Acórdão nº 0978/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 10 de Março de 2016

Magistrado ResponsávelCARLOS CARVALHO
Data da Resolução10 de Março de 2016
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1.

RELATÓRIO 1.1.

“Z…………, SA” devidamente identificada nos autos, instaurou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada [«TAF/A»] a presente ação administrativa especial contra a atual “X………….., SA” [doravante «X……..…, SA»] [ente que sucedeu ope legis à “V………., SA” - arts. 01.º, 23.º do DL n.º 91/2015, de 29.05, e 262.º do CPC/2013 - cfr. despacho de fls. 452], peticionando, pela motivação inserta na petição inicial, que fosse declarado nulo ou, então, anulado parcialmente o ato praticado pela Delegação Regional da Bragança, comunicado pelo ofício de 06.07.2010 e recebido a 12.07.2010, que determinou que a mesma, no prazo de 60 dias, apresentasse um projeto relativo a obras a realizar no posto abastecimento de combustíveis [«PAC»] localizado na EN 103 [Km 232+700], em Vinhais [i) arranjos exteriores não deram execução cabal ao projeto licenciado, existindo um posto de ar e de água que não estava previsto naquele projeto; ii) ausência completa de sinalização horizontal; iii) sinalização vertical em desconformidade com normas vigentes], bem como para, no mesmo prazo, apresentasse “projeto que contemple memória descritiva, o alçado, corte e perfil transversal cotado relativamente ao eixo da estrada e sua implantação na respetiva infraestrutura, descritiva dos elementos publicitários, dando cumprimento ao disposto na Lei n.º 97/88 … e Decreto-Lei n.º 105/98 …”.

1.2.

O «TAF/A» veio a prolatar acórdão, datado de 28.01.2013, julgando a ação parcialmente procedente e, nessa conformidade, anulou o referido ato apenas no segmento relativo à ordem de apresentação de projeto para legalização e licenciamento da afixação de publicidade por violação de lei [erro nos pressupostos de direito] [cfr. fls. 178 e segs.

].

1.3.

A A. e a R., inconformadas, recorreram para o TCA Sul o qual, por acórdão de 16.04.2015, negou provimento a ambos os recursos jurisdicionais, mantendo a decisão recorrida ainda que com fundamentação em parte diversa [cfr. fls. 350 e segs.

].

1.4.

Invocando o disposto no art. 150.º do CPTA a A., de novo inconformada com o acórdão proferido pelo TCA Sul, interpôs, então, o presente recurso jurisdicional de revista [cfr. fls. 385 e segs.

], apresentando o seguinte quadro conclusivo que se reproduz: “...

A.

O presente recurso perante o Supremo Tribunal Administrativo deve ser admitido ao abrigo do artigo 150.º, n.º 1 do CPTA, por aos presentes autos estar subjacente uma questão de grande relevância jurídica e social de importância fundamental, isto para além de ser manifestamente necessária a intervenção desse Supremo Tribunal Administrativo em vista a uma melhor aplicação do Direito.

  1. Com efeito, cumpre determinar concretamente se a V…………. tem ou não competência própria e concreta para ordenar a adoção de condutas relativas ao bom e seguro funcionamento de um posto de abastecimento, ou se tais competências estão reservadas às Câmaras Municipais ou às Delegações Regionais do Ministério da Economia como ocorre com o licenciamento das obras - posição esta seguida pelo Acórdão Recorrido -, dependendo da localização dos postos na rede viária municipal ou na rede viária regional e nacional, respetivamente.

  2. Na verdade, o quadro normativo aplicável nos autos é complexo, carece de ser devidamente interpretado e aplicado atenta a abundância legislativa e a sucessão de leis no tempo que têm vindo a regular a matéria relativa ao licenciamento de obras a realizar em postos de abastecimento de combustível, bem como da competência para adotar certas condutas relativas ao bom e seguro funcionamento dos postos, merecendo aqui destaque o Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de janeiro e o Decreto-Lei n.º 267/2002, de 26 de novembro, na redação do Decreto-Lei n.º 195/2008, de 6 de outubro.

  3. Acresce que a matéria em crise nos presentes autos é comum à de dezenas de ações pendentes e propostas pela Z………… - bem como a dezenas de ações propostas por outras petrolíferas - contra a V………, tendo como objeto precisamente a discussão da incompetência da V……… para impor a adoção de condutas relativas ao bom e seguro funcionamento dos postos de abastecimento/realização de obras em postos de abastecimento de combustível.

  4. Por essa razão objeto do presente recurso reveste-se também de relevância jurídica e social fundamental, pois a decisão deste Supremo Tribunal terá impacto em dezenas e dezenas de processos com o mesmo e exato objeto.

  5. Acresce que - por outra banda - a matéria dos autos é semelhante à que estava em crise no âmbito do processo n.º 0535/13 (no qual se levantavam questões relativas com o licenciamento de construção de um posto de abastecimento de combustível intrinsecamente ligadas com a matéria de discussão acerca competência para impor a adoção de determinadas condutas) tendo esse Tribunal admitido a revista por considerar que se exigia «ao intérprete um adequado labor na aplicação do direito, sendo certo que a questão a apreciar é de complexidade superior ao comum em razão da dificuldade das operações exegéticas a efetuar, de enquadramento normativo especialmente complexo, atenta a necessidade de compatibilizar diferentes regimes potencialmente aplicáveis».

  6. Assim, atento o preenchimento dos pressupostos legais que estão subjacentes ao artigo 150.º do Código de Procedimento e Processo nos Tribunais Administrativos deverá esse Supremo Tribunal Administrativo admitir a presente revista, apreciando assim o objeto do presente recurso.

  7. Isto posto, deve antes de mais deixar-se desde já patente que a V………… é incompetente para ordenar a adoção de certas condutas relativas ao bom e seguro funcionamento como o é aliás para a determinação de realização de obras no posto de abastecimento de combustível ora em causa.

    I. De facto, o regime aplicável aponta, no entendimento da Recorrente, no sentido de que a competência para a adoção de certas condutas relativas ao bom e seguro funcionamento bem como para o licenciamento de obras e de postos de abastecimento de combustíveis é das Câmaras Municipais e das Direções Regionais do Ministério da Economia, dependendo da localização dos postos de combustível na rede viária municipal ou regional e nacional, respetivamente.

  8. Com efeito, vigora atualmente nesta matéria o Decreto-Lei n.º 267/2002, de 26 de novembro, - revisto pelo Decreto-Lei n.º 195/2008, de 6 de outubro -, do qual resulta que a competência para proceder ao licenciamento de postos de abastecimento de combustível, e logo para as fiscalizar, passou a ser atribuída ou às Direções Regionais do Ministério da Economia ou às Câmaras Municipais, dependendo da localização dos postos de combustível na rede regional e nacional ou na rede viária municipal respetivamente.

  9. Porém, o acórdão ora recorrido aponta no sentido de que a ora Recorrida tem legitimidade para impor à ora Recorrente a adoção de certas condutas relativas ao bom e seguro funcionamento.

    L. No entanto, semelhante entendimento não se pode manter, sendo contrário ao que doutamente proferiu esse Supremo Tribunal Administrativo através de acórdão relatado no âmbito do processo n.º 0535/13, de 05 de dezembro de 2013, que taxativamente veio afirmar que «A construção, reconstrução, ampliação, alteração ou conservação das instalações de armazenamento e dos postos de abastecimento de combustíveis obedecem ao regime jurídico do licenciamento municipal de obras particulares, com as especificidades estabelecidas neste diploma», M. Logo acrescentando que «a competência para conceder o licenciamento das obras de construção é da Câmara Municipal nos termos dos arts. 4.º, n.º 2, alínea c) e 5.º, n.º 1 do DL n.º 555/99, de 16/12 (RJUE), podendo ser delegada e subdelegada».

  10. Além do mais, esse Supremo Tribunal Administrativo entendeu ser «inequívoco que a Entidade demandada nos autos citados - então a Câmara Municipal de Santa Maria da Feira - tem competência para a apreciação dos procedimentos de licenciamento e autorização de operações urbanísticas, em matéria respeitante ao licenciamento de postos de combustíveis».

  11. Ora, seguindo de perto o doutamente decidido é lícito concluir que a competência para o licenciamento de obras/para a determinação da adoção de certas condutas relativas ao bom e seguro funcionamento do posto, consubstanciáveis na realização de obras de alteração a realizar em posto de abastecimento de combustível é das câmaras municipais ou das Delegações Regionais do Ministério da Economia, consoante a localização concreta do posto de abastecimento de combustível.

    P.

    Ficam assim excluídas das competências para a determinação da adoção de certas condutas e o ato de licenciamento propriamente dito outras entidades que não as acima referidas, sem prejuízo, porém, da possibilidade de intervenção de outras entidades no procedimento pela via da emissão de parecer sobre as condições em que obras em posto de combustível devam ser realizadas.

  12. Resulta assim cabalmente demonstrada a incompetência absoluta da V………., S.A. para ordenar a adoção de certas condutas, consubstanciáveis em obras de alteração, e realização de obras em posto de abastecimento de combustível, por contraposição às competências próprias dos municípios e o do Ministério da Economia.

  13. De facto, dúvidas não restam sobre o facto de a competência para proceder ao licenciamento da construção, exploração, alteração da capacidade renovação de licença e outras alterações que de qualquer forma afetem as condições de segurança das instalações ser das câmaras municipais ou das direções regionais do Ministério da Economia.

  14. Tal facto é determinante para concluir que a V……… não tem competência para ordenar a adoção das referidas condutas, consubstanciáveis em obras de alteração, que invoca no despacho em crise nos autos, visto que competência necessária à prática desses atos é de órgãos de outras pessoas coletivas: dos municípios e do Estado.

  15. Além do mais, a norma contida no artigo 10.º do DL 374/2007 - e...

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