Acórdão nº 0969/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 29 de Janeiro de 2015

Magistrado ResponsávelCARLOS CARVALHO
Data da Resolução29 de Janeiro de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1.

RELATÓRIO 1.1. A……….

, devidamente identificado nos autos, instaurou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro [doravante «TAF/A»] e nos termos do art. 48.º do DL n.º 503/99, a presente ação administrativa urgente contra “MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA” [abreviadamente «MAI»], peticionando, pela motivação inserta na petição inicial de fls. 02/06 [ilegalidade: violação dos arts. 15.º e 19.º do DL n.º 503/99 e 23.º do DL n.º 299/09], que fosse o R. condenado a pagar-lhe “o suplemento de turno desde março de 2010 inclusive até à data da alta clínica … (25.10.2010), período em que esteve de baixa médica decorrente das lesões sofridas em acidente de serviço”, bem como o “suplemento de turno desde 26.10.2010 até à presente data” e a “retomar o pagamento mensal do suplemento de turno”.

1.2.

O «TAF/A», por sentença de 31.12.2013, julgou a ação improcedente, considerando totalmente improcedente a pretensão, absolvendo o R. dos pedidos.

1.3.

O A., inconformado, recorreu para o TCA Norte o qual, por acórdão de 15.05.2014, negou provimento ao recurso jurisdicional.

1.4.

Invocando o disposto no art. 150.º do CPTA o mesmo, inconformado com o acórdão proferido pelo TCA Norte, interpôs, então, o presente recurso jurisdicional de revista apresentando o seguinte quadro conclusivo que se reproduz [cfr. fls. 246 e segs.

- paginação processo suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário]: “...

CONCLUSÕES 1. À data do acidente em serviço o recorrente exercia as funções de comandante da esquadra de ………….. e integrava a escala de Oficial de Serviço, recebendo, para além da remuneração base, os competentes suplementos com caráter permanente sobre os quais incidiam descontos para a Segurança Social (CGA), onde se incluía o de turno, este último desde 01.08.2004.

  1. De acordo com o disposto no art. 15.º e no art. 19.º, n.º 1 do DL 503/99, de 20 de novembro, o recorrente tinha direito a continuar a receber o suplemento de turno até 25.10.2010, data em que cessaram as faltas ao serviço resultantes de incapacidade temporária absoluta motivadas por acidente em serviço.

  2. Por força da entrada em vigor do DL 299/09, de 14 de outubro - 01.01.2010 - o suplemento de turno abonado aos oficiais que exercessem funções de oficial de serviço passou a ser abonado a título de suplemento de piquete. No entanto, nas novas funções em que foi investido, em consequência das lesões de que ficou a padecer decorrentes do acidente em serviço, o recorrente não pode integrar a escala de oficial de serviço, pelo que não recebe o suplemento de piquete.

  3. Não fora o acidente, e em situação normal, o recorrente continuaria a exercer as suas funções como comandante e as de oficial de serviço, recebendo o suplemento de turno; com a entrada em vigor do DL 299/09, receberia o suplemento de piquete.

  4. Estamos perante uma situação de um acidente qualificado como ocorrido em serviço de que resultou uma incapacidade de 72,8%, pelo que, face a letra e ao espírito consubstanciados no art. 23.º, n.ºs 3, 4 e 5 do DL 503/99, de 20 de novembro, o recorrente tem, efetivamente, direito a receber o suplemento de turno que lhe era processado e pago à data do acidente em serviço.

  5. Aliás, a recorrida sempre subscreveu este entendimento Parecer emitido pelo Técnico Superior da Direção Nacional, …………, em 05.03.2010, número 1985/DAARH/2010 - Doc. 2 - «A continuidade na perceção dos suplementos afere-se no momento em que ocorre o acidente. Assim, se o trabalhador auferia o suplemento de turno, deverá manter esse abono, ainda que, nos termos da nova legislação não subsistam os pressupostos para a sua atribuição ou mude de local de trabalho» - sublinhado nosso - vide alínea M) dos factos assentes - e que foi notificado ao ora recorrente com a proposta de indeferimento do requerimento do suplemento de piquete.

  6. Acresce que no processo que correu termos sob o n.º 513/11.9BELRA, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, a recorrida foi condenada a pagar o subsídio de turno muito para além da entrada em vigor do DL 299/09, de 14 de outubro, a pessoa que, antes do acidente em serviço, exercia as mesmas funções que o ora recorrente, por ser esse o suplemento que auferia à data do acidente, tendo-se conformado com tal decisão - cfr. cópia da sentença junta aos presentes autos em 19.09.2013.

  7. Em 27.02.2008 foi publicada a Lei 12-A/2008, que estabelece os regimes de vinculação, de carreiras e de remunerações dos trabalhadores que exercem funções públicas, prevendo o n.º 1 do art. 112.º a revisão dos suplementos remuneratórios criados por lei especial, e o n.º 2 a salvaguarda das situações em que fossem extintos suplementos.

  8. O DL 299/09, de 14 10 - Estatuto da PSP - veio rever os suplementos remuneratórios para a PSP, mantendo o caráter permanente do suplemento de turno, mas alterando os pressupostos da sua atribuição, retirando-o aos oficiais que exerciam as funções do A., e substituindo-o pelo suplemento de piquete, atribuindo a este caráter excecional, pois é pago em função do trabalho efetivamente prestado.

  9. O art. 121.º, n.ºs 2 e 3 daquele DL 299/09 salvaguardou as situações já existentes relativamente aos suplementos remuneratórios que extinguiu, mas, não salvaguardou as situações de sinistrados em serviço antes da entrada em vigor daqueles diplomas legais, que deixaram de reunir os pressupostos para auferirem o suplemento de turno, deixando de o receber, e que, por causa das lesões de que ficaram a padecer, não podem prestar o serviço efetivo que lhes daria direito a um suplemento que tem caráter excecional - o suplemento de piquete.

  10. A decisão de que se recorre, ao considerar que a alteração legislativa operada pelo DL 299/09, durante a baixa médica do A., se aplica, sem qualquer restrição, sem ponderação do espírito do legislador do DL 503/99 (art. 23.º), do disposto no art. 59.º, n.º 1, alínea f) da CRP e do princípio da segurança jurídica, é ilegal.

  11. A manter-se a decisão de que se recorre, um sinistrado em acidente de serviço de que resultou uma elevada incapacidade, estando de baixa médica ou tendo vindo já a ser reintegrado, estando a receber um suplemento remuneratório em virtude de categoria por causa de cuja integração ou titularidade adquiriu direito a ele, pode ver reduzida a sua remuneração e a futura pensão de reforma, por aplicação «cega» de uma alteração legislativa que não salvaguardou essas situações de incapacidade, desvirtuando, dessa forma, a vontade do legislador do DL 503/99, de 20.11 e do legislador constitucional.

  12. Com tal alteração/redução, as expectativas, juridicamente criadas, dos sinistrados em serviço que exercessem funções iguais ou similares às do A., ficaram frustradas.

  13. A proteção da confiança dos cidadãos e da comunidade na ordem jurídica na atuação do Estado obriga este, para que a vida em comunidade decorra com normalidade e sem sobressaltos, à garantia de um mínimo de certeza e de segurança do direito das pessoas e das expectativas que lhes são juridicamente criadas.

  14. Com tal alteração legislativa, as expectativas, juridicamente criadas, dos sinistrados em serviço que exercessem funções iguais ou similares às do A., ficaram frustradas, desvirtuando-se, dessa forma, a vontade do legislador do DL 503/99, de 20.11.

  15. Ao negar ao recorrente o direito de continuar a receber o suplemento de turno, o acórdão de que se recorre violou o disposto nos artigos 15.º, 19.º e 23.º do DL 503/99, art. 59.º, n.º 1 alínea f) da CRP e o princípio constitucional da segurança jurídica.

  16. O A. alegou na p.i., estar isento do pagamento de custas, nos termos do disposto no art. 48.º, n.º 2, do DL 503/99, de 20 de novembro, cfr. foi decidido nos Acs. STA de 01.02.2011, proc. 0612/10; TCAS de 18.12.2008, proc. 04278/08, TCAN de 27.10.2011, proc. 00722/09.0BEPNF; TCAN de 12.03.2009, proc. 0318/06.4BEPRT; TCAN de 25.07.2009, proc. 731/08.7BEPRT; TC Acórdão de 19.10.2010, proc. 25/10, todos in www.dgsi.pt.

  17. A decisão proferida em primeira instância foi no sentido de o isentar, conforme requerido, isto é, nos termos do disposto no art. 48.º, n.º 2, do DL 503/99, de 20.11, decisão essa que não foi questionada, já que transitou em julgado, devendo manter-se, sob pena de violação do disposto no art. 576.º do CPC …”.

    Termina peticionando, na procedência do recurso, a revogação da decisão judicial recorrida com condenação do R. nos termos constantes da petição inicial.

    1.5.

    Devidamente notificado o R., aqui ora recorrido, não veio produzir contra-alegações [cfr. fls. 269 e segs.].

    1.6.

    Pelo acórdão da formação de apreciação preliminar deste Supremo Tribunal prevista no n.º 5 do art. 150.º do CPTA, datado de 30.09.2014, veio a ser admitido o recurso de revista.

    1.7.

    O Digno Magistrado do Ministério Público junto deste Supremo Tribunal, notificado nos termos e para os efeitos do disposto nos arts. 146.º, n.º 2, e 147.º, n.º 2, ambos do CPTA, emitiu parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso [cfr. fls. 288 a 294], pronúncia essa que, objeto de contraditório, não mereceu qualquer resposta [cfr. fls. 295 e segs.].

    1.8.

    Sem vistos, dado o disposto no art. 36.º, n.ºs 1 e 2 do CPTA e 48.º do DL n.º 503/99, cumpre decidir em Conferência.

  18. DAS QUESTÕES A DECIDIR No essencial, constitui objeto de apreciação nesta sede o alegado erro de julgamento suscitado pelo A., aqui recorrente, dado discordar do decidido por entender haver violação dos arts. 15.º, 19.º e 23.º todos do DL n.º 503/99 [em articulação com o DL n.º 299/09], 59.º, n.º 1, al. f) da CRP e do princípio constitucional da segurança jurídica [cfr. alegações e demais conclusões supra reproduzidas].

  19. FUNDAMENTAÇÃO 3.1.

    DE FACTO Resulta da decisão recorrida como assente nos autos [retificados os meros lapsos de escrita n.º XXIII) quanto ao suplemento em ali questão “turno” e não “piquete” e à data aposta «18.11.2012» e não «29.11.2011»...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT