Acórdão nº 0781/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 08 de Julho de 2015

Magistrado ResponsávelARAGÃO SEIA
Data da Resolução08 de Julho de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam os juízes da secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: A Fazenda Pública, inconformada, recorreu da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa (TTL) datada de 4 de Maio de 2015, que deferiu a reclamação deduzida por A…………….., contra o despacho proferido pelo Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa 2, que revogou o despacho que declarou a prescrição da divida exequenda referente a IRS do ano de 2000.

Alegou, tendo concluído como se segue: A.

Vem o presente recurso interposto da douta Sentença que julgou procedente a reclamação de actos do órgão de execução fiscal à margem identificada, que decidiu: “(...) defiro a presente reclamação deduzida por A……………, e anulo o despacho do Chefe de Finanças de 2014.04.24, que revogou o despacho proferido em 2013.12.11, que declarou a prescrição da dívida exequenda e extinguiu o processo de execução fiscal”.

B.

Salvo o devido respeito por melhor opinião, não pode a Representação Fazenda Pública conformar-se com o decidido, entendendo que a douta sentença, é nula por excesso de pronúncia, se atendermos aos conceitos exatos usados na mesma, ou se encontra ferida de erro de julgamento apresentando alguma confusão de conceitos, não sendo facilmente inteligível.

C.

Debruçando-se a douta Sentença sobre a invocada violação do alcance do caso julgado pelo despacho reclamado concluiu o seguinte: “Em suma, o despacho do órgão de execução fiscal que declarou a prescrição da dívida exequenda e extinguiu o processo de execução fiscal constituí caso decidido e suscitou a inutilidade superveniente da lide impugnatória determinando a extinção da instância [sublinhado e negrito nosso].

Tem, pois, que ser dada razão ao Reclamante, sem necessidade de mais apreciar os fundamentos trazidos ao debate e que diriam respeito à averiguação sobre se a dívida se encontrava ou não prescrita.” D.

A relação entre aquilo que foi alegado, peticionado, contestado e decidido levanta à RPF dúvidas, que a fundamentação da sentença não dissipam, ora, essas dúvidas dificultam a estruturação do presente recurso, razão pela qual se estrutura o vício que entendemos sofre a sentença, assim como, os vícios que lhe são imputáveis no caso de o alcance da decisão não ser o que nela consta, mas o que, entendemos pretendia constar.

E.

Entende a Fazenda Pública que o douto tribunal a quo: (1) querendo escrever o que de facto escreveu, incorreu em excesso de pronúncia ferindo de nulidade a douta Sentença; (2) tendo escrito “constitui caso decidido” queria escrever “constitui caso julgado” incorreu em erro de julgamento de direito; ou (3) entendeu, conforme peticionado pelo Reclamante que o despacho reclamado violou o alcance do caso julgado da decisão do TCA Sul, também aqui incorreu em erro de julgamento de direito; e (4) a única questão susceptível de avaliação pelo Tribunal, face à petição apresentada pelo Reclamante, é a questão da verificação, ou não da prescrição, e aquela não se verifica.

F.

Concluiu a douta Sentença que o despacho que declarou a prescrição da dívida exequenda constitui caso decidido, a figura do caso decidido ou do caso resolvido é distinta do instituto do caso julgado, aquela implica tão-só que o ato adquiriu um caráter de incontestabilidade, que se não confunde com a intangibilidade do caso julgado nem inviabiliza em termos absolutos a sua revogação.

G.

Ora, a questão da força de caso julgado atribuível ao despacho que reconheceu a prescrição não se verifica, tão pouco foi trazida aos autos pelo Reclamante e não é de conhecimento oficioso, pelo que, se o Tribunal pretendia, como o escreveu, declarar a força de caso decidido ao ato de reconhecimento da prescrição, incorreu em excesso de pronúncia.

H.

O excesso de pronúncia pressupõe que o julgador vai além do conhecimento do que lhe foi pedido pelas partes, e sentencia de nulidade a sentença, nos termos do artigo 125° do CPPT.

I.

Importa pois, aliás é primordial, realçar que o que fundamentou e peticionou o Reclamante foi a violação do caso julgado, pelo despacho que revoga o despacho que reconheceu a prescrição, mas por força do caso julgado da decisão do Tribunal Central Administrativo do Sul que declarou a inutilidade superveniente da lide no processo de impugnação, e não por força do caso decido atribuível ao despacho que reconhece a prescrição.

J.

Aliás, em nenhuma alegação ou pedido o Reclamante apontou qualquer vicio ao ato reclamado (ato de revogação) por relação com o ato que reconheceu a prescrição, fosse por constituir caso decidido, caso julgado ou irrevogabilidade.

K.

A Sentença fixou-se nesta segunda vertente, ou seja, reportou a força de caso decidido ao ato que reconheceu a prescrição e que aos autos não foi trazida, nem é de conhecimento oficioso, logo ultrapassou o pedido.

L.

Entendendo-se que pretendeu a douta Sentença considerar que o despacho do órgão de execução fiscal que declarou a prescrição da dívida exequenda e extinguiu o processo de execução fiscal constitui caso julgado, não obstante tal não ser invocado pelo Reclamante, estamos perante matéria de conhecimento oficioso, nos termos dos artigos 576°, 577° alínea i) e 578° do CPC (Código de Processo Civil), aplicável por via do artigo 2° do CPPT.

M.

Ocorre que, estamos perante um ato de um chefe de Finanças, que apesar de atuar ali como órgão de execução fiscal e a execução fiscal ter natureza judicial, como bem refere a douta Sentença, trata-se de um ato de reconhecimento da prescrição, ou seja, um ato materialmente administrativo.

N.

É que, o processo de execução fiscal tem natureza judicial, na totalidade, mas a Administração Tributária pode praticar nele actos que não tenham natureza jurisdicional (art. 103°, n.° 1, da LGT), nestes inclui-se a declaração da prescrição da dívida exequenda, como se prevê expressamente no artigo 175° do CPPT, o reconhecimento da prescrição da dívida exequenda pelo órgão da execução fiscal constitui um acto de natureza administrativa, pois engloba-se no conceito definido no artigo 120° do CPA (na versão aplicável à data dos factos — atual artigo 148°), o qual refere que se consideram actos administrativos as “decisões dos órgãos da Administração que ao abrigo de normas de direito público visem produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta”.

O.

Tratando-se de um acto administrativo, não está abrangido pela força do caso julgado, prevista nos artigos 619° e 620° do CPC, pois este só se forma sobre decisões judiciais, inexistindo qualquer disposição legal que atribua idêntica força obrigatória aos actos administrativos, por outro lado, pela mesma razão de não se tratar de uma decisão judicial, não é aplicável o disposto no artigo 613° do CPC, sobre o esgotamento do poder jurisdicional.

P.

Assim, tendo a prescrição sido reconhecida por ato administrativo, está afastada a possibilidade de se formar sobre ela caso julgado que obste à posterior reapreciação da mesma questão, logo, sendo esta a intenção da douta Sentença, aqui recorrida, incorreu em erro de julgamento por violação das disposições legais supra referidas.

Q.

Entendendo-se que pretendeu a douta Sentença considerar que o despacho do órgão de execução fiscal que revogou o despacho que declarou a prescrição da divida exequenda violou o alcance do caso julgado — este sim o argumento invocado pelo Reclamante — também com esta solução não pode a Fazenda Pública conformar-se, como aliás apresentou na sua resposta.

R.

O artigo 621° do CPC sob a epígrafe “Alcance do caso julgado” dispõe que a sentença constitui caso julgado nos precisos limites e termos em que julga e tem entendido a jurisprudência que a determinação dos limites do caso julgado e sua eficácia passam pela interpretação do conteúdo da sentença, nomeadamente quanto aos seus fundamentos que se apresentem como antecedentes lógicos necessários à parte dispositiva do julgado.

S.

Ora, ao contrário do que refere a douta Sentença, início da página 16, a RPF defendeu, que este não era o meio próprio para procederem alguns dos pedidos formulados pelo Reclamante, mas também defendeu que não se verifica o alcance de caso julgado relativamente à decidida inutilidade superveniente da lide pelo Tribunal Central Administrativo do Sul e o despacho reclamado, o que aqui se reitera, porquanto o TCA Sul não procedeu a qualquer apreciação à prescrição da divida em causa, aliás como não é objeto da impugnação, ali discutia-se a legalidade das liquidações cujo não pagamento deu origem ao processo executivo aqui em causa.

T.

Ora, se nada foi alegado, peticionado, contestado e julgado, naquele processo do TCA Sul, sobre a prescrição, apenas acatado o que foi decidido por despacho do Chefe do Serviço de finanças, também nenhum alcance de caso julgado impõe sobre aquela questão, pois que, a contagem do prazo de prescrição nunca foi objeto do processo de impugnação e só sobre este assunto versa o despacho reclamado, se foi este o sentido da Sentença de que se recorre, como pensamos que foi, incorreu a mesma em erro de julgamento por violação da disposição legal referida supra.

U.

Defendeu e defende a RFP que, a única questão susceptível de avaliação pelo Tribunal, face à petição apresentada pelo Reclamante, é a questão da verificação, ou não da prescrição, e aquela não...

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