Acórdão nº 02717/16.9BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 07 de Julho de 2017

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Apar
Data da Resolução07 de Julho de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO MLT, com residência na Rua …, Bragança, sob invocação do artigo 30º da Lei 27/2008, de 30 de junho, apresentou impugnação jurisdicional contra o Ministério da Administração Interna, formulando o seguinte pedido: Termos em que vem requerer se digne julgar procedente por provado o presente recurso/impugnação jurisdicional e determinar a concessão do asilo ao A. nos termos expostos.

Por decisão proferida pelo TAF de Mirandela foi julgada procedente a acção.

Desta vem interposto recurso.

Alegando, o Réu formulou as seguintes conclusões:1ª Atento o exposto, considera-se o pedido de asilo infundado, por não se enquadrar em nenhuma das disposições previstas na Convenção de Genebra e no Protocolo de Nova Iorque, e designadamente, por se aferir subsumível no disposto nas als. a) e e) do n.º 1 do art. 19.º, a Lei n.º 27/2008, de 30/06, que taxativamente inibe ao usufruto do estatuto de refugiado.

  1. O mesmo se passa relativamente à concessão de Autorização de Residência por Razões Humanitárias, dado que a situação não é, de todo, suscetível de enquadramento no regime de Proteção Subsidiária previsto no art. 7.º da mesma Lei.

  2. Destarte, o acto administrativo ora em crise encontra-se legalmente enquadrado face ao disposto na Convenção de Genebra e na Lei de Asilo.

  3. Em suma, o pedido formulado pelo mesmo é de todo improcedente, uma vez que a validade do acto administrativo praticado pelo SEF, entidade ora requerida, é insindicável.

Nestes termos e nos mais de Direito, deve o processo e os pedidos formulados serem julgados improcedentes com todas as legais consequências.

O Autor não juntou contra-alegações.

O MP, notificado nos termos e para os efeitos do artº 146º/1 do CPTA, emitiu parecer no sentido do provimento do recurso.

Cumpre apreciar e decidir.

FUNDAMENTOS DE FACTO Na decisão foi fixada a seguinte factualidade: 1) No dia 02.11.2015, o autor provinha de Dakar, no voo TP1408,; P.A., fls. 6 2) Nesse mesmo dia o autor solicitou pedido de asilo no Posto de Fronteira do Aeroporto da Portela, em Lisboa, a que foi atribuído o n.º de processo 853/15, tendo-se inicialmente identificado como sendo AK, nacional do Mali e nascido a 11.04.1989, titular do passaporte ordinário n.º B0...; P.A., fls. 1 e ss.

3) Foi recusada a entrada do autor em território nacional por «não ser portador de documento de viagem válido ou documento que o substitua (Uso de documento falsificado)»; P.A. fls. 6 e 12 e ss.

4) No inquérito preliminar, preenchido no próprio dia 02.11.2015, o autor identificou-se como MLT, nascido a 11.09.1989 no Mali; P.A., fls. 36 e 37 5) A 10.11.2015 foi autorizada a entrada do autor em território nacional; P.A., fls. 57-A e ss.

6) O pedido de proteção internacional apresentado pelo autor foi admitido, determinando-se que o processo seguisse para instrução, tendo concedida autorização de residência provisória ao autor; P.A., fls. 66 e ss.

7) Foi emitida proposta de recusa do direito de asilo, bem como recusa da autorização de residência por proteção subsidiária; P.A., fls. 94 e ss.

8) O Conselho Português para os Refugiados emitiu pronúncia no sentido de ser reformulado a proposta de recusa da conceção de proteção internacional ao autor; P.A., fls. 109 e ss.

9) Com fundamento na informação de 03.07.2016, e por despacho de 30.09.2016, foi recusado o pedido de asilo do autor, bem como a concessão da autorização de residência por proteção subsidiária; Doc. 1 junto com a p.i.

10) O autor nasceu no Mali e com 6 anos de idade foi viver para o Senegal com uma tia; P.A., fls. 40 e ss; declarações de parte 11) O autor tem nacionalidade senegalesa e máli; Doc. 2 junto com a p.i.; cópia do passaporte junto na audiência; P.A., fls. 40 e ss.

Declarações de parte; 12) O autor é homossexual; P.A., fls. 40 e ss.; declarações de parte 13) O autor foi exposto como homossexual pelo seu ex- namorado; P.A., fls. 40 e ss.

14) Em resultado disso, o autor foi agredido fisicamente por ser homossexual no Senegal, incluindo por familiares, tendo sido despedido; Declarações de parte; P.A., fls. 40 e ss.

15) O autor, depois de ter tido formação durante um mês, a que se seguiu estágio de três meses, assinou a 22.12.2016 contrato de trabalho por tempo indeterminado num contact center em Macedo de Cavaleiros, onde se encontra a trabalhar; Doc. junto na audiência; declarações de parte 16) A homossexualidade não é diretamente criminalizada no Mali, mas dificilmente aceite, sendo os homossexuais com frequência vítimas de discriminação; P.A., fls. 116 e ss.

17) No Mali a lei proíbe a associação “para um fim imoral” no artigo 224.º do Código Penal com pena de prisão entre 3 meses e 2 anos e/ou pena de multa, o que pode ser utilizado para punir práticas homossexuais; P.A., fls. 116 e ss.

18) O Senegal criminaliza expressamente as práticas homossexuais com pena de prisão e multa (artigo 319.º, n.º 1), sendo uma sanção efetivamente aplicada.

Doc. 2 junto com a p.i.

XDE DIREITO Está posta em causa a decisão que julgou procedente a acção.

Na óptica do Recorrente não existem fundamentos para que possa ser aplicado ao caso em análise o regime previsto na Lei de Asilo.

Cremos que lhe assiste razão.

Antes, atente-se no seu discurso jurídico fundamentador: “Entende o autor preencher os requisitos legais de que depende a concessão do direito de asilo ou, pelo menos, a título subsidiário os requisitos para a autorização de residência a título subsidiário.

Vejamos.

A Lei n.º 27/2008, de 30 de junho, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 26/2014, de 05 de maio, estabelece as condições e procedimentos de concessão de asilo ou proteção subsidiária, transpondo para a ordem jurídica interna várias Diretivas da UE.

De acordo com o artigo 2.º, n.º 1, al. b) por «beneficiário de proteção jurídica» entende-se “uma pessoa a quem foi concedido o estatuto de refugiado ou o estatuto de proteção subsidiária, definidos nas alíneas i) e j)”. A mencionada alínea i) refere que se entende por “«Estatuto de proteção subsidiária», o reconhecimento, por parte das autoridades portuguesas competentes, de um estrangeiro ou de um apátrida como pessoa elegível para concessão de autorização de residência por proteção subsidiária”. E a alínea j) menciona que se entende por “«Estatuto de refugiado», o reconhecimento, por parte das autoridades portuguesas competentes, de um estrangeiro ou de um apátrida como refugiado que nessa qualidade seja autorizado a permanecer em território nacional”.

O artigo 3.º do referido diploma legal dispõe o seguinte: Artigo 3.º Concessão do direito de asilo1 - É garantido o direito de asilo aos estrangeiros e aos apátridas perseguidos ou gravemente ameaçados de perseguição, em consequência de atividade exercida no Estado da sua nacionalidade ou da sua residência habitual em favor da democracia, da libertação social e nacional, da paz entre os povos, da liberdade e dos direitos da pessoa humana.

2 - Têm ainda direito à concessão de asilo os estrangeiros e os apátridas que, receando com fundamento ser perseguidos em virtude da sua raça, religião, nacionalidade, opiniões políticas ou integração em certo grupo social, não possam ou, por esse receio, não queiram voltar ao Estado da sua nacionalidade ou da sua residência...

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