Acórdão nº 884/10.4JDLSB-A.1-3 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 18 de Março de 2015

Data18 Março 2015
ÓrgãoCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em Conferência, no Tribunal da Relação de Lisboa.

I.

RELATÓRIO.

  1. No Processo de Instrução com o número supra identificado, a correr termos na Comarca de Lisboa -Lisboa -Instância Central -...ª Secção -Instrução Criminal-J..., na sequência do despacho de arquivamento, o assistente R...

    veio requerer a abertura de Instrução contra o arguido RN...

    , imputando-lhe a prática de um crime de ofensa à integridade física qualificada previsto e punido pelo artº 143º, nº 1, 145º nº 1 a), com referência ao artº 132º nº 2, m), todos do Código Penal. Terminada a Instrução veio a ser proferido o despacho certificado a 1280 a 1288, pronunciando os arguidos nos termos da acusação pública proferida, não pronunciando o arguido RN pela prática do crime de ofensa à integridade física qualificada que lhe havia sido imputado pelo assistente R....

  2. O assistente R...., não se conformando com esta decisão instrutória de não pronúncia do arguido RN... veio interpor recurso, terminando a motivação com a formulação das seguintes conclusões (transcrição): “I.

    Vem o presente recurso interposto da douta Decisão Instrutória proferida pelo Mmº Tribunal a quo, na parte em que determinou a não pronuncia do arguido RN... pela prática do crime de ofensa à integridade física qualificada previsto e punido pelo artº 143º, nº 1, 145º nº 1 a), com referência ao artº 132º nº 2, m), todos do Código Penal, relativamente aos factos indiciados no requerimento de abertura de instrução apresentado pelo assistente, ora recorrente, R....

    II.

    Com excepção do interrogatório do Arguido (prestado em debate instrutório, a requerimento do Recorrente), esta foi uma Instrução sem actos de instrução; foi uma Instrução em que o Mmo. Tribunal a quo violou o dever, com assento no art.° 290.°, n.° 1, do C.P.P., de praticar "todos os actos necessários à realização das finalidades referidas no n. ° 1 do artigo 286" do C.P.P., pois não praticou todos nem sequer algum; III.

    Sobre a factualidade vertida pelo Assistente no requerimento de abertura de instrução, entende o Recorrente que o conhecimento do mérito do requerimento instrutório - que culminou com a decisão ora recorrida de não pronúncia do Arguido R... -, omite a decisão fáctica em que se deveria estribar, não descrevendo nem especificando quais os factos do requerimento de instrução que considera suficientemente indiciados e os que considera não suficientemente indiciados para a sujeição do Arguido a julgamento pelo crime que lhe vem imputado; IV.

    Face a tal omissão, entende o Recorrente que a não descrição da matéria fáctica, ainda que de forma sintética, determina a nulidade do acto, nulidade esta cognoscível em sede de recurso da decisão instrutória, nos termos das disposições conjugadas dos artigos. 308.°, n.° 2 e 283.°, n.° 3, al. b), do C.P.P.; V.

    Não fazendo, embora, parte do elenco de nulidades descritas nas alíneas a) a f) do art.° 119.° do C.P,P., não pode deixar de ter-se como insanável a nulidade consistente na falta de narração, ainda que sintética, dos factos que constituem fundamento da decisão de pronúncia ou não pronúncia, tendo em atenção que as disposições do art.119.° do CPP não são taxativas, segundo a interpretação que vem sendo dada a tal norma; VI.

    Em rigor, a Decisão recorrida redunda numa apreciação da instrução requerida em que apenas se lhe descortina: i)Uma súmula de actos praticados na fase de Inquérito; ii)A invocação das razões que fundamentaram o Despacho de arquivamento pelo Ministério Público; iii)A invocação, aliás manifestamente incompleta, dos fundamentos subjacentes ao indeferimento dos meios de prova requeridos no requerimento de abertura de instrução apresentado pelo Recorrente; iv)Uma resenha de apreciações atinentes à aparência física do Arguido, colhidas de testemunhas inquiridas ainda na fase de Inquérito, para aparentemente (?) justificar que não poderá ter-se por agente da agressão que lhe vem imputada porquanto, agora (no dia do debate instrutório), "constatou-se que o mesmo é alto, de porte atlético e com cabelo e barba alourados."; VII.

    Em rigor, fica-se, inclusivamente, sem entender se a Decisão instrutória adere à hipótese aventada no Inquérito pelo Ministério Público de que as lesões sofridas pelo Assistente podem ter sido provocadas por agentes policiais ou pelos restantes intervenientes nos incidentes; VIII.

    Hipótese esta tão inverosímil (para não dizer irreal) quando há três testemunhas – CF..., CL... e SD... - que ainda na fase de Inquérito disseram que viram um agente sem uniforme abrir um bastão que trazia na mão e acertado com o mesmo na face do Assistente; IX.

    Atento o teor da Decisão Instrutória parece que a mesma, não só adere à posição do Ministério Público - que obliterou o teor da queixa apresentada em que se relata que o Assistente e o amigo RD..., que o acompanhava, tentaram retirar-se do local, tendo sido impedidos de realizar tal intento pelo Agente RN... e por um Agente fardado como, inclusivamente, omite o teor dos depoimentos das testemunhas que presenciaram os factos: CF... e SD..., respectivamente a fls. 248 e 387; X.

    No que concerne à requerida diligência de oficiar-se a PSP para identificação do agente retratado na fotografia junta à queixa como Doc. 2, a fim de, posteriormente, se proceder à sua inquirição relativamente aos factos vertidos nos artigos 59° a 71º do requerimento de abertura de instrução, recaiu o Despacho de indeferimento de fls. 1073 e 1074 que invoca a falta de nitidez da fotografia carreada aos autos, tal aliás como consta da Decisão recorrida; XI.

    Mas esta omite que o indeferimento assentou também no seguinte fundamento: "Há que ter em conta os prazos de duração máxima da realização da fase de instrução previstos no art°. 306° CPP (quatro meses) seriam com toda a certeza ultrapassados aguardando os autos, eventualmente, vários meses pelas diligências a efectuar pela PSP sem sucesso;" XII.

    Data venia, a descoberta da verdade material concretizada no apuramento de factos indiciários do cometimento do crime e do seu autor não pode ceder perante uma mera prognose de ultrapassagem de um prazo que aliás tem a natureza de prazo meramente ordenador/indicativo; XIII.Conjugado com a evidência de que tal prova requerida não era destituída de interesse à instrução ou meramente dilatória para protelamento dos autos, até porquanto o indeferimento não aduziu tais fundamentos; XIV.

    Ademais, tal indeferimento obliterou a reiterada invocada importância de ser a única fotografia carreada aos autos que, de forma perceptível, retrata o agente que presenciou e até teve participação nas ocorrências que culminaram na agressão infligida ao Assistente; XV.

    E atendendo a que o douto Despacho de fls. 1073 e 1074 invocou, em segunda linha de fundamentação de indeferimento, a aparente falta de nitidez da fotografia dada aos autos, o Assistente, na reclamação que apresentou de tal Despacho, procedeu à junção da mesma, impressa a cores e com ampliação, obviando assim à alegada inutilidade da diligência invocada no Despacho de indeferimento; XVI.

    Apesar de requerida novamente a prova, o Tribunal a quo não se pronunciou, tendo incorrido assim em omissão de pronúncia relativamente a um meio de prova de incontestável importância; XVII.

    Para além de omissão de pronúncia, o Mmo. Tribunal a quo violou o disposto no art.° 290.° do C.P.P. pois não praticou todos os actos necessários com vista à comprovação judicial de deduzir acusação ou de arquivar o inquérito em ordem a submeter ou não a causa a julgamento.

    XVIII.

    Mais grave ainda, será bom constatar que ainda decorria o prazo para reclamação do indeferimento dos meios de prova requerido pelo ora Recorrente e pelo Assistente AAG... e já o Mmo. Tribunal a quo havia notificado as partes da data para a realização do debate instrutório; XIX.

    O que de per si é esclarecedor de que o desígnio da realização da Justiça e, concretamente, do apuramento da verificação ou não da matéria indiciada cedeu perante a intolerável primazia de razões de oportunidade, ou seja, tudo em detrimento da legalidade e da razão de ser da instrução que, nos termos do art.° 286.° e segs. do C.P.P., é a fase processual indicada para a realização de diligências requeridas pelo assistente que não tenham sido, ou não possam ter sido efectuados em sede de inquérito; XX.

    Acresce que a Decisão instrutória, ao vir tecer apreciações atinentes à aparência física do Arguido, colhidas...

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