Acórdão nº 247/13.0TBCCH.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Novembro de 2018

Magistrado ResponsávelBERNARDO DOMINGOS
Data da Resolução15 de Novembro de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA 2ª SECÇÃO CÍVEL * Relatório AA, BB, CC, DD, EE, FF, GG, HH, II, JJ, KK, LL, MM, NN, OO, PP, QQ, RR, intentaram a presente acção declarativa comum contra - SS, e mulher, TT, peticionando o seguinte: Deve ser considerado impugnado, para todos os efeitos legais, o facto justificado na escritura de 16 de Abril de 2013, referente à invocação da aquisição pelos RR, por usucapião do prédio rústico inscrito na matriz rústica da freguesia da …, Concelho de Coruche sob o artigo 359, da secção AA; Ser declarada ineficaz e de nenhum efeito essa mesma escritura de justificação notarial, por forma a que os RR., não possam através dela, registrar quaisquer direitos sobre o prédio identificado no prédio anterior; Ser ordenando o cancelamento de quaisquer registos operados com base no documento aqui impugnado; Serem os RR. condenados a restituir o imóvel aos AA., no estado em que o mesmo se encontrava antes da s/ intervenção; Serem os RR. condenados em sanção pecuniária compulsória no valor de €75,00 por cada dia de incumprimento de restituição do terreno dos AA. após o trânsito em julgado da decisão final.

* Alegaram para o efeito, em síntese, que por escritura lavrada no dia 16 de Abril de 2013, no Cartório Notarial de …, os réus declararam que “(…) com exclusão de outrém, são donos e legítimos possuidores, dos seguintes imóveis: “Prédio rústico, sito na Rua da G…, freguesia da …, concelho de Coruche, com a área de trinta e dois mil e trinta e quatro metros quadrados, composto por terreno de cultura arvense, que confrontado norte onde termina em bico com a Rua da G… e a Rua do …, do sul com UU, do nascente com Rua da G… e do poente com Rua do …, prédio este inscrito na matriz cadastral da freguesia de …, sob parte do artigo 359, da secção AA, pendente de resolução”, ao qual atribuíram o valor de € 500,00; e “Prédio rústico, sito na Rua da G…, freguesia da …, concelho de Coruche, com a área de trinta e cinco mil cento e cinco vírgula sessenta e cinco metros quadrados, composto por terreno de cultura arvense, que confronta do norte com Rua da G… e Rua da C…, do sul com Herdeiros de VV, do nascente com Rua da G… e do Poente com Rua da C…, inscrito na matriz cadastral da freguesia de …, sob parte do artigo 359, da secção AA, pendente de resolução”, ao qual atribuíram o valor de € 500,00.

- Mais declararam que os prédios vieram à sua posse “(…) em mil novecentos e oitenta e seis, em dia que não podem precisar, através de compra verbal, nunca reduzida a escritura pública, que fizeram a XX, viúva, residente na freguesia da …, já falecida, a qual por sua vez os havia adquirido por partilha e divisão meramente verbal que efectuou com os demais interessados e herdeiros de ZZ e AAA, também nunca reduzido a escrito, formalmente válido.” - Tendo declarado ainda que “(…) ignoram o título pelo qual os mencionados ZZ e AAA, adquiriram os prédios, mas sabem que aqueles os possuíam há muito mais de oitenta anos.” - Declararam ainda que “(…) têm possuído e usado aquelas parcelas de terreno, objecto do direito que agora justificam, tendo sempre e desde então agido como proprietários exclusivos das mesmas e nunca como compossuidores ou comproprietários do prédio originário, respeitando rigorosamente as suas estremas e divisórias, com total exclusividade e independência, e sempre praticaram sobre os mesmos todos os actos de posse de que estes eram susceptíveis, tais como, amanhando-o, colhendo os seus frutos e pagando as respectivas contribuições, tudo na convicção de exercerem um direito próprio, sem qualquer interrupção, à vista de toda a gente e sem oposição de quem quer que fosse, sendo por isso uma posse pública, pacífica, continua e de boa fé.” - Contudo, as declarações prestadas pelos réus não correspondem à verdade, porque o prédio do qual se arrogam proprietários é propriedade dos autores, tendo-lhes o mesmo sucedido, por herança desde a sua bisavó BBB.

- Os ascendentes dos autores, proprietários da então denominada Herdade da CCC, deram início a um novo processo de aforamento, do qual resultaria o desenvolvimento da região.

- Os chamados “foros” foram intensamente habitados e desenvolvidos a partir do fim do século XIX, tendo sido os mesmos divididos e dados de arrendamento a rendeiros que dos mesmos cuidavam, cultivavam, colhiam os seus frutos, neles construíam, com a autorização dos “senhores”, as suas casas, e por tudo pagavam uma renda.

- Mais tarde, parcelas de terreno foram arrendadas a variados indivíduos.

- Sendo o terreno de que os réus se arrogam proprietários uma das parcelas pertencentes à família DDD e inseridas naquela que era a chamada Herdade da CCC.

- Os réus nunca exerceram qualquer ato de posse no terreno, mas sim ocuparam abusivamente o mesmo, com a consciência de que não era propriedade sua.

Concluem pedindo a procedência da acção, e em consequência: a) Deve ser considerado impugnado, para todos os efeitos legais, o facto justificado na escritura de 16 de Abril de 2013, referente à invocada aquisição pelos réus, por usucapião do prédio rústico inscrito na matriz rústica da freguesia da ..., concelho de Coruche sob o artigo 359, da secção AA; b) Ser declarada ineficaz e de nenhum efeito essa mesma escritura de justificação notarial, por forma a que os réus não possam através dela, registar quaisquer direitos sobre o prédio identificado no pedido anterior c) Ser ordenado o cancelamento de quaisquer registos operados base no documento aqui impugnado; d) Serem os réus condenados a restituir o imóvel aos autores, no estado em que o mesmo se encontrava antes da sua intervenção; e) Serem os réus condenados em sanção pecuniária compulsória no valor de€ 75,00 por cada dia de incumprimento de restituição do terreno aos autores após trânsito em julgado da decisão final.

* Os Réus deduziram Contestação, impugnando os factos alegados pelos autores, alegando que desde Janeiro de 1986 que iniciaram a posse das parcelas identificadas na escritura de justificação notarial, por as terem adquirido por compra verbal a EEE, já falecida, que por sua vez as adquiriu, há mais de 40 anos, através de partilha e divisão, também verbal que efetuou com os outros herdeiros de ZZ e AAAno.

Mais alegaram que a EEE demarcou as duas parcelas e colhia a produção florestal, nomeadamente pinheiros e que a partir de 1986 cortaram as árvores existentes, mandaram nivelar as parcelas, fizeram um furo numa delas, fizeram pomar e horta que regam, podam, adubam, curam, colhem a sua produção, o que fazem à vista de toda a gente, sem oposição de ninguém, inclusive dos autores, convictos que são donos das parcelas e que não lesavam o direito de ninguém.

Concluem pela improcedência da acção e pela sua absolvição do pedido.

* Efectuado julgamento, foi proferida Sentença em que se decidiu o seguinte: “ Em face do exposto, e vistas as já indicadas normas jurídicas e os princípios expostos, decido julgar a presente ação totalmente procedente, por totalmente provada, e em consequência: a) Declaro impugnado, para todos os efeitos legais, o facto justificado na escritura pública de 16 de abril de 2013, por os réus não terem adquirido os prédios nela identificados por usucapião; b) Declaro ineficaz e de nenhum efeito essa mesma escritura de justificação notarial, por forma a que os réus não possam através dela registar quaisquer direitos sobre os prédios nela identificados; c) Ordeno o cancelamento dos registos operados com base na dita escritura, e bem assim a eliminação das inscrições matriciais feitas com a mesma base; d) Condeno os réus SS, e mulher, TT a restituir aos autores os prédios objeto da escritura pública de justificação de 16 de abril de 2013, no estado em que o mesmo se encontrava antes da sua intervenção; e) Condeno os réus SS, e mulher, TT ao pagamento de sanção pecuniária compulsória no valor de € 75,00 por cada dia de incumprimento de restituição do terreno aos autores, após trânsito em julgado da presente decisão.

Julgo improcedentes os pedidos formulados pelos réus de condenação dos autores como litigantes de má – fé e no pagamento da indemnização peticionada.

…” * Inconformados com tal decisão, vieram os Réus interpor recurso de apelação, onde além do mais impugnaram a decisão de facto e impetram a improcedência da acção.

Apreciando o recurso o Tribunal da Relação de …, deu provimento parcial à impugnação da decisão de facto, julgou procedente a apelação e improcedente a acção.

Irresignados com o deliberado, vieram os AA. interpor recurso de revista que fundamentaram com as seguintes Conclusões: 1. « O Tribunal a quo erra na aplicação do Direito quando decide que os Réus têm direito a ver reconhecida a aquisição, por usucapião, do direito de propriedade sobre as parcelas de terreno identificadas nos autos, e consequentemente, julga improcedente a presente ação.

  1. Para que exista aquisição do direito de propriedade, por usucapião, é necessário que se verifiquem dois elementos; o corpus possessório e animus possidendi 3. No caso em apreço não resulta da factualidade provada nenhum dos referidos elementos.

  2. Ao contrário do sufragado pelo Acórdão ora recorrido o Réu não logrou provar os factos que objetivamente são tipicamente praticados por um proprietário.

  3. Com efeito, a factualidade assente nos pontos 21 a 27 dos factos provados não reflete...

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