Acórdão nº 01309/04.0BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 19 de Novembro de 2015
Magistrado Responsável | H |
Data da Resolução | 19 de Novembro de 2015 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I – RELATÓRIO Recorrente: JCGGR; MGGGR; EMGGRML Recorrido: Município de E...
; Instituto de Conservação da Natureza Vem interposto recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga que, na identificada acção administrativa comum, julgou verificada a inutilidade superveniente da lide quanto ao primeiro pedido formulado na petição inicial dos Autores, e, nessa medida, declarou extinta a respectiva instância, e absolveu os Réus dos restantes pedidos de condenação dos Réus a pagar aos Autores quantias pecuniárias a título de danos, lucros cessantes e juros de mora.
O objecto do recurso é delimitado pelas seguintes conclusões da respectiva alegação(1): “1.ª Dada a factualidade julgada provada (maxime, a constante das alíneas C) a P) dos Factos Provados), o Tribunal a quo teria de ter considerado verificado o requisito da culpa, face ao disposto no art. 56-6 do DL n.º 448/91, de 29 de Novembro.
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Conforme resulta do acórdão do Supremo Tribunal Administrativo junto à P.I., como doc. 19, a deliberação recorrida incorreu em violação do disposto no art. 32-1 do Regulamento do PDM do Município de E..., sendo, consequentemente, nula (art. 56-2 do DL n.º 448/91, de 29 de Novembro).
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O fundamento da declaração de nulidade da deliberação da Câmara é, precisamente, um dos previstos no art. 56-6 do Decreto-Lei n.º 448/91, como sendo constitutivos da obrigação de indemnizar, sem que incumba ao lesado a prova da ocorrência de culpa, porquanto esta se presume, por efeito da norma invocada.
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A verificação das situações enunciadas sob os n.
os 1, 2 e 4 do art. 56 determina a constituição da obrigação de indemnizar os prejuízos causados, não tendo contudo o Tribunal a quo retirado tal conclusão.
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Os Recorrentes invocaram o normativo legal de onde resulta a presunção de culpa acima referida nos arts. 78 e 79 da P.I., sendo certo, de todo o modo, que, nos termos previstos no art. 664 do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do art. 1.º do CPTA, o Tribunal não se encontra sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito.
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Ainda assim, os Recorrentes demonstraram que sempre estariam reunidos todos os requisitos de que depende a verificação de responsabilidade civil extracontratual de pessoas colectivas públicas, nos termos previstos no DL n.º 48 051, de 21 de Novembro de 1967 (subsidiariamente, quanto ao município, e a título principal, quanto ao 2.º Réu, aqui 2.º Recorrido).
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Com efeito, resulta dos Factos Provados elencados na sentença recorrida que, após indeferimento do pedido de licenciamento formulado em 06.07.1994, o 1.º Autor, aqui 1.º Recorrente, apresentou em 04.10.1994, um projecto de alterações ao projecto de loteamento (cfr. alíneas E) e F) dos Factos Provados).
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Do teor das alíneas G), H), I) e J) dos Factos Provados, para o qual se remete, resulta que, após emissão de um primeiro parecer onde não é colocada em causa a capacidade construtiva do solo (cfr. alínea G) dos Factos Provados), o 2.º Recorrido (bem como o 1.º) decidiu que, afinal, os terrenos em apreço não possuíam viabilidade construtiva.
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Ora, caso os terrenos não tivessem efectivamente capacidade construtiva, tal deveria ser o primeiro e único argumento invocado nos pareceres emitidos anteriormente, porquanto se trataria de um obstáculo insuprível pelos Recorrentes, de nada lhes valendo aperfeiçoar e alterar o projecto inicial.
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Ao invés, o indeferimento do pedido de loteamento motivado exclusivamente pela inviabilização da ocupação do terreno a poente (doc. 7 junto à petição inicial e alínea E) dos Factos Provados) permitia aos Recorrentes aperfeiçoar o pedido inicial, o que, de resto, foi estabelecido pelo Tribunal a quo na alínea F) dos Factos Provados: 11.ª Sobre este pedido recaiu o já referido parecer constante da acta de 14.1/94, onde nem a Câmara Municipal de E... nem a APPLE colocaram em causa a viabilidade construtiva do terreno limitando-se a declarar que o então requerente deveria, por um lado, esclarecer se pretendia proceder à compensação devida em numerário ou em espécie e, por outro lado, suprir as deficiências do processo de instrução que lhe eram apontadas (cfr. alínea G) dos Factos Provados e doc. 8 junto à petição inicial).
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O comando do art. 4.º-1 do DL n.º 48 051 remete para o do art. 487 do Cód. Civil na apreciação da culpa dos titulares de órgãos ou dos agentes do Estado e demais pessoas coletivas públicas, aplicando-se o critério do bom pai de família como aferidor da culpa.
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A conduta do 2.º Réu, aqui 2.º Recorrido, não poderá ser considerada como tendo respeitado a diligência média expectável deste tipo de entidades porquanto, dadas as atribuições prosseguidas, tem, naturalmente, de saber se a falta de viabilidade de um pedido de loteamento se deve ao desrespeito de normas passíveis de suprimento ou se, diferentemente, se deve à impossibilidade total de, em determinado local, ser levada a cabo uma operação de tal natureza.
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Verificando-se tal impossibilidade absoluta, esta não pode deixar de ser comunicada ao interessado de imediato, sob pena de este ser levado a proceder a investimentos e gastos, na tentativa de aperfeiçoar algo impossível de realizar.
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Dado o conteúdo das alíneas E) a G) dos Factos Provados, há, necessariamente, erro de julgamento na matéria de facto quanto ao ponto (xv) dos Factos Não provados.
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Com efeito, da alínea E) dos Factos Provados decorre, precisamente, que o pedido de loteamento formulado em 06.07.1994 foi indeferido porquanto «o loteamento tal como apresentado inviabiliza a ocupação do terreno a poente (…)».
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Ou seja, se o loteamento fosse apresentado de outra forma, não inviabilizando esse terreno, poderia ser deferido; e foi unicamente por esse motivo que os Recorrentes adquiriram esse terreno, que corresponde aos terrenos referidos na alínea VV) dos Factos Provados.
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Por outro lado, foi dado como provado na alínea G) que, na acta de 14.1/4, nenhum dos Recorridos pôs em causa, por qualquer modo, a capacidade construtiva dos terrenos.
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Impõe-se então concluir que os pareceres emitidos até então consideravam possível o loteamento pretendido pelos Recorrentes, referindo quais os aspectos do projecto que deveriam ser corrigidos a fim de se possibilitar a operação.
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Em face destes factos provados, não é possível, nem sequer lógico, julgar como não provados os pontos (i) e (xv) dos Factos Não Provado.
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Neste sentido, e nos termos do disposto no art. 685-B do CPC, verifica-se que, em face dos factos provados constantes das alíneas E) a G) e dos docs. 6, 7 e 2 juntos à P.I., foram incorrectamente julgados os pontos (i) e (xv) dos Factos Não Provados, devendo os mesmos ser incluídos nos Factos Provados.
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Sem prejuízo da presunção de culpa constante do art. 56-6 do DL n.º 448/91 que recai sobre o Município, subsidiariamente, para efeitos de apreciação da culpa no âmbito do DL n.º 48 051 resta dizer que das alíneas K), L), N), O) e R) dos Factos Provados (para as quais se remete) resulta que à semelhança do que ocorreu com o 2.º Recorrido, o 1.º Recorrido considerou ser viável e possível a operação de loteamento pretendida pelos Recorrentes, tendo indeferido, inicialmente, tal pedido, por circunstâncias todas elas supríveis.
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Também à semelhança do que aconteceu com o 2.º Recorrido, o 1.º Recorrido passou a considerar que, afinal, o pedido loteamento efetuado não era viável por não ter capacidade construtiva, tendo omitido uma decisão célere sobre o projecto de alterações apresentado e forçando os Recorrentes a apresentar requerimentos para que tal decisão fosse tomada.
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Assim, sempre se verificaria a culpa do 1.º Recorrido, ao abrigo do disposto no art. 487-2 do Código Civil.
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O Tribunal recorrido considera, igualmente, verificar-se uma situação de concorrência de culpas na produção do dano (cfr. página 23 da sentença para onde se remete), o que não pode deixar de causar perplexidade aos Recorrentes porquanto os actos administrativos beneficiam de uma presunção de legalidade inerente à circunstância de serem manifestações do poder público.
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Por outro lado, se consta da matéria de facto provada (alíneas MM) e OO) dos Factos Provados) que a suspensão judicial do acto administrativo de licenciamento foi erroneamente decretada, tendo vindo a ser objecto de levantamento, ela nunca poderá servir de fundamento para a alegada exigibilidade de suspensão dos trabalhos.
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Dada a complexidade da execução do projecto em causa, os trabalhos foram iniciados, mediante empreitada, logo após a emissão do alvará, até porque importava acautelar o prazo de caducidade da licença da operação de loteamento.
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Todos estes actos antecederam a declaração de nulidade do acto de licenciamento, bem como os próprios embargos extrajudiciais referidos nas alíneas AA) e BB) dos Factos Provados (que, de resto, não chegaram a ser ratificados judicialmente).
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Em suma, não se verifica que os Recorrentes tenham sido, de forma alguma, imprudentes na sua conduta, não podendo admitir-se a concorrência de culpas.
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A decisão recorrida, ao julgar não existir culpa na conduta de nenhum dos Recorridos, viola o disposto nos arts. 56-6 do DL n.º 448/91; 4.º-1 do DL n.º 48 051; e 487 do Cód. Civil − devendo ser revogada e substituída por outra que, julgando assentes os factos constantes dos pontos (i) e (xv) dos Factos não Provados, condene os Recorridos no pagamento de indemnização no montante de 1 459 443,41 Euros (um milhão, quatrocentos e cinquenta e nove mil quatrocentos e quarenta e três euros e quarenta e um cêntimos).
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Verificam-se igualmente os demais requisitos de que depende a condenação daqueles no pagamento da indemnização peticionada: facto ilícito, dano e nexo de causalidade (DL n.º 48 051 e art. 56-6 do DL 448/91).
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No caso concreto, a ilicitude da conduta dos Recorridos encontra-se estabelecida por decisão judicial...
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