Acórdão nº 00923/13.7BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 06 de Novembro de 2015

Magistrado ResponsávelFrederico Macedo Branco
Data da Resolução06 de Novembro de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório MJAM, devidamente identificado nos autos, no âmbito da ação administrativa comum, intentada contra o Município do P...

, na qual peticionou uma indemnização global de 35.700€, em resultado de acidente verificado em 27 de Janeiro de 2013, quando circulava na Via Panorâmica EC, inconformado com a Sentença proferida em 15 de Dezembro de 2014, no TAF do Porto, na qual a ação foi julgada “improcedente”, veio interpor recurso jurisdicional da mesma, em 4 de Fevereiro de 2015 (Cfr. fls. 224 a 268 Procº físico).

Formula o aqui Recorrentes/MJAM nas suas alegações de recurso as seguintes conclusões (Cfr. fls. 259 a 268 Procº físico).

“I) O meritíssimo juiz a quo decidiu, em primeiro lugar, considerar como não provado que existisse qualquer lençol de água e que o piso se encontrasse em mau estado de conservação, e que tenha sido isso que determinou o despiste do aqui Recorrente.

II) Com base nesta suposta falta de prova, entendeu assim que não existiu in casu qualquer violação do dever de conservação e manutenção da via por parte do Recorrido Município, e que como tal não existiria base para se afirmar a prática de qualquer ato ilícito pelo mesmo.

III) Com todo o devido respeito, não interpretou o tribunal da melhor forma os depoimentos testemunhais, tendo assentado a sua motivação essencialmente no depoimento de uma delas, o agente da Polícia de Segurança Pública EPPP, responsável pelo auto e pela análise do local, bem como pelo croqui que este documentou e que se encontra junto aos autos.

IV) Apesar da coerência do depoimento em causa, que se reconhece, do facto de no auto e do croquis não constar que existisse um lençol de água ou buracos e fissuras no piso não se pode automaticamente auferir que não existissem.

V) A testemunha em causa poderia perfeitamente ter cometido um erro no preenchimento do mesmo, e, chegado à fase de audiência de julgamento, obviamente confirmaria o seu teor.

VI) Não se pretendendo afirmar que não seja verdadeiro o depoimento em causa; mas o tribunal não deveria ter-se apoiado, como o fez, em absoluto, no depoimento e nos elementos documentais da autoria daquela testemunha para dar como não provada a existência de lençóis de água ou defeitos no pavimento, quando muitas outras testemunhas afirmaram perentoriamente a sua existência.

VII) Testemunhas cujos depoimentos se revelaram sérios e coerentes, tendo-se em especial atenção os que resultam da prestação das testemunhas FAAM e JCAM, que chegaram ao local até antes da polícia ou das ambulâncias e testemunharam de imediato a existência de falhas e degradação do piso.

VIII) Falhas e degradações que seriam bem passíveis de provocar um despiste mesmo ao condutor mais cuidadoso e diligente, e que, proporcionando a acumulação de água derivada das chuvas intensas nessa altura do ano, conforme resulta também daqueles depoimentos, estabeleceram assim as condições para que o Recorrente perdesse controlo do veículo.

IX) Deste modo se compreende que o tribunal se apoiou em demasia nos elementos juntos aos autos pelo agente da Polícia de Segurança Pública, sem atender a depoimentos também eles credíveis, por parte de testemunhas que estiveram no local e presenciaram o estado e condições da estrada. X) Aliás, de denotar também que a via em questão foi, durante muitos anos, uma zona relativamente segura e de reduzida sinistralidade, mas em tempos recentes tem vindo a mesma a aumentar, sendo que previamente ao acidente do Recorrente já tinha havido um de contornos bastantes semelhantes, e voltou a suceder o mesmo passado algum tempo. XI) A testemunha MCA, inquirida quanto ao prévio ponto, não conseguiu explicar a ocorrência de tantos acidentes seguidos no mesmo local.

XII) De modo que não será de todo incoerente, face aos depoimentos também prestados por outras testemunhas, considerar que a degradação do piso foi a causa principal para a ocorrência dos referidos despistes.

XIII) Todos os acidentes tiveram os mesmos contornos – ou seja, perda do controlo do automóvel por parte do condutor, na zona da faixa de rodagem em questão.

XIV) Significando que errou o Mmo. Juiz a quo quando considerou como não provado que “o piso se encontrava em mau estado de conservação, com diversos buracos na via” (fls. 201 da decisão recorrida), principalmente quando verificamos que se motivou unicamente através do depoimento da testemunha JP e na prova documental resultante da ação e laboração do mesmo, sem atender a qualquer outro testemunho.

XV) E tendo em conta que existem bastantes depoimentos sérios, isentos e coerentes em sentido contrário, deveria ter o tribunal tomado os mesmos em linha de conta, o que não o fez, atuação que certamente alteraria o sentido da matéria de facto dada como provada e não provada.

XVI) A douta sentença presentemente impugnada veio também considerar como não provados a existência de danos não patrimoniais sofridos pelo Recorrente, mais precisamente que este tenha passado a ter “insónias, pesadelos e sensação de ansiedade que se relaciona com o acidente”, que tenha passado “a tomar medicação própria para conseguir dormir e se manter calmo”, e que “a violência do acidente em causa transtornou o A. de tal forma que o mesmo deixou de conduzir, tendo o seu pai de o levar e buscar semanalmente a A...”. – v. fls. 201.

XVII) Motivou-se o tribunal na alegada falta de prova produzida pelo Recorrente, entendendo que as testemunhas que se referiram aos danos não patrimoniais, por serem “quase todas familiares do Autor, procuraram, de forma clara, incrementar os efeitos nefastos do acidente na sua personalidade”.

XVIII) Esta motivação do tribunal a quo não pode valer, na medida em que ignora por completo depoimentos de todo fiáveis, seguros e coerentes no sentido apontado.

XIX) O facto de se tratarem de familiares do Recorrente explica-se com facilidade no facto de serem as pessoas que com ele mais convivem e privam, e com quem aquele passa a maior parte do seu tempo; são eles quem tem maior consciência das sequelas do acidente para o Recorrente.

XX) E dos vários depoimentos apresentados, pode-se retirar com segurança a certeza de que os danos não patrimoniais alegados se verificaram, pela coerência e isenção que se verificam nos mesmos.

XXI) É certo que ao Recorrente não foi ministrada nem receitada qualquer medicação forte, nem teve, na altura, acompanhamento psiquiátrico.

XXII) Mas tal não invalida que se à data os médicos responsáveis pelo exame entenderam não existir necessidade de nenhum desses elementos, tais problemas não se tenham vindo a notar mais tarde, chegando ao ponto de os membros da família chegada do Recorrente já estarem decididos a procurar ajuda psiquiátrica caso este não consiga ultrapassar o seu medo de conduzir.

XXIII) A ansiedade e as dificuldades em dormir a longo prazo seriam até, aliás, de difícil diagnóstico na altura imediatamente a seguir ao acidente, e parece resultar claro dos depoimentos referidos a alteração da personalidade do arguido e os efeitos negativos que o acidente em causa trouxe à sua vida e a sua convivência pessoal.

XXIV) Nestes termos, o tribunal a quo desvalorizou por completo os aludidos depoimentos com base apenas no facto de se tratarem de membros da família do Recorrente, chegando a falar em “incrementar os efeitos nefastos do acidente na sua [do Recorrente] personalidade”.

XXV) Não se compreende tal afirmação, uma vez que é por demais claro que os membros da família sempre seriam quem teria maior contacto com o Recorrente e maior consciência do quanto este se encontrava alterado pelo acidente; e todos eles deram depoimentos isentos, claros e precisos acerca do estado em que aquele se encontrava e se encontra ainda: assustado, nervoso, incapaz de conduzir e ainda necessitado de medicação para dormir.

XXVI) Daqueles testemunhos resulta assim, de forma clara e evidente, a alteração da personalidade do Recorrente que teve lugar após a ocorrência do sinistro, evidenciada e notada por todos os membros da família mais próxima, que com ele convivem diariamente.

XXVII) As testemunhas prestam assim o depoimento naquele sentido de forma coerente e séria, e peca o tribunal a quo por defeito ao subvalorizar os mesmos da forma que o fez.

XXVIII) Por todo o exposto, deverá a matéria de facto ser alterada, considerando-se como provado que: 1. O piso se encontrava num mau estado de conservação, com diversos buracos na via.

  1. O Autor passou a ter insónias, pesadelos e situações de ansiedade que se relaciona com o acidente.

  2. O Autor passou a tomar medicação própria para conseguir dormir e se manter calmo.

  3. A violência do acidente em causa transtornou o A. de tal forma que o mesmo deixou de conseguir conduzir, tendo o seu pai de o levar e buscar semanalmente a A....

    XXIX) Na medida em que os aludidos factos resultam por demais provados através da prova testemunhal produzida em audiência, e não existe prova suficiente para que se possa retirar a ilação oposta.

    XXX) Vem o tribunal a quo afirmar, a fls. 207 e ss. da sentença impugnada, não estarem presentes os requisitos da responsabilidade civil extracontratual resultantes do artigo 483.º do Código Civil, que se entendem também ser aplicáveis no âmbito da Lei 67/2007.

    XXXI) Mais precisamente afirma o tribunal inexistir qualquer facto ilícito cometido pelo Município, no sentido em que não violou este a sua obrigação de manutenção e conservação da via, concluindo também pela inexistência de culpa.

    XXXII) Afirma também que, mesmo com o apoio no facto provado da inexistência de proteção lateral no troço de estrada em causa, não se verificaria o nexo de causalidade entre aquela inexistência e a queda do veículo do Recorrente, na medida em que o gradeamento “guarda-corpos”, que não fora reposto pelo Recorrido após o acidente anteriormente ocorrido no mesmo local, frágil por natureza, não tem a função de evitar quedas de veículos.

    XXXIII) Em relação...

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