Acórdão nº 00647/14.8BEAVR de Tribunal Central Administrativo Norte, 11 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelLu
Data da Resolução11 de Fevereiro de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo: NMSS, com os sinais nos autos, inconformada, interpôs recurso jurisdicional da sentença proferida pelo TAF de Aveiro, em 31.10.2014, que julgou improcedente a providência cautelar de intimação por si interposta contra Município da M...

, em que peticionou a notificação do requerido: a) (…) “para que se abstenha de promover e/ou licenciar a realização de novos espectáculos musicais no LV, freguesia da T..., concelho da M..., cujos intervenientes não respeitem de forma escrupulosa a legislação vigente sobre a emissão de ruído, tudo nos termos conjugados do Art.º 30. Do Decreto-Lei n.º 310/2002, de 28 de Dezembro; dos Art.ºs 14 e 15. Do Regulamento Geral do Ruído, anexo ao D.L. n.º 9/2007, de 17 de Janeiro /redacção vigente); do Art.º 66. Da Constituição da Republica Portuguesa; da alínea f), do n.º 2, do Art.º 112, da alínea c), do n.º 1, do Art.º 120 e do n.º 1, do Art.º 131, todos do Código de Processo nos Tribunais Administrativos; e, acessoriamente, em caso de incumprimento da providência decretada pela Ré, b) Seja aquela condenada ao pagamento diário de um quantitativo mínimo de 50.000,00 € (cinquenta mil euros), a título de sanção pecuniária compulsória – nos termos conjugados do n.º 2, do Art.º 127, do Art.º 169, ambos do Código de Processo nos Tribunais Administrativos ex vi n.º 2, do Art.º 384, do CPC e Art.º 829-A, do CC”.

No seu recurso, formula a autora as seguintes conclusões: I. A Recorrente entende que a sentença recorrida não procedeu ao correcto enquadramento jurídico da situação de facto apurada, padecendo, como tal, de erro de julgamento.

  1. O presente recurso versa exclusivamente sobre a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de direito.

  2. A presente providência cautelar preenche integralmente os requisitos exigidos pela alínea a), do n.º 1 e pelo n.º 5, do Art.º 120 do CPTA.

  3. O Tribunal a quo erro quando conclui que, em “face ao alegado pela Requerente e analisada a factualidade assente, verifica-se que a pretendida tutela cautelar não poderá ser concedida com base neste critério (A evidente procedência da pretensão formulada ou a formular no processo principal), uma vez que não se afigura que haja sido demonstrada, sumariamente, uma violação gritante e palmar dos direitos da Requerente, ou a manifesta ilegalidade nos termos exigidos por este normativo”.

  4. O Tribunal a quo erra quando conclui que “o vício de violação de lei, nas diversas cambiantes aduzidas pela Requerente, não é apto para alicerçar o decretamento da providência com base no critério em apreço, uma vez que não concretiza uma lesão insuportável dos valores protegidos pelo direito administrativo; pelo que não se afigura possível concluir pela existência de uma situação de manifesta ilegalidade, devendo ser indagados os demais critérios consagrados no artigo 120º do CPTA”.

  5. Resulta expresso da matéria de facto – indiciariamente – dada como assente, pela sentença ora recorrida, que foi provado que: a) “No LV, nos Sábados dos meses de Julho e Agosto, decorrem espectáculos musicais ao ar livre, denominados de “Noites de Verão, entre as 22h:00m e cerca das 24h:30m (testemunhas) ” – Cfr. Facto constante da alínea B), da matéria de facto dada como assente, constante da sentença; b) “Entre 4 a 8 de Setembro, ocorre a festa de S. P... que inclui a realização de espectáculos musicais ao ar livre no LV, os quais terminam cerca da 01h:00m (testemunhas) ” – Cfr. Facto constante da alínea C), da matéria de facto dada como assente, constante da sentença; c) “Este ano, os espectáculos referidos em B) e C), realizaram-se num palco móvel, situando-se a casa da Requerente nas traseiras do mesmo (testemunhas) ” – Cfr. Facto constante da alínea D), da matéria de facto dada como assente, constante da sentença; d) “Nos anos anteriores, os espectáculos referidos em B) e C), realizaram-se num palco fixo que se situava em frente da casa da Requerente (testemunhas) ” – Cfr. Facto constante da alínea E), da matéria de facto dada como assente, constante da sentença.

    e) “O som produzido pelos espectáculos referidos em B) e C) perturbam a Requerente (testemunhas) ” – Cfr. Facto constante da alínea F), da matéria de facto dada como assente, constante da sentença.

  6. Não tendo sido provado, por seu turno, que existisse a competente e necessária licença especial de ruído, validamente emitida, que permitisse a realização dentro da legalidade de qualquer um dos espectáculos musicais entretanto realizados.

  7. O Art.º 14, do Regulamento Geral do Ruído (RGR), estabelece expressamente que “é proibido o exercício de actividades ruidosas temporárias na proximidade de edifícios de habitação, aos sábados, domingos e feriados e nos dias úteis entre as 20 e as 8 horas” – Cfr.

    Alínea a), do Art.º 14, do Regulamento Geral do Ruído, anexam ao D.L. n.º 9/2007, de 17 de Janeiro, na redacção vigente IX. Apenas em algumas situações excepcionais, “o exercício de actividades ruidosas temporárias previsto no artigo anterior pode ser autorizado, …, mediante emissão de licença e ruído pelo respectivo município, que fixe as condições de exercício da actividade relativas aos aspectos referidos no número seguinte» – Cfr.

    n.º 1, do Art.º 15, do Regulamento Geral do Ruído, anexo ao D.L. n.º 9/2007, de 17 de Janeiro, na redacção vigente.

  8. Estabelecendo o Art.º 30, do Decreto-Lei n.º 310/2002, de 18 de Dezembro, por seu turno, que: “as bandas de música, grupos filarmónicos, tunas e outros agrupamentos musicais não podem actuar nas vias e demais lugares públicos dos aglomerados urbanos desde as 0 até às 9 horas” – Cfr.

    Art.º 30, do Decreto-Lei n.º 310/2002, de 18 de Dezembro (Regula o licenciamento do exercício da actividade de realização de espectáculos de natureza desportiva e de divertimentos públicos).

  9. E mais acrescentando o Art.º 32, do mesmo Decreto-Lei n.º 310/2002, de 18 de Dezembro, que: “… a realização de festividades, de divertimentos públicos e de espectáculos ruidosos nas vias públicas e demais lugares públicos nas proximidades de edifícios de habitação, escolares durante o horário de funcionamento, hospitalares ou similares, bem como estabelecimentos hoteleiros e meios complementares de alojamento só é permitida quando, cumulativamente: a) Circunstâncias excepcionais o justifiquem b) Seja emitida, pelo presidente da câmara municipal, licença especial de ruído; c) …” – Cfr.

    Art.º 32, do Decreto-Lei n.º 310/2002, de 18 de Dezembro (Regula o licenciamento do exercício da actividade de realização de espectáculos de natureza desportiva e de divertimentos públicos).

  10. Qualquer espectáculo ou actividade que não esteja licenciada ou se não contenha nos limites da respectiva licença pode (e deve) ser imediatamente suspensa, oficiosamente ou a pedido de qualquer interessado, nos termos do vigente n.º 2, do Art.º 33, do Decreto-Lei n.º 310/2002, de 18 de Dezembro.

  11. Competindo em especial às Câmaras Municipais velar pelo rigoroso cumprimento das regras que constam do Regulamento Geral do Ruído, assim como, as atinentes ao licenciamento do exercício da actividade de realização de espectáculos de natureza desportiva e de divertimentos públicos – Cfr.

    Alínea d), do Art.º 26 do Regulamento Geral do Ruído e n.º 2, do Art.º 33, do Decreto-Lei n.º 310/2002, de 18 de Dezembro.

  12. O disposto nos Art.ºs 14 e 26 (alínea d)), do Regulamento Geral do Ruído (RGR) e nos Art.ºs 30 e 33 (n.º 2), do Decreto-Lei n.º 310/2002, de 18 de Dezembro, não tem sido ostensivamente cumprido e respeitado pela Ré, como a própria sentença ora recorrida não deixa de certo modo de reconhecer, directa ou indirectamente, na sua fundamentação de facto – Cfr. Sentença.

    XV.

    O quadro factual indiciariamente apurado pelo Tribunal a quo e a correcta interpretação do conjunto de normativos legais atinentes à matéria controvertida importam por isso, necessariamente, a conclusão de que ocorreu um claro erro de julgamento.

  13. Pois que, ao contrário do que defende a sentença ora recorrida, verifica-se não só existir uma manifesta ilegalidade, como se trata efectivamente de uma violação gritante, ostensiva, palmar e reiterada dos direitos da Requerente, mormente, do seu direito constitucionalmente protegido a viver num ambiente sadio e ecologicamente equilibrado, que lhe permita descansar e estar em sossego, dentro da sua própria habitação, o que consubstancia a evidente procedência da pretensão formulada ou a formular no processo principal – Cfr. Art.º 66, da Constituição da Republica Portuguesa.

    XVII.

    Tendo ficado objectivamente demonstrado que os espectáculos musicais ao ar livre promovidos pela R., perduram para lá das 0h:00m – Cfr. Factos constantes da alínea B) e C), da matéria de facto dada como assente, constante da sentença.

    XVIII.

    Que os ditos espectáculos musicais ocorrem junto da residência habitada pela ora Recorrente – Cfr. Factos constantes da alínea D) e E), da matéria de facto dada como assente, constante da sentença.

    XIX.

    Mais tendo ficado demonstrado, que o som que é produzido pelos ditos espectáculos musicais causa perturbações à ora Recorrente – Cfr. Facto constante da alínea F), da matéria de facto dada como assente, constante da sentença.

  14. Sendo que de acordo com o preâmbulo do Decreto-Lei n.º 9/2007, de 17 de Janeiro, que aprovou o invocado e vigente Regulamento Geral do Ruído, “a prevenção do ruído e o controlo da poluição sonora”, assim como, a “salvaguarda da saúde humana e o bem-estar das populações, …, “constitui tarefa fundamental do Estado, nos termos da Constituição da República Portuguesa e da Lei de Bases do Ambiente”.

  15. O vício de violação da lei supra imputado é assim absolutamente notório e evidente, para efeitos do juízo perfunctório que a lei exige – Cfr.

    Alínea a), do Art.º 120, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

  16. Como tal apto para alicerçar o decretamento da providência, com base no critério da evidente procedência da pretensão...

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