Acórdão nº 49/16.1T8FND.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 25 de Outubro de 2018
Magistrado Responsável | FÁTIMA GOMES |
Data da Resolução | 25 de Outubro de 2018 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I. Relatório 1.
“AA, LDA” instaurou em 20/01/2016, contra “BB, LDA acção declarativa, pedindo a condenação da Ré a pagar-lhe:
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A quantia de € 12.300,00 (doze mil e trezentos euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal supletiva aplicável às obrigações de natureza comercial, desde 27.12.2012 até integral pagamento, cifrando-se os vencidos à data da instauração da presente acção em € 2.744,00 (dois mil setecentos e quarenta e quatro euros); b) A quantia de € 6.762,00 (seis mil setecentos sessenta e dois euros), acrescida de juros de mora à taxa legal supletiva, desde a citação até integral pagamento.
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Alegou, em síntese, o seguinte: - No decurso do mês de Novembro de 2012, a A. vendeu à Ré uma máquina Bulldozer, usada, de marca Komatsu, modelo D65EX12, com o n.º de série ..., pelo preço de € 55.000,00; - A Ré não pagou a totalidade do preço acordado, estando por pagar a quantia de € 10.000,00, acrescido do valor do IVA, não obstante as insistências da A. para o fazer desde 27.12.2012.
- Acontece, ainda, que correu termos no Tribunal Judicial de Vila Flôr, sob o n.º 17/13.5TAVFL, processo comum singular, emergente de participação criminal apresentada pelo representante legal da Ré contra o representante legal da A. por, alegadamente, este ter retirado da dita máquina que lhe vendeu o distribuidor hidráulico; - O representante legal da A. veio a ser absolvido pelo crime de furto de que havia sido acusado, bem assim, do pedido cível deduzido; - Com a referida acção crime a A. teve prejuízos, pois teve que pagar honorários ao Advogado para defender o seu representante legal, bem assim, taxa de justiça devida pela contestação do pedido cível.
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Devidamente citada, contestou a R., suscitando, desde logo, a excepção da recusa legítima em fazer a sua prestação à A., alegando, para tanto, que a A. não eliminou os defeitos de que a máquina padecia, não tendo, dessa forma, cumprido o contrato, para além de que a máquina vendida sem o distribuidor hidráulico não funcionava. Deduziu reconvenção, onde pede a condenação da A. a pagar-lhe a quantia de € 35.169,16 pelos danos causados com a sua actuação e com o incumprimento do contrato. Termina pugnando pela improcedência da acção e procedência da reconvenção.
A A. apresentou réplica, onde, desde logo, suscita a excepção do caso julgado, pois a Ré havia deduzido pedido cível no âmbito do citado processo-crime e volta a deduzir agora igual pretensão, verificando-se os requisitos previstos no art.º 581.º do CPC. No mais, impugna a factualidade vertida na reconvenção, alegando não ter incumprido o contrato de compra e venda, pois procedeu à reparação do distribuidor hidráulico, não tendo a Ré querido receber tal peça por não querer pagar o resto do preço acordado. E, ainda que a Ré tivesse direito à indemnização que pede, sempre a acção estaria caducada nos termos do art.º 921.º/4 do CC.
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Foi proferido despacho saneador, onde, admitido o pedido reconvencional, foi fixado o valor da acção, após o que se conheceu da excepção do caso julgado, julgando-a improcedente. Por fim, foram fixados o objecto do litígio e enunciados os temas da prova.
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Realizada a audiência final (efectuada pela Instância Central – Secção Cível – J2, da Comarca de Castelo Branco), veio a ser proferida sentença (em 19/06/2017), na parte dispositiva da qual se consignou o seguinte: «[…] decide-se: 1. Julgar parcialmente procedente a presente acção, e, consequentemente, decide-se:
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Condenar a Ré, BB, LDA, a pagar à A., AA, LDA, a quantia de € 10.000,00, (dez mil euros), acrescida de juros de mora, à taxa supletiva para as relações comerciais, desde 27.12.2012 até integral pagamento, a que acresce a quantia devida a título de IVA e respectivos juros, à referida taxa, desde a data da emissão da respectiva factura – 02.12.2015 até integral pagamento; b) Absolve-se a Ré do demais peticionado.
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Julgar totalmente improcedente a reconvenção, e, consequentemente, absolve-se a A/reconvinda da totalidade dos pedidos formulados. […]».
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Inconformada com tal decisão, dela recorreu a Ré.
O Tribunal da Relação de Coimbra julgou o recurso, proferindo acórdão onde decidiu conceder “(na) parcial procedência do recurso, mantendo a sentença recorrida quanto ao mais, designadamente, quanto à condenação da Ré aí proferida (excepcionada a condenação das custas da reconvenção, e a do momento a partir do qual são devidos juros de mora sobre o montante do IVA), revogar essa sentença; No que concerne à condenação da Ré quanto ao pagamento de juros de mora sobre o montante do IVA, sendo tais juros devidos, não desde 02/12/2015, como foi decidido, mas sim, desde a data da citação (27/01/2016) e até integral pagamento, como ora se decide; No que concerne à reconvenção, pois que a julgam parcialmente procedente, condenando a Autora/Reconvinda a pagar à Ré Reconvinte, a indemnização de 17.219,18 € (dezassete mil duzentos e dezanove euros e dezoito cêntimos) a que acrescem os respectivos juros mora, vencidos desde a notificação da contestação à Reconvinda (artºs 804.º, n.º 1, 805.º, n.º 1, 806.º, n.ºs 1 e 2, art.º 559.º, n.º 1, todos do Código Civil), e à taxa supletiva de 4%, ao ano, nos termos do art.º 559.º, n.º 1 do CC e da Portaria n.º 291/03, de 08/04. Custas da acção, da reconvenção e do recurso, por Reconvinte/Apelante e Reconvinda/Apelada, na proporção dos respectivos decaimentos.” 7.
Inconformada com o acórdão dele apresentou revista principal a A. e subordinada a R.
Nas conclusões do recurso independente diz a A. (transcrição): “1ª- A aqui Recorrida funda o pedido reconvencional que formula nos presentes autos em incumprimento contratual da Recorrente, pedindo, por isso, a sua condenação no pagamento de uma indemnização por danos emergentes e lucros cessantes, por alegada responsabilidade contratual.
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- O acórdão recorrido considera a actuação do legal representante da Autora consubstanciadora de responsabilidade extra-contratual ou por factos ilícitos, afectando esta a Autora no âmbito da responsabilidade objectiva.
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- O facto ilícito de que, na perspectiva vertida no acórdão recorrido, emerge a responsabilidade do legal representante da Autora e desta ocorreu em 15 de Fevereiro de 2013.
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- O pedido reconvencional foi deduzido em 2 de Março de 2016, presumindo-se a Autora, ora Recorrente, notificada do mesmo em 5 de Março de 2016.
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- Quer quando a Recorrente foi notificada da Reconvenção, quer quando a mesma foi deduzida, já havia decorrido mais de três anos após a prática do acto que, no douto acórdão recorrido, se considera ilícito e no qual radica a responsabilidade extra-contratual ou por factos ilícitos do legal representante da Recorrente e a consequente responsabilidade civil objectiva desta sociedade.
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- O direito de indemnização por danos emergentes de responsabilidade extra-contratual prescreve no prazo de três anos a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete (artigo 498.º, n.º 1, do Código Civil).
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- Tendo expirado tal prazo à data em que o pedido reconvencional foi formulado, o direito que a Ré eventualmente tivesse a esse título prescreveu - prescrição que expressamente se invoca, para todos os legais efeitos.
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- Constituindo a questão da responsabilidade civil por factos ilícitos uma questão superveniente, surgida apenas no acórdão recorrido, assiste à Recorrente o direito de invocar a prescrição em sede de recurso, à luz do disposto no n.º 2 do artigo 573.º do CC.
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- Ainda que assim não se entenda - no que não se concede -, da factualidade dada como provada não resulta que o legal representante da Autora tenha praticado qualquer facto ilícito, gerador de responsabilidade civil perante a Ré.
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- Da factualidade provada resulta que o legal representante da Autora retirou e transportou para as suas oficinas o distribuidor da máquina que vendeu à Ré, com o objectivo de proceder à reparação do mesmo, o que fez na sequência dum telefonema do legal desta, no qual lhe deu conhecimento que a máquina "vertia água e óleo".
1lª - Resulta também da tábua de factos provados que, por cartas de 8/3/2013 e 14/3/2013, quando ainda não havia decorrido sequer um mês após a remoção do distribuidor, o legal representante da Recorrente comunicou à Recorrida que pretendia entregar-lho, reparado, ao que esta não deu qualquer resposta.
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- Emerge, de igual modo, da matéria de facto provada que a Recorrida não pagou à Recorrente parte do preço estabelecido para a venda da máquina, mais precisamente a quantia de € 10.000,00, não obstante o prazo para o efeito contratado se mostrasse ultrapassado à data em que o distribuidor da máquina foi removido, para reparação, não tendo regularizado tal pagamento até à presente data.
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- A indemnização que a Autora foi condenada a pagar à Ré corresponde ao preço de aquisição dum distribuidor novo e à sua instalação 14ª - O eventual prejuízo (dano emergente) susceptível de resultar da conduta do legal representante da Autora reconduzir-se-ia, no máximo, ao valor do distribuidor usado que a máquina tinha e à sua reinstalação - o que não foi sequer alegado ou pedido nos presentes autos.
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- Não existe, assim, nexo de causalidade entre o acto ilícito que no acórdão recorrido se imputa ao legal representante da Autora e o dano que esta foi condenada a indemnizar. Finalmente: 16ª - A actuação do legal representante da Ré, traduzida na compra e montagem dum distribuidor novo, sem antes interpelar a Autora para lhe restituir o que retirou da máquina, quando sabia que esta pretendia restituí-lo, reparado, e quando ainda lhe devia a quantia de € 10.000,00 (dez mil euros), correspondente a parte do preço da máquina, sempre consubstanciaria manifesto abuso de direito, que expressamente se invoca.
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- O acórdão recorrido viola, designadamente, o disposto nos artigos 483.°, 498.º, 500.º, 562.°, 564.° e 566.°, todos do Código Civil, pelo que deve ser revogado, proferindo-se decisão que julgue procedente a excepção...
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Acórdão nº 43/18.8T8TBU.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 08 de Maio de 2019
...proc. 2172/14.8TBBRG.G1.S1; de 08/11/2018, proc. 1069/16.1T8PVZ.P1.S1; de 27/11/2018, proc. 78/13.7PVPRT.P1.S1 e de 25/10/2018, proc. 49/16.1T8FND.C1.S1; da RC de 30/1/2001 e da RLx de 14/12/2002 e da RP de 30/1/2000, todos disponíveis, in “www.dgsi.pt.” e ainda o Abrantes Geraldes, in “ Te......
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...terá de ser ressarcido em termos de equidade, tomando por base a prova realizada (danos concretos) – cfr. Ac. STJ de 25/10/2018, Proc. 49/16.1T8FND.C1.S1 (Cons. Fátima Gomes), em www.dgsi.pt. No mesmo sentido, entre outros, o Ac. STJ de 28/09/2021, Proc. 6250/18.6T8GMR.G1.S1 (Cons. Oliveira......
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