Acórdão nº 123/20.0YHLSB.L1-PICRS de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 10 de Fevereiro de 2022
Magistrado Responsável | ANA PESSOA |
Data da Resolução | 10 de Fevereiro de 2022 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
Acordam na Secção da Propriedade Intelectual e da Concorrência, Regulação e Supervisão do Tribunal da Relação de Lisboa: I. RELATÓRIO.
Nos presentes autos de acção declarativa comum que Sociedade Portuguesa de Autores, C.R.L. (SPA) moveu contra Yellowtel, Hotelaria e Turismo, SA, inconformada com a sentença proferida pelo Tribunal da Propriedade Intelectual, em cujo decreto judicial se decidiu condenar a ré “Yellowhotel Hotelaria e Turismo, SA.” na proibição de executar publicamente, nos estabelecimentos hoteleiros denominados «Yellow Alvor Garden» e «Yellow Praia de Monte Gordo», por si explorado, obras musicais e literário-musicais relativas ao repertório entregue à gestão da autora, SPA – Sociedade Portuguesa de Autores, C.R.L., até que proceda ao pagamento dos correspondentes direitos de autor devidos a esta, no pagamento à autora o montante de €55.804,64 (cinquenta e cinco mil, oitocentos e quatro euros e sessenta e quatro cêntimos) e se absolveu a Ré do demais peticionado, veio a referida Ré interpor o presente recurso de apelação.
Por decisão singular de 28.12.2021 decidiu-se julgar improcedente o pedido de reenvio prejudicial, condenar a Recorrente a pagar à Recorrida o montante de €53.109,92, em substituição do valor consignado no ponto 2 do decreto judicial da sentença recorrida, e manter no mais, a mesma sentença.
Notificada de tal decisão, veio a Apelante deduzir reclamação para a conferência, nos termos do disposto no artigo 652º, n.º 3 do Código de Processo Civil, concluindo que na decisão reclamada:
-
Não se resolve nenhum dos problemas que a recorrente invoca relativos à falta de legitimidade da recorrida para agir em juízo em nome das pessoas que alega representar (não exibe os mandatados dos titulares dos direitos que afirma representar); b) Ignora-se que nenhuma prova se produziu sobre factos anteriores a 17 outubro de 2018 e erra-se no julgamento da matéria de facto referida nas alegações e nas conclusões do recurso; c) Ignora-se expressa e ostensivamente o Acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia, de 16 de fevereiro de 2017, que, no Processo C-641/15, decidiu a mesma matéria em sentido oposto àquele que antes havia decidido, sendo que o caso em análise neste processo é rigorosamente igual ao que está em causa neste recurso, e no qual se afirma que “O artigo 8.o, n.o 3, da Diretiva 2006/115/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, relativa ao direito de aluguer, ao direito de comodato e a certos direitos conexos ao direito de autor em matéria de propriedade intelectual, deve ser interpretado no sentido de que a transmissão de emissões de televisão e de rádio através de aparelhos de televisão instalados nos quartos de um hotel não constitui uma comunicação realizada num local aberto ao público com entrada paga”, ignorando-se assim que a decisão que se extrai deste acórdão vincula os Tribunais Portugueses; d) Não resolve a questão da inconstitucionalidade relativa ao privilégio que os Tribunais Portugueses, ao decidir como tem decidido, concedem à recorrida SPA e a associações privadas semelhantes.
A Apelada foi notificada e silenciou.
* Colhidos os vistos legais, cumpre reapreciar, de novo, agora em conferência, o mérito da apelação.
* Como já se referiu, Sociedade Portuguesa de Autores, C.R.L. (SPA), instaurou a presente acção declarativa de condenação sob a forma comum contra Yellowtel, Hotelaria e Turismo, SA, pedindo que a Ré seja proibida de continuar a promover a execução pública de obras radiodifundidas nos quartos das unidades hoteleiras por si exploradas enquanto não pagar a totalidade dos direitos de autor devidos à Autora e que a Ré seja condenada a pagar-lhe a quantia de €93.043,20 a título de danos patrimoniais, acrescida de €1000,00 a título de indemnização, conforme previsto no art. 211º,6 do CDADC e ainda €15.250,00 a título de sanção pecuniária.
Alegou, em síntese, que é uma cooperativa de direito privado, sem fins lucrativos, criada para a gestão colectiva dos direitos de propriedade intelectual e a defesa e promoção dos bens culturais, tendo por objecto, nomeadamente, a gestão, em representação dos seus cooperadores e beneficiários, das obras e prestações de cujos direitos sejam titulares, competindo-lhe administrar as obras intelectuais cujos direitos lhe hajam sido transmitidos, autorizando, mediante os competentes contratos, e fiscalizando a sua utilização e exploração sob qualquer forma e por qualquer meio, e cobrando e arrecadando os respectivos direitos.
Mais alegou que a Requerida é uma entidade que se dedica à actividade de hotelaria e de exploração de estabelecimentos hoteleiros, actividade no exercício da qual, a requerida explora, em território português, três hotéis, a saber: Yellow Alvor Garden, Yellow Praia Monte Gordo e Yellow Lagos Meia Praia, que nestes estabelecimentos são e foram colocadas à disposição do público, regularmente, para todos os seus clientes, obras musicais e literário-musicais, quer nas áreas comuns, quer nos quartos das unidades hoteleiras, bem como são realizados espetáculos de música ao vivo, de modo a que todos os clientes tenham acesso a estas obras; dispondo de aparelhos de televisão em todos os quartos, que mantém à disposição do público em geral, conforme publicita nos seus sites da internet.
Acrescentou que através da disponibilização das televisões nos quartos, a Requerida presta aos seus clientes um serviço, distinto dos restantes designadamente a comunicação das obras que enumerou, que se consubstancia na comunicação de obras radiodifundidas, obras que são protegidas pelo direito de autor, estando obrigada a solicitar e obter, por escrito, autorização dos autores das obras executadas publicamente, ou da requerente na qualidade de sua representante, bem como a pagar-lhes a contraprestação económica devida pela utilização das obras nos estabelecimentos que explora, tendo concretamente, e a título meramente exemplificativo, nos dias 6 de Agosto e 17 de Outubro de 2018 sido comunicadas as seguintes obras: 6 de Agosto: 17 de Agosto: Na RTP: - ‘Fuel’ - ‘Freedom Corner’ - ‘Greenlight’ - ‘Save a Little Piece 2’ - ‘Thunder’ - ‘Spur of the Moment’ Na SIC: - ‘Agulha no Palheiro’ - ‘Nasty' - ‘Darkest Dawn’ - ‘Quando o Fado Passa’ - ‘Submersion’ - ‘The Sunny Hill’ Na TVI: - ‘A Partir de Hoy’ - ‘Calm before the Norm’ - ‘Rippling Waters’ - ‘Depois’ - ‘Strange Reports’ - ‘Tragic End’ Mais alegou que são igualmente promovidos eventos com regularidade, como a requerida faz questão de referir nos seus sites http://www.yellowtels.ptalvorgarden/hotelactivitieshtml e http://www.yellowtels.pt/praiademontegordo/hotel-actividades-clubhtml, sendo que, a título de exemplo, no dia 17 de Outubro de 2018, decorreu um espectáculo de música ao vivo, executada por dois músicos na zona da restauração e esplanada, onde foram executadas as seguintes obras: - ‘All Night Long’, de Lionel Ritchie; - ‘Billie Jean’, de Michael Joe Jackson; - ‘Is This Love’, de Robert N Marley; - ‘Perfect’, de Marck Edward Cascian Nevin; - ‘Put Your Records On’, de Steven Crisanthou, John Robert Beck e Corinne Jacqueline Bailey Era; - ‘This Is The Life’, de Amy Elizabeth MacDonald; - ‘When Did Yourt Heart Go Missing’, de Robert Coppola Schwartzman.
Referiu que todas as referidas obras são protegidas pelo direito de autor e geridas, em Portugal, directa ou indirectamente, pela Requerente, conforme mapas de classificação de obras que juntou como docs. 1 e 3, e certidão emitida pela Inspecção Geral das Actividades Culturais, comprovativa da representação dos titulares de direitos de autor das obras supra identificadas, e, bem assim, que não obstante a Requerida tenha, por diversas ocasiões e de variadas formas, diligenciado para que a Requerida pagasse a remuneração devida aos autores por si representados, esta persiste em não obter autorização daquela e, consequentemente, em não pagar os direitos aos autores, continuando a promover, de forma regular, a comunicação e a execução de obras intelectuais nas unidades hoteleiras que explora.
* Regularmente citada, a Ré contestou alegando que o hotel do Alvor está fechado desde Outubro de 2009 e o de Monte Gordo desde 15.02.2020 e só devem abrir no início de julho deste ano.
Mais impugnou o próprio estatuto e atribuições da Autora e a legitimidade desta para representar os autores de obras audiovisuais e videogramas que diz representar, alegando que os clientes da Ré, quase todos estrangeiros e que não falam ou entendem a língua portuguesa, não visionam os programas referidos pela requerente ou outros programas televisivos nacionais nos estabelecimentos hoteleiros em causa.
* Realizou-se a Audiência Prévia, onde se proferiu despacho saneador e se fixaram o objecto do litígio e os temas da prova.
Teve lugar a audiência final, no termo da qual veio a ser proferida sentença que julgou parcialmente procedente a presente ação e em consequência, condenou-se a ré “Yellowhotel Hotelaria e Turismo, SA.” : 1) Na proibição de executar publicamente, nos estabelecimentos hoteleiros denominados «Yellow Alvor Garden» e «Yellow Praia de Monte Gordo», por si explorado, obras musicais e literário-musicais relativas ao repertório entregue à gestão da autora, SPA – Sociedade Portuguesa de Autores, C.R.L., até que proceda ao pagamento dos correspondentes direitos de autor devidos a esta.
2) A pagar à autora o montante de €55.804,64 (cinquenta e cinco mil, oitocentos e quatro euros e sessenta e quatro cêntimos).
Mais se absolveu a Ré do demais peticionado pela Autora.
* Inconformada com esta decisão, dela apelou a Ré, formulando as seguintes conclusões:
-
Nos termos das normas dos artigos 72.º, 73.º e 74.º do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos a recorrida SPA só pode reclamar seja o que for em juízo se agir em nome e representação de autores, produtores ou editores de conteúdos audiovisuais se estiver a pedir para estes últimos, sejam eles seus associados ou seus...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO