Acórdão nº 00450/13.2BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 16 de Abril de 2015
Magistrado Responsável | Vital Lopes |
Data da Resolução | 16 de Abril de 2015 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA SECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO NORTE 1 – RELATÓRIO O Exmo. Representante da Fazenda Pública, recorre da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por P... – Produtos Pirotécnicos, Lda., das liquidações adicionais de IVA e juros compensatórios dos anos de 2009, 2010 e 2011, no valor global de 339.069,50€.
O recurso foi admitido com subida imediata nos próprios autos e efeito devolutivo.
Na sequência do despacho de admissão, o Recorrente apresentou alegações e formulou as seguintes «Conclusões: 1 – A Meritíssima Juiz do Tribunal “a quo” julgou procedente a impugnação, nos autos acima identificados, anulando as liquidações adicionais de Imposto Sobre o Valor Acrescentado de 2009, 2010 e 2011, impugnadas pela Autora, por ter considerado que as mesmas enfermam de erro nos pressupostos de direito e de falta de fundamentação, com o fundamentos explanados nos art. 2.º a 7.º das presentes alegações, para os quais remetemos e que aqui se consideram integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais.
2- Concluindo que por um lado não pode afirmar-se que os motivos em que a AT estribou a decisão de determinar a matéria colectável através de métodos indirectos constituem factos concretamente identificados através dos quais seja patenteada uma capacidade contributiva superior à declarada e que por outro lado, a AT não fundamentou em moldes adequados a sua decisão de tributação através daqueles métodos, permitindo ao Tribunal o controlo da sua actividade.
3– No entanto existe, com todo o respeito pela douta sentença “ a quo” e reconhecendo a profunda análise levada a cabo pela Mma. Juiz e a complexidade da questão, erro na apreciação da prova, que conduziu a tal procedência.
4- Com efeito e relativamente ao identificado desvio significativo entre a margem bruta de vendas declarada pelo sujeito passivo nos exercícios de 2009, 2010 e 2011 e as efectivamente praticadas na empresa, não se trata de um mera ilação retirada da amostragem (com base nos elementos disponibilizados pelo sujeito passivo, designadamente o SAFT, Ficheiro Normalizado de Exportação de Dados criado pela Portaria n.º 321-A/2007, de 26/03 e documentos facturas de compra e venda de mercadorias), mas, com todo respeito, de um facto resultante dessa amostragem, face à abrangência da mesma, cfr. quadro a fls. 43 do P.A. e Anexo II ao Relatório de Inspecção fls. 53 a 66 do mesmo, sendo essa abrangência de 67,12% em 2009, 56,98% em 2010 e 39,26% em 2011, sobre o universo de produtos comercializados pela ora impugnante, correspondendo a um total de vendas amostradas a valor do SAFT, de respectivamente € 1.710.336,92, € 1.397.614,98 e € 816.363,19, não sendo a mesma mais abrangente, porque conforme resulta do Relatório de Inspecção, tendo o sujeito passivo sido notificado em 10/09/2012 na pessoa do seu TOC, para fornecer esses elementos/esclarecimentos não veio a fazer.
5- Resultando um desvio entre os valores da margem bruta das vendas sobre o preço de custo declaradas declarada pelo sujeito passivo e a margem bruta das vendas sobre o preço de custo obtido na amostragem, de 33.46% para 65,89% em 2009, 32,19% para 52,07 em 2010 e , 31,22 % para 57,87% em 2011.
6- E esta divergência é um facto, não uma mera ilação, sendo que este desvio significativo, demonstra, com todo o respeito pelo entendimento da Mma. Juiz, capacidade contributiva significativamente maior que a declarada, pois estamos num plano já para além da discrepância entre o valor declarado e o valor de mercado, trata-se de discrepância entre o valor de margem declarado pelo próprio sujeito e o valor de margem, resultante de uma significativa amostragem retirada do próprios registos no SAFT do sujeito passivo.
7- E, com todo o respeito, não existe uma remissão do art. 87.º, al. d), da LGT para o art.89.º-A do mesmo diploma legal, que permita concluir que a manifestação de capacidade contributiva superior ao declarado esteja necessariamente associada a sinais exteriores de riqueza, basta que existam factos que a patenteiem, sob pena de se tributar quem mostra tais sinais e de não se tributar quem os oculta.
8- É entendimento desta Representação da Fazenda Pública que tal não foi o pretendido pelo legislador, quando aditou pela Lei 30-G/2000, de 29/12 o art. 89.º- A à LGT e a alínea d) do texto do artigo 88.º, nem pelas alterações legislativas posteriores ao art. 89.º-A, que mantiveram o art. 88.º inalterado.
9- E contra tal não nos parece contender o disposto na alínea a) do art. 88.º da LGT, pois a contabilidade pode ser existente ou suficiente, mas impossibilitar a comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável e dela resultar capacidade contributiva significativamente maior que a declarada, como entendemos ser o caso dos autos, pois a contabilidade embora formalmente organizada, não era credível.
10- Saliente-se que o art. 89.º-A da LGT dispõe que há lugar a avaliação indirecta da matéria colectável quando falte a declaração de rendimentos e o contribuinte evidencie as manifestações de fortuna constantes da tabela prevista no n.º 4 ou quando o rendimento líquido declarado mostre uma desproporção superior a 30% para menos, em relação ao rendimento padrão resultante da referida tabela, ou seja é um artigo vocacionado à partida para situações respeitantes a Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares.
11- Ora, a situação concreta não se enquadra em nenhuma das situações enunciadas neste artigo, mas com todo o respeito pela douta sentença “a quo”, resulta do probatório dos autos, a existência de capacidade contributiva superior à declarada, no caso concreto, para efeitos de tributação em IVA, nos exercícios em causa.
12- Relativamente às anomalias verificadas nos inventários, as variações negativas e positivas realçam a existência de valorizações diferenciadas injustificadas dos mesmos produtos existentes em stock, demonstrando o irrealismo das margens declaradas.
13- Por último, relativamente ao considerando de que “ as margens brutas (são) manifestamente desajustadas dos valores normais das actividades em que se insere”, acerca do qual a douta sentença salienta que a AT refere valores tão distintos que é difícil determinar quais os normais, refira-se que, efectivamente, a margem média da unidade orgânica (Direcção de Finanças de Coimbra), em 2009, é superior à média nacional, no entanto a margem declarada pelo sujeito passivo é muito inferior a qualquer uma delas, mesmo da mais baixa (43,82%), sendo de 33,46% no ano de 2009.
14- Saliente-se que estes rácios respeitam a um universo de 62 sujeitos passivos na unidade orgânica e a um universo de 3044 sujeitos passivos, ao nível nacional.
15- Assiste razão à Mma. Juiz quando refere na douta sentença “a quo” que apenas estão indicadas as percentagens para o ano de 2009, no entanto o resultado da amostragem demonstra que para os anos de 2010 e 2011, existe uma manifesta discrepância entre as margens brutas declaradas e as resultantes dessa amostragem, conforme supra realçado, tendo sido esta margem bruta obtida a utilizada como critério para a presunção dos proveitos/réditos, cfr. fls. 45 do P.A.
16- E, entende esta Representação que as correcções em causa se encontram devidamente fundamentadas, nos exactos termos da contestação oportunamente apresentada, identificando a AT factos concretamente identificados através dos quais é patenteada uma capacidade contributiva superior à declarada, encontrando-se a decisão de tributação fundamentada, enfermando a douta sentença a quo, com todo o respeito, de erro na apreciação da prova.
Nestes termos e com o douto suprimento de V.ªs Ex.ªs, deve a decisão recorrida ser revogada e substituída por douto acórdão que conclua pela inexistência de erro nos pressupostos de direito e pela fundamentação do acto tributário consubstanciado nas liquidações impugnadas de IVA, mantendo as mesmas, assim se fazendo JUSTIÇA» A Recorrida contra-alegou e requereu a ampliação do objecto do recurso, tendo formulado as seguintes «Conclusões: 1. Não pode afirmar-se que os motivos em que a AT estribou a decisão de determinar a matéria coletável através de métodos indiretos constituem “factos concretamente identificados através dos quais seja patenteada uma capacidade contributiva superior à declarada”; 2. A AT não fundamentou em moldes adequados a sua decisão de tributação através daqueles métodos, mormente permitindo ao tribunal o controlo efetivo da sua atividade.
-
Conclui-se, assim, que as liquidações objeto destes autos enfermam de erro nos seus pressupostos de direito e de falta de fundamentação.
-
Verifica-se que foi com base na metodologia seguida pelos serviços de inspecção e acima indicada que foram apuradas as margens consideradas como “efectivamente praticadas” e que serviram para comparar com as declaradas.
-
Ou seja, os serviços de inspecção não detectaram valores omitidos de forma directa, mas efectuaram uma amostragem com base em parte dos elementos da contabilidade da impugnante (valores médios de vendas, quantidades e preços médios unitários), mas também recorrendo a valores médios de descontos (que não os efectivamente praticados) para apurar a margem, a qual, até tendo em conta esta última situação, e apesar de apelidada de “efectiva”, só por sorte assim seria.
-
O que se fez foi fazer actuar uma presunção sobre outra presunção, o que não é permitido. No caso concreto, foi dado um passo a mais: passou-se para...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO