Acórdão nº 01509/07.0BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 22 de Maio de 2015

Magistrado ResponsávelJoaquim Cruzeiro
Data da Resolução22 de Maio de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1 – RELATÓRIO S... Vinhos SA vem interpor recurso do Acórdão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datado de 16 de Outubro de 2012, e que julgou improcedente a acção administrativa especial intentada contra o IFAP- Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas IP, e onde se requeria que deveria ser: a) Anulado o despacho do…. vogal do Conselho de Administração do INGA – Instituto Nacional de Intervenção e Garantia Agrícola, constante do ofício com a referência 777/DJ/SD/2007, pelo qual “determina-se a reposição da quantia de € 37.435,12 considerada como indevidamente recebida, relativamente à Ajuda à Armazenagem Privada de Mosto» relativamente aos contratos de ajuda à armazenagem privada nºs……” b) E ordenada prática do acto devido de restituição à Autora dessa quantia, acrescida de juros moratórios à taxa legal, vencidos e vincendos até integral restituição, desde a data da devolução da quantia pela autora (27-04-2007), e que nesta data perfazem o montante de € 716,17, uma vez que a mesma autora já devolveu a quantia em causa ao INGA – Instituto Nacional de Intervenção e garantia Agrícola.

Em alegações o recorrente concluiu assim: 1.ª O acto administrativo em crise foi praticado pelo Instituto Nacional de Intervenção e Garantia Agrícola (doravante INGA), representado pelo seu vogal do Conselho de Administração, JL, por delegação de competências. Ao INGA sucedeu o ora Recorrido Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas, I. P. (doravante IFAP), nos termos do Decreto-Lei nº 209/2006, de 27 de Outubro e do Decreto-Lei nº 87/2007, de 29 de Março.

  1. O objecto da presente lide é a legalidade do acto proferido pelo INGA, no qual foi ordenada a reposição pela Recorrente da quantia de € 37.435,12, conforme documento nº 3, junto aos autos com a petição inicial.

  2. A Recorrente deu entrada da competente acção administrativa especial, na qual pugnou, além do mais, pela verificação de vício de violação de lei do respectivo acto, requerendo ao Tribunal a quo que declarasse a sua anulação, bem como que ordenasse a prática do acto devido de restituição à Recorrente da aludida quantia de € 37.435,12, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data da devolução da quantia pela Recorrente (27/04/2007) até integral e efectiva restituição.

  3. Ora, apesar de toda a factualidade alegada pela Recorrente na sua petição inicial, a decisão recorrida absolveu o Réu de todos os pedidos, mantendo o acto administrativo impugnado na ordem jurídica.

  4. A Recorrente não pode concordar com esta decisão. Vejamos melhor, 6.ª A Recorrente celebrou com o Instituto da Vinha e do Vinho (doravante IVV) o contrato nº 03000004 de ajuda à Armazenagem Privada de Mosto, em 22/01/2002, aprovado pelo IVV em 01/02/2002, com data de início em 02/02/2002 e data de fim em 30/11/2002.

  5. Ao abrigo do referido contrato nº 03000004, a Recorrente recebeu do INGA, a título de ajuda paga à armazenagem privada, por Mosto Rosado, a quantia de € 4.660,10.

  6. Além disso, a Recorrente celebrou com o Instituto da Vinha e do Vinho (IVV) o contrato nº 05000098 de ajuda à Armazenagem Privada de Mosto, em 13/02/2002, aprovado pelo IVV em 15/02/2002, com data de início em 16/02/2002 e data de fim em 30/11/2002.

  7. Ao abrigo do referido contrato nº 05000098, a Recorrente recebeu do INGA, a título de ajuda paga à armazenagem privada, por Mosto Rosado, a quantia de € 32.775,02.

  8. Com respeito aos contratos em causa, a Recorrente recebeu o total de € 37.435,12, a título de ajudas.

  9. Por carta registada expedida à Recorrente, com a referência 777/DJ/SD/2007, sem data, apenas com a indicação do ano de 2007, mas recebida em 04/04/2007, o INGA, por despacho do Senhor JL, vogal do seu Conselho de Administração, constante do ofício acima referido, determinou a reposição pela Recorrente da referida quantia de € 32.435,12 (documento nº 3, junto aos autos com a petição inicial).

  10. É este o acto que constitui objecto do presente recurso.

  11. Este acto é ilegal, pelas razões que ao diante se aduzirão.

  12. O acto em crise não faz a correcta aplicação da lei.

  13. O montante supra-referenciado foi concedido à Recorrente a título de ajuda à armazenagem privada de mosto, na campanha 2001/2002.

  14. Esta ajuda encontra-se prevista no Regulamento (CE) nº 1623/2000 da Comissão (cfr. artigos 23º a 39º).

  15. Esta ajuda foi concedida por meio de um acto administrativo, o qual foi praticado, precedido de dois contratos, aprovados em 01/02/2002 e em 15/02/2002, tendo os respectivos pagamentos acontecido em 13/02/2003 e 06/03/2003, datas estas entre as quais foram efectuadas as transferências dos montantes em causa para a conta bancária da Recorrente.

  16. A recuperação é pretendida, uma vez que, alegadamente, os boletins de análise dos mostos, elaborados por um laboratório oficial, não o terem sido durante os 30 dias que antecederam a celebração dos respectivos contratos.

  17. Ora, acontece que, a eventual recuperação deste montante atribuído só poderá ser efectuada através de um acto administrativo que proceda à revogação do acto que o concedeu.

  18. Caso se entenda que o acto é válido, não pode o mesmo ser revogado, uma vez que os actos administrativos que sejam válidos são livremente revogáveis, excepto (entre outras situações) quando forem constitutivos de direitos ou de interesses legalmente protegidos, o que acontece no presente caso.

  19. É o que acontece no presente caso (cfr. artigo 140º do C. P. A. – Código do Procedimento Administrativo, e página nº 8 da decisão recorrida, que prescreve o seguinte: “Quanto à qualificação do acto de concessão de ajudas comunitárias, é pacífico, há muito, na nossa jurisprudência, que se trata de um acto constitutivo de direitos.”.

  20. Caso assim não se entenda, poderá considerar-se que o acto que concedeu a ajuda aqui em causa possa ser eventualmente considerado anulável, nos termos do artigo 135º do C. P. A., uma vez que não se encontra previsto o regime da nulidade para a situação sub judice (artigo 133º do C. P. A., a contrario).

  21. Nos termos do artigo 136º, nº 1, do mesmo diploma, “O acto administrativo anulável pode ser revogado nos termos previstos no artigo 141.º.” (também do C. P. A.).

  22. Porém, o artigo 141.º do C. P. A. estatui que os actos administrativos que sejam inválidos só podem ser revogados com fundamento na sua invalidade e dentro do prazo do respectivo recurso contencioso.

  23. Este prazo entende-se que é de um ano, pois é prazo mais longo para a interposição de recurso, atribuído ao Ministério Público.

  24. Acontece que mesmo este prazo de um ano já havia terminado há muito aquando da prática do acto em crise.

  25. Assim, o R. já não está legalmente habilitado a revogar o acto administrativo que concedeu este subsídio no âmbito do referido projecto, pelo que já não está em tempo de proceder à recuperação do subsídio aqui em causa.

  26. Sem prescindir e a acrescer ao exposto, ainda que se entenda que não é o direito português interno que aqui se aplica, dir-se-á o seguinte: 29.ª Caso se entenda nesse sentido, isto é, que o direito comunitário prevalece, neste caso, sobre o direito nacional, o prazo para recuperação de ajudas deferido pelo direito comunitário seria de quatro anos a contar da data em que a alegada irregularidade tenha sido praticada.

  27. Caso a questão seja tratada em função do ordenamento jurídico comunitário, em relação aos procedimentos de controlo e recuperação, o prazo para o efeito é de quatro anos, admitindo-se apenas regulamentações sectoriais que o encurtem para três anos, e nunca para menos, e que as legislações nacionais o alonguem sem estabelecimento de qualquer limite.

  28. Aqui chegados, vejamos qual o entendimento da jurisprudência comunitária acerca desta problemática: 32.ª Com efeito, e a este respeito, vide, o douto Acórdão da Quarta Secção do Tribunal de Justiça da União Europeia, proferido no âmbito dos Processos apensos nºs C-278/07 e C-280/07, o qual pela sua pertinência se passa a transcrever, com a devida vénia: · “O artigo 3.°, n.° 1, primeiro parágrafo, do Regulamento n.° 2988/95, relativo à protecção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias, que fixa, em matéria de procedimentos, um prazo de prescrição de quatro anos que é contado a partir da data em que foi praticada a irregularidade, é aplicável às medidas administrativas como a recuperação de uma restituição à exportação indevidamente recebida pelo exportador em virtude de irregularidades por ele cometidas”; · “No que toca ao tipo de vantagens indevidamente obtidas através do orçamento comunitário em virtude de irregularidades cometidas antes da entrada em vigor do Regulamento n.° 2988/95, relativo à protecção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias, não se pode deixar de observar que, mediante a adopção do artigo 3.°, n.° 1, desse regulamento e sem prejuízo do n.° 3 desse artigo, o legislador comunitário definiu, desse modo, uma regra de prescrição geral, com a qual reduziu voluntariamente para quatro anos o período durante o qual as autoridades dos Estados-Membros, actuando em nome e por conta do orçamento comunitário, deveriam recuperar ou deveriam ter recuperado essas vantagens indevidamente obtidas”; · “(…) o artigo 234.° CE baseia-se numa clara separação de funções entre os tribunais nacionais e o Tribunal de Justiça.

    A apreciação dos factos é da competência jurisdicional dos tribunais nacionais, enquanto que o papel do Tribunal de Justiça é fornecer orientações quanto à interpretação da legislação comunitária. O Tribunal de Justiça deve assim basear a sua decisão num processo de reenvio prejudicial nos factos referidos pelo tribunal nacional no seu despacho de reenvio” (relevo e sublinhado nossos); · “Um prazo mais longo na acepção do artigo 3.°, n.° 3, do Regulamento (CE, Euratom) n.° 2988/95 também pode ser aplicado por um Estado-Membro nos casos em que esse prazo já estava previsto no direito interno do...

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