Acórdão nº 041/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 12 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelMARIA BENEDITA URBANO
Data da Resolução12 de Março de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I – Relatório 1.

O Estado português (EP), representado pelo Ministério Público (MP), recorreu para este Supremo Tribunal do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS), de 12.03.13, invocando para o efeito o n.º 1 do artigo 150.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA).

1.1.

O recorrente apresentou alegações, concluindo, no essencial, do seguinte modo (fls 317 e ss): 1. “O pedido de condenação formulado contra o R. radica, apenas, num suposto dever de indemnizar directamente ancorado no artigo 22.º da Constituição e tem como pressuposto a responsabilidade civil extracontratual do Estado pela omissão de medidas legislativas necessárias para tornar exequível o direito previsto na alínea e) do n.º 1 do art. 59.º da CRP, relativamente a funcionários da administração pública, baseando-se no Acórdão n.º 474/2002 do Tribunal Constitucional”.

  1. “A atribuição do subsídio de desemprego não é automática, sendo que todos os diplomas legais que o regulavam e o regulam, fazem depender tal atribuição de diversos pressupostos, nomeadamente, da situação de desemprego, da apresentação de requerimento/pedido pelo trabalhador (a qual marca o início do direito ao subsídio), da situação de desempregado da inscrição prévia do trabalhador como candidato a emprego no centro de emprego na sua área de residência, dos descontos enquanto foi trabalhador para a segurança social.

  2. A aplicação directa de normas constitucionais apenas é possível quando se trate de direitos, liberdades e garantias, pelo que não sendo o caso do art.º 22.º da CRP, este não pode ser directamente aplicável à situação sub judice.

  3. É inaplicável directamente ao caso, o art.º 22.º da CRP, também porque este dispositivo legal apenas estabelece um princípio geral, não sendo possível do mesmo extrair qualquer critério para aferir dos pressupostos que permitam responsabilizar o EP pela prática de actos legislativos.

  4. A inconstitucionalidade por omissão não pode ser suprida pelos tribunais, mas apenas pelo legislador, na sequência da declaração dessa inconstitucionalidade pelo Tribunal Constitucional (TC) nos termos do n.º 2 do art.º 283.º da CRP.

  5. O ordenamento jurídico-constitucional português não admite o controlo jurisdicional concreto de omissões legislativas, ao contrário do que se verifica com a inconstitucionalidade por acção.

  6. O Acórdão do TC n.º 474/02, apenas verificou a omissão legislativa parcial por o legislador não ter dado total execução à alínea e) do n.º 1 do art.º 59º da CRP – excluindo do direito dos trabalhadores por conta de outrem ao subsídio de desemprego, a maioria dos trabalhadores da função pública – com vista a essa omissão ser suprida, o que ocorreu com a entrada em vigor da Lei n.º 11/2008.

  7. Só a partir da entrada em vigor daLei n.º 11/2008 é que o A. teria direito a subsídio de desemprego o que não o eximiria de demonstrar que possuía todos os requisitos necessários naquela previstos.

  8. Não é possível precisar juridicamente a formulação dos diferentes direitos sociais para que os cidadãos possam neles fundar pretensões directamente exigíveis, sem os mesmos serem definidos, em concreto, pelo legislador comum, dado o princípio da oportunidade política e económica por que este se pode reger, nesta matéria.

  9. À data em que o A. cessou o contrato não existia qualquer normativo que previsse a atribuição do subsídio de desemprego aos funcionários públicosnem que determinasse a responsabilidade do Estado por omissões legislativas.

  10. Ao não ter requerido o subsídio de desemprego que peticiona, não se formou qualquer direito ao mesmo.

  11. Não se verifica, assim, qualquer ilicitude por parte do Estado.

  12. A petição inicial não contém os factos demonstrativos da existência dos pressupostos necessários ao dever de indemnizar, nem a motivação de direito que justifique o pedido formulado, irregularidades que conduziram à ininteligibilidade do montante pedido e deveriam ter levado à improcedência da acção.

  13. “O A. não alegou nem fez prova de que requereu o subsídio de desemprego que agora peticiona, e que este lhe tivesse sido negado em virtude da omissão legislativa em causa, pelo que é impossível aferir a que período o mesmo se reporta e se nesse período estava desempregado”.

  14. “Desconhece-se se o A. pretende o subsídio social de desemprego ou o subsídio de desemprego bem como se detém os requisitos exigidos para as respectivas atribuições”.

  15. “De todo o modo, pela matéria factual trazida aos autos e documentação a estes junta e tendo em vista a aplicabilidade pelo acórdão recorrido, quer do DL n.º 119/99, de 14-4, quer do DL n.º 84/2003, de 24-4, o A. não detinha à data em que ficou desempregado, os requisitos quer para o subsídio de desemprego quer parao subsídio social de desemprego e nomeadamente que continuou desempregado, que estava inscrito na Segurança Social bem como no Centro de Desemprego”.

  16. “O A. nada alegou nem provou que demonstrasse a prática de um acto ilícito, a culpa do Estado, os danos, bem como o nexo de causalidade entre a omissão legislativa e os danos que invoca”.

  17. “Desconhece-se em que factos o A. se baseou para apresentar o quantitativo de 28.691,00 €, nomeadamente a percentagem de 65%, os 18 meses, bem como o salário mínimo”.

  18. “De todo o modo, os parâmetros de cálculo apresentados pelo A., não encontram em qualquer diploma legal o menor cabimento, não podendo o tribunal substituir-se ao A. na fixação desses parâmetros, com base em legislação de duvidosa aplicação ao caso, nomeadamente o DL n.º 84/2003, de 24-4”.

  19. “O art.º 6º dos factos dados como assentes, refere-se a uma modalidade de subsídio de desemprego que não está em causa nesta acção, sendo, de todo o modo, comprovativo de que se o A. requeresse o subsídio que agora peticiona antes de 29-3-2006, ou antes de 6-12-2007 (cfr art.º 7.º da factualidade assente) e detivesse os requisitos necessários, tê-lo-ia conseguido mesmo antes da entrada em vigor da Lei n.º 11/2008 de 20-2”.

  20. “Nestes termos, pode-se considerar que a não atribuição do subsídio, antes das datas referidas, se deveu ao facto de o A. não o ter solicitado ou não ter apresentado os documentos exigidos, ou não ter os requisitos necessários e não a qualquer omissão legislativa”.

  21. “Inexiste, assim, nexo de causalidade adequada entre a alegada omissão legislativa e os danos invocados”.

  22. “Verifica-se a existência de ‘culpa do lesado’ na medida em que o A. não requereu, aquando do termo do seu contrato, que lhe fosse atribuído o subsídio de desemprego que agora peticiona”.

  23. “Também não foram alegados pelo A., factos demonstrativos da culpa do Estado, nem sequer este requisito foi dado como provado pelas decisões recorridas”.

  24. “Na sequência da prolação do Acórdão n.º 474/02, de 19-11-2002, do Tribunal Constitucional, publicado no DR, I série – A, de 18-12-2002, foi iniciado o processo legislativo que culminou com a publicação da Lei n.º 11/2008, de 20.02, não tendo esta efeito retroactivo”.

  25. “O DL n.º 48051 de 21-12-1967, inaplicável ao caso, apenas responsabilizava as entidades públicas pela prática de erros de gestão pública de onde estavam excluídos os actos legislativos, jurisdicionais e políticos, bem como as omissões legislativas”.

  26. “O poder judicial não se pode substituir ao poder legislativo criando direito, sob pena da violação do princípio da separação de poderes consignada no art.º 111.º da CRP”.

  27. “A aplicação directa das normas constitucionais apenas é possível quando se trate de direitos, liberdades e garantias, pelo que não sendo o caso do art.º 22.º da CRP, este não pode ser directamente aplicável à situação sub judice”.

  28. “Nestes termos, por falta de demonstração dos requisitos necessários à invocação do direito ao subsídio de desemprego a que se arroga e por não se verificarem os requisitos da responsabilidade civil extracontratual do Estado – ilicitude, culpa, dano e nexo causal entre a ilicitude e o dano – a presente acção deveria improceder”.

  29. “Ao assim não considerar, violou o douto acórdão recorrido, os artºs 22º, 111º, 165º n.º 1 al f) e 202.º n.º 3 da CRP, 341º, 342º, 483º nº 1, 487º nº 2, 563º, 569º n.º 3 e 570º, todos do C. Civil; artºs 1 e 6 do DL nº 48051; artºs 16º, 19º, 22º, nº 2 e 24º nº 2 do DL nº 119/99, de 14-4, artº 10º do DL nº 67/2000, de 26-4”.

  30. “Termos em que se requer que o presente recurso de revista seja admitido e que seja o mesmo considerado procedente, revogando-se o acórdão recorrido e considerando-se improcedente a acção, absolvendo-se o Estado da totalidade do pedido”.

  31. O recorrido contra-alegou (fls 323 e ss), e, quanto ao mérito da causa, concluiu, no essencial, assim: “6) Estamos a falar de um caso que está atualmente legislado e conforme o recorrente diz «…existem já vários casos idênticos, tratados na jurisprudência dos TCA Norte e Sul, todos condenatórios do Estado»” (fl. 337).

    (…) 14) Tendo em conta que a questão de direito...

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