Acórdão nº 045/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 25 de Junho de 2015

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução25 de Junho de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de impugnação judicial com o n.º 534/12.4BELLE 1. RELATÓRIO 1.1 A sociedade denominada “A…………, S.A.” (a seguir Impugnante ou Recorrente) recorre para este Supremo Tribunal Administrativo da sentença por que a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, considerando verificada a excepção da caducidade do direito de acção, absolveu o Município de Albufeira (a seguir Recorrido) do pedido na impugnação judicial que aquela sociedade deduziu contra a liquidação de taxas de águas residuais, de resíduos sólidos e de recursos hídricos-saneamento que lhe foi efectuada pelo Município, na sequência da formação do indeferimento tácito da reclamação graciosa apresentada contra o mesmo acto tributário.

1.2 O recurso foi admitido, com subida imediata, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo e a Recorrente apresentou a motivação do recurso, que resumiu em conclusões do seguinte teor (Porque usamos o itálico nas transcrições, os excertos que estavam em itálico no original surgirão, aqui como adiante, em tipo normal.

): «1. A sentença recda. parte do pressuposto de ser aplicável ao caso em apreço o regime da Lei n.º 53-E/2006, designadamente o seu art. 16.º, por considerar estar em causa «a impugnação da liquidação de taxas referentes a saneamento, emitidas pela Câmara Municipal de Albufeira».

  1. A sentença reclamada desconsidera a coexistência de duas normas aparentemente contraditórias, isto é, desconsidera que, apesar de no Regulamento das Taxas Locais, aprovado pela Lei n.º 53-E/2006, se prever, no art. 16.º, um prazo de 60 dias para a impugnação judicial do acto de liquidação de «taxas para as autarquias locais», já na Lei das Finanças Locais, aprovada pela Lei n.º 2/2007, se concede um prazo de 90 dias para o mesmo fim, isto é, para a impugnação judicial de actos de liquidação de «taxas, encargos de mais-valias e demais receitas de natureza tributária», pelo que, no presente caso, importava determinar qual das duas leis se deve aplicar.

  2. Sendo a Lei n.º 2/2007 posterior à Lei n.º 53-E/2006, poderá entender-se que o art. 56.º da Lei n.º 2/2007 revogou o art. 16.º da Lei 53-E/2006, até por o primeiro ter um âmbito mais amplo que o segundo e nele serem expressamente referidas as taxas como um dos tributos passíveis de impugnação judicial nos termos do CPPT, o que significaria que, prevalecendo o prazo de 90 dias previsto no aludido art. 56.º sobre o prazo de 60 dias previsto no art. 16.º do RTL, a presente impugnação judicial foi apresentada tempestivamente, improcedendo, por isso, a excepção de caducidade do direito à acção da ora reclamante.

  3. Porém, ainda que assim não se entenda, o que apenas como hipótese se refere, sem conceder, e se considere que o art. 16.º da Lei n.º 53-E/2006 integra norma especial relativamente ao art. 56.º da Lei das Finanças Locais, a supra mencionada conclusão de improcedência da excepção de caducidade não seria afectada, uma vez que a primeira das mencionadas leis apenas tem por objecto taxas das autarquias locais e não outro tipo de receitas das autarquias, pelo que o regime previsto na Lei n.º 53-E/2006, e, em particular, as normas contidas no seu art. 16.º, apenas são aplicáveis quando se estiver em presença de uma taxa das autarquias locais, isto é, quando se estiver em presença de uma receita recondutível ao conceito previsto no art. 3.º do RTL e explicitado no art. 6.º do mesmo diploma.

  4. Não obstante o Município, ora reclamado, qualificar de forma muito confusa e contraditória o facto gerador da liquidação ora em apreço, a verdade é que é indubitável que a quantia que pede se deve ou à prestação de serviços de abastecimento público de água, ou à prestação de serviços de saneamento de águas residuais e gestão de resíduos sólidos.

  5. A correcta interpretação e aplicação do preceituado na Lei n.º 53-E/2006, maxime os seus arts. 1.º, 3.º e 6.º, e na Lei n.º 2/2007, maxime os seus arts. 10.º, 15.º e 16.º, deve levar à conclusão de que a contrapartida devida pelos referidos serviços se deve qualificar como preço ou tarifa e não como taxa.

  6. E assim sendo, não pode deixar de se concluir que ao caso dos autos é aplicável o regime de garantia dos particulares previsto na Lei das Finanças Locais e não o previsto na Lei n.º 53-E/2006, do que decorre que a presente impugnação foi apresentada tempestivamente, nos termos do preceituado no art. 56.º da Lei n.º 2/2007, conjugado com o preceituado no art. 102.º do CPPT, pelo que improcede a excepção de caducidade deduzida.

    Termos em que, com o douto suprimento de V. Excelências a quanto alegado, deve ser dado provimento ao presente recurso, com as demais consequências legais».

    1.3 O Município de Albufeira apresentou contra-alegações, pugnando pela manutenção da sentença.

    1.4 Recebidos neste Supremo Tribunal Administrativo, os autos foram com vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que seja negado provimento ao recurso e confirmada a decisão recorrida, se bem que com fundamentos não coincidentes na íntegra. Isto com a seguinte fundamentação: «1. O termo preços utilizado no art. 16.º da Lei das Finanças Locais (aprovada pela Lei n.º 2/2007,15 Janeiro), correspondente à contrapartida remuneratória da actividade de exploração de sistemas municipais ou intermunicipais de abastecimento público de água, saneamento de águas residuais e gestão de resíduos sólidos a cobrar pelos municípios, equivale ao conceito de tarifa usado nas anteriores Leis de Finanças Locais, a que a doutrina e a jurisprudência reconheciam a natureza de taxas (acórdão STA Pleno SCT 10 Abril 2013 processo n.º 15/12; na doutrina Sérgio Vasques Manual de Direito Fiscal Almedina 2012 p. 208).

  7. O indeferimento tácito da reclamação graciosa apresentada perante o órgão que efectuou a liquidação das taxas para a autarquia local verifica-se no prazo de 60 dias, contado a partir da data da apresentação da petição e não a partir da data em que o sujeito passivo se pronunciou no exercício do direito de audiência (art. 16.º n.º 3 Regime Geral das Taxas das Autarquias Locais, aprovado pela Lei n.º 56-E/2006, 29 Dezembro RGTAL) Do indeferimento tácito ou expresso cabe impugnação judicial para o tribunal fiscal da área do município, no prazo de 60 dias a contar do indeferimento (art. 16.º n.º 4 RGTAL). Este regime especial prevalece sobre o regime constante do art. 56.º n.º 1 Lei n.º 2/2007, 15 Janeiro, Lei das Finanças Locais (LAL) e do art. 57.º n.ºs 1 e 5 LGT, diplomas de aplicação subsidiária (art. 2.º als. a) e b) LAL).

  8. No caso concreto a petição apresentada em 3 Setembro 2012 é intempestiva, em consequência de: a) apresentação da reclamação graciosa em 31 Outubro 2011 (probatório al. B); b) formação da presunção de indeferimento tácito em 30 Dezembro 2011 (art. 16.º n.º 3 RGTAL)».

    1.5 Colheram-se os vistos dos Juízes Conselheiros adjuntos.

    1.6 A questão que cumpre apreciar e decidir é a de saber se a sentença fez errado julgamento ao considerar caducado o direito de impugnar, o que, como procuraremos demonstrar, impõe que se estabeleça se esse prazo é o de 60 dias, previsto no art. 16.º do Regime Geral das Taxas das Autarquias Locais (RGTAL), aprovado pela Lei n.º 53-E/2006, de 29 de Dezembro, ou o de 90 dias estabelecido no art. 102.º do CPPT, aplicável ex vi do n.º 1 do art. 56.º da Lei das Finanças Locais, aprovada pela Lei n.º 2/2007, de 15 de Janeiro, o passa por indagar da natureza da prestação exigida pelo Município de Albufeira à Impugnante: preço ou taxa? * * * 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 DE FACTO A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé efectuou o julgamento da matéria de facto nos seguintes termos: «[…] para apreciação da excepção invocada [caducidade do direito de acção], desde já se consideram provados os seguintes factos: A) A Impugnante foi notificada, após auto de vistoria, do ofício com a referência S-CMA/2011/13025 Águas, de 04/10/2011 para “proceder ao pagamento da importância de € 8.982,20” (cfr. fls. 19 a 29 dos autos); B) Em 31/10/2011, a Impugnante apresentou reclamação (cfr. fls. 30 a 34 dos autos); C) Em 23/11/2011, a reclamação apresentada obteve o seguinte despacho: “(…) Reitere-se o conteúdo da última comunicação sobre este assunto efectuada ao requerente” (cfr. fls. 35 dos autos); D) Em 30/11/2011 foi enviado, pelo Município de Albufeira, à Impugnante, o ofício com a referência S-CMA/2011/15444 Águas a informá-la do despacho referido na alínea anterior (cfr. fls. 35 dos autos); E) Em 19/12/2011 foi enviada pela Impugnante ao Município de Albufeira um requerimento onde consta o seguinte: “Nestes termos, e em face das omissões supra-relevadas, requer-se a V. Exa., nos termos e para os sujeitos do preceituado no art. 37.º n.ºs 1 e 2 do CPPT, se digne ordenar a notificação dos requisitos omitidos ou a passagem de certidão que os contenha” (cfr. fls. 41 e 42 dos...

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