Acórdão nº 0905/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 22 de Abril de 2015

Magistrado ResponsávelMARIA BENEDITA URBANO
Data da Resolução22 de Abril de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I – Relatório 1.

A………, juiz de direito no Tribunal …………, vem propor acção administrativa especial contra o Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais (CSTAF), com ela pretendendo reagir contra a deliberação deste Conselho, de ………., pela qual lhe foi atribuída a classificação de Bom com Distinção, relativamente ao serviço por ele prestado no Tribunal …………, no período compreendido entre …….. a ……….

1.1.

O autor alegou, para o efeito, e em síntese: (i) Vício de ilegalidade das normas em que assenta a deliberação do CSTAF em crise, designadamente, do artigo 16.º, n.º 4, do Regulamento das Inspecções Judiciais do Conselho Superior da Magistratura (RIJ), por falta de habilitação legal das mesmas.

(ii) Vício de ilegalidade material do artigo 16.º do RIJ por violação directa do artigo 33.º, que estabelece as várias classificações de mérito, e, de igual modo, dos artigos 34.º e 37.º, todos do Estatuto dos Magistrados Judiciais (EMJ).

(iii) Vício de ilegalidade da deliberação do CSTAF por violação dos princípios da justiça e igualdade e da proporcionalidade (arts 5.º e 6.º do CPA, na sua versão anterior, actuais artigos 6.º, 7.º e 8.º).

(iv) Erro nos pressupostos de facto da deliberação do CSTAF por inexacta valoração dos elementos constantes do relatório inpectivo e consequente contradição intrínseca da deliberação classificatória.

1.2.

O réu contestou, concluindo pela improcedência de todos os vícios imputados ao acto impugnado.

1.3.

O Digno Magistrado do MP, notificado nos termos dos artigos 84.º, n.º 6, e 85.º, n.º 5, do CPTA, não emitiu parecer.

1.4.

Não tendo sido suscitadas questões prévias e não tendo as partes renunciado à apresentação de alegações escritas, foram as mesmas notificadas para o efeito, ao abrigo do n.º 4 do artigo 91.º do CPTA.

1.4.1.

O autor não apresentou alegações.

1.4.2.

O réu contra-alegou, concluindo deste modo: “

  1. No que concerne ao alegado erro nos pressupostos, não existe qualquer discrepância entre os factos pressupostos do sentido da deliberação em causa e a realidade.

  2. Os factos invocados e valorados por este Conselho como fundamento da classificação de “Bom com Distinção” existem e correspondem à verdade, pelo que a deliberação aqui posta em crise não padece de erro nos pressupostos.

  3. Sendo que o pretendido reconhecimento da excepcionalidade do mérito do A. não é um facto, mas sim um juízo de valor.

  4. Excepcionalidade essa que o CSTAF, face aos elementos recolhidos em sede de inspecção, considerou não ser de reconhecer.

  5. O direito aplicado corresponde ao complexo normativo aplicável em matéria de avaliação e classificação de serviço dos magistrados.

  6. O exercício dos poderes regulamentares do CSM em matéria de critérios para a avaliação do mérito dos juízes obedeceu à exigência constante na Constituição (actual n.º 7 do artigo 112.º): «Os regulamentos devem indicar expressamente as leis que visam regulamentar ou que definem a competência subjectiva e objectiva para a sua emissão».

  7. Sendo inerente ao CSM, como órgão constitucional que é (citado artigo 217.º, n.º 1) e órgão superior de gestão e disciplina da magistratura judicial, o poder regulamentar (cfr.

    Acórdão do TC n.º 61/02, Processo n.º 380/00, de 6/2/2002; cfr. ainda Acórdãos do STJ n.º 98/12.9 YFLSB, de 10.02.2013, e n.º 99/12.7 YFLSB, de 21.03.2013).

  8. As normas constantes do RIJ foram aprovadas por entidade com poder regulamentar, intrínseco ao exercício das suas funções, não ocorrendo o alegado vício de ilegalidade, por falta de habilitação legal.

  9. E estão em conformidade com a lei que estão a desenvolver e a concretizar, o EMJ.

  10. Os critérios de avaliação e subsequente eventual atribuição da classificação de Muito Bom estão expressos desde logo no EMJ, sendo o tempo de serviço um dos factores a ponderar (cfr. artigo 37.º do EMJ).

  11. O grau de exigência na avaliação do serviço de um magistrado com antiguidade na jurisdição inferior a 10 anos para efeito de atribuição da classificação mais elevada é, necessariamente, superior, impondo-se uma prestação de excelência.

  12. Daí o limite previsto no n.º 4 do artigo 16.º do RIJ.

  13. Não estando em causa a violação do princípio da igualdade.

  14. “(…) o CSM, ao considerar a antiguidade na carreira, não age com injustiça, nem com parcialidade, interpretando e aplicando os elementos relevantes para a classificando do magistrado, pois sempre se há-de entender que, numa situação de antiguidade na carreira inferior a dez anos, ele não dispõe ainda de conhecimentos e experiência que lhe permitam exercer mais seguramente e eficientemente a sua actividadade.

    A diferenciação de tratamento entre magistrados com antiguidade na carreira superior ou inferior a dez anos tem assim justificação material bastante. E – acrescente-se – todos os magistrados com antiguidade na carreira inferior a dez anos são tratados de igual modo, só excepcionalmente podendo ser-lhes atribuída nota de Muito Bom, «desde que se evidencie manifestamente pelas suas qualidades pessoais e profissionais», não podendo, assim, afirmar-se haver uma distinção arbitrária entre eles (…)» (Ac. do TC n.º 61/02) (…).

  15. A exigência de um período de tempo, no caso, 10 anos, de exercício da actividade como magistrado justifica-se pela necessidade de um substracto de experiência suficientemente consistente para ser demonstrativo de elevado mérito.

  16. Estando em causa uma avaliação no âmbito da jurisdição administrativa e fiscal, é a qualidade da prestação profissional nesta área que está sob avaliação, e não o percurso na jurisdição comum (como magistrado do MP), pelo qual o A. foi oportunamente classificado.

  17. Pensando num caso paralelo, em termos de requisitos para passagem a juiz de círculo (artigo 58.º do ETAF), são exigidos 5 anos de serviço, com a classificação de Bom com Distinção, para ocorrer tal mudança.

  18. Regime que o STA entendeu aplicável aos juízes recrutados ao abrigo da Lei n.º 1/2008, considerando que o tempo de serviço prestado na jurisdição comum pelos magistrados recrutados ao abrigo da referida Lei n.º 1/2008, como é o caso do A., apenas releva para efeitos de antiguidade na magistratura e para outros efeitos remuneratórios - como a «progressão normal nos índices remuneratórios» em função do «mero preenchimento de módulos de tempo» e como acautelou o n.º 10 do artigo 3.º da referida Lei (Acórdão do Pleno, de 21. 02.2013, Proc. n.º 874/11, que confirmou o Acórdão da Secção de 26.04.2012).

  19. Mas já não pode ser tido em conta para efeitos de antiguidade na jurisdição administrativa e fiscal (artigo 3.º, n.º 11, alínea a)) nem contagem do tempo necessário ao acesso aos TCAS (n.º 11, alínea b)).

  20. Nem para a (mais célere) passagem a juiz de círculo (cfr. referidos acórdão).

  21. Não procede a argumentação do A. no sentido de usar a excepcionalidade da Lei n.º 1/2008 para lhe ser reconhecida a antiguidade de 10 anos exigida no artigo 16.º, n.º 4, do RIJ, para efeito da obtenção da classificação de ‘Muito Bom’.

  22. Uma coisa é a experiência na jurisdição comum, outra a experiência na jurisdição administrativa e fiscal, de distinta natureza.

  23. Como bem distinta é também a actividade de julgador face à actividade de magistrado do Ministério Público.

  24. O tempo de seviço do A. como magistrado na jurisdição administrativa e fiscal – no âmbito da qual foi feita a avaliação aqui em causa – é inferior aos 10 anos exigidos como substracto material mínimo de experiência nesta jurisdição para a atribuição da classificação de Muito Bom.

  25. A situação do A. não é pois materialmente idêntica à daqueles colegas que detêm essa antiguidade de 10 anos na jurisdição administrativa e fiscal.

  26. Estando em causa situações de facto diversas, de modo distinto devem ser tratadas, pois só assim se salvaguarda a igualdade, não formal, mas material.

    A

  27. Sem estar preenchida a exigência da antiguidade, o serviço do A. só poderia ser classificado de Muito Bom se revelasse excelência.

    BB) Analisada a prestação funcional do A., foram apuradas uma «produtividade elevada» e «excelente qualidade técnica» – o que justificou, entre outros aspectos, a segunda classificação mais elevada, ‘Bom com Distinção’.

    CC) No entanto, os elementos recolhidos não permitiram ao CSTAF reconhecer ao A. um mérito excepcional.

    DD) Deliberação tomada pelo órgão competente, órgão colegial, no exercício das funções que lhe estão legalmente cometidas, apreciados os elementos recolhidos no âmbito do processo de inspecção e o direito aplicável.

    EE) Como é jurisprudencialmente reconhecido, «no domínio da actividade de avaliação e classificação do mérito profissional, o órgão administrativo competente dispõe de uma ampla margem de valoração dos elementos ao seu alcance, a dita discricionariedade imprópria da Administração (…)» (cfr. Acórdão do STA, de 02.05.2006, Proc. n.º 0219/04).

    FF) «Ao execer a chamada justiça administrativa, o CSTAF move-se a coberto da sindicância judicial, salvo em situações extravagantes ou anormais em que o percurso escolhido ou o resultado atingido sejam ostensivamente inadmissíveis» (Ac. do STA, de 06.10.2004, Proc. n.º 0499/03; cfr. ainda o Ac. do STA, de 23.05.2002, Proc. n.º 048333).

    GG) Não se encontrando verificados os pressupostos para a atribuição de Muito Bom – questão independente da qualidade do serviço e das classificações atribuídas a outros colegas –, tal classificação não poderia ter sido atribuída ao A., não estando em causa a violação do direito à igualdade no progresso na função pública.

    HH) A deliberação do CSTAF de …….., aqui posta em crise, não padece dos vícios que lhe foram assacados pelo Autor”.

    1. Colhidos os vistos dos Exmos Adjuntos, vêm os autos à conferência para decisão.

      II – Fundamentação 1.

      De facto: 1.1.

      Com interesse para a decisão consideram-se os seguintes factos (i) O serviço prestado pelo autor, enquanto juiz do ........, no período de ……. a …….., foi objecto de inspecção extraordinária com vista à...

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