Acórdão nº 01026/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 03 de Junho de 2015

Magistrado ResponsávelTERESA DE SOUSA
Data da Resolução03 de Junho de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal administrativo 1. Relatório A………., SA, identificada nos autos, interpôs o presente recurso do acórdão da Secção que, indeferindo a reclamação deduzida pela Recorrente, manteve o despacho do Relator que julgara o STA incompetente em razão da matéria para conhecer da acção administrativa especial interposta e, consequentemente, absolvera da instância o Conselho de Ministros.

Em alegações a recorrente formula as seguintes conclusões: 1.ª Para sustentar que o ato impugnado, constante do artigo 3.°, n.° 1, alínea a), e n.° 2, do Decreto-Lei n.° 35/2013, de 28 de fevereiro, que encurtou de 35 para 25 anos o prazo ao abrigo do qual a ora Recorrente vem explorando as PCH de que é titular, é um ato administrativo sob forma legislativa é preciso demonstrar qual a norma legal pré-existente que o citado artigo 3.°, n.° 1, alínea a), e n.° 2, supostamente executa, ou a cujas opções políticas se submete.

  1. a A norma legal pré-existente que o citado artigo 3.°, n.° 1, alínea a), e n.° 2, executa é a norma do n.° 20, alínea b), do anexo II do Decreto-Lei n.° 189/88, de 27 de maio, na redação do Decreto-Lei n.° 33-A/2005, de 16 de fevereiro, alterado pelo Decreto-Lei n.° 225/2007, de 31 de maio, e mantido pelo próprio Decreto-Lei n.° 35/2013, de 28 de fevereiro, que estabeleceu um prazo máximo de 25 anos a contar da licença de exploração para aplicação do regime remuneratório definido nesse mesmo anexo às PCH.

  2. a Todavia, ao executar essa norma pré-existente, o Governo desrespeitou os mais elementares princípios do Estado de direito, designadamente previstos no artigo 6.°-A do CPA, que regem a aplicação no tempo dos atos administrativos, princípios esses que o próprio legislador havia respeitado anteriormente, através do artigo 4.° do Decreto-Lei n.° 33-A/2005, de 16 de fevereiro, o artigo 4.° do Decreto-Lei n.° 225/2007, de 31 de maio, e o artigo 15.°, n.° 4, do Decreto-Lei n.° 215-B/2012, de 8 de outubro, preceitos que salvaguardaram a aplicação do regime remuneratório pelo prazo de 35 anos às PCH licenciadas antes da entrada em vigor do Decreto-Lei n.° 33-A/2005, de 16 de fevereiro, apesar de este último diploma ter reduzido tal prazo para o futuro.

    4.ª Caso se entenda que o ato impugnado não aplica uma norma legal pré-existente a um caso concreto, então não poderá deixar de se admitir que o mesmo consubstancia uma lei-medida ou uma lei individual, que define a situação jurídica de um grupo de casos concretos, com referência a destinatários individualizáveis, pelo que a sua exclusão da jurisdição administrativa, ao abrigo do disposto no artigo 4.°, n.° 2, alínea a), do ETAF não pode ser feita sem que previamente se averigue se o ato em causa é configurável como um ato legislativo individual que restringe direitos, liberdades e garantias e se existe alguma outra via para impugnar judicialmente o mesmo ato, sob pena de se abrir uma brecha inaceitável nos princípios da constitucionalidade dos atos do poder público e da tutela jurisdicional efetiva, consagrados nos artigos 3.°, n.° 3, 18.°, n.° 3, 20.° e 268.°, n.° 4, da Constituição.

  3. a Ao considerar que o ato impugnado não é um ato administrativo sob forma legislativa, mas um verdadeiro ato legislativo, assim se declarando incompetente para o conhecimento da presente ação, a decisão recorrida viola o disposto nos artigos 4.°, n.° 2, alínea a), do ETAF, 268.°, n.° 4, da Constituição e 52.°, n.° 1, do CPTA.

  4. a A decisão recorrida interpreta e aplica o disposto no artigo 4.°, n.° 2, alínea a), do CPTA no sentido de que, concluindo-se que o ato impugnado tem natureza legislativa, a sua sindicância não cabe no âmbito da jurisdição administrativa, sem que seja necessário apurar qual a exata espécie dentro do género legislativo que está em causa, designadamente uma lei-medida ou uma lei individual restritiva dos direitos, liberdades e garantias, o que se mostra violador dos princípios da constitucionalidade e da tutela jurisdicional efetiva, consagrados nos artigos 3.°, n.° 3, 18.°, n.° 3, 20.° e 268.°, n.° 4, da Constituição.

  5. a A interpretação e aplicação do artigo 4.º, n.º 2, alínea a), do ETAF, consubstanciada na exclusão da jurisdição administrativa de um ato legislativo, sem averiguar se o mesmo reveste natureza individual e concreta restritiva de direitos e princípios consagrados na Convenção Europeia dos Direitos do Homem, viola ainda o respetivo artigo 13.º, sobre o direito a um recurso efetivo, em conjugação com o artigo 1.º do Protocolo l da mesma Convenção, sobre a proteção da propriedade privada.

    Em contra-alegações o Conselho de Ministros formulou as seguintes conclusões: 1.1.

    A qualificação dos comandos impugnados, inseridos no DL n.º 35/2013, de 28 de fevereiro, como atos administrativos, sob forma de lei ou verdadeiros enunciados de natureza legislativa, pressupõe o preenchimento de todos os critérios legais que definem o ato administrativo: orgânico, formal, estrutural, e sobretudo, material; 1.2.

    Um enunciado materialmente legislativo exprime a vontade política primária da comunidade, definindo o que esta assume ser o interesse geral, ao passo que um enunciado de natureza administrativa desempenha um papel condicionado e subordinado de concretização, de realização prática do interesse geral superiormente definido pelo legislador. A lei cria Direito; o ato administrativo aplica-o, sendo que a sujeição mais direta da lei ao princípio da constitucionalidade é um reflexo - e não a causa - dessa circunstância, pelo que essa sujeição não serve como critério de distinção entre lei e ato administrativo; 1.3.

    Os comandos do art. 3.º, n.º 1, al. a), e n.º 2 do DL n.º 35/2013, de 28 de fevereiro, não executam qualquer norma legal pré-existente, não sendo, portanto, aplicável o artigo 6.º-A do CPA; 1.4.

    A sugestão de que a norma legal supostamente executada é aquela que consta do n.º 20 do anexo II do DL n.º 189/88, de 27 de maio, na versão...

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