Acórdão nº 1546/15.1YRLSB-1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 21 de Dezembro de 2015

Magistrado ResponsávelMARIA DO ROS
Data da Resolução21 de Dezembro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa.

1-Relatório: A demandante F. Ag deduziu arbitragem necessária contra a demandada Pharma.. , s.r.o., formulando os seguintes pedidos: i) Deverá a Demandada ser condenada a abster-se de, em território português, ou com o objectivo de comercialização nesse território, importar, fabricar, armazenar, introduzir no comércio, vender ou oferecer os medicamentos genéricos contendo como princípio activo o Bosentano, enquanto o CCP 131 (correspondente à EP526708) estiver em vigor.

ii) Mais deve ser a Demandada condenada a não transmitir a terceiros as AIM identificadas no artigo 54.° desta petição, até à referida data de caducidade do direito ora exercido.

iii) Requer-se, ainda, que, nos termos do artigo 829.°-A do Código Civil, seja a Demandada condenada a pagar uma sanção pecuniária compulsória de valor não inferior à média diária de vendas do medicamento Tracleer® no mercado português, por cada dia de atraso no cumprimento da condenação que vier a ser proferida nos termos acima requeridos, atendendo que a média anual de vendas do medicamento Tracleer® no mercado português ascende a € 9.629.096,00 (nove milhões, seiscentos e vinte e nove mil e noventa e seis euros)." Prosseguiram os autos a sua normal tramitação, vindo a ser proferida sentença com o seguinte teor na sua parte decisória: «Pelo exposto, acordam os árbitros em considerar parcialmente procedente a presente ação arbitral e em consequência:

  1. Condenam a Demandada PHARMA a abster-se de importar, fabricar, armazenar, introduzir no comércio, vender ou oferecer o medicamento genérico contendo como princípio ativo o Bosentano, em território português, ou tendo em vista a comercialização nesse território, enquanto o Certificado Complementar de Proteção n.º 131 se encontrar em vigor, ou seja, até 28 de fevereiro de 2017; b) Absolvem a Demandada PHARMA do pedido de proibição de transmissão a terceiros das AIM's em causa, sem prejuízo de o (s) eventual (ais) transmissário (s) se encontrar (em) vinculado (s), em termos de caso julgado, pela presente decisão arbitral; c) Condenam a Demandada PHARMA a pagar uma sanção pecuniária compulsória no montante de € 7.416,00 (sete mil quatrocentos e dezasseis euros), por cada dia em que se verifique o incumprimento da presente sentença; d) Condenam a Demandante a suportar 40% e a Demandada a suportar 60% das custas do processo, nos termos descritos supra no § 10.°, devendo o saldo de custas em dívida pela Demandada ser pago à Demandante no prazo de 15 (quinze) dias a contar do trânsito em julgado desta decisão».

    Inconformada recorreu a demandada, concluindo nas suas alegações: A- O presente recurso vem interposto da sentença arbitral, datada de 16 (dezasseis) de Junho de 2015, proferida, no âmbito dos autos de acção arbitral necessária, pelo tribunal arbitral ad hoc especificamente constituído para dirimir um pretenso litígio que oporá a Recorrida (F. AG) à Recorrente (PHARMA , S.R.O.), que os julgou parcialmente procedentes, por provados, e na parte em que condenou a Recorrente no 3.°pedido formulado e no pagamento de 60% dos encargos decorrentes da acção arbitral. No entanto.

    B- Salvo o devido respeito, o tribunal arbitral a quo não valorou in casu os elementos de base que fundamentariam uma decisão em sentido totalmente oposto, qual seja a improcedência do pedido de condenação no pagamento de sanção pecuniária compulsória, por falta de competência do tribunal arbitral para o efeito e por falta de prova dos respectivos pressupostos de aplicação, com a consequente absolvição da ora Recorrente de tal pedido e a respectiva condenação no pagamento dos encargos da acção arbitral em proporção não superior a 33,33333333333333%.

    C- O instituto da sanção pecuniária compulsória reveste uma dupla funcionalidade, mista de prevenção e de repressão.

    D- Tal vertente repressiva evidencia a necessidade de decisão judicial para arbitrar a sanção pecuniária compulsória.

    E- A vertente repressiva da sanção pecuniária compulsória apenas pode ser alcançada através de decisão emanada de tribunal judicial, dotado de jus imperii.

    F- O tribunal arbitral a quo (ou qualquer outro com a mesma natureza) não dispõe do necessário jus imperii para o arbitramento de sanção pecuniária compulsória.

    G- O tribunal arbitral recorrido não tinha competência para condenar a Recorrente no pagamento de sanção pecuniária compulsória e, como tal, errou ao arbitrá-la.

    H- Não resulta do artigo 2.° da Lei n.° 62/2011, de 12 de Dezembro, de compromisso arbitral ou tão pouco do acto de instalação do tribunal arbitral que estejam incluídos, no âmbito do objecto da arbitragem, poderes para arbitrar sanção pecuniária compulsória, logo.

    I- O tribunal arbitral a quo não podia ter condenado a Recorrida no pagamento de sanção pecuniária compulsória.

    J- Ao enveredar por aquele caminho, o tribunal arbitral a quo violou o disposto no artigo 46 °, n.° 3, alínea a), subalínea v), da Lei n.° 63/2011, de 14 de Dezembro.

    K- Foi feita errada interpretação do disposto no artigo 2.° da Lei n.° 62/2011, de 12 de Dezembro, conjugadamente com o disposto no artigo 46.°, n.° 3, alínea a), subalínea v), da Lei n.° 63/2011, de 14 de Dezembro, os quais deveriam ter sido interpretados no sentido de reconhecer a incompetência do tribunal arbitral para estabelecer uma sanção pecuniária compulsória.

    L- A aplicação de uma sanção pecuniária compulsória, nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 829.°-A, n.° 3, do Código Civil, é, por definição, uma condenação acessória da condenação principal do devedor no cumprimento da prestação decretada por sentença judicial, proferida por um tribunal estadual, sendo apenas possível em sede judicial (estadual) e não em sede arbitral.

    M- A competência para decretar sanção pecuniária compulsória constitui monopólio dos tribunais judiciais.

    N- A decisão recorrida, tendo por base o primeiro pedido formulado pela Recorrida, condenou a Recorrente numa prestação de facto negativo, infungível e instantânea [(...) abster-se de importar, fabricar, armazenar, introduzir no comércio, vender ou oferecer o medicamento genérico contendo como princípio activo o bosentano, em território português, ou tendo em vista a comercialização nesse território, enquanto o Certificado Complementar de Protecção n.° 131 se encontrar em vigor (...)].

    O- Não estão reunidos in casu os requisitos de aplicação de uma sanção pecuniária compulsória em concreto.

    P- A sanção pecuniária compulsória visa assegurar o respeito e o cumprimento das decisões judiciais, não assumindo natureza de indemnização.

    Q- A aplicação de uma sanção pecuniária compulsória constitui um meio de intimidação ou de pressão sobre o devedor, levando-o a cumprir a obrigação a que foi condenado, vencendo a resistência da sua oposição ou do seu desleixo, indiferença ou negligência, pelo que a procedência do pedido formulado pela Recorrida, encontrar-se-ia dependente da alegação e da prova pela mesma de um actual ou iminente incumprimento da Recorrente na execução da obrigação em que foi condenada na decisão recorrida.

    R- A jurisprudência maioritária do Tribunal da Relação de Lisboa vai no sentido de a cominação de sanção pecuniária compulsória pressupor uma violação actual ou iminente da obrigação de base.

    S- A fundamentação apresentada pelo tribunal arbitral para justificar a decisão tomada sobre a respectiva competência para arbitrar a sanção pecuniária compulsória é errada.

    T- No caso sub judice não existe uma violação actual ou a ameaça de uma violação iminente do direito derivado de patente de invenção ou de certificado complementar de protecção da titularidade da Recorrida.

    U- Em bom rigor, a Recorrida não alegou quaisquer circunstâncias factuais das quais pudesse resultar a convicção, pelo tribunal arbitral, da existência de uma violação actual ou a ameaça de uma violação iminente dos seus direitos de propriedade industrial, por parte da Recorrente.

    V- Contrariamente, resultou provado que a Recorrente não introduzirá no comércio o respectivo medicamento genérico objecto da autorização de introdução no mercado identificadas nos autos enquanto os direitos de propriedade industrial titulados pela Recorrida permanecerem válidos e em vigor.

    W- Pelo que, não poderia a Recorrente ter sido condenada no pagamento de qualquer sanção pecuniária compulsória.

    X- A titularidade ou o pedido de AIM não constitui ofensa de direitos de propriedade industrial.

    Y- Para efeitos de aplicação da sanção pecuniária compulsória tem de considerar-se o incumprimento, manifestado ou prestes a ocorrer, de determinada obrigação.

    Z- A falta de cumprimento atrás referida tem de ser verificada judicialmente.

    AA- Não podia o tribunal arbitral a quo condenar a Recorrente no pagamento de sanção acessória de obrigação principal cuja violação não foi alegada ou sequer indiciada (e...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT