Acórdão nº 197/14.2YHLSB.L1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelSOUSA LAMEIRA
Data da Resolução15 de Março de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I – RELATÓRIO l.

GEDIPE - Associação para a Gestão de Direitos de Autor, Produtores e Editores intentou a presente acção com processo comum contra BB (Portugal) – Empreendimentos Turísticos, S.A. do, alegando, em síntese: A autora é uma associação de gestão colectiva que se encontra devidamente constituída, registada e mandatada para representar os produtores de videogramas em matérias relacionadas com a cobrança de direitos de autor e direitos conexos.

Fruto da lei e de acordos firmados com a GDA – Cooperativa de Gestão dos Direitos dos Artistas, Intérpretes ou Executantes, CRL, entidade de gestão colectiva dos direitos dos artistas, a autora está também mandatada para promover o licenciamento e cobrança devida aos artistas intérpretes ou executantes.

A actividade de licenciamento e cobrança das remunerações é desenvolvida pela autora em parceria com a referida GDA, procedendo assim ao licenciamento conjunto de direitos conexos dos artistas, intérpretes, executantes e produtores de videogramas.

A execução pública de videogramas editados comercialmente, além de carecer de autorização dos respectivos produtores (cf. artigo 184º n.º 2 do CDADC), confere a estes e aos artistas intérpretes e executantes, o direito a receber uma remuneração equitativa (cf. artigo 184º n.º 3 do CDADC). A remuneração cobrada pela AA é dividida entre produtores e artistas, sendo a parcela destinada a estes últimos entregue à parceira GDA.

A autora licencia a utilização da quase totalidade do repertório de videogramas (“cerca de 100%”), nomeadamente filmes, séries ou telenovelas, nacionais ou estrangeiras, comercializados e utilizados em Portugal.

O hotel CC Algarve Hotel Resort, sito na …, A..., explorado pela ré, é um estabelecimento comercial aberto ao público, no qual se procede de forma habitual e continuada à execução pública, através dos aparelhos de televisão existentes nas unidades de alojamento e nos espaços comuns, de videogramas do repertório entregue à gestão da autora sem a necessária autorização, sendo que a ré jamais pagou a remuneração devida por tal comunicação.

Apesar de lhe terem sido enviadas cartas pela autora datadas de 11/10/2010, 26/10/2011 e 20/01/2014, a informar da necessidade de obter a respectiva licença e de pagar os direitos conexos devidos pela utilização de videogramas, a ré continua a exibir publicamente na referida unidade hoteleira videogramas explorados comercialmente ou reproduções dos mesmos, não tendo feito à requerente qualquer pedido ou solicitação de licenciamento ou autorização.

O estabelecimento explorado pela ré é um hotel de cinco estrelas, com 215 quartos e 12 televisores em espaços comuns.

De acordo com as tarifas anuais da autora aplicáveis ao estabelecimento explorado pela ré, o valor indemnizatório deve ser constituído pelos seguintes montantes: 1. Referente ao 2º semestre de 2010, a quantia € 21.414,00; 2. Referente ao ano de 2011 a tarifa anual aplicável é de € 42.828,00; 3. Referente ao ano de 2012 a tarifa aplicável é de € 42.828,00; 4. Referente ao ano de 2013 a tarifa aplicável é € 42.828,00; e 5. Referente ao 1º semestre de 2014 a tarifa aplicável é de € 14.989,80.

Estes valores devidos a título de indemnização, calculados de acordo com a equidade, correspondem à remuneração devida, mas não paga (artigo 211.º, n.º 5 do CDADC), a que devem acrescer juros moratórios desde 11/10/2010 até integral pagamento.

Acrescem ainda os encargos da autora suportados com a protecção dos direitos lesados pela ré, bem como com a investigação e cessação da conduta lesiva da mesma. Na impossibilidade de se determinar com rigor tais encargos, a autora indica o valor de € 2.500,00.

Conclui pedindo a título Principal: 1) Condenação da ré a proceder, junto da autora, ao devido licenciamento para exibição pública de videogramas de acordo com os tarifários constantes da tabela em vigor para o efeito e junta sob Doc. nº 13; 2) Condenação da ré, ao abrigo do disposto no artigo 211.º CDADC, no pagamento à autora das seguintes quantias: a) € 164.887,80, que, de acordo com a tabela tarifária da autora para o ano de 2010, 2011, 2012 e 2013 até à data de entrada da presente acção, seria devido pelo licenciamento que a ré não obteve, como devia; b) € 15.961,81, devida a título de juros de mora vencidos, calculados à taxa legal aplicável, sobre o montante referente ao 2º semestre do ano 2010, desde 11 de outubro de 2010 (data da interpelação da ré para cumprir a obrigação de licenciamento), do ano 2011 desde 01 de janeiro de 2011 e do ano 2012 desde 01 de janeiro de 2012, e do ano de 2013 desde 01 de janeiro de 2013, todos até à data da entrada em juízo da presente acção; c) Juros de mora vincendos calculados à aludida taxa legal, sobre o mesmo montante, até efectivo e integral pagamento; d) € 2.500,00, destinada a, com parcimónia, ressarcir os danos inerentes aos encargos suportados pela autora com a protecção dos direitos lesados pela sociedade ré, bem como com a investigação e cessação da conduta lesiva da mesma.

3) Condenação da ré a pagar à autora o montante adicional que eventualmente se mostre devido, face ao disposto no artigo 829.º-A do Código Civil, pela falta de pagamento do montante global em que for condenada, desde a data do trânsito em julgado da sentença a proferir na presente acção até efectivo e integral pagamento.

4) Condenação da ré, ao abrigo do disposto no artigo 210.º-J do CDADC, ao encerramento do estabelecimento CC Algarve Hotel Resort até que obtenha o devido licenciamento da Autora para execução pública de videogramas em tal estabelecimento; A título subsidiário 5) Condenação da ré na proibição de proceder à execução pública não licenciada de videogramas, acompanhada da obrigação do pagamento da sanção pecuniária compulsória, a fixar pelo douto arbítrio desse Tribunal, por cada dia que decorra entre a data do trânsito em julgado da sentença a proferir na presente acção e a data da efectiva obtenção da devida licença.

  1. A Ré contestou excepcionando a nulidade de todo o processo, a ilegitimidade activa da autora e a nulidade das tarifas fixadas unilateralmente pela autora por violação dos princípios que devem presidir à respectiva concretização, em concreto os princípios de transparência, gestão democráticas, equidade, razoabilidade, proporcionalidade e de fundamentação dos actos praticados.

    Por impugnação, invocou que são desconhecidas as entidades, nacionais e estrangeiras e repertório efectivamente representado pela autora.

    Quando aos pedidos indemnizatórios, impugna os cálculos efectuados pela autora.

    Quanto à sanção pecuniária compulsória e medidas inibitórias, defende que as mesmas são manifestamente desproporcionais.

    Em sede de direito defende que a utilização dos televisores em causa não corresponde ao conceito de execução pública, salientando a natureza privada dos quartos de hotel e defendendo que do que aqui se trata é de mera recepção de emissões transmitidas pelo operador de televisão ZON, entidade esta que já paga as correspondentes taxas às entidades de gestão colectiva.

    Conclui pedindo a improcedência da acção.

  2. Teve lugar audiência prévia, no âmbito da qual, foi proferido despacho saneador, foi julgada improcedente a nulidade processual e a excepção de ilegitimidade activa, tendo sido fixado o objecto do litígio e seleccionados os temas da prova.

    Realizou-se a audiência de julgamento com observância do legal formalismo, e, a final, foi proferida sentença que decidiu o seguinte: «Pelo exposto, julga-se a presente acção parcialmente procedente e, em consequência, decide-se o seguinte: 1) Condenar a Ré, com referência ao estabelecimento hoteleiro CC Algarve Hotel Resort, na proibição de proceder à execução pública não licenciada de videogramas sem a obtenção da competente autorização da A.

    2) É fixada uma sanção pecuniária compulsória judicial, de € 500,00 (quinhentos euros) por dia, da responsabilidade da R. pela eventual violação do decidido em 1) com efeitos a partir da data do trânsito em julgado da sentença.

    3) Condenar a R. no pagamento à Autora, a título de indemnização pela execução pública não autorizada realizada pela R. no estabelecimento hoteleiro CC Algarve Hotel Resort, no ano de 2010 (2.º semestre), nos anos integrais de 2011, 2012, 2013, e 2014 (1.º semestre), no montante total de € 33.808,32 (trinta e três mil oitocentos e oito euros e trinta e dois cêntimos), acrescido de juros de mora, à taxa legal supletiva, desde a citação da R. e até integral pagamento.

    4) À quantia indemnizatória ora referida em 3) acresce, ainda, juros à taxa de 5% ao ano, desde a data do trânsito em julgado da presente sentença, a título de sanção pecuniária compulsória legal, nos termos do disposto no artigo 829.º-A, n.º 4 do Código Civil.

    5) No demais, a R. é absolvida do pedido».

  3. Inconformada, apelou a Ré para o Tribunal da Relação de …, que, por Acórdão de 16 de Maio de 2017, julgou «parcialmente procedente a apelação, alterando-se o valor da indemnização do ponto 3) da parte dispositiva da sentença para € 33.499,20 (trinta e três mil, quatrocentos e noventa e nove euros e vinte cêntimos), condenando-se consequentemente a ré a pagar à autora este valor, mantendo-se no demais».

  4. Inconformada, de novo, a Ré BB (Portugal) Empreendimentos Turísticos, S.A, interpôs Recurso de Revista Excepcional (art.º 672º, n.º 2 al. a) do CPC) para o Supremo Tribunal de Justiça e, tendo alegado, formulou as seguintes conclusões: 1. O Tribunal Recorrido considerou que seria irrelevante saber qual o "concreto número de produtores representados", dado que a Recorrente não teria alegado "que os videogramas passados nos televisores do hotel não estivessem inseridos no repertório representado pela autora".

  5. Em primeiro lugar, não é verdade que a Recorrente não tenha feito tal alegação: em diversos pontos da sua Contestação, e em particular no artigo 149.° desta, a Recorrente alegou que não correspondia à verdade que "videogramas" invocados...

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