Acórdão nº 122528/14.9YIPRT.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 17 de Dezembro de 2015
Magistrado Responsável | MARIA TERESA ALBUQUERQUE |
Data da Resolução | 17 de Dezembro de 2015 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
Acordam na 2ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa I – “Nos Comunicações”, instaurou contra Esplanada do Facho Bar Lda, procedimento de injunção, fazendo-o em 21/7/2014, assinalando estar em causa obrigação emergente de transacção comercial, solicitando o pagamento da quantia de € 7.315,77 de capital, acrescida de € 6.574,48 a título de juros de mora e de € 153,00 relativos ao montante de taxa de justiça paga pela apresentação do requerimento injuntivo, bem como € 100,00 a título de outras quantias, alegando ter celebrado com o requerido um contrato de prestação de bens e serviços de telecomunicações, no âmbito do qual, este se obrigou a efectuar o pagamento tempestivo das facturas e a manter o serviço pelo período nele fixado, sob pena de, não o fazendo, ser responsável pelo pagamento a título de cláusula penal, e nos termos das condições contratuais, do valor relativo à quebra do vínculo contratual, que inclui os encargos decorrentes da cessação antecipada do contrato, referindo mostrar-se em divida uma única factura, justamente relativa ao valor da cláusula penal (€ 7.315,77).
A requerida contestou invocando a incompetência territorial, a prescrição, a nulidade da cláusula penal ao abrigo do disposto nos arts 5º e 8º do DL nº 446/85 de 25/10, mais referindo, em sede de impugnação, nunca ter sido notificada pela A. da resolução do contrato, tão pouco do accionamento da cláusula penal, e não ter recebido a factura em causa, sendo o valor da mesma exageradíssima, impugnando ainda o valor de 100,00 a titulo de “outras quantias”, por se tratar de um valor não informado e não discriminado pela A.
A A. respondeu às excepções.
Foi proferido despacho que, julgando improcedente a excepção da incompetência territorial, notificou as partes para se pronunciarem sobre o eventual erro na forma do processo, tendo em conta que a quantia peticionada é referente ao valor de uma cláusula penal.
O que a A. fez, referindo, em síntese, que o valor peticionado a título de cláusula penal é uma obrigação pecuniária, ser admissível peticionar o pagamento de “outras quantias”, apenas devendo ser excluídas do âmbito de aplicação do Decreto-Lei n.º 269/98 as situações de responsabilidade civil extracontratual, concluindo pela inexistência de erro na forma do processo.
Também a R. se pronunciou, referindo que a pretensão da A. se funda em transacção comercial, mas da aplicação da transacção comercial estão excluídos os contratos celebrados com os consumidores, e ela, R., é uma consumidora, pelo que a A. deveria ter utilizado processo declarativo comum, o que gera a nulidade de todo o processo, não sendo sequer possível o convite ao aperfeiçoamento.
Referindo que se a acção tiver de prosseguir, pode o juiz julgar, logo procedente, alguma excepção dilatória ou nulidade que lhe cumpra conhecer, ou decidir do mérito da causa, e invocando o art 3º/1 do Regime Anexo ao Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de Setembro, foi julgada procedente a excepção dilatória de nulidade de todo o processo e, em consequência, absolvida a R. da instância.
II – Do assim decidido apelou a requerente, que concluiu as suas alegações nos seguintes termos: 1. Considerou o Tribunal a quo nulo todo o processo e absolveu a Ré da instância.
2. Salvo o devido respeito, decidiu o Tribunal a quo sem fundamento, como se deixará demonstrado.
3. Pelo que, em consequência, deverá o presente recurso ser julgado totalmente procedente, com a consequente revogação da sentença recorrida.
4. No requerimento de injunção, alegou a ora Recorrente a celebração do contrato, no qual a Recorrente se obrigou a prestar o serviço e a Recorrida se obrigou a pagar as facturas, bem como a manter o contrato pelo período estipulado entre as partes, sob pena de lhe ser cobrada uma cláusula penal apurada pela multiplicação do valor da mensalidade pelo período de permanência em falta; mais alegou que emitiu as facturas peticionadas e que as enviou à Recorrida, mas que a mesma não procedeu ao seu pagamento, pelo que lhe foi cobrado o valor contratualmente estabelecido a título de cláusula penal, o qual foi facturado e também peticionado.
5. A mui douta sentença recorrida padece de nulidade, senão pela própria sentença e fundamentos nela vertidos, mas também por reflectir a omissão grave de um dos actuais deveres processuais mais expressivos: o dever de gestão processual.
6. O regime da injunção destina-se a exigir o cumprimento das obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior a € 15.000,00, permitindo ainda peticionar o pagamento de “outras quantias”.
7. O requerimento injuntivo é um meio adequado para peticionar o pagamento da quantia devida pela Apelada a título de cláusula penal, porquanto, além de constituir uma obrigação pecuniária, está em estrita conexão com o contrato celebrado e o seu consequente incumprimento.
8. Neste sentido dispõe o Acórdão de 18.03.2010, disponível em www.dgsi.pt, concernente ao processo n.º 37975/08.3YIPRT, do Tribunal da Relação de Lisboa.
9. A simplicidade do procedimento de injunção não é incompatível com a discussão da própria validade da cláusula penal ou do valor peticionado a título de despesas, considerando que à oposição deduzida, a parte contrária tem sempre a faculdade de se pronunciar no início da audiência.
10. Não se verifica qualquer erro na forma do processo no que respeita ao montante cujo pagamento é peticionado a título de cláusula penal.
11. Assim, não é nulo todo o processo, conforme decidiu o Ilustre Julgador.
12. Dispõe o artigo 17º/3 do Decreto Lei n.º 269/98, de 1 de Setembro: “Recebidos os autos, o juiz pode convidar as partes a aperfeiçoar as peças processuais.”, referindo o artigo 6º do CPC que “O juiz providencia oficiosamente pelo suprimento da falta de pressupostos processuais susceptíveis de sanação, determinando a realização dos actos necessários à regularização da instância ou, quando a sanação dependa de ato que deva ser praticado pelas partes, convidando estas a praticá-lo”.
13. Assim, assumindo que eventualmente ocorresse erro na forma de processo, sempre podia e devia o juiz a quo ter convolado os autos especiais em autos de processo comum.
14. Tal entendimento resulta dos princípios conjugados do Código de Processo Civil na sua actual versão, a qual revolucionou o papel do juiz no processo, atribuindo-lhe mais poderes e deveres, precisamente para que o mesmo possa ajustar o processo às necessidades do caso, às vicissitudes do mesmo.
15. Sem prescindir, atente-se que o próprio artigo 193º/3 do Código de Processo Civil determina que “O erro na qualificação do meio processual utilizado pela parte é corrigido oficiosamente pelo juiz, determinando que se sigam os termos processuais adequados.” 16. Decorrendo, desde logo, dos arts 6º e 590º, ambos do CPC um poder dever de gestão processual, não poderia o tribunal a quo deixar de convolar os presentes autos numa acção de processo comum e, consequentemente, adequar os mesmos e os respectivos articulados à nova forma adoptada.
17. De tudo quanto ficou exposto, resulta que, a decisão proferida nos presentes autos: - violou, desde logo, os art.ºs 6º e 590º, ambos do CPC, pelo que deverá ser revogada e substituída por outra que julgue totalmente procedente o pedido, porquanto não só inexiste erro na forma de processo ou utilização indevida de meio processual como, ainda que a houvesse, a mesma apenas deveria ter originado a convolação dos presentes autos.
Não foram apresentadas contra alegações.
III – O circunstancialismo fáctico processual a ter em consideração na decisão do recurso emerge do acima relatado.
IV - Constituem questões a apreciar no presente recurso, a de saber se o procedimento de injunção assinalando obrigação emergente de transacção comercial constitui processo próprio para peticionar o pagamento de quantia correspondente à da cláusula penal, mostrando-se esta estabelecida nas condições contratuais referentes ao contrato de prestação de bens e serviços de telecomunicações celebrado entre as partes, e, caso assim não se entenda e se conclua pela existência de erro na forma do processo, se o dever de gestão processual não impunha ao juiz que providenciasse pelo suprimento da nulidade de processo em questão, convolando os autos numa acção de processo comum.
Para a resolução das questões assinaladas, julga-se útil proceder a algumas considerações a respeito da génese e evolução da providência de injunção.
A injunção, enquanto «providência que permite que o credor de uma prestação obtenha de uma forma...
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