Acórdão nº 00818/12.1BEAVR-A de Tribunal Central Administrativo Norte, 18 de Março de 2016

Magistrado ResponsávelJoaquim Cruzeiro
Data da Resolução18 de Março de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1 – RELATÓRIO A... Seguros, SA vem interpor recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, datada de 2 de Setembro de 2015, que julgou parcialmente procedente a excepção de prescrição do direito que invoca no âmbito da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e demais Entidades Públicas, relativamente à acção administrativa comum interposta contra MFA, SA, Município de Águeda e EP Estradas de Portugal, SA, hoje, Infraestruturas de Portugal, SA e onde era solicitado que devia: a) Condenar-se a 1ª Ré a pagar à Autora a quantia de € 24 643,66, acrescida de juros vincendos desde a citação até efectivo e integral pagamento, ou, b) Condenar-se a 2ª Ré a pagar à Autora a quantia de € 24 643,66, acrescida de juros vincendos desde a citação até efectivo e integral pagamento, ou, c) Condenar-se a 3ª Ré a pagar à Autora a quantia de € 24 643,66, acrescida de juros vincendos desde a citação até efectivo e integral pagamento.

Em alegações a recorrente concluiu assim: 1. A Mmª Juiz do Tribunal a quo considerou que, de acordo com o disposto no artigo 498º, nº 2 do Código Civil, o direito de regresso que a Recorrente pretende exercer relativamente às quantias de € 11.141,03 e de € 19.434,87 encontrava-se prescrito à data da entrada da presente acção em Tribunal.

  1. A ora Recorrente discorda do entendimento da Mmª Juiz do Tribunal a quo no que respeita à data a partir da qual começa a contar o prazo de prescrição do seu direito de regresso.

  2. As prestações pagas e correspondentes aos valores de € 11.141,03 e de € 19.434,87, devem ser considerados como um todo, uma vez que respeitam a valores indemnizatórios decorrentes das lesões sofridas pela Sinistrada, em consequência do acidente em causa nos presentes autos.

  3. As obrigações que impendem sobre a ora Recorrente derivam todas do mesmo facto: a ocorrência do acidente em causa nos presentes autos.

  4. A jurisprudência e doutrina têm entendido que estamos perante uma única prestação, faseada e protelada ao longo do tempo.

  5. Ainda que os pagamentos à Sinistrada tenham tido início em 2009, a obrigação da ora Recorrente é única, embora fraccionada.

  6. A contagem do prazo prescricional só se inicia a partir do cumprimento da última prestação, data em que a obrigação se encontra integralmente cumprida, o que, in casu, ocorreu apenas em 24.03.2010.

  7. A posição da ora Recorrente diverge da perfilhada pela Mmª Juiz do Tribunal a quo no que concerne ao prazo prescricional aplicável.

  8. A conduta omissiva dos RR. preenche o tipo de crime previsto e punido pelo artigo 148º, n.º 1 do Código Penal.

  9. O prazo de prescrição previsto para o crime previsto e punido pelo artigo 148º do Código Penal é de cinco anos, segundo o 118º, n.º 1, alínea c) do Código Penal.

  10. O prazo prescricional aplicável na presente acção, nos termos e para os efeitos do artigo 498º, n.º 3 do Código Civil, é de cinco anos e não o prazo de três anos previsto no n.º 2 da referida normal legal, por força do disposto no artigo 118º, n.º 1, alínea c) do Código Penal.

  11. A aplicação do prazo de prescrição previsto no artigo 498º, n.º 3 do Código Civil é independente da existência de um processo-crime ou de uma efectiva condenação no tipo de crime em causa.

  12. A Sinistrada beneficia do prazo alargado de prescrição previsto no artigo 118º, n.º 1, por força do disposto no artigo 498º, n.º 3 do Código Civil.

  13. Sendo a Recorrente a seguradora para a qual se encontrava transferida a responsabilidade pelos danos emergentes de acidentes de trabalho e tendo aquela assegurado o pagamento das indemnizações decorrentes do acidente, fica sub-rogada nos direitos da Sinistrada sobre o causador do acidente, pelo que beneficia também deste alargamento do prazo prescricional.

  14. Á data da entrada da Petição Inicial em Tribunal, ainda não tinham decorrido os cinco anos desde a data do último pagamento efectuado, datado de 24.03.2010.

  15. A sistematização do próprio Código Civil indicia que tanto os casos previstos no n.º 1 e n.º 2 do artigo 498º podem beneficiar do alargamento do prazo prescricional permitido pelo n.º 3 daquela disposição legal.

  16. A responsabilidade civil da R., MFA, S.A., estava validamente transferida para a Interveniente, através do contrato de seguro titulado pela apólice n.º RC54374260.

  17. A R., MFA, S.A., não invocou a excepção da prescrição, o que obsta a que a Interveniente possa invocar essa excepção e beneficiar dos efeitos decorrentes da procedência da mesma.

  18. A ora Recorrente não conhecia, nem tinha obrigação de conhecer, a existência de um contrato de seguro e, em especial, qual a Seguradora para a qual se encontrava transferida a responsabilidade civil da R., MFA, S.A.

  19. A prescrição invocada pela Interveniente apenas se iniciou quando a Recorrente teve conhecimento desse facto, ou seja, com o chamamento da Interveniente aos presentes autos, ocorrido em 19.10.2012.

  20. A ora Recorrente não aceita o Despacho recorrido na parte em que absolve os RR. e a Interveniente do pedido, não se conformando com as conclusões aí produzidas, por considerar desajustada e por reflectir uma incorrecta interpretação da Lei e da Jurisprudência aplicável a situações semelhantes.

    O Recorrido Município de Águeda contra-alegou apresentando as seguintes conclusões: 1-Na sequência de um acidente de viação e simultâneo de trabalho (in itinere) sofrido em 15/2/2009 por MALFR, empregada da Santa Casa da Misericórdia de Águeda, a Autora, na qualidade de seguradora por acidentes de trabalho de pessoal da Segurada, Santa Casa da Misericórdia de Águeda, de que aquela era trabalhadora, veio pedir o reembolso de diversas quantias que, por força desse seguro de acidente de trabalho, por ela foram sendo pagas à sinistrada e a terceiros, quantias essas que enumerou na petição inicial que deu entrada em tribunal em 10/9/2012.

    2- Tendo em conta as datas em que a Autora, segundo ela própria, procedeu aos sucessivos pagamentos das quantias por ela indicadas na sua petição inicial, os Réus Município de Águeda e Estradas de Portugal e a interveniente principal F... invocaram a prescrição do direito ao reembolso por parte da Autora de diversas quantias por ela pagas, segundo ela própria, mais de 3 anos antes da data da sua citação para a acção, invocando para tanto o disposto no nº 2º do artigo 498º do Código Civil, exceção essa que veio a ser julgada procedente pela decisão recorrida nos exatos termos que dela constam e que aqui se dá como reproduzida para todos os efeitos legais.

    3 – No presente recurso, a Autora discorda dessa decisão, sustentando, por um lado, que a contagem do prazo de prescrição do seu direito, que, no seu entender, não será verdadeiramente um direito de regresso, mas um de caso verdadeira sub-rogação legal, só se inicia após o pagamento da totalidade das sucessivas quantias ou prestações que integram a indemnização cujo reembolso pede, e, por outro lado, que o prazo de prescrição nesta ação seria, não o de 3 anos previstos no nº 2º do artigo 498º do Código Civil, mas sim o de cinco anos ao abrigo do disposto nº 3 do mesmo artigo 498º, em razão de a sinistrada ter sofrido no acidente ferimentos graves pelo que, em abstracto, os factos fundamentadores do direito de indemnização da lesada se poderiam subsumir a um crime de ofensas à integridade física cujo prazo de prescrição do procedimento criminal seria de cinco anos, Mas a sua tese não tem qualquer apoio legal.

    4 - O nº 2 do artigo 498 do Código Civil, em que se funda o pedido formulado na presente ação, é claro ao estipular que o prazo de prescrição se inicia com o cumprimento, ou seja, o pagamento, pelo que, se este pagamento é constituído por inúmeros pagamentos de diversas quantias de diferente natureza e feitos a diversas pessoas e entidades por força do mesmo seguro, o prazo de prescrição corre e inicia-se em relação a cada pagamento e não apenas após o último pagamento que, em casos como o sub-judice, nunca se sabe qual é e quando ocorre.

    Nesse sentido, podem ver-se: -o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 07/05/2914, processo nº 8303/11.0T2SNT-AL1.S1, de que foi Relator o Juiz Conselheiro Granja da Fonseca, in www.dgsi.pt, em cujo sumário no seu item VII se refere expressamente que “A contagem do prazo de prescrição deve fazer-se a partir da data de cada ato de cumprimento , e não do cumprimento integral ou do último pagamento”; - o Acórdão do STJ de 13/05/ 2014, Processo nº 360/12.02AND.C1,S1, de que foi Relator o Juiz Conselheiro João Camilo, no qual se decidiu que no caso de prestações sucessivas o prazo de prescrição corre e se inicia em relação a e com o pagamento de cada uma das prestações e não da data do pagamento da primeira.

    5- No caso sub-judice e na previsão do nº 2 do artigo 498º do Código não estamos nas relações entre sinistrado e eventual (em abstracto) responsável pelo facto causal do acidente / sinistro ou quem, por força de contrato de seguro, responda em vez deste, hipótese em que poderia suscitar-se a questão do eventual alargamento do prazo de prescrição do direito de indemnização do lesado para cinco anos, de harmonia com a previsão do nº 3 do citado artigo 498º do C.C., mas estamos, isso sim, no âmbito das relações entre quem, por força dum contrato de seguro, pagou indemnizações ao sinistrado e a terceiros e outrem contra quem eventualmente quem pagou possa ter direito ao reembolso do que pagou, por força do direito de regresso ou de sub-rogação legal.

    5- As razões que subjazem ao alargamento do prazo de prescrição do nº 1 do artigo 498º do Código Civil para o prazo de prescrição do procedimento criminal previsto no nº 3 do mesmo artigo só existem nas relações entre sinistrado e quem responda diretamente para com ele pelo ressarcimento dos danos por ele sofridos no sinistro (causador do acidente ou sua Seguradora), uma vez que só perante o sinistrado podem os factos causadores do sinistro assumirem dignidade...

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