do DL 220/2006 de 03/11 e artº 17º da Portaria 985/2009 de 04/09), não tendo, por conseguinte, que restituir ao Recorrente o montante total do subsídio de desemprego pago – 43.512,96 € (artº 34º nº 4 do DL 220/2006 de 03/11).

  3. De acordo com o acórdão recorrido e perante a factualidade dada por provada, que aqui se dá por reproduzida: «Em síntese, o rendimento tirado pela Autora da execução deste projeto aprovado pelo Réu não dava para ela viver com normal dignidade, sem se demonstrar a sua culpabilidade em tal situação. Aliás, embora não provado como causa (e, portanto, irrelevante para análise de uma alegada alteração substancial das circunstâncias ‘contratuais’), podemos afirmar aqui um contexto evidente: a crise económica-financeira nacional desde 2011. O exercício a título parcial e não permanente, da segunda atividade (de formação profissional), durante cerca de ano e meio, foi motivado pela necessidade de a Autora se manter a si própria, ao seu agregado familiar e à referida empresa ‘B............

    ’.

    Portanto, sem o segundo trabalho, ou segunda atividade profissional a autora não teria tido condições para viver, nem para evitar o fecho da empresa criada.

    Isso quer dizer, necessariamente, que o incumprimento (a segunda atividade profissional em horário parcialmente coincidente com a da empresa subsidiada) foi justificada».

  4. Contrariamente ao concluído pelo TAF de Sintra, que perante a mesma factualidade entendeu nomeadamente que: «Competia à A. apresentar a justificação, os motivos justificativos para o incumprimento, já que o projeto foi aprovado, entre o mais, por ser económica e financeiramente viável, sendo recebido, de entrada, o subsídio de desemprego na totalidade. A prestação da referida atividade cumulativa da C…………, Lda, pela A., em nosso entender, não constitui motivo de justificação do incumprimento daquela obrigação. No que respeita às razões pessoais ou familiares da A., que a A. alega, o legislador não deu relevo a este ponto, pois o subsídio visa a criação do próprio emprego, através da empresa objecto do projeto, e não acudir a outras situações, para as quais estabeleceu outros mecanismos legais e assistenciais».

    Assim, 5.

    Perante a mesma exata factualidade, o incumprimento foi considerado injustificado por sentença proferida pelo TAF de Sintra (na sequência do entendimento do Recorrente) e justificado pelo Acórdão ora recorrido.

  5. Atentas as diferentes interpretações do conceito de ‘incumprimento injustificado’ patente no artº 34º nº 4 do DL 220/2006 de 03/11 efetuadas por parte do TAF de Sintra e do Recorrente, por um lado, e por parte do TCASul, por outro lado, entende o Recorrente que para além de tal questão se revestir de grande relevância jurídica e social, a admissão do recurso será necessária a uma melhor aplicação do direito, motivo pelo qual se justifica, salvo melhor opinião, uma reapreciação excecional por esse Venerando Tribunal, de acordo com o art. 150º nº 1 do CPTA.

  6. O pagamento por uma só vez do montante global das prestações de desemprego depende da apresentação de um projeto que origine a criação do próprio emprego a tempo inteiro do promotor destinatário (artº 1º nº 2 b) da referida Portaria e artº 34º/1 do DL 220/2006, de 03/11), devendo o projeto ser apresentado no IEFP, IP, juntamente com o requerimento do pedido de pagamento antecipado da prestação de desemprego dirigido ao ISS, IP.

  7. Nos termos do Despacho 2087/2009 de 17/09, o IEFP, IP, analisa a viabilidade económico-financeira do projeto e remete a análise, juntamente com o requerimento subscrito pelo promotor e beneficiário da prestação de desemprego, ao Centro Distrital do ISS, IP competente.

    Assim, 9.

    Constitui requisito do deferimento do pagamento do montante global das prestações de desemprego (ou seja, a disponibilização imediata de tal valor pelo Sistema Social de Segurança Social com inerente esforço em termos orçamentais) a existência de um projeto com viabilidade económico-financeira que permita ao promotor criar e manter o seu próprio emprego a tempo inteiro durante pelo menos 3 anos, possibilitando a autonomização de prestações ou subsídios sociais.

  8. Do exposto resulta a proibição de exercício de outra atividade profissional remunerada durante o referido período, tendo o DL 64/2012 de 15 de março que entrou em vigor em 1 de abril de 2012 vindo plasmar o que já era inerente à aplicação da referida medida, atribuindo nova redação ao artº 34º nº 3 do DL 220/2006 de 03/11.

  9. De acordo com o acórdão recorrido, o facto de a Autora ter exercido, a título parcial e não permanente, uma segunda atividade por necessidade de se manter a si própria, ao seu agregado familiar e à referida empresa ‘B............’, em face de os resultados da execução do projeto não terem sido suficientes para o efeito, constitui um incumprimento justificado daquela obrigatoriedade.

  10. Aquilo que no entender do Recorrente e de acordo com a sentença do TAF de Sintra fica por provar é a ocorrência de circunstâncias anormais/extraordinárias justificativas do facto de a ‘B............’ não ter tido os resultados esperados, não bastando, no entender do Recorrente, que se prove uma necessidade de prover ao sustento para justificar o exercício de outra atividade normalmente remunerada.

    É que, 13.

    O projeto apresentado pela Recorrida foi considerado económica e financeiramente viável e as prestações de desemprego foram pagas em montante único com base nesse pressuposto, ou seja, a criação de pelo menos um posto de trabalho.

  11. Tendo, aliás, decorrido um curto espaço de tempo entre a aprovação do pagamento das prestações de desemprego em montante único, novembro de 2011, com a consequente aplicação pela Recorrida de 68.512,96€ - 43.512,96€ – de prestações de desemprego a que acresce o valor do capital próprio investido no valor de 25.000,00€ – e o ‘declínio’ da atividade da ‘B............’ que levou logo a que logo em março de 2012 a Recorrida deixasse de receber remuneração (pontos 6, 15, 17, 28, 29, 33 e 34 dos factos provados).

  12. Até porque a provada diminuição do consumo privado da área de atividade da ‘B............’ fruto da crise económico-financeira que tem atravessado o país nos últimos anos (ponto 21 dos factos provados), facto abstrato e genérico, nunca poderia justificar, em concreto, o ‘declínio’ do projeto da Recorrida, uma vez que a situação económica nacional foi necessariamente levada em conta pelo IEFP, IP, aquando da aprovação daquele.

  13. Não resultando alegada muito menos provada qualquer alteração anormal das circunstâncias entre o momento em que o apoio foi concedido – novembro de 2011 – e a acumulação de atividade profissional por parte da Recorrida, não se pode concluir pela justificação do incumprimento do artº 34º nº 3 do DL 220/2006 de 03/11 (artº 437º do Código Civil, Acórdão desse douto Supremo Tribunal Administrativo datado de 03/02/2011 – Processo 0474/10 e Acórdão do TCAN de 04/02/2010 – processo nº 02553/06.0BEPRT, ambos em www.dgsi.pt).

  14. Precisamente porque o projeto foi analisado e aprovado por ter viabilidade económica, só a prova de uma circunstância concreta anómala poderia justificar que decorridos apenas escassos meses já não existisse possibilidade de pagar a remuneração da Recorrida.

  15. A não ser exigida esta prova, qualquer beneficiário do requerimento de pagamento de subsídio de desemprego em montante único poderia exercer outra atividade no prazo de 3 anos, não se dedicar ao negócio projetado e vir depois alegar simplesmente que «os resultados não foram os esperados».

    Acresce que, 19.

    Conforme resulta provado, desde pelo menos janeiro de 2011, e mesmo logo em período subsequente à aprovação e início do projeto – novembro e dezembro de 2011, que a Recorrida exerceu funções como formadora na C…………, Lda, pelo que se conclui que o início do projeto não a impediu de dar continuidade a essa outra atividade, que, aliás, não chegou a deixar de exercer, tudo muito antes do motivo justificativo apresentado – o declínio da ‘B............’.

  16. O exercício logo em 2011 da referida atividade de formadora, que, como é do...

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