Acórdão nº 1853/11.2TBVFR.P2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 05 de Abril de 2018

Magistrado ResponsávelABRANTES GERALDES
Data da Resolução05 de Abril de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

I - AA e mulher BB, por si e na qualidade de representantes legais dos seus filhos de menoridade, CC e DD, instauraram a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, sob a forma ordinária, contra EE, pedindo que fosse condenado a: - Cessar imediatamente a actividade de chapeiro e pintura de automóveis que desenvolve nas suas instalações à R. …, em …, retirando as chaminés aí colocadas, de onde, de forma contínua, sistemática e repetida são expelidos gases, vapores e cheiros para a atmosfera, com isso lesando a saúde dos AA. e dos seus filhos, violando os seus direitos de personalidade, designadamente o direito à saúde, à qualidade de vida e a um ambiente ecologicamente equilibrado; - Abster-se da prática de qualquer ato ou atividade nessas instalações que, pela poluição provocada, ponha em causa o direito à saúde e o direito à qualidade de vida dos AA. e dos seus filhos; - Indemnizar os AA. pelos danos não patrimoniais sofridos, em montante que se crê seja razoável fixar em € 5,000,00 e € 2.000,00 para cada um dos filhos menores; - Indemnizar os AA. no valor de € 4.640,01 correspondente a danos patrimoniais sofridos, designadamente os valores pagos pelos AA. a título de honorários a advogado em ordem a encontrar uma solução extrajudicial do litígio.

Invocaram o direito de oposição que se mostra consagrado no art. 1346° do CC, fundado na preocupação de garantia dos seus direitos de personalidade - saúde e repouso - enquanto titulares do direito de propriedade de prédio vizinho.

O R. invocou a ilegitimidade alegando que quem desenvolve a actividade de manutenção e de reparação de automóveis é A. FF, Soc. Unipessoal, Lda. Impugnou ainda parte substancial da factualidade que integra a causa de pedir, nomeadamente a conexa com a imputação de responsabilidade à sua pessoa, a qualquer título, pela ocorrência de qualquer prejuízo na esfera jurídica dos interesses dos AA., concluindo pela total improcedência da acção.

Em sede de réplica, os AA. pugnaram pela improcedência da exceção dilatória.

No seguimento de convite, os AA. vieram deduzir incidente de intervenção principal provocada passiva de A. FF, Soc. Unipessoal, Lda, de modo a assegurar a produção do efeito útil não só contra o R. primitivamente demandado como ainda contra a Interveniente.

No seguimento, a Interveniente veio declarar que se associava ao R. EE, aderindo ao articulado da contestação que aquele apresentara.

Oportunamente foi proferida sentença na qual se decidiu julgar totalmente improcedente a acção e absolver os RR. EE e A. FF, Soc. Unipessoal, Lda, dos pedidos deduzidos pelos AA.

Os AA.

apelaram e a Relação revogou parcialmente a sentença e condenou a Interveniente A. FF, Soc. Unipessoal, Lda, a abster-se da prática de qualquer ato ou atividade nessas instalações que, pela poluição provocada, ponha em causa o direito à saúde e o direito à qualidade de vida dos AA. e dos seus filhos. Condenou-a ainda no pagamento de indemnização de € 5.000,00 por danos não patrimoniais.

A Interveniente interpôs recurso de revista e os AA. interpuseram recurso de revista subordinado.

A Interveniente suscitou as seguintes questões essenciais: - Revogação do acórdão da Relação na parte em que alterou a decisão da matéria de facto, considerando que os documentos em que a Relação se fundou não permitiam a alteração introduzida; - Inexistência de prejuízo essencial para a utilização do imóvel dos AA. resultante da atividade exercida na oficina da Interveniente, sendo que já foi instalado um sistema de extração de fumos e cheiros com filtros em cumprimento das normas legais; - Inexistência de perigo especial para a saúde de qualquer dos AA. e falta de conexão entre a doença de que padece um dos AA. e a atividade exercida; - Falta de fundamento para a condenação da Interveniente em qualquer indemnização Os AA., no recurso subordinado, invocaram a nulidade do acórdão por omissão de pronúncia quanto à apreciação do pedido de indemnização relacionado com as despesas extrajudiciais.

Já neste Supremo foi determinada a remessa dos autos à Relação para apreciação da referida nulidade, o que foi feito, sendo proferido acórdão complementar que reconheceu a existência de nulidade por omissão de pronúncia, na parte referente ao pedido de indemnização por despesas extrajudiciais, condenando adicionalmente a R. Interveniente no pagamento da quantia de € 4.640,01.

Foi interposto novo recurso de revista, mas apenas pelos RR., no qual, para além das questões anteriormente inseridas no recurso de revista, vêm ainda impugnar o acórdão complementar que condenou no pagamento da indemnização por despesas extrajudiciais.

Os AA. contra-alegaram.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

II - Factos provados: 1. Encontra-se descrito na 1ª CRP de …, sob o n° 02…1/19…3, da Freguesia de Stª Maria …. o prédio urbano sito na …, a confrontar a Norte com R. …, a Sul com EE, aqui R., a Nascente e Poente com GG – A); 2. Relativamente ao prédio descrito em 1.

, encontra-se inscrita, por cota G-1, correspondente à apresentação n° 20, de 19-3-03, a sua aquisição, por doação, a favor de AA e mulher BB, aqui AA. – B); 3. Encontra-se inscrito no Serviço de Finanças de … a favor do A. AA o prédio urbano com o art. 4…3, sito na R. … – C); 4. Os AA. AA e mulher BBs construíram no prédio descrito em 1.

a sua casa de habitação a que foi atribuída a licença de habitabilidade n° 5…/05 e vivem nessa habitação desde 2005, juntamente com os seus filhos, os co-AA. – D) e E); 5. O prédio descrito em 1.

confronta de Sul com um prédio do R., com entrada pela R. …, onde se encontra implantada uma oficina de automóveis, onde o R. exerce a actividade de reparação, manutenção e pintura de automóveis – F); 6. Em 2006, o R. deu início à construção da nova oficina, mantendo a primitiva oficina, a qual foi entretanto demolida, tendo permanecido apenas um barraco, entretanto mandado demolir pela Câmara Municipal de … – G) e H); 7. O R. construiu uma nova oficina de raiz que nada tem a ver com a primitiva oficina – 2º; 8. O terreno onde está implantada a referida oficina situava-se a uma cota mais elevada e o R. procedeu ao desaterro com o objetivo também de nivelar o solo de modo a permitir a edificação das instalações da oficina – 22º e 23º; 9. A referida oficina de automóveis situa-se na zona central da cidade de … – 1º; 10. Em 2009, ao lado da cobertura branca (oficina atual do R.), foi construída nova instalação (também com cobertura branca) onde o R. realiza trabalhos de pintura – I); 11. A Interveniente A. FF, Soc. Unipessoal, Lda, de que o R. é sócio-gerente, desenvolve a atividade de manutenção e reparação de automóveis, incluindo serviços de chapeiro e pintura, na oficina referida em 6.

e 9.

– DD); 12. No domínio da referida atividade genérica de reparação de automóveis, a mesma montou o equipamento de pintura em 29-6-09 – art. 51° da contestação.

13. O R. requereu junto da Câmara Municipal de … um “Pedido de Licenciamento ou Comunicação Prévia” datado de 1-7-09 (cfr. doc. 4 a fls. 122) – EE); 14. Com o fim de proceder à exaustão de cheiros e vapores decorrentes da realização de trabalhos de mecânica, chapeiro e pintura foram colocadas 3 chaminés na dita instalação, as quais se encontram abaixo da cota do prédio descrito em 1.

, e situam-se a cerca de 22,50 m do prédio descrito em 1.

– J) e L) e 3º: 15. O sistema de extração e respetivas condutas que vão dar às chaminés estão equipados com filtros habitualmente usados para o efeito – 29º; 16. Os AA., através do seu mandatário, remeteram ao Pres. da Câmara Municipal de …, fax datado de 22-7-09, correspondente ao doc. de fls. 43 e 44 (doc. 14) (“Funcionamento ilegal de oficina de reparação automóvel”) – M); 17. A Câmara Municipal de …, Pelouro do Planeamento e Urbanismo, respondeu nos termos constantes da missiva de fls. 47 (doc. 16) – N); 18. Os AA., através do seu mandatário, remeteram ao Director dos Serviços de Fiscalização da CCDR Norte o fax datado de 28-8-09 constante de fls. 48 e 49 (doc. 17) (“Funcionamento ilegal de oficina de reparação automóvel com estufa de pintura”) – O); 19. Os AA. apresentaram uma “denúncia” junto da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica, tendo esta entidade respondido nos termos que constam de fls. 50 (doc. 18) – P); 20. Os AA. apresentaram “queixa” junto da GNR, tendo esta autoridade policial respondido nos termos que constam de fls. 51 (doc. 19) – Q); 21. Os AA., através do seu mandatário, remeteram ao Pres. da Câmara Municipal de … uma carta datada de 9-12-09 constante de fls. 52 a 54 (doc. 20) – R); 22. O assunto foi levado a reunião de Câmara de 8-3-10 pelo Vereador HH que advertiu a Câmara Municipal nos termos que constam de fls. 55 e 56 (doc. 21) – S); 23. A CCDRN remeteu ao R., na qualidade de representante da Interveniente, a carta com epígrafe “Processo de contraordenação/Notificação da decisão” constante de fls. 126 a 129, de 18-2-10 (sendo a decisão absolutória da prática da...

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