Acórdão nº 1011/14.4TYLSB.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 25 de Junho de 2015

Magistrado ResponsávelJORGE LEAL
Data da Resolução25 de Junho de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os juízes no Tribunal da Relação de Lisboa: RELATÓRIO: Em 09.7.2014 Luísa requereu no Tribunal do Comércio de Lisboa a declaração de insolvência de F, Lda.

A A. alegou, em síntese, que é sócia e gerente da requerida, à qual emprestou, em 2009 e 2010, o total de € 2 950,00, que nunca lhe foi devolvido. Segundo a requerente, a requerida é devedora de um elevado número de obrigações incumpridas e objeto de ações judiciais, entre as quais a requerente identificou três execuções, no valor total de € 7 666,67. Mais acrescentou que a requerida encerrou o seu estabelecimento e não tem qualquer atividade nem tão pouco qualquer bem para ser penhorado. Assim, alega a requerente, verificam-se as situações previstas nas alíneas a) e b) do n.º 1 do art.º 20.º do CIRE, tendo a requerente legitimidade para requerer a insolvência da requerida.

Em 14.7.2014 foi proferido despacho de indeferimento liminar da petição inicial, por ilegitimidade da requerente, atento o disposto no n.º 2 do art.º 245.º do Código das Sociedades Comerciais (“os credores por suprimentos não podem requerer, por esses créditos, a falência da sociedade (…)”).

A requerente apelou desta decisão, tendo apresentado alegação em que formulou as seguintes conclusões:

  1. O recurso ora interposto pela Apelante versa sobre a sentença proferida pela Meritíssima Juiz a quo, a fls.., a qual indeferiu liminarmente a petição inicial.

  2. Ou seja, resulta claro que, nos termos do nº 1 do artigo 20º do CIRE, qualquer credor pode requerer a insolvência da sociedade.

  3. Resta contudo aferir como deverá ser interpretado o art. 245º nº2 do Código das Sociedades Comerciais estabelecendo que consagra que “Os credores por suprimentos não podem requerer, por esses créditos, a falência da sociedade.” d) Resulta claro que este regime estava previsto para o anterior regime dos processos de falência.

  4. Resta apurar se deve ser efectuada, ou não, uma interpretação actualista da norma em causa.

  5. O Código de Insolvência vigente já foi objecto de oito versões e sujeito a sete alterações: g) O Código da Sociedades Comerciais foi objecto de quinze alterações (não contando as rectificações) h) Ou seja, não pode a Requerente concordar que o intérprete deve efectuar uma interpretação actualista quando o legislador, posteriormente à publicação do CIRE, já alterou o Código das Sociedades quinze vezes e o Código de Insolvência sete vezes, e nunca alterou o nº 2 do artigo 245º do Código das Sociedades Comerciais.

  6. Entende a Recorrente que se a intenção do Legislador fosse que tal norma se aplique aos processos de insolvência, teria alterado a norma como alterou outras.

  7. Assim sendo, sem mais delongas, vem requerer a revogação da douta sentença e a substituição por outra que ordene o prosseguimento dos autos.

O recurso foi admitido como apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.

Determinada a citação e a notificação da requerida para os termos da ação e do recurso, veio a ser nomeada representante especial da requerida nos termos do n.º 3 do art.º 25.º do CPC, a qual foi citada, nada tendo dito ou requerido.

Chegados os autos a esta Relação, foram colhidos os vistos legais.

FUNDAMENTAÇÃO: A questão objeto deste recurso cinge-se em saber se deve considerar-se ainda em vigor o disposto no n.º 2 do art.º 245.º do Código das Sociedades Comerciais, com base no qual o tribunal a quo recusou à requerente legitimidade para peticionar a declaração de insolvência da sociedade requerida.

O factualismo a levar em consideração é o emergente do Relatório supra.

O Direito: O Código das Sociedades Comerciais, aprovado pelo Dec.-Lei n.º 262/86, de 02.9, ao regular no capítulo IV do Título III o contrato de suprimento, tipificou juridicamente um contrato que já era socialmente típico. Como o indica o próprio sentido etimológico da palavra (proveniente das palavras latinas “supplere” – preencher, completar – e “mento” – sufixo nominativo que ocorre em substantivos derivados de verbos, traduzindo o resultado de uma ação), os suprimentos representam empréstimos (ou ato equiparado) efetuados pelos sócios em benefício da sociedade, tendo em vista acudir a necessidades para cuja satisfação o capital social é insuficiente. O caráter de permanência do respetivo crédito é essencial, o que decorre da sua função suplementar do capital social ou substitutiva de novas entradas de capital. O prazo que o legislador definiu como indicativo desse caráter de permanência é de um ano.

Assim, o art.º 243.º do CSC dispõe o seguinte: “Contrato de...

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