Acórdão nº 0808/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 21 de Outubro de 2015

Magistrado ResponsávelPEDRO DELGADO
Data da Resolução21 de Outubro de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: I – Vem a Fazenda Pública, recorrer para este Supremo Tribunal: a) do despacho do Mº Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, proferido a fls. 305 dos autos de recurso de contra-ordenação nº 1072/14.6 BEPNF, decisão essa que admitiu liminarmente o recurso de contra-ordenação deduzido por A………. de decisão de aplicação de coima por falta de pagamento de taxas de portagens e ordenou a apensação de todos os processos de recurso de contra-ordenação instaurados pela mesma recorrente naquele Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel; b) - da decisão do mesmo Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, de 3 de Março de 2015, proferida a fls. 333 e seguintes, que, ao abrigo do disposto nos artigos 63.º, n.ºs 1, d), 3 e 5 e 79.º, n.ºs 1, alínea b) e 2 do RGIT, julgou verificada nulidade insuprível do processo de contra-ordenação, anulando as decisões de aplicação das coimas dos autos e dos processos apensados, bem como os ulteriores termos do processo.

Termina as suas alegações de recurso do despacho de fls. 305 formulando as seguintes conclusões: A. Vem o presente recurso interposto do douto despacho que admitiu liminarmente o recurso apresentado pelo arguido, o qual se circunscreve à questão de direito da decisão de apensação, determinada pelo Meritíssimo Juiz a quo, de todos os processos de recurso de contra-ordenação que lhe foram distribuídos, do mesmo recorrente, o que resultou na apensação de 46 processos de contra-ordenação aos presentes autos.

B. Para assim decidir, considerou o Tribunal a quo, que “Este tribunal tem conhecimento que lhe foram distribuídos inúmeros processos de recurso de contra-ordenação pela mesma recorrente. Todos esses recursos são legais, tempestivos e obedecem às exigências legais, pelo que admito liminarmente esses recursos (arts. 63º, nº 1, do RGIMOS, 3º, alínea b), e 80º, nº 1 do RGIT) e determino a sua apensação a estes autos”, determinando consequentemente, a apensação de 46 processos a estes autos.

C. Quanto à legitimidade da Fazenda Pública para interpor o presente recurso, importa ter em conta que, com a proposta de Lei n.º 496/2012, de 10 de Outubro de 2012, de aprovação do Orçamento do Estado para 2013, foi alterada a redacção do art. 83.º do RGIT, passando o representante da Fazenda Pública, por força do nº 1 da referida norma, a ter legitimidade para interpor recurso da decisão proferida pelo tribunal, ampliando-se, deste modo, a sua possibilidade de intervenção no processo de contra-ordenação, que antes se limitava à produção de prova, nos termos do art. 81º, nº 2 do RGIT.

D. Deste modo, e tendo em conta a unidade do sistema jurídico e a aplicação subsidiária do RGCO neste âmbito, por força do art. 3º, alínea b) do RGIT, com a alteração legislativa ocorrida, a Fazenda Pública tem também legitimidade para recorrer nos recursos de processos de contra-ordenação tributária, ao abrigo do nº 2 do art. 73º do RGCO.

E. Observa-se de perto, quanto a esta questão, o douto entendimento dos Conselheiros Jorge Lopes de Sousa e Simas Santos em “Regime Geral das Infracções Tributárias anotado”, 4 a edição, 2010, em anotação ao art. 83º, página 562 e seguintes, que se transcreve: “Porém, em matéria de direito sancionatório, não será compreensível que não exista também uma válvula de segurança do sistema de alçadas que permita assegurar a realização da justiça pelo menos em casos em que se esteja perante uma manifesta violação do direito, sendo esta possibilidade uma exigência do direito de defesa constitucionalmente consagrado.

Por isso, deve-se concluir que será aplicável subsidiariamente o preceituado no nº 2 do art. 73º do RGCO.” F. Quanto à subida imediata do presente recurso, entende a Fazenda Pública que, no regime previsto no artº.84, do R.G.I.T., complementado pelo R.G.C.O., não é possível a execução das coimas e sanções acessórias antes do trânsito em julgado ou de se ter tornado definitiva a decisão administrativa que as aplicar, sendo esta a única interpretação que assegura a constitucionalidade material deste artº.84, do R.G.I.T., nos casos em que o recurso é interposto de decisão condenatória, assim não sendo necessário a prestação de garantia para que o mesmo recurso goze de efeito suspensivo da decisão recorrida — conforme se doutrinou no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 15-11-2011, processo nº 04847/11; e na esteira do entendimento dos Conselheiros Jorge Lopes de Sousa e Simas Santos em “Regime Geral das Infracções Tributárias anotado”, 40 edição, 2010, em anotação ao art. 84º, página 582 e seguintes.

G. Neste sentido, não deverá ser considerada exequível para efeitos de decisão de instauração de processo de execução fiscal, a decisão judicial proferida nestes autos que decidiu apensar todos os recursos de contra-ordenações do mesmo recorrente, face à pendência do presente recurso, sob pena de se afectar o efeito útil do mesmo.

H. Especificando o que para aqui releva, quanto à apensação de vários processos de contra- ordenação e por forma a evitar neste âmbito a formação de caso julgado parcial, entende a Fazenda Pública, salvo melhor opinião, que não pode proceder o argumento expendido no douto despacho a quo, não se conformando a Fazenda Pública com o mesmo e considerando que tal despacho padece de erro de direito, urgindo assim, a promoção da uniformização da jurisprudência face ao inerente perigo de repetição e desigualdade na aplicação entre os diversos tribunais tributários de 1ª instância, tudo nos termos do disposto no art. 83º do RGIT, em conformidade com o art. 73º, nº 2 do RGCO, aplicável por força da alínea b) do art. 3º do RGIT — cfr. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 07-11- 2012, proc. 0704/12; Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 17-01-2007, proc. 01124/06.

I. A decisão subjacente o douto despacho a quo, de apensação de 46 processos de contra- ordenação distribuídos ao Meritíssimo Juiz a quo, aos presentes autos, tem unicamente em conta, quanto ao elemento de conexão existente entre os mesmos, a identidade do arguido.

J. No caso de processos de contra-ordenação tributários, é aplicável o RGIT e subsidiariamente o RGCO, aprovado pelo Decreto-Lei nº 433/82, de 27 de Outubro, que contém norma específica no seu art. 3º, alínea b), sendo que não existe nestes diplomas, norma legal que preveja a apensação de processos de contra-ordenação.

K. O artigo 36º do RGCO, aplicável subsidiariamente ao RGIT, prevê a competência por conexão” em caso de concurso efectivo de contra-ordenações.

L. Neste âmbito importa observar o entendimento do Ilustre Juiz do TEDH Paulo Pinto de Albuquerque, in “Comentário do Regime Geral das contra-ordenações à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem”, Universidade Católica Editora, 2011, em anotação ao art. 36º, p. 128: “O critério do artigo 36º só opera relativamente aos processos que se encontrem na fase administrativa. (...) Na fase judicial, a conexão rege- se pelo disposto nos artigos 24º e seguintes do CPP.” M. Assim, por força do disposto no art. 41º do RGCO, quanto à unidade e apensação de processos, terá de se recorrer aos preceitos reguladores do processo criminal, ou seja, às normas do Código de Processo Penal (CPP).

N. Perscrutado o referido diploma legal, temos que, quanto aos casos de conexão inerentes à apensação de processos, as situações são exclusivamente as previstas no seu art. 24º.

O. As infracções por falta de pagamento de taxas de portagens, como as dos presentes autos e dos autos ora apensados, não são cometidas através da mesma acção, na mesma ocasião ou lugar, não sendo também umas, causa ou efeito das outras, nem se destinando umas, a continuar ou a ocultar as outras, não sendo praticadas por vários agentes em comparticipação, não se verificando igualmente qualquer outra das condições aí taxativamente previstas - Cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 12/12/2013, proc. nº 07056/13.

P. Quanto à conexão subjectiva que sustentou a opção do Meritíssimo Juiz a quo, salvaguarda- se que o art. 25º do Código de Processo Penal, limita-se a ampliar o critério de conexão subjectivo determinado no art. 24º, a todos os crimes cometidos na área de uma mesma comarca, da competência de diferentes tribunais dessa área, mas não prescinde, salvo melhor opinião, dos critérios de conexão processual subjectiva do art. 24º, sob pena de essa taxatividade perder toda a razão de ser, e se permitir mais, quando os crimes são do conhecimento de dois ou mais tribunais, com sede na mesma comarca, do que quando a apreciação da ocorrência de mais do que um crime cometido pelo mesmo agente é da competência do mesmo tribunal.

Q. O elemento subjectivo por si só não sustenta a conexão de processos, impondo a lei a verificação de algum dos elementos taxativos no art. 24º do CPP.

R. E neste pressuposto, só o funcionamento da conexão permite a apensação de processos, nos termos do nº 1 do artigo 29º do mesmo diploma legal, que tem em vista a economia processual e uniformidade de julgamento, mas impõe-se que se verifiquem, desde logo, os elementos objectivos de conexão tipificados na lei, o que não ocorre in casu.

S. No caso em apreço, os processos apensados correspondem ao levantamento de vários autos de notícia, autónomos entre si, face aos restantes, que deram lugar a diversos e independentes processos de contra-ordenação, aos quais, por decisão de condenação, foi aplicada a coima respectiva, ainda não transitada em julgado.

T. Sucede que, os 47 processos de contra-ordenação em apreço, não foram apensados pela autoridade tributária, mantendo autonomia entre si.

U. Com todo o respeito que nos merece a fundamentação expendida pelo douto Tribunal a quo, entende a Fazenda Pública que a apensação dos processos determinada pelo Meritíssimo Juiz a quo, não tem sustentação legal, pelo que não poderá a decisão do tribunal de 1ª instância versar numa única...

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