Acórdão nº 2656-10.7TBVFX.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 26 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelV
Data da Resolução26 de Março de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa * I – Relatório: A...

e J...

, com os sinais dos autos, intentaram acção declarativa de condenação, sob indicação da forma de processo ordinário, contra J...

e mulher, H...

, também com os sinais dos autos, peticionando a condenação dos RR. a:

  1. Reconhecerem que o terraço que ocupam é comum às duas fracções infra identificadas, conforme o respectivo título constitutivo de propriedade horizontal; b) Desocuparem esse terraço de coisas que nele se encontrem; c) Demolirem o pombal no prazo de vinte dias; d) Retirarem o portão de acesso ao terraço de cobertura das garagens, de modo a possibilitar aos AA. o acesso ao mesmo; e) Absterem-se de usar o terraço para fim diferente do que consta no título de constituição da propriedade horizontal.

    Alegaram, para tanto, que: - são proprietários da fracção autónoma designada pela letra “A”, correspondente ao rés-do-chão e garagem, do prédio urbano, constituído em propriedade horizontal, sito na Quinta da Marquesa, Estrada da Sub-Serra, n.º 5, em Alhandra; - os RR. são proprietários da fracção autónoma designada pela letra “B”, correspondente ao 1.º andar e garagem, do mesmo prédio urbano; - são comuns todas as partes não individualizadas, designadamente o terraço de cobertura das garagens, terraço este onde os RR., sem consentimento dos AA., construíram um pombal, dando ao local um destino diverso do que consta no título de constituição da propriedade horizontal; - os RR. ocupam também o terraço com uma churrasqueira, mesas e cadeiras, tendo até vedado o acesso ao mesmo, mediante a colocação de portão fechado à chave, com que impedem os AA. de acederem ao terraço.

    Contestaram e reconvieram os RR.: - impugnando, em contestação, que o terraço de cobertura da sua garagem seja parte comum do edifício; - alegando que o pombal existe no mesmo local há mais de 50 anos, tendo sido construído por anterior proprietário, com ocupação apenas do terraço de cobertura da sua garagem; - bem como que os demandados instalaram, na sua propriedade exclusiva, o portão para maior segurança das suas pessoas e bens; - e que, caso os AA. pretendam utilizar o terraço de cobertura da sua garagem, terão que construir o respectivo acesso, e não através da fracção dos RR.; - assim concluindo pela improcedência da acção; - e peticionando, em reconvenção contra os AA., a condenação destes a demolirem a rede de vedação e o portão que construíram a meio do logradouro do prédio, por tal inovação prejudicar a utilização pelos Reconvintes da parte do logradouro comum.

    Replicaram os AA., concluindo pela inadmissibilidade da reconvenção ou, assim não se entendendo, pela sua improcedência e, bem assim, pela procedência da acção.

    Na audiência preliminar, corrigido o valor da causa e, consequentemente, a distribuição, passaram os autos a ser tramitados como acção de processo sumário, decidindo-se ainda pela inadmissibilidade do pedido reconvencional e operando-se o demais saneamento e a condensação do processo, com elaboração de factos assentes e base instrutória, sem reclamações.

    Falecido o A. J..., foi habilitada como sua herdeira a A. A...

    Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença – datada de 04/04/2014 – que conheceu em matéria de facto e de direito, julgando a acção parcialmente procedente e, assim, condenando os RR. a reconhecerem que o terraço de cobertura das garagens é parte comum do prédio e a retirarem o portão de acesso ao terraço de cobertura das garagens, de modo a possibilitar aos AA. o acesso ao mesmo, absolvendo-os do demais peticionado.

    Inconformados, recorrem os RR., apresentando as seguintes Conclusões: «1ª O registo do depoimento de parte da A. bem como o das testemunhas sob a forma gravada apresenta grandes deficiências por excesso de ruídos, tornando extensas passagens totalmente inaudíveis ou imperceptíveis.

    1. A arguição da nulidade dos meios de prova só agora pode ser deduzida, por estar condicionada ao prazo de interposição de recurso sobre a matéria de facto, que envolva a apreciação da reapreciação da prova gravada.

    2. Face à conservação dos meios processuais imperfeitos, torna-se necessária a repetição do julgamento.

    3. O Tribunal “a quo” não apreciou devidamente as provas testemunhal e documental produzidas em audiência de julgamento, verificando-se assim, erro na apreciação da prova.

    4. Impõe-se, assim, a reapreciação dos meios concretos da prova.

    5. Com vista à cabal qualificação quanto à questão de saber se o terraço de cobertura quer da garagem dos AA., quer da garagem dos RR., ser ou não parte comum do edifício.

    6. E ainda, apurar se as escadas de acesso à fracção dos RR. sita no 1º andar, estão oneradas com servidão de passagem para acesso ao terraço de cobertura da garagem dos AA. com vista a permitir a estes o livre acesso ao terraço destes.

    7. Devem, pois, ver reapreciados os concretos meios probatórios produzidos (testemunhais e documentais) e, consequentemente, revogar-se a sentença na parte recorrida, e substituir-se por outra que decida que os RR. não estão obrigados a reconhecer que os terraços de cobertura das garagens dos AA. e dos RR. não são partes comuns do edifício.

      E consequentemente, 9ª Os RR. não estão obrigados a dar passagem aos AA. pelas suas escadas e pelo seu terraço da sua garagem para que estes acedam ao terraço da sua garagem.

    8. E ainda, que os RR. não sejam obrigados a retirar o portão de acesso aos terraços de cobertura das garagens.

    9. O Tribunal “a quo” violou o previsto nos nºs 4 e 5 do art. 607º do C.P.C.

    10. Deve, pois, dar-se provimento ao Recurso absolvendo-se os RR. da totalidade dos pedidos formulados pelos AA. na sua p. i.».

      *** A A. contra-alegou, concluindo pela extemporaneidade da invocação de deficiência na gravação da prova, pela rejeição da impugnação da decisão de facto por inobservância dos ónus legais a cargo da parte impugnante e pelo bem fundado da decisão recorrida, com a consequente improcedência do recurso.

      *** O Tribunal a quo indeferiu, por extemporaneidade, a arguição de nulidade por deficiência da gravação da audiência, perante o que os Recorrentes nada vieram dizer.

      O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo, tendo então sido ordenada a remessa dos autos a este Tribunal ad quem, onde resultam mantidos o regime e efeito recursório fixados.

      II – Âmbito do Recurso: Perante o teor das conclusões formuladas pela parte recorrente – as quais (exceptuando questões de conhecimento oficioso não obviado por ocorrido trânsito em julgado) definem o objecto e delimitam o âmbito do recurso, nos termos do disposto nos art.ºs 608.º, n.º 2, 609.º, 620.º, 635.º, n.ºs 2 a 4, 639.º, n.º 1, todos do Código de Processo Civil actualmente em vigor e aqui aplicável (doravante NCPCiv.), o aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26-06 ([1]) –, constata-se que o thema decidendum consiste em saber ([2]): 1. - Se é tempestiva e, caso o seja, se deve proceder a invocação de deficiência da gravação da prova, com a decorrente repetição do julgamento; 2. - Se ocorre adequada impugnação da decisão de facto e, caso ocorra, se existe erro de julgamento, obrigando à alteração da decisão de facto; 3. - Se os terraços de cobertura das garagens não são partes comuns, não havendo obrigação de dar passagem através das escadas e terraço dos RR./Apelantes, nem de retirada do portão destes.

      *** III – Fundamentação:

      1. Matéria de facto: Na 1.ª instância foi considerada a seguinte factualidade como provada: «1. Mostra-se registada a favor da Autora, através da Ap. 4849 de 2010/03/18, a aquisição da fracção autónoma designada pela letra “A”, correspondente ao rés-do-chão, destinado a habitação, do prédio urbano sito na Quinta da Marquesa, Estrada da Sub-Serra n.º 5, em Alhandra.

      1. Mostra-se registada a favor dos Réus, através da Ap. 3 de 2008/09/25, a aquisição da fracção autónoma designada pela letra “B”, correspondente ao 1.º andar, destinado a habitação, do prédio urbano sito na Quinta da Marquesa, Estrada da Sub-Serra n.º 5, em Alhandra.

      2. Do título constitutivo da propriedade horizontal do prédio identificado em 1 e 2, outorgado por escritura pública de 17.02.1994, consta: “Fracção A Formada pelo rés-do-chão, composta de cinco assoalhadas, cozinha, casa de banho, vestíbulo, despensa e garagem a tardoz com acesso pela Estrada de Sub-Serra (…), correspondente a cinquenta por cento do valor total do prédio; Fracção B Formada pelo primeira andar, com cinco assoalhadas, cozinha, casa de banho, vestíbulo, despensa e garagem a tardoz com acesso pela Rua das Linhas de Torres (…), correspondente a cinquenta por cento do valor total do prédio; (…) Que as fracções antes identificadas e relacionadas (…) são unidades independentes, distintas e isoladas entre si, são todas destinadas a habitação e com saída própria para a via pública.

        E que são comuns todas as partes do prédio não individualizadas (…)”.

      3. Os réus residem na fracção B e têm acesso à mesma através de uma escada exterior, com entrada pela Rua das Linhas de Torres.

      4. Por cima das garagens existe um terraço, situado ao nível do 1.º andar e contíguo à porta de entrada para a fracção B.

      5. A escada exterior existente na Rua das Linhas de Torres serve de acesso à fracção B e ao terraço de cobertura das garagens.

      6. Os réus utilizam um pombal que foi construído no terraço de cobertura das garagens.

      7. O pombal foi construído há, pelo menos, cerca de 50 anos.

      8. O pombal foi construído sem o consentimento dos Autores.

      9. O pombal ocupa parte da área do terraço correspondente à cobertura da garagem pertencente à fracção B.

      10. A estrutura do pombal é metálica e com cobertura plástica.

      11. Em meados do ano de 2009, os réus colocaram um portão com fechadura no cimo das escadas que dão acesso à sua fracção e ao terraço.

      12. Para além do pombal, os réus colocaram no terraço uma churrasqueira, mesas e cadeiras.

      13. O portão mencionado em 11 foi colocado sem o consentimento dos autores.

        ...

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