Acórdão nº 0323/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 14 de Julho de 2015

Data14 Julho 2015
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1.

RELATÓRIO 1.1. “A…………” [doravante «A…………»], devidamente identificada nos autos, instaurou no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto [«TAF/P»] a presente ação administrativa especial de pretensão conexa com normas, nos termos dos arts. 35.º, n.º 2 e 73.º, n.º 2, do CPTA, contra o atual “MINISTÉRIO DA ECONOMIA” [doravante «ME»] [então “MINISTÉRIO DAS OBRAS PÚBLICAS, TRANSPORTES E COMUNICAÇÕES”] peticionando, pela motivação inserta na petição inicial, que fosse declarada i) “ilegalidade sem força obrigatória geral” do Despacho n.º 8594/2009, de 20 de janeiro, “por forma a obter a desaplicação da norma” aos seus representados e ii) “nulidade dos atos de execução do Despacho”, bem como que fosse condenado o R. a “reconhecer e a reconstituir a situação que existiria se não tivesse sido praticado o Despacho”.

1.2.

O «TAF/P» proferiu despacho saneador, sem qualquer reclamação e/ou impugnação, onde improcedeu as exceções de ilegitimidade ativa e passiva, de “falta de pressuposto da impugnabilidade da norma” [cfr. fls. 199 e segs.] e, após decurso dos ulteriores termos, veio a prolatar acórdão, datado de 13.07.2012, julgando a ação totalmente improcedente e absolvendo o R. do pedido [cfr. fls. 312 e segs.].

1.3.

A A., inconformada, com esta última decisão recorreu para o TCA Norte o qual, por acórdão de 08.11.2013, negou provimento ao recurso jurisdicional, confirmando o julgado recorrido [cfr. fls. 444 e segs.].

1.4.

Invocando o disposto no art. 150.º do CPTA a mesma A., inconformada com o acórdão proferido pelo TCA Norte, interpôs, então, o presente recurso jurisdicional de revista [cfr. fls. 527 e segs.], apresentando o seguinte quadro conclusivo que se reproduz: “...

  1. O presente recurso de revista é interposto nos termos do artigo 150.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e tem por objeto o Acórdão recorrido.

  2. Desde 1948 até hoje, de forma ininterrupta, o RTA regula a atividade de transporte rodoviário pesado de passageiros, a qual é exercida em regime de concessão, prevendo o mesmo dois tipos: (i) concessões definitivas e (ii) concessões provisórias, como resulta dos artigos 74.º, 95.º e 96.º do RTA.

  3. Foi neste quadro jurídico (que se mantém hoje em dia) que, em 2009, o Governo publicou o Despacho 8594/2009.

  4. O Despacho 8594/2009 veio determinar que, a atribuição de novas concessões ou a renovação de concessões existentes (cujo prazo terminasse a 20 de janeiro de 2009) nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto apenas podem ser feitas em regime provisório nos termos do artigo 74.º do RTA, tendo feito cessar todas as concessões definitivas cujo prazo expirasse a partir de janeiro de 2009.

  5. O Acórdão recorrido faz uma errada aplicação das normas do § 1.º do artigo 96.º do RTA e do artigo 74.º do mesmo diploma, numa matéria em que está em causa a sobrevivência de dezenas de empresas associadas da Recorrente (todas as que operam nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto), que empregam milhares de trabalhadores, gerem uma frota de milhares de autocarros e são responsáveis pelo transporte diário de centenas de milhares de pessoas, tudo isto agravado pelo facto de o pressuposto do Despacho 8594/2009 - a preparação da transição para o novo regime jurídico da contratualização - não ter nunca ocorrido (em 2013 estamos como em 2009) e hoje todas as concessões existentes nas referidas áreas metropolitanas são «provisórias»! F. O Governo não pode, face às citadas disposições do RTA, não renovar as concessões em vigor com base no § 1.º do artigo 96.º do RTA, para logo em seguida voltar a emitir as mesmas a título provisório, nem decidir que a partir de determinada data todas as concessões a outorgar no âmbito geográfico das áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto o sejam em regime de concessões provisórias.

  6. A necessidade de o Governo levar a cabo uma revisão legislativa em matéria de transportes - através da entrada em vigor de novo regime jurídico da contratualização anunciado em 2009 e nunca concretizado - não consubstancia uma situação que, à face do artigo 74.º do RTA, permita validamente a utilização do mecanismo da concessão provisória.

  7. O Governo não pode fazer cessar todas as concessões definitivas e vir depois alegar, como faz no ponto 2 do Despacho 8594/2009, que «os serviços que se revelarem indispensáveis» são objeto de concessões provisórias.

    I. Uma interpretação e aplicação do artigo 74.º do RTA na linha da conduta seguida pelo Governo no Despacho 8594/2009 e secundada pelo Acórdão recorrido nos termos acima expostos, determina a inconstitucionalidade material da referida norma à luz do n.º 2 do artigo 266.º da Constituição da República Portuguesa.

  8. O Acórdão recorrido seguiu, a respeito da interpretação e aplicação das normas do artigo 74.º, corpo do artigo 95.º, e corpo e § 1.º do artigo 96.º todas do RTA uma interpretação e aplicação incorretas face ao respetivo teor literal e aos elementos finalístico e sistemático de tais normas.

    L. A presente matéria tem uma relevância jurídica e social fulcral porquanto todas as empresas de transporte que operam nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto vivem atualmente uma situação totalmente indefinida em termos de enquadramento jurídico porque o Governo, apoiado agora também do Acórdão recorrido, nunca aprovou o tal «novo regime de contratualização» anunciado em 2009 e mantém a prática subjacente ao Despacho 9594/2009, de emissão e renovação de concessões «provisórias».

  9. Esta indefinição jurídica promovida pelo Governo desde 2009 é nociva para o setor porquanto nenhuma empresa corre o risco de contratar mais, de investir mais, de querer crescer mais, quando vive, por força das indefinições e práticas governamentais, num ambiente totalmente incerto e precário.

  10. O Acórdão recorrido violou o disposto nos artigos 74.º, 95.º e 96.º do RTA.

  11. O Governo não podia, através de um mero despacho de um Secretário de Estado - como ocorre com o despacho n.º 8594/2009 - fixar um regime transitório entre o RTA e o alegado novo regime da contratualização que implicasse uma alteração aos termos do próprio RTA, designadamente no que se refere aos casos específicos em que este admite a atribuição de concessões provisórias.

  12. Espera a A………… que esse Venerando Tribunal, admitindo e apreciando o presente recurso de revista, traga a segurança e a clarificação jurídicas indispensáveis à atividade do transporte rodoviário pesado de passageiros em Portugal, uma vez que o Acórdão recorrido não teve engenho para tanto …”.

    1.5.

    Devidamente notificado o R., aqui ora recorrido, veio produzir contra-alegações [cfr. fls. 574 e segs.] nas quais termina com o quadro conclusivo seguinte: “…

    1. A questão jurídica in casu, não se afigura de importância fundamental com relevância jurídica ou social, …, pois apenas existe um interesse particular dos mesmos.

    2. Consideramos igualmente não haver necessidade de qualquer clarificação jurídica da atividade do transporte rodoviário pesado de passageiros em Portugal, uma vez que resulta claro que esta atividade tem sido regulada pelo RTA, e que conforme previsto na Lei n.º 1/2009, vai ser alterado pelo novo regime de contratualização, que em breve vai ser enviado para consulta pública, e cuja transição foi preparada pelo Despacho n.º 8594/2009.

    3. A decisão proferida pelo Tribunal a quo não incorreu em qualquer erro de julgamento, nomeadamente, não violou o disposto nos referidos arts. 74.º, 95.º e 96.º do RTA.

    4. Não se verificam, no caso concreto, os requisitos de admissibilidade do presente recurso de revista nos termos do artigo 150.º do CPTA.

    5. O objeto do presente recurso de revista, tal como definido pela própria recorrente, restringe-se a saber se o Governo através de um despacho podia fixar um regime transitório entre o RTA e o alegado novo regime da contratualização que implicasse uma alteração aos termos do próprio RTA, designadamente no que se refere aos casos específicos em que se admite a atribuição de concessões provisórias, e sobre esta questão o Tribunal a quo pronunciou-se de forma clara e fundamentada.

    6. Muito embora a recorrente possa discordar do entendimento do Tribunal a quo, até porque não lhe é favorável, tal não basta para que seja admitido o presente recurso de revista, com fundamento numa clara necessidade de melhor aplicação do direito, uma vez que o direito é claríssimo quanto à questão em apreço.

    7. Após a publicação da Lei n.º 1/2009...

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